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Psicologia, Saúde & Doenças
versão impressa ISSN 1645-0086
Psic., Saúde & Doenças vol.16 no.2 Lisboa set. 2015
https://doi.org/10.15309/15psd160201
Atividade física e estilos educativos parentais
Physical activity and parental educational styles
José Vasconcelos-Raposo1,Carla Teixeira1, Ana Lima1, & Inês Monteiro1
1Departamento Educação e Psicologia, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal
Endereço para Correspondência
RESUMO
O objectivo do estudo foi de determinar a relação entre sexo, idade e prática de actividade física ao nível dos estilos educativos parentais e das atitudes e comportamentos habituais de estudo. Participaram 272 alunos (101 rapazes e 171 raparigas) de uma escola da zona interior norte de Portugal, com idades compreendidas entre 13 e os 21 anos de idade (M = 15,66, DP = 1,71). Para avaliar as diferentes dimensões em estudo utilizamos o Questionário de Estilos Educativos Parentais (QEEP). Os resultados evidenciaram que os adolescentes percepcionam ambos os pais como mais responsivos e menos exigentes. Ambos os sexos percepcionam os estilos educativos parentais do mesmo modo, os adolescentes mais jovens (entre os 13 e 14 anos) percepcionam pai e mãe como mais responsivos e menos exigentes. O mesmo não acontece entre praticantes e não praticantes de actividade física fora do contexto escolar, uma vez que entre estes dois grupos não se verificaram diferenças nos estilos parentais percebidos. Quando olhamos ao sexo combinado com a prática de actividade física, constatou-se que os rapazes praticantes e as raparigas não praticantes percepcionam pai e mãe como mais exigentes do que responsivos. Com o presente estudo é possível concluir que ambos os pais tendem a adoptar um estilo mais responsivo e menos exigente, sendo notório um maior envolvimento parental com os adolescentes mais novos do que com os mais velhos. Por outro lado, os pais tendem a educar rapazes e raparigas dentro do mesmo estilo, sejam eles praticantes ou não de actividade física.
Palavras-chaves: adolescentes, estilos educativos parentais, actividade física
ABSTRACT
This study was conducted in order to determine the relationship between gender, age and physical activity, outside the school context, according to parenting styles and study attitudes and behaviors. The sample consisted of 272 students (101 girls and 171 boys) of a school from northern Portugal, aged between 13 and 21 years old (M = 15.66, SD = 1.71). For the purposes of the present studt the Questionário de Estilos Educativos Parentais (QEEP) was used. Results showed that adolescents perceived their parents as being more responsive and less demanding. Furthermore, boys and girls perceived parenting styles in the same way, and younger teens (between 13 and 14 years old) perceived their parents as being more responsive and less demanding. Among physically active and inactive students there were no differences in perceived parenting styles. However, when we analyze the combined effect of sex and physical activity, it was found that activie boys and inactive girls perceived their parents as more demanding than responsive. We can conclude that parents tend to adopt a more responsive and less demanding style, there is a greater parental involvement with younger adolescents than older ones. Moreover, parents tend to educate boys and girls in the same way, whether they are Physicalle active or inactive.
Keywords: adolescents, parenting style, physical activity
Desde 1920 que a psicologia do desenvolvimento se mostra interessada em estudar a influência parental no desenvolvimento das competências sociais e instrumentais das crianças e dos adolescentes (Darling, 1999). Os pais exercem muita influência na aquisição de hábitos e comportamentos, por serem os principais agentes de enculturação e socialização e modelos de referência para os seus filhos (Ramos, 2009). É no período da infância que esta influência se torna mais intensa e mais notória, mas os comportamentos parentais também afectam o desenvolvimento e a adaptação dos seus filhos durante o período da adolescência (Ducharne, Cruz, Marinho, & Grande, 2006). Este período é comummente designado de transição da infância para a idade adulta, durante o qual ocorrem mudanças biológicas (crescimento físico e maturação sexual), que contribuem para alterações sociais e psicológicas e para a aquisição de várias competências que permitem aos indivíduos tornarem-se membros activos da sociedade (Gleitman, Fridlund, & Reisberg, 2003). A adolescência inicia-se a partir da puberdade, que ocorre mais ou menos por volta dos 10 anos, mas todo o desenvolvimento biológico, psicológico e social vai depender do contexto sociocultural onde o adolescente se insere (Traverso-Yépez & Pinheiro, 2002). Para além das mudanças a nível biológico (a puberdade), a adolescência caracteriza-se, ainda, pelas modificações a nível cognitivo e interpessoal. Os adolescentes desenvolvem o pensamento abstracto e o raciocínio proposicional, pensam mais em termos de dinâmica e interacções, tentam perceber e colocar-se no ponto de vista do outro (Larson & Sheeber, 2009), criam hierarquias complexas de regras para guiarem as suas acções e desenvolvem a memória de trabalho (Kesek, Zelato, & Lewis, 2009). Por outro lado, os adolescentes passam menos tempo com a família e mais com os grupos de amigos, pois sentem necessidade de encontrar outras formas de identificação, do mesmo modo que necessitam de estabelecer relacionamentos íntimos (Allen & Sheeber, 2009). Este período da vida nem sempre é conturbado, mas coloca alguns desafios sérios, que, por um lado, geram alguma vulnerabilidade comportamental e emocional (Allen & Sheeber, 2009) e, por outro, são necessários ao desenvolvimento da independência, da responsabilidade, da auto-consciencialização, apreensão e empatia (Larson & Sheeber, 2009).
Embora a interacção pais-filhos tenda a diminuir durante a fase da adolescência, as práticas educativas parentais constituem um factor relevante no desenvolvimento dos adolescentes, sendo que estas práticas influenciam o crescimento da autonomia e o desempenho académico (Peixoto & Rodrigues, 2005). Contudo, a relação pais-filhos nem sempre se tem estabelecido da mesma forma ao longo dos tempos. Gomide (2009) realça algumas modificações fazendo alusão às alterações que a sociedade tem sofrido nas últimas décadas, que influenciaram o modo como os pais educam e se relacionam com os seus filhos. Uma dessas alterações prende-se com a crescente industrialização e com a consequente entrada da mulher no mercado de trabalho, o que levou a que a função “cuidadora”, que até então era desempenhada pela mãe, passasse a ser dividida com o pai. Por outro lado, a estrutura familiar em si tem-se alterado, sendo que as famílias extensas são cada vez mais raras e as novas formas de família surgem em maior número, como por exemplo, famílias monoparentais, homossexuais, com filhos de uniões anteriores, entre outros. Até à década de 80, as tarefas educativas eram baseadas na divisão de papéis segundo o género, o que na actualidade tende a ser mais escasso, embora a figura feminina assuma, ainda, a responsabilidade doméstica e o homem a autoridade moral. De acordo com Salvador (2007), as famílias tradicionais e controladoras estão a dar lugar às famílias modernas que valorizam não só os filhos, mas também a comunicação.
É neste contexto, o da interacção entre pais-filhos, de atitudes e de comportamentos parentais que se destacam os estilos educativos parentais. Em primeiro lugar, importa diferenciar o que são práticas parentais e o que são estilos parentais. As primeiras correspondem a comportamentos específicos por parte dos pais que têm como objectivo incentivar, nos filhos, comportamentos socialmente adequados e suprimir os inadequados (Salvador, 2007; Weber, Brabdenburg, & Viezzer, 2003). As práticas parentais podem ser coercivas, que se caracterizam pelo uso de estímulos aversivos no controlo do comportamento (por exemplo, punição verbal ou física), ou não coercivas, que representam o reforço positivo e a instituição de regras com determinadas consequências (Salvador, 2007).
As práticas parentais devem proporcionar o desenvolvimento de competências, evitando o aparecimento de comportamentos problema (Salvador, 2007). Inerente a este conceito estão os estilos parentais, que correspondem a manifestações dos pais para os filhos e que caracterizam a natureza da relação entre eles, ou seja, os estilos parentais estão relacionados com o padrão comportamental (por exemplo, atitude, tom de voz, práticas, tipo de linguagem) que os pais expressam dentro do clima emocional da interacção com os filhos (Darling & Steinberg, 1993; Salvador, 2007). Para Darling and Steinberg (1993) os estilos parentais são uma “constelação de atitudes face à criança, que, em conjunto, criam um clima emocional onde os comportamentos parentais são expressos” (p.488). A cada pai/ mãe corresponde um estilo parental, isto é, existem diferenças nos estilos parentais e tais diferenças devem-se, essencialmente, à cultura, à personalidade, ao tamanho da família, aos antecedentes parentais, ao estatuto socioeconómico, às habilitações literárias e à religião (Maccoby, 1992), bem como às características individuais dos filhos (Huver, Otten, Vries, & Engels, 2009; Montandon, 2005).
A maioria das pesquisas no âmbito dos estilos parentais tem por base o trabalho de Diane Baumrind (1966) e o seu conceito de estilos parentais, que inclui todo um conjunto de aspectos emocionais e comportamentais (Darling, 1999; Darling & Steinberg, 1993; Weber, Prado, Viezzer, & Branberburg, 2004). Num estudo longitudinal, a autora identificou três principais estilos educativos parentais: o estilo autorizado ou autoritativo, o estilo autoritário e o estilo permissivo (Baumrind, 1966; Cruz, et al., 2011; Darling, 1999; Ducharne et al., 2006; Weber, et al. 2003; 2004). Mais tarde, identificou-se outro estilo parental, o estilo negligente (Darling, 1999; Darling & Steinberg, 1993). Este conceito de estilos parentais está associado às variações das tentativas parentais de controlar e socializar as crianças e cada um destes estilos reflecte padrões de valores, práticas e comportamentos que ocorrem naturalmente (Darling, 1999). A caracterização dos estilos parentais tem por base duas dimensões importantes: a responsividade e a exigência, sendo que responsividade diz respeito à sensibilidade dos pais face aos interesses e necessidades dos filhos, e a exigência está associada ao grau de controlo exercido pelos pais para que as regras se façam cumprir (Ducharne et al., 2006; Huver et al., 2009). De um modo mais particular, pode dizer-se que a responsividade (também denominada de afecto-comunicação ou apoio parental) refere-se ao reconhecimento que os pais têm da individualidade da criança (Darling & Steinberg, 1993), ou seja, ao modo como os pais promovem essa individualidade e auto-afirmação, apoiando e tendo em conta os pedidos da criança (Baumrind, 2005). A responsividade está associada a comportamentos específicos como carinho, envolvimento, aceitação (Huver et al., 2009; Weber et al., 2004), incentivos à autonomia e comunicação fundamentada (Baumrind, 2005). Por outro lado, a exigência refere-se à regulação do comportamento, à confrontação directa, à exigência de maturidade (Baumrind, 2005) e à supervisão das actividades dos filhos, desde o conhecimento das mesmas até à sua monitorização activa (Huver et al., 2009; Weber et al., 2004). Actualmente, os pais temem errar na educação dos seus filhos, sentem-se em dívida para com eles, principalmente porque trabalham durante muito tempo, e neste sentido, tendem a compensá-los com a permissividade excessiva (Gomide, 2009). Assim, a exigência parental e a ideia de que as crianças “não têm querer” foram dando lugar à permissividade e à crença de que estabelecer limites pode originar traumas psicológicos. As crianças necessitam de regras de fácil execução e compreensão, com consequências curtas e consistentes, sendo que os pais devem fornecer um modelo moral adequado, estabelecendo e ensinando os limites comportamentais dos filhos (Gomide, 2009). É importante que os estilos educativos parentais não se enquadrem nos extremos, mas que se estabeleça um equilíbrio entre a responsividade e a exigência, de modo a surtir mais efeitos positivos no desenvolvimento da criança (Huver et al., 2009) e a gerar uma interacção positiva, promovendo comportamentos pró-sociais e saudáveis nos filhos (Salvador, 2007). Para adoptarem um estilo educativo parental que evidencie o equilíbrio entre estas duas dimensões, os pais devem envolver- se na educação dos seus filhos, facultando atenção, incentivo e auxílio, estimulando o diálogo e a diversão, respondendo às necessidades dos filhos e supervisionando as actividades e comportamentos dos mesmos, com obediência e limites (Weber et al., 2004). Os estilos parentais, para além de influenciarem o desenvolvimento dos filhos, vão também afectar os estilos parentais que estes irão adoptar futuramente (Weber et al., 2004).
Todo o conjunto de comportamentos e atitudes expressos dentro do clima emocional da interacção pais-filhos, e que caracterizam os diferentes estilos educativos parentais, exercem influência nos diferentes aspectos do desenvolvimento da criança, por exemplo, o desempenho escolar ou académico. Neste âmbito, Peixoto e Rodrigues (2005) e Salvador (2007) verificaram a existência de uma relação positiva entre o apoio social e emocional dado pelos pais e o desempenho e motivação escolar. O envolvimento dos pais na vida académica dos filhos tem mostrado efeitos positivos, principalmente se os pais interagirem com os filhos na realização de trabalhos escolares, na monitorização das actividades diárias e nos seus comportamentos, através do encorajamento e do reforço verbal directo (Soares, Souza, & Marinho, 2004). Assim, o papel dos pais mostra-se fulcral na modelagem de atitudes e comportamentos dos filhos face ao estudo, nomeadamente na reflexão de conteúdos e no aumento da motivação (Monteiro, Vasconcelos, & Almeida, 2005). De acordo com Salvador (2007), a família situa-se em dois extremos opostos, que são a família pró-saber e a família anti-saber. A primeira valoriza e respeita as actividades académicas dos filhos, estimulando a aquisição de conhecimentos, enquanto a segunda exerce um controlo aversivo, não dando prioridade à procura de conhecimento, mas apenas ao cumprimento das tarefas e obtenção das notas. Contudo, existem factores que dificultam a participação activa dos pais, tais como, falta de tempo, mudanças no ensino, desconhecimento das matérias, dificuldades de aprendizagem dos filhos, tipos de avaliação e comportamentos e atitudes dos professores em relação aos pais e às crianças (Soares et al., 2004). Apesar de ser importante a participação dos pais no percurso académico dos filhos, estes devem desenvolver o seu próprio método de estudo de acordo com as suas necessidades individuais (Monteiro et al., 2005). Os estilos parentais influenciam os hábitos de estudo e, consequentemetne, o rendimento académico. Deste modo, é evidente a influência dos pais na aquisição dos mais variados hábitos, comportamentos e atitudes por parte dos seus filhos, nomeadamente, os que estão relacionados com um estilo de vida saudável e activo (Ramos, 2009). É cada vez mais evidente a acentuada redução da prática de actividade física nas sociedades desenvolvidas, com padrões de sedentarismo cada vez mais vincados (Lopes & Maia, 2004). Estudos longitudinais que analisaram o tracking (estabilidade e manutenção de um determinado comportamento ao longo da vida) concluíram que a prática de actividade física é um comportamento pouco estável, sendo essa instabilidade mais evidente nos períodos de transição da infância para a adolescência e da adolescência para a idade adulta (Malina, 2001).
É necessário distinguir o conceito de actividade física de exercício físico, pois estes conceitos são muitas vezes confundidos e usados sem distinção. O exercício físico é um subgrupo da actividade física, que se caracteriza pelo movimento do corpo planeado, estruturado e repetitivo, realizado para promover ou manter uma ou mais componentes da condição física (Buckworth & Dishman, 2002; Veloso, 2005). De acordo com Buckworth and Dishman (2002), actividade física pode ser definida como o movimento produzido pelos músculos esqueléticos, do qual resulta dispêndio energético, e compreende lazer, actividade desportiva, trabalho e tarefas domésticas. Deste modo, a actividade física é de natureza complexa e difícil de mensurar, pois pode envolver diferentes formas, contextos e períodos de tempo. As dimensões que a compõem (tipo, frequência, intensidade e duração) é que permitem caracterizar o sujeito como activo ou inactivo (Lopes & Maia, 2004; Veloso, 2005). Os factores que influenciam o envolvimento dos adolescentes na actividade física diferem das restantes faixas etárias, por exemplo, intenção de ser activo devido à competência física percebida, nível de actividade dos pares, encorajamento por parte de pessoas significativas e tempo gasto fora de casa (Ammouri, Kaur, Neuberger, Gajewski, & Choi, 2007). O suporte social, principalmente o apoio parental, influencia a prática de actividade física nos adolescentes e contribui para a consolidação do hábito de ser ou não activo (Silva et al., 2008). Assim, a adesão das crianças e adolescentes à prática de actividade física depende do sistema de crenças e expectativas e do envolvimento dos pais, sendo que um estilo parental associado a um forte apoio e promoção de autonomia é muito importante para alcançar as recomendações da prática de actividade física em crianças e jovens (Ramos, 2009). Estas recomendações têm sido estipuladas por importantes instituições relacionadas com a saúde pública e com a prática de actividade física. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2003), para que se obtenham ganhos para a saúde, a actividade física deve ser praticado todos os dias, durante pelo menos 30 minutos, com uma intensidade moderada. Segundo Haskell et al. (2007), o American College of Sports Medicine e a American Heart Association recomendam a prática de exercício físico aeróbio de intensidade moderada, durante o mínimo de 30 minutos, cinco dias por semana ou, então, actividade de intensidade vigorosa durante 20 minutos, pelo menos 3 dias por semana.
A noção de actividade física remete-nos para o conceito de vivência activa ou active living, onde a actividade física se insere como um comportamento representativo de um estilo de vida activo e que se traduz em determinadas rotinas, como ir a pé para a escola, andar de bicicleta ou subir escadas (Veloso, 2005). Neste sentido, a prática regular de actividade física tem um papel decisivo na promoção da saúde, no aumento da qualidade de vida e do bem-estar (Veloso, 2005). A actividade física regular tem efeitos positivos na saúde, sendo os mais fundamentados na literatura a diminuição do risco de doenças coronárias, aterosclerose, acidentes vasculares cerebrais, enfarte do miocárdio (Alves, Montenegro, Oliveira, & Alves, 2005); auxílio no controlo de peso e da obesidade (Malina, 2001a), no controlo da ansiedade e depressão; e melhoria nos níveis da auto-estima, bem-estar e a socialização (Alves et al., 2005; OMS, 2003). Durante o período da adolescência verificam-se elevados níveis de stress, devido às constantes transformações de que os adolescentes são alvos, e, neste sentido, a actividade física funciona como um mecanismo de coping através do aumento dos sentimentos de mestria e de auto-eficácia e da avaliação dos acontecimentos de vida como menos stressantes e negativos (Hays, 1999). A actividade física tem, assim, um efeito amortecedor no stress e nos acontecimentos desfavoráveis, bem como, no consumo de substâncias e no impacto das adversidades familiares (Hays, 1999). Outro efeito benéfico prende-se com as questões da imagem corporal e da auto-estima, na medida em que, uma boa forma física está associada à prática de actividade física que se traduz numa melhor imagem corporal e, consequentemente, origina um aumento da auto-estima (Miles, 2007). A importância do estudo da relação entre estilos educativos parentais e actividade física prende-se com o facto de sabermos que a prática de actividade física encontra-se associada ao desempenho académico e que o envolvimento dos jovens nessas actividades está dependente do estilo educativo adoptado pelos pais. Estudos demonstram que crianças que são fisicamente activas tiveram um desempenho mais rápido em tarefas cognitivas e uma maior mobilização cerebral (devido ao aumento da produção de neurotrofinas), o que contribui para um maior rendimento escolar (Stevens, To, Stevenson, & Lochbaum, 2008; Tomporowski, Davis, Miller, & Naglieri, 2008).
Assim, com o presente estudo pretende-se determinar a relação entre sexo, grupo etário e prática de actividade física com os tipos de estilos educativos parentais. Para tal, foram definidos os seguintes objectivos específicos: comparar rapazes e raparigas ao nível dos estilos educativos parentais percebidos; comparar os diferentes grupos etários ao nível dos estilos parentais percebidos; comparar a prática e não prática de actividade física ao nível dos estilos educativos parentais percebidos; e, comparar o efeito combinado das variáveis sexo e prática de actividade física nos estilos educativos parentais.
MÉTODO
Este estudo é de cariz quantitativo, uma vez que foram utilizados questionários como instrumentos de recolha de dados e foi realizado um tratamento estatístico desses mesmos dados. É também um estudo quasi-experimental, pois não houve manipulação da variável independente, e é do tipo transversal, porque os dados foram recolhidos num único espaço de tempo (Almeida & Freire, 2003). Uma vez que foram realizadas comparações entre os diferentes grupos, este estudo tem também um cariz comparativo. As variáveis independentes são o sexo, a idade e a prática de actividade física. As variáveis dependentes são os estilos educativos parentais.
Participantes
A amostra deste estudo pode ser caracterizada como de conveniência, porque foi recolhida através da técnica de amostragem não probabilística, não sendo, assim, representativa da população portuguesa. Inicialmente, foram recolhidos 309 questionários, mas 37 destes foram eliminados, porque o seu preenchimento estava incompleto ou incorrecto. A amostra final ficou constituída por 272 estudantes do 8o e 9o ano do 3o ciclo (n = 136) e estudantes do ensino secundário (n = 136) de uma escola da zona interior norte de Portugal. Destes 272 estudantes, 37,1 % são do sexo masculino (n = 101) e 62,9% do sexo feminino (n = 171), com idades compreendidas entre os 13 e os 21 anos de idade (M = 15,66, DP = 1,71). Relativamente à prática de actividade física, da totalidade da amostra, 61 % praticam actividade física fora do contexto escolar (n = 166), sendo a actividade mais referida o futebol (22,8 %), seguido pela prática de várias actividades (10,7 %), da natação (7 %) e da dança (4,4 %). Destes 166 estudantes que praticam actividade física fora do contexto escolar 81 % pratica duas vezes e três ou mais vezes por semana, e cerca de 89 % praticam durante 30 a 60 minutos e mais do que uma hora. Quanto à caracterização do agregado familiar, convém salientar que a maior parte dos adolescentes que compõem a amostra vivem com os pais (80,9 %) e os restantes vive com famílias monoparentais ou com outra constituição (19,1 %). A maioria tem um ou dois irmãos (58,5 % e 19,5 %, respectivamente), apenas 9,2 % têm três ou mais irmãos e cerca de 12,8 % são filhos únicos.
Material
Questionário de Estilos Educativos Parentais (QEEP)
Este questionário, que permite avaliar as percepções que os adolescentes têm dos estilos educativos dos seus pais, foi traduzido e adaptado das Parenting Scales, de Lamborn, Mounts, Steinberg and Dornbusch (1991), por Ducharne et al. (2006) e posteriormente validado por Cruz et al. (2011). Em relação à escala original, foram introduzidos dois itens novos, um item foi reformulado e um outro foi eliminado, e o modo de cotação foi ligeiramente alterado, optando-se pela uniformização das escalas de resposta. O QEEP é então constituído por 19 itens, cujas respostas são cotadas numa escala de quatro pontos e a sua denominação vai variando ao longo dos itens. Nos primeiros cinco itens as opções de resposta variam de discordo totalmente, não concordo, concordo a concordo em absoluto. Já nos itens 6 e 7, as opções variam de nunca, às vezes, frequentemente a sempre. Nos itens 8 e 9, as respostas alternam entre quase todos os dias, algumas vezes por semana, algumas vezes por mês e quase nunca. Por último, os restantes itens variam entre nada, pouco, bastante e muito. Este questionário é composto por duas subescalas, a exigência/supervisão e a responsividade, que permitem identificar os quatro estilos educativos parentais propostos por Baumrind (1966). A exigência/supervisão é composta por 10 itens, cujo conteúdo remete para a monitorização, controlo e supervisão dos pais. Já a subescala da responsividade, composta por 9 itens, baseia-se no apoio emocional, comunicação e promoção da autonomia. Nos cinco primeiros itens, o pai e a mãe são avaliados separadamente e nos restantes itens são avaliados em simultâneo. Tendo em conta esta divisão relativamente às figuras parentais, na prática estes 5 itens transformam-se em 10 itens, uma vez que cinco itens são dirigidos ao pai e outros cinco à mãe. Deste modo, a subescala responsividade fica composta por 14 itens, ficando, assim, a escala total com 24 itens. Na sua versão original, as duas sub-escalas apresentaram uma boa consistência interna, com um α de 0, 78 para a sub-escala responsividade e 0,85 para a sub-escala supervisão. Neste estudo, a escala apresentou uma boa consistência interna (α = 0,817), assim como as sub-escalas, 0,733 para a responsividade e 0,847 para a exigência. Tendo em consideração a divisão dos cinco primeiros itens, criaram-se duas sub-escalas: a responsividade do pai, que agrupa os cinco primeiros itens do questionário dirigidos ao pai e os restantes itens relativos à dimensão responsividade; e a responsividade da mãe, que engloba os itens da responsividade direccionados à figura materna e os restantes. Contudo, estas duas sub-escalas apresentaram uma consistência interna aceitável, com valores de 0,564 e 0,536, respectivamente.
Procedimento
Os questionários deste estudo foram aplicados aos alunos do 8.º e 9.º ano do 3.º ciclo do ensino regular, bem como, aos alunos que frequentavam os três anos do ensino secundário. Por questões de regulamento interno da escola, os questionários deste estudo foram aplicados por professores, previamente informados acerca das normas de aplicação. Os professores pediram aos alunos que respondessem com sinceridade a todas as questões que lhes foram apresentadas.
Para a criação da base de dados e posterior análise estatística foi utilizada a versão 16 do software SPSS (Statistical Package for Social Sciences). Numa primeira fase, foi feita a análise descritiva que permitiu a descrição das variáveis em estudo e da amostra, no que diz respeito à média, desvio-padrão e frequências. De seguida, para a análise comparativa das diferentes variáveis dependentes, foram realizadas análises multivariadas da variância (MANOVA). A MANOVA permite não só trabalhar com mais do que uma variável dependente, como combina as diferentes variáveis dependentes e as assume como uma única variável (Dancey & Reidy, 2006). Efectuou-se ainda uma MANOVA com o intuito de verificar o efeito combinado das variáveis independentes sexo e prática de actividade física nas variáveis dependentes. Convém salientar que, para proceder à análise multivariada da variância é necessário que sejam cumpridas algumas condições: normalidade multivariada (cada variável dependente deve ter uma distribuição normal, com um mínimo de 12 participantes cada) e homogeneidade de variâncias (visível através do teste M de Box, e sempre que este apresenta um valor de p > 0,005). Contudo, uma vez que o teste M de Box é considerado conservador e mais adequado a amostras pequenas, deve ter-se em conta os valores do teste de Levene, que devem apresentar um valor de p > 0,05, na maioria das variáveis (Dancey & Reidy, 2006).
RESULTADOS
Inicialmente serão apresentados os resultados relativos à análise descritiva das variáveis analisadas, e os restantes resultados serão apresentados tendo em consideração a ordem dos objectivos propostos neste estudo. As variáveis independentes deste estudo são: sexo, grupos de idade e prática de actividade física fora do contexto escolar. Ao nível dos estilos educativos parentais, as variáveis dependentes são a responsividade do pai, responsividade da mãe, responsividade total e exigência/ supervisão.
Para ser possível descrever cada variável dependente, foram calculados os valores da média e desvio padrão. Por outro lado, para se verificar a distribuição dos dados, determinaram-se os valores de Skewness (assimetria) e Kurtosis (achatamento). No quadro 1 estão apresentados os valores para cada variável dependente deste estudo.
Uma vez identificadas as diferentes variáveis, a primeira análise incide na distribuição dos dados. Considerando os valores de Skewness e Kurtosis apresentados, e tendo por referência Munro (2001), os dados apresentam uma distribuição normal, uma vez que os valores respeitam o intervalo [-1,96; 1,96] proposto pelos autores. Olhando aos valores da média e desvio padrão, no que diz respeito aos estilos educativos parentais percebidos, a responsividade por parte da mãe apresenta uma média superior (3,14 ± 0,39), assim como a responsividade total (3,10 ± 4,0), enquanto a dimensão exigência/supervisão apresenta o valor mais baixo (2,87 ± 0,57). (Ver quadro 2)
Uma vez expostos os resultados da análise descritiva, de seguida segue-se a apresentação dos resultados obtidos através da análise comparativa. No que respeita às diferenças entre o sexo masculino e o sexo feminino quanto aos estilos educativos parentais, foi possível prosseguir com a MANOVA, uma vez que o valor do teste M de Box não foi significativo (p = 0,411) e os valores do F de Levene foram superiores a 0,05. Através da MANOVA constatou-se que a variável sexo não produz um efeito geral no conjunto das variáveis dependentes (F(4,267) = 0,942, p = 0,440, λ Wilks = 0,986, ηp2 = 0,014) e quando analisámos separadamente as variáveis dependentes também não se verificou efeito da variável sexo em cada uma delas. No quadro 3 estão apresentados os valores médios que diferenciam os dois grupos, bem como o valor de F e o respectivo valor de significância.
A análise comparativa por grupos etários, o teste M de Box apresentou um valor não significativo (p = 0,125) e no teste de Levene, com excepção da variável responsividade da mãe (p = 0,004), todas as restantes variáveis apresentaram valores de p > 0,05, o que permitiu continuar com a respectiva análise multivariada. Neste sentido, verificou-se que a variável grupo de idade não produz um efeito geral no conjunto das variáveis dependentes (F (4,532) = 1,833, p = 0,069, λ Wilks = 0,947, ηp2= 0,027). Contudo, quando cada variável dependente é analisada separadamente, verificam-se diferenças entre os grupos de idade a nível das variáveis responsividade da mãe (F(2) = 6,063, p = 0,003) e responsividade total (F(2) = 4,794, p = 0,009), sendo que o grupo 13 a 14 anos apresenta valores médios superiores. O quadro 4 apresenta os valores relativos à média e ao desvio padrão de cada grupo de idade, assim como, os valores de F e o respectivo valor de significância.
Para identificarmos entre quais grupos etários estas diferenças se verificaram foi realizado um teste Post Hoc. Através deste teste constatou-se que existem diferenças estatisticamente significativas entre os grupos 13 a 14 anos e 18 e mais (F(2) = 6,063, p = 0,031) e entre 13 a 14 anos e 15 a 17 anos (F(2) = 6,063, p = 0,013) no que diz respeito à variável responsividade da mãe. Quanto à responsividade total, verificaram-se diferenças estatisticamente significativas entre os grupos 13 a 14 anos e 18 e mais (F(2) = 4,794, p = 0,016).
Continuando a análise comparativa entre não praticantes e praticantes de actividade física fora do contexto escolar no que diz respeito às variáveis associadas aos estilos educativos parentais, o teste M de Box apresenta um valor significativo de p = 0,004. Uma vez que este valor é significativo, poderia dizer-se que foi violada uma das condições necessárias para a realização da MANOVA, nomeadamente a homogeneidade das variâncias. Contudo, como foi dito anteriormente, o teste de M de Box é um teste conservador, e, tendo por base os valores do teste de Levene, verificou-se que para todas as variáveis associadas aos estilos educativos parentais o valor de p não é significativo (p > 0,05). Para além disso, cada grupo tem mais de 12 elementos, o que nos permite prosseguir com a análise mulivariada (Dancey & Reidy, 2006).
Avançando com as comparações, verificámos que a variável prática de actividade física não produz um efeito geral no conjunto das variáveis dependentes (F(4,267) = 0,70, p = 0, 58, λ Wilks = 0,99, ηp2 = 0,01) e quando analisámos separadamente as variáveis dependentes também não se verificou efeito da variável prática de actividade física em cada uma delas. O quadro 5 apresenta os valores da média e desvio padrão que caracterizam estes dois grupos e também os valores de F e o respectivo valor de significância (p).
Para verificar o efeito combinado das variáveis independentes sexo e prática de actividade física nas variáveis dependentes associadas aos estilos educativos parentais foi realizada uma MANOVA que apresentou um valor não significativo do teste M de Box (p = 0,09) e valores do teste de Levene superiores a 0,05. Assim, verificou-se que, quando combinadas, as variáveis sexo e prática de actividade física produzem um efeito geral a nível das variáveis dependentes (F(4, 265) = 2,60, p = 0,03, λ Wilks = 0,96, ηp2 = 0,03). Quando analisámos separadamente as variáveis dependentes apenas se verificou efeito da combinação das variáveis sexo e prática de actividade física a nível da variável dependente exigência/supervisão parental (F( 1) = 8,33, p = 0,004). No quadro 5 estão apresentados os valores da média e desvio padrão relativos aos praticantes e não praticantes do sexo masculino e feminino quanto às variáveis dependentes associadas aos estilos educativos parentais, bem como, o valor de F e o respectivo valor de significância.
Tendo em conta uma perspectiva geral dos resultados até agora apresentados, podemos verificar que não se verificaram diferenças entre os sexos quanto aos estilos educativos parentais percebidos. Quando nos debruçamos nos três grupos de idade, verificámos que o grupo dos 13 a 14 anos se destaca dos outros dois grupos quanto à responsividade da mãe, e do grupo 18 anos e mais quanto à responsividade total, apresentando valores médios mais elevados. Analisando a prática de actividade física, constatou-se que não existem diferenças entre praticantes e não praticantes, quer a nível dos estilos parentais percebidos, quer a nível das atitudes e comportamentos habituais de estudo. Por último, quando a análise recai no efeito combinado do sexo e prática de actividade física, verificou-se um efeito apenas na dimensão exigência/ supervisão dos estilos educativos parentais, mas tal não se verificou a nível das atitudes e comportamentos habituais de estudo.
DISCUSSÃO
O propósito inicial deste estudo foi determinar a relação entre sexo, grupo etário e prática de actividade física ao nível dos estilos educativos parentais. Neste sentido, foram estabelecidos diferentes grupos, no que diz respeito às variáveis independentes, posteriormente analisados de acordo com as diferentes dimensões em estudo. Tendo em conta as diversas análises realizadas, a discussão dos resultados obtidos respeita a ordem anteriormente estabelecida na apresentação dos mesmos. Numa primeira abordagem, procurou-se descrever as variáveis em estudo, nomeadamente os estilos educativos parentais percebidos dos estudantes adolescentes.
Sabemos que os pais desempenham um papel fulcral em todo o processo de desenvolvimento das crianças. Eles tornam-se não só agentes de socialização, como também modelos de referência (Ducharne et al., 2006), e, independentemente do estilo educativo parental adoptado, é notória a influência que os pais exercem na aquisição de hábitos e comportamentos dos seus filhos (Ramos, 2009), particularmente, nos comportamentos habituais de estudo. Está claro que a participação dos pais na educação dos filhos contribui, não só, para um ajustamento emocional, mas também para um bom rendimento académico principalmente se as atitudes parentais forem centradas no processo de aprendizagem (Peixoto & Rodrigues, 2005).
Os resultados da aplicação dos questionários permitiram extrair dados relativos a cada uma das dimensões que estão na base dos estilos educativos parentais e das atitudes e comportamentos de estudo dos indivíduos que compõem a amostra. No que diz respeito aos estilos parentais, constatou-se que a dimensão responsividade da mãe foi a que apresentou uma média mais elevada em relação às restantes dimensões. O mesmo se constatou no estudo de Costa, Teixeira, e Gomes (2000), quando analisou as percepções de exigência e responsividade parental, numa amostra de 378 adolescentes do ensino médio brasileiro. A responsividade materna desempenha um papel importante na promoção do desenvolvimento da criança, pois é com a mãe que a criança estabelece o seu primeiro vínculo afectivo (Ribas & Moura, 2004) e é a continuação desse vínculo de afecto estabelecido durante a infância que ditará a qualidade das relações afectivas dos adolescentes (Fuentes, Motrico, & Bersabé, 2003). Contudo, embora a mãe seja a primeira figura parental a estabelecer um vínculo afectivo e físico, para promover o desenvolvimento dos filhos é necessário um maior envolvimento de ambas as figuras parentais (Ferreira & Abreu-Lima, 2010). Quando olhamos apenas para as dimensões centrais, Costa et al. (2000) constataram ainda que a dimensão responsividade total é a que apresenta um valor mais alto, quando comparado com a exigência. Estes dados vão de encontro aos do nosso estudo, onde se verificou que a dimensão responsividade total apresenta valores médios mais elevados do que a exigência/ supervisão. Contudo, os resultados obtidos por Ducharne et al. (2006) não vão neste sentido, uma vez que, num estudo realizado com 641 estudantes adolescentes, a dimensão exigência/ supervisão apresentou uma média superior. Ao contrário do que estes autores verificaram, neste estudo notou-se uma tendência para a prevalência de um estilo parental mais responsivo. Esta tendência para a responsividade parental pode sugerir uma predominância do estilo parental permissivo, ainda que a divisão dos diferentes estilos parentais não tenha sido feita. Este estilo parental tem vindo a substituir o autoritarismo parental de outras épocas (Gomide, 2009) e, nesse sentido, prevalece a responsividade excessiva em detrimento da exigência e do controlo do comportamento (Weber et al., 2003). Esse excesso de responsividade, aliado a baixos índices de exigência parental, está, por um lado, associado a boas competências sociais, mas, por outro, associa-se ao baixo rendimento académico (Weber et al., 2004). Já os pais cujo estilo educativo estabelece um equilíbrio entre a responsividade e a exigência tendem a educar crianças mais competentes, mas é necessário ressalvar que não existe uma “maneira” única e mais correcta para educar os filhos, sendo que os diferentes estilos parentais expressam diferentes resultados em determinadas culturas (Papaia, Olds, & Feldman, 2001). Os estilos educativos parentais têm implicações distintas à luz da cultura, uma vez que estão associados a questões culturais específicas que nem sempre são tidas em consideração. Por exemplo, para a maioria das culturas ocidentais, nomeadamente a europeia e a americana, o estilo parental que estabelece um equilíbrio entre a responsividade e a exigência é o que surte efeitos mais positivos na socialização, educação e desenvolvimentos da criança (Chao, 1994, Musitu & Garcia, 2005). Mas tal já não acontece na cultura espanhola, onde os estudos comprovam que um estilo parental mais responsivo e menos exigente é o que mais se adequa ao desenvolvimento da criança (Musitu & Garcia, 2005). Para estas culturas, o estilo parental mais controlador ou exigente está associado à desconfiança e à hostilidade (Chao, 1994). Contudo, nas culturas orientais asiáticas o cenário parental é completamente diferente, pois os filhos tendem a percepcionar os pais como mais exigentes do que responsivos, mas essa exigência e controlo são vistos como parte integrante da preocupação parental e estão associados a bons índices de funcionamento social e académico dos filhos (Chao, 1994). Para além das diversidades culturais, quando falamos em estilos parentais deparamo-nos com uma ambiguidade de causa e efeito, uma vez que um determinado estilo educativo parental pode ser a causa do comportamento da criança, assim como uma consequência do mesmo (Gleitman et al., 2003). Neste sentido, o modelo tradicional de socialização familiar outrora defendido, perde a sua força, pois o seu carácter de unidireccionalidade (os pais influenciam os filhos) foi substituído pela bidireccionalidade das relações entre pais e filhos (Bersabé, Fuentes, & Matrico, 2001). Posto isto, podemos verificar que os estilos educativos parentais não podem ser vistos como universais e inflexíveis, uma vez que são influenciados não só pela cultura, mas também pelas características individuais quer dos pais quer dos filhos.
Numa segunda fase deste estudo, comparamos os sexos quanto aos estilos educativos parentais. Ducharne et al. (2006) verificaram que existem diferenças entre os sexos a nível dos estilos parentais, na medida em que o sexo feminino percepciona os pais como mais responsivos e controladores do que o sexo masculino. Já outros autores apuraram que as raparigas percebem níveis de responsividade da mãe e de exigência mais elevados do que os rapazes (Costa et al., 2000; Teixeira, Bardagi, & Gomes, 2004). Contrariamente a estes factos, Wolfradt, Hempel, e Miles (2003) realizaram um estudo com 272 adolescentes e não encontraram diferenças entre os dois grupos, o que reforça os resultados do nosso estudo que evidenciaram que a responsividade e a exigência parental são percebidas de igual modo pelos rapazes e raparigas. Esta ausência de diferenças entre os sexos na percepção dos estilos parentais pode sugerir uma tendência para a atenuação dos estereótipos sexuais, ou seja, a ideia de que o sexo masculino é mais autónomo e requer menos supervisão, perde assim a sua força. Tudo isto traduz uma tendência para a igualdade no modo como se educam rapazes e raparigas.
Depois de analisadas as diferenças entre os sexos nas várias dimensões, debrucemo-nos agora sobre a comparação entre os diferentes grupos etários a nível dos estilos parentais. O grupo de adolescentes com 13 e 14 anos tende a percepcionar os pais como mais responsivos e menos exigentes. Estes resultados traduzem uma tendência para os adolescentes mais velhos percepcionarem os pais como menos responsivos, o que também se constatou no estudo de Ducharne et al. (2006). Esta tendência pode estar associada ao aumento gradual da importância que o grupo de pares vai assumindo ao longo da adolescência. À medida que este período se desenrola, o adolescente passa mais tempo com o seu grupo de amigos do que com a família, o que acaba por alterar o carácter das interacções familiares (Papaia et al., 2001). Os adolescentes mais novos mantêm uma relação ainda muito próxima com os pais, enquanto os adolescentes mais velhos, como têm mais autonomia, sofrem menos influência parental e vêem nos seus amigos o principal foco de identificação e relacionamento. Por outro lado, de acordo com Teixeira et al. (2004), à medida que os adolescentes vão ficando mais velhos, os pais também têm alguma dificuldade em lidar com eles, com as suas problemáticas e ideologias emergentes, o que gera um menor envolvimento parental e, consequentemente, uma menor responsividade percebida.
Feita a comparação entre sexos e grupos etários, a análise que se segue recai sobre a prática de actividade física. A prática regular de actividade física contribui para um estilo de vida saudável e activo, que leva a um aumento da qualidade de vida e de bem-estar (Veloso, 2005). A maior parte dos adolescentes que compõem esta amostra inserem-se num estilo de vida activo, pois, para além das aulas de educação física, os adolescentes praticam actividade física fora do contexto escolar. As principais actividades mencionadas foram o futebol, a natação e a dança. Estes resultados estão em conformidade com os de Duarte (2006), que constatou que a maioria dos elementos da amostra praticava actividade física extracurricular e tinha o mesmo tipo de actividades como referência. A adesão à prática de actividade física por parte das crianças e jovens depende, em grande parte, das figuras parentais, para além de outros factores. É sabido que as relações entre pais e filhos contribuem muito para a consolidação do hábito de ser ou não ser activo (Silva et al., 2008) e que o envolvimento das crianças na prática de actividade física depende do sistema de crenças e expectativas dos pais (Ramos, 2009). Como constatou Arredondo et al. (2006), filhos de pais que monitorizam e reforçam comportamentos saudáveis são fisicamente mais activos quando comparados com filhos de pais que não enveredam por essas práticas. Contudo, neste estudo, a prática de actividade física não parece reflectir diferenças em função dos estilos parentais percebidos. Na literatura existente, não foi possível encontrar estudos que contemplem estas duas variáveis, o que não nos permite estabelecer comparações com outros resultados. Apenas podemos sugerir, com base nos dados obtidos, que os praticantes de actividade física não se diferenciam dos não praticantes na percepção dos estilos parentais. Contudo, é importante ressalvar o comportamento das médias, que nos sugere uma tendência para os praticantes de actividade física percepcionarem ambos os pais como mais responsivos e menos exigentes, quando comparados com os não praticantes.
Por último, centramo-nos na análise da combinação das variáveis sexo e prática de actividade física e do seu efeito nos estilos parentais percebidos e nos comportamentos habituais de estudo. Neste sentido, também não foram encontrados estudos que contemplassem este conjunto de variáveis, o que não nos permite ter um termo de comparação para os nossos resultados. O que podemos constatar foi que os praticantes e não praticantes de actividade física, quer do sexo masculino, quer do sexo feminino, apenas se distinguem entre si ao nível da variável exigência/ supervisão, relativa aos estilos educativos parentais percebidos. Assim, os rapazes que praticam actividade física fora do contexto escolar percepcionam os pais como mais exigentes em relação aos não praticantes. Contudo, quando analisamos o sexo feminino, verificamos que as raparigas que não praticam actividade física fora do contexto escolar são as que percepcionam os pais como mais exigentes e controladores. Esta contradição relativa às percepções dos rapazes e raparigas praticantes e não praticantes de actividade física sugere que, no caso dos rapazes, os pais supervisionam mais as actividades realizadas fora do contexto escolar, o que pode estar associado a um maior interesse e controlo por parte dos pais, nas actividades extra escolares. Por outro lado, a maior supervisão parental das raparigas não praticantes de actividade física sugere que, existe uma necessidade em monitorizar o tempo que não é preenchido com uma actividade específica.
Apresentada a discussão, e tendo por base os principais resultados obtidos, de seguida apresentamos as principais conclusões destes estudo. Olhando para a descrição das variáveis dependentes, podemos concluir que os adolescentes desta amostra percepcionaram os pais como mais responsivos do que exigentes, o que nos permite retirar duas conclusões: por um lado, os pais tendem a educar os filhos num ambiente de maior envolvimento e aceitação, dando maior ênfase aos interesses dos filhos, em detrimento da regulação dos seus comportamentos e da supervisão das suas actividades; por outro lado, verifica-se uma tendência para os pais adoptarem um estilo educativo parental mais próximo do estilo permissivo, uma vez que este estilo tem mais de responsividade do que de exigência.
Relativamente às diferenças entre sexos na percepção dos estilos educativos parentais, podemos concluir que os pais educam os rapazes e raparigas do mesmo modo, tendo em conta que não se verificaram diferenças entre sexos a nível das diferentes dimensões associadas aos estilos educativos parentais.
Quando olhamos à idade face aos estilos educativos parentais percebidos, verificámos que o grupo etário dos 13 a 14 anos de idade percepciona os pais como mais responsivos e menos exigentes. Este facto permite-nos concluir que os adolescentes mais novos mantêm com os pais, e vice-versa, uma relação de maior envolvimento afectivo e emocional, o que traduz um menor nível de autonomia, em comparação com os adolescentes mais velhos. Por outro lado, os adolescentes mais velhos demonstram um maior distanciamento afectivo dos pais, como possível consequência de uma maior autonomia que foram adquirindo.
No que diz respeito à prática de actividade física, outra conclusão que podemos retirar, prende-se com a igualdade na educação de que os adolescentes praticantes e não praticantes de actividade física são alvo, uma vez que ambos os grupos percepcionam do mesmo modo os estilos educativos parentais.
Contudo, quando as variáveis sexo e prática de actividade física foram combinadas, verificaram-se diferenças a nível da dimensão exigência/ supervisão, no que toca aos estilos educativos parentais. A existência destas diferenças permitem-nos concluir que: os rapazes que praticam actividade física fora do contexto escolar estão submetidos a práticas educativas mais direccionadas para a regulação do comportamento e controlo das actividades, quando comparados com os rapazes não praticantes; no caso das raparigas, são as que não praticam actividade física fora do contexto escolar que também são alvo deste tipo de práticas parentais.
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Recebido em 13 de Dezembro de 2013/ Aceite em 13 de Junho de 2015