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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.16 no.3 Lisboa dez. 2015

 

Fatores associados ao consumo de álcool na adolescência, em função do género

Factors associated with alcohol consumption in adolescence, by gender

Irma Brito1,2, José Alberto Gomes Precioso3,*, Cláudia Correia3, Carlos Albuquerque4, Catarina Samorinha5, Hilson Cunha-Filho6, & Elisardo Becoña7

 

1Escola Superior de Enfermagem de Coimbra

2Universidade de Coimbra

3Instituto de Educação, Universidade do Minho

4Escola Superior de Saúde de Viseu

5Instituto de Saúde Pública, Universidade do Porto

6Centro de Estudos de Sociologia, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Nova de Lisboa

7Departamento de Psicologia Clínica e Psicobiologia, Faculdade de Psicologia, Universidade de Santiago de Compostela

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

De acordo com o último relatório do ESPAD (2012), 74% dos adolescentes portugueses reportaram ter consumido bebidas alcoólicas no último ano, 52% no último mês e 22% reportaram “binge drinking”. O consumo de álcool é um problema grave e prevalente entre os jovens, sendo indispensável identificar fatores associados a este consumo, por forma a desenvolver estratégias preventivas eficazes.

Objetivos: Descrever as perceções sobre os fatores de risco e protetores associados à experimentação e ao consumo regular de álcool na adolescência, de acordo com o género.

Metodologia: Recorreu-se à técnica de grupos focais, através da metodologia “World Café”. Organizaram-se nove grupos de estudantes (n=243): 2 grupos masculinos, 2 femininos, 4 mistos (de consumidores de álcool) e 1 grupo misto de jovens abstémicos. Os dados foram transcritos e analisados de acordo com a metodologia de análise de conteúdo.

Resultados: Os participantes identificaram fatores de risco associados à experimentação (ex. atitudes da família face ao consumo) e ao consumo regular de bebidas alcoólicas (ex. gestão de emoções negativas). Foram encontradas diferenças de género na experimentação; as atitudes dos familiares face ao consumo surgem como mais relevantes para os rapazes, enquanto nas raparigas, a influência dos pares parece ter um papel mais preponderante.

Conclusões: Os dados revelam diferentes fatores associados ao consumo de álcool na adolescência e identificam diferenças entre géneros. Os programas preventivos devem ter em conta estas diferenças e desenvolver ações suportadas pelas mesmas. Concomitantemente, revela-se importante que estes envolvam os pais, consciencializando-os para a influência dos seus comportamentos nos filhos.

Palavras-chave: Consumo de álcool, Adolescência, Fatores de risco e protetores, Metodologia World Café

 

ABSTRACT

According to the last ESPAD Report (2012), 74% of Portuguese adolescents reported to have used alcohol in the last year, with 52% using it in the last month and 22% reporting binge drinking. Alcohol consumption is a severe and prevalent problem among adolescents; therefore it is very important to identify factors associated with this consumption in order to develop effective preventive strategies.

Objectives: To describe the perceptions about the risk and protective factors associated with experimentation and regular alcohol consumption in adolescence, by gender.

Methods: A focus group technique was used trough a World Café methodology. Nine groups of students were organized (n=243): 2 male groups, 2 female groups, 4 mixed groups (boys and girls who used alcohol) and 1 group of abstinent students. Data was transcribed and analyzed through a content analysis methodology.

Results: Participants identified risk factors associated with experimentation (e.g.: family attitudes towards alcohol consumption) and regular alcohol consumption (e.g.: way of dealing with negative emotions). Gender differences were also identified in experimentation; family attitude towards alcohol consumption seems to be more relevant to boys, while peer’s influence seems to play a predominant role to girls.

Conclusions: Data reveals several factors associated with alcohol consumption in adolescents and identify gender differences. Preventive programs should take these differences into account and develop actions supported by those. At the same time, it is important that they involve parents, raising awareness to their influence in children’s behaviors.

Keyword: Alcohol consumption, Adolescence, Risk and protective factors,World Café methodology

 

Segundo dados da OMS (2012), a Europa lidera o consumo mundial de álcool, com uma média anual de 12,4 litros por habitante.

De acordo com dados do relatório do European School Survey Project on Alcohol and Other Drugs (ESPAD) respeitante ao ano de2011 e que envolveu mais de 100 000 estudantes, de 36 países europeus com uma média de idades de 16 anos, 71% dos jovens portugueses participantes no estudo afirmam já ter experimentado bebidas alcoólicas sendo que destes 74% afirmam ter consumido nos últimos 12 meses. No que respeita ao consumo nos últimos 30 dias (que antecederam o inquérito do ESPAD), 56% dos rapazes e 50% das raparigas portuguesas referiram ter consumido bebidas alcoólicas no último mês. Mais de metade dos jovens de ambos os sexos têm um consumo regular de álcool. No que concerne ao consumo excessivo de álcool (5 ou mais bebidas na mesma ocasião), nos últimos 30 dias, a prevalência registada foi de 27% nos rapazes e 19% nas raparigas, numa prevalência média de 22% dos jovens. Estes dados indicam que o consumo de bebidas alcoólicas está integrado no quotidiano de muitos jovens e uma análise da evolução do consumo nos últimos 16 anos, em Portugal, parece apontar para uma tendência crescente da prevalência de "binge drinking" em ambos os sexos.

O consumo de álcool é uma das principais causas de morte e de invalidez, sendo o terceiro fator de risco de morbilidade, depois da hipertensão e do tabagismo (OMS, 2005).

Na adolescência, o consumo de álcool associa-se frequentemente a comportamentos de risco, entre os quais se incluem as relações sexuais desprotegidas, o contágio de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez indesejada (OMS, 2011); acidentes de viação (Calafat, 2002); danos cerebrais, alterações estruturais do cérebro e défices cognitivos (Guerri & Pascual, 2010); baixo rendimento escolar: problemas de atenção, aprendizagem, memória (Brown et al., 2000; Casey et al., 2000) e dependência na idade adulta (DeWit et al, 2000; Pitkanen et al., 2008; Hingson, et al., 2006).

É indiscutível que o consumo abusivo de bebidas alcoólicas pelos jovens é um comportamento lesivo para a saúde individual e coletiva, cujos fatores interessa identificar para melhor agir preventivamente.

Fatores de risco ou fatores protetores podem ser definidos como caraterísticas, variáveis ou acontecimentos que quando presentes na vida de um indivíduo aumentam ou reduzem (respetivamente) a probabilidade de ocorrência de um determinado fenómeno (Swadi, 1999). Estes podem ser agrupados, globalmente, em caraterísticas individuais (idade, sexo, fatores genéticos e biológicos e caraterísticas adquiridas como personalidade, atitudes, gostos e interesses,entre outros); caraterísticas microssociais que se relacionam com as do contexto, mais próximo, em que o indivíduo se desenvolve como a casa, família, escola, amigos ou vizinhos; caraterísticas macrossociais, as quais influenciam em grande medida as anteriores como o sistema social e cultural, os meios de comunicação social, a influência de grupos económicos ou as instituições oficiais; e em caraterísticas ambientais, ou seja, do meio físico e geográfico, as quais influem nas condições de vida dominantes numa determinada sociedade, podem sofrer alterações pela ação humana e possuem grande influência sobre as demais dimensões (Mendoza, Pérez & Foguet, 1994).

O consumo abusivo e/ou dependência de álcool é determinado pela interação entre diversos fatores de risco e fatores protetores que per si não são passíveis de explicar o comportamento alcoólico (Adès & Lejoyeux, 1997). No que respeita ao consumo de substâncias psicoativas, a literatura sobre o tema tem vindo a demonstrar que podem existir diferentes fatores de risco para a experimentação, para a manutenção e escalada do consumo, bem como para o comportamento face a determinada substância (Swadi, 1999).

Para se compreender a constelação de fatores de risco e protetores do consumo abusivo de substâncias psicoativas devem ser tomados em consideração tanto os aspetos físicos, biológicos e psicológicos como os aspetos sociais, etno-culturais, económicos e políticos. A prevenção deve visar a pessoa individualmente, com especial atenção ao seu desenvolvimento pessoal e nível de informação (que influencia as suas crenças e perceções) assim como ao seu contexto familiar e social, não esquecendo a influência dos fatores macrossociais, que dificilmente são modificáveis com intervenções educativas mas devem ser alvo de ações de advocacia em saúde (Kreutter et al., 1991).

Este estudo teve como objetivo descrever as perceções sobre os fatores de risco e fatores protetores individuais, micro e macrossociais e ambientais associados à experimentação e ao consumo regular de álcool em jovens portugueses, de acordo com o género.

 

MÉTODO

Recorreu-se à técnica de grupos focais, através da metodologia World Café (Brown & Isaacs, 2005).Esta é uma metodologia simples, efetiva e flexível, que permite o acesso a informação gerada por grandes grupos, acreditando que, ao reproduzir o ambiente de um café, se promove o diálogo entre os participantes, podendo permitir o acesso a informação resultante da inteligência coletiva do grupo.

Participantes

Organizaram-se 9 grupos de estudantes universitários (n=243). Entre estes, oito grupos eram compostos por jovens consumidores de bebidas alcoólicas (2 grupos masculinos, 2 grupos femininos e 4 grupos mistos) e um grupo era composto por jovens abstémicos de ambos os sexos. Esta divisão visava a análise de diferenças de género, bem como permitir que os jovens abstémicos pudessem expressar livremente a sua opinião, sem pressões diretas ou indiretas de jovens consumidores. A idade média dos 95 participantes homens era de 20,7±1,5 anos e das 138 mulheres era de 20,6±1,6 anos (Tabela 1). Não foram encontradas diferenças de médias na idade dos participantes segundo o sexo (t= 0,413; df=0,231; p=0,680), pelo que não se considerou necessário analisar os dados desagregados por grupos etários.

Material

Tendo em conta os objetivos do estudo foi elaborado um guião semiestruturado com questões específicas acerca da experimentação e consumo regular de álcool, bem como acerca das perceções relativas ao aumento do consumo de álcool no sexo feminino e dos fatores protetores relacionados com o consumo de álcool. As questões colocadas para discussão nestas sessões de grupo foram:

1. Onde, com que idade, com quem e porquê experimentaram bebidas alcoólicas?

2. Porque é que os jovens começam a consumir bebidas alcoólicas?

3. Porque é que os jovens consomem bebidas alcoólicas com regularidade?

4. Há jovens que não consomem álcool ou fazem-no raras vezes. Porque é que os estes jovens não bebem bebidas alcoólicas?

5. Hoje em dia, regista-se um aumento do consumo de álcool pelas mulheres. Na vossa opinião, porque é que isto acontece?

Em seguida procedeu-se à validação dos guiões, que foram revistos e aprovados pela equipa de investigação do projeto em que este estudo se insere.

Procedimento

Cada grupo foi subdividido em pequenos grupos de 4-5 elementos cada, tendo cada um dos grupos um porta-voz. O pequeno grupo respondia à questão exposta numa mesa, sendo que cada mesa continha um porta-voz incumbido de incentivar a expressão de todos os participantes e anotar todas as opiniões, do seu sub-grupo, em folhas grandes. Esgotada a discussão inicial, os elementos de cada grupo trocam de mesa (exceto o porta-voz) e são desafiados a responder a uma nova questão, fazendo-se a discussão através do acrescento ou refutação das ideias anteriormente expostas por outros jovens (Figura 1).

Depois de diversas “rodadas de diálogo”, inicia-se o período de partilha das opiniões com todo o grupo. É nestas conversas, estilo plenário, que os padrões podem ser identificados, o conhecimento coletivo cresce e as possibilidades para a ação surgem. É o porta-voz de cada mesa que apresenta os resultados mas todo o grupo identifica os padrões e obtém consenso (ou não) acerca dos fatores de risco e dos fatores protetores (individuais, microssociais, macrossociais e ambientais) para a experimentação e para o consumo regular de bebidas alcoólicas.

Os dados registados nas folhas, pelo porta-voz de cada uma das mesas, foram transcritos e posteriormente analisados através da técnica de análise de conteúdo, conforme Bardin (2007). Pretendeu-se identificar, categorizar e agrupar os fatores de risco e protetores, emergentes da discussão dos grupos, de acordo com as seguintes dimensões: individual, micro e macro social e ambiental (Mendonza, Pérez e Foguet, 1994).

 

RESULTADOS

1. Fatores de Risco Associados à Experimentação de Bebidas Alcoólicas

Para identificar os fatores de risco associados à experimentação de bebidas alcoólicas, analisaram-se os dados relativos à questão “Onde, com que idade, com quem e porquê experimentaram bebidas alcoólicas?” (Tabelas 2 e 3).

Idade - A idade média de experimentação mais referida pelos participantes foram os 15 anos, com idade mínima referida de 7/8 anos e máxima de 19 anos: “foi no contexto doméstico, tinha 7/8 anos”(Grupo misto - Mi);“comecei no primeiro ano de universidade, aos 19 anos de idade”(Mi).

Local – No que respeita ao local de experimentação, constata-se que existem diferenças entre grupos, especialmente notáveis entre o grupo masculino e o feminino. Nos rapazes, os locais referidos para o primeiro consumo vão desde locais privados como a casa de amigos (“Comecei a consumir bebidas alcoólicas em casa de amigos”) e a casa do próprio (“Em minha casa”), até espaços públicos como cafés, bares e discotecas (“no bar da minha terra”), superfícies comerciais (“no pingo doce ao pé da minha escola”) e locais de festa (“Numa festa de anos com amigos”). No que concerne às raparigas, os locais apontados para o primeiro consumo foram locais públicos como cafés, bares e discotecas (“Num bar da cidade”) e festividades (“No jantar de aniversário de uma amiga”). De ressalvar que o grupo feminino foi o único grupo onde não foi referido a casa do próprio, como local do primeiro consumo. Contrariamente, no grupo de abstémicos a casa do próprio foi o único local referido pelo grupo como local de experimentação das bebidas alcoólicas.

Pessoas presentes – Em todos os grupos, com exceção do grupo misto de consumidores, o primeiro consumo de bebidas alcoólicas foi efetuado com o grupo de amigos (“Estava numa festa e com os meus amigos”- M); com familiares (“Para experimentar com primos/primas” - F) ou com os pais (“Comecei a beber com os meus pais” - Ab).

1.1. Fatores Individuais

Curiosidade. A curiosidade ou vontade de experimentar bebidas alcoólicasfoi identificada por três grupos, nomeadamente pelo grupo masculino, feminino e misto, como um fator que conduziu à experimentação de álcool: (“Por curiosidade com os meus pais”- M); (“Bebi um shot para experimentar” - F); (“Com a família, para sentir o ato de experimentar mas estar protegida”- Mi).

Expetativa de diversão. A procura de divertimento foi referida pelo grupo masculino e pelo grupo misto de consumidores como um dos motivos que os predispuseram à experimentação de bebidas alcoólicas(“Com amigos, por diversão”- M); (“Nas saídas com os amigos para nos divertirmos”- Mi).

Parcos conhecimentos dos riscos. Poucos conhecimentos relativamente aos riscos associados ao consumo de bebidas alcoólicas foram identificados apenas pelo grupo masculino como um dos fatores que conduziu à experimentação de bebidas alcoólicas (“Pareceu algo inofensivo e beber um pouco não ia causar algo desagradável, por isso comecei” - M).

1.2. Fatores Microssociais

Frequência de contextos recreativos. Três grupos referiram a ocorrência do primeiro consumo de bebidas alcoólicas nas saídas com os amigos/colegas: (“Estava numa festa e com os meus amigos”- M); (“Nas saídas à noite” -F); (“Nas saídas com os amigos” -Mi)

Atitudes dos pais/familiares face ao consumo. A atitude de aceitação dos pais e/ou familiares face ao consumo de bebidas alcoólicas pelos jovens foi mencionada como fator de risco para a experimentação em dois grupos, nomeadamente no grupo masculino e no grupo de não consumidores: “Apenas por convívio com familiares”(M); “Com a família em dias festivos”(Ab).

Oferta de bebidas alcoólicas pelos pais/família. Receber ofertas de bebidas alcoólicas pelos pais e/ou familiares foi mencionado por todos os grupos como um dos motivos que conduziram à experimentação de álcool(“Para experimentar com primos/primas” - F); (“Comecei a beber com os meus pais” - M); (“Com os pais e foi para provar” -Mi); (“Os pais muitas vezes dão-nos bebidas quando somos pequenos” - Ab).

1.3. Fatores Macrossociais

Norma social. A norma social foi referida por todos os grupos como sendo um fator que conduziu à experimentação(“Com 15 anos, nas festas académicas” -Mi);(“Comecei a beber porque estava numa festa com os meus amigos” - M); (“Bebi socialmente com os meus amigos” - F); (“Por influência de outros, dos amigos” - Ab).A perceção dos participantes de que grande parte dos jovens da sua idade consome bebidas alcoólicas conduz a uma normalização do comportamento, tornando-se este num hábito e fazendo parte do seu estilo de vida como jovem.

1.4. Fatores Ambientais

Nenhum dos grupos identificou fatores ambientais como fatores de risco para a experimentação.

2. Fatores de Risco Associados ao Consumo Regular de Bebidas Alcoólicas

Na identificação dos fatores de risco relacionados com o consumo regular, analisaram-se os dados relativos às questões “Porque é que os jovens começam a consumir bebidas alcoólicas com regularidade?” e “Porque é que os jovens consomem bebidas alcoólicas com regularidade?”(Tabela 4).

2.1. Fatores Individuais

Prazer/sabor O sabor das bebidas alcoólicas e o prazer decorrente do seu consumo foram referidos pelos três grupos de jovens consumidores como um dos fatores que mantêm o consumo. Concomitantemente, este fator foi referido pelo grupo de não consumidores como uma das potenciais causas que mantém o consumo regular dos jovens: (“Os jovens consomem bebidas alcoólicas com regularidade porque gostam” - Mi); (“Porque desde que experimentaram começaram a gostar” - M); (“No meu caso foi porque gostei” - F); (“Talvez por gostarem da sensação” - Ab).

Expetativa de diversão. O consumo de álcool enquanto promotor de divertimento foi identificado por três grupos como fator que mantém o consumo regular de bebidas alcoólicas: (“Por diversão” - M); (“É essencial para se divertirem” - F); (“Porque não têm outra maneira de se divertirem” - Ab).

Gestão de emoções negativas. O consumo regular de bebidas alcoólicas como forma de gerir emoções negativas como o stress e a ansiedade ou como instrumento para a abstração mental de problemas quotidianos foi referido por três grupos, com exceção do grupo misto:(“Bebem para esquecer os problemas” - M); (“Para se libertarem das tensões diárias” - F); (“Porque se encontram longe da família, encontram-se em novos ambientes, com novas rotinas, com novos amigos, com novas exigências” - Ab).

Procura de desinibição. A desinibição através do consumo de álcool foi apenas referido pelo grupo de jovens abstémicos como um dos potenciais fatores conducentes ao consumo regular (“Talvez por gostarem da desinibição que a bebida alcoólica dá”).

Baixa autoestima. O consumo de bebidas alcoólicas com o intuito de aumentar a autoconfiança, foi referido apenas pelo grupo feminino como fator de manutenção do consumo (“Para ganharem mais confiança, não quer dizer que sejam todos mas talvez seja a maioria”).

2.2. Fatores Microssociais

Frequência de contextos recreativos. Frequentar festas foi identificado por três dos grupos, com exceção do grupo masculino, como fator de risco para o consumo regular: (“Devido às saídas à noite” - Mi); (“Porque normalmente bebem quando saem e saem todas as semanas” - F); (“Porque quando saem à noite não sabem o que fazer, então ocupam-se com os copos” - Ab).

Grupo de pares consumidores. A pertença a um grupo de pares consumidores de álcool foi referida por todos os grupos, como fator de risco para o consumo regular:(“Devido às saídas à noite com os amigos” - Mi); (“Por verem os amigos a beber e também quererem apanhar bebedeiras” - M); (“Por prazer e divertimento quando estão com os amigos” - F); (“Para se sentirem introduzidos nas atividades com os amigos e praticamente todas as saídas envolvem beber bebidas alcoólicas” - Ab).

Pressão de pares. O consumo de álcool como estratégia necessária para integrar um determinado grupo de pares de que o jovem gostava de fazer parte foi um fator identificado por três grupos, com exceção do grupo misto, para a manutenção do consumo:(“Para se imporem e pertencerem a um grupo de pessoas” - M); (“Alguns é só mesmo pelo facto de se quererem instalar num determinado grupo” - F); (“Muitas vezes para serem aceites em determinados grupos” - Ab).

“Estatuto social”. No mesmo sentido, o consumo de bebidas alcoólicas enquanto promotor de “estatuto social” entre os pares foi identificado por três grupos: (“Para se imporem, por vezes para se mostrarem” - M); (“É uma questão de estatuto” - F); (“Porque acham que fica bem e que vão ter outro estatuto” - Ab).

Disponibilidade financeira. Ter dinheiro disponível para a aquisição de bebidas alcoólicas foi referido por todos os grupos como fator de risco para o consumo regular de álcool:(“Ter dinheiro regula o consumo” - M);(“Não podemos comprar a não ser que nos ofereçam” - Mi); (“Se não se tem dinheiro não se pode consumir” - F); (“Mais dinheiro significa mais consumo” - Ab).

2.3 Fatores Macrossociais

Norma social. O facto da ingestão de bebidas alcoólicas ser um comportamento socialmente aceite, frequente e desejável foi identificado como fator de risco por todos os grupos: (“Também porque se tornou moda” - Mi); (“É uma moda hoje em dia” - M); (“Talvez pela pressão que sentem de viver numa sociedade onde quase não se vê nenhum jovem que não beba” - F); (“Por moda e quando não sabem de outras maneiras de se divertirem, todos fazem isso” - Ab).

2.4.Fatores Ambientais

Acessibilidade a bebidas alcoólicas. A facilidade de acesso e de compra de bebidas alcoólicas foi identificada apenas pelo grupo misto: “É de fácil acessibilidade de compra”.

3. Fatores de Risco Associados ao Aumento do Consumo de Bebidas Alcoólicas no Sexo Feminino

Os fatores de risco associados ao aumento do consumo de álcool no sexo feminino resultaram da análise dos dados relativos à questão “Hoje em dia, regista-se um aumento do consumo de álcool pelas mulheres. Na vossa opinião, porque é que isto acontece?” (Tabela 5).

3.1. Fatores Individuais

Prazer/sabor. O sabor das bebidas alcoólicas e o prazer decorrente do consumo foram identificados por dois grupos como potenciais fatores de risco para o aumento do consumo feminino: (“Porque gostam de bebidas doces” - Mi); (“Cada vez existem mais bebidas que agradam às mulheres” - F).

Expetativa de diversão. A procura de divertimento foi identificada em dois grupos, nomeadamente no grupo misto e no grupo feminino:(“Bebem para se divertirem porque ao beberem ficam mais divertidas” - Mi); (“Hoje em dia algumas mulheres bebem para socializar, para se divertirem e se embriagarem” - F).

Procura de desinibição. O consumo de álcool como promotor de desinibição nos contatos sociais foi referido por três grupos com exceção do grupo misto de consumidores: (“Para se sentirem desinibidas” - M); (“Para maior desinibição” - F); (“Por necessidade de se desinibir” - Ab).

3.2.Fatores Microssociais

Pressão de pares. Consumir bebidas alcoólicas como forma de integrar um determinado grupo, foi mencionado por dois grupos: (“Querem sentir-se integradas” - M); (“Por necessidade de inclusão nos grupos” - Ab).

3.3.Fatores Macrossociais

Norma social: A perceção que o consumo feminino é um comportamento comum entre as mulheres e socialmente aceite foi referido apenas pelo grupo masculino (“Por moda”).

Mudanças sociais face ao papel da mulher: As mudanças sociais decorrentes das alterações de crenças face ao papel da mulher na sociedade foram identificadas por três grupos: (“Atualmente já não há tantas restrições como antigamente” - Mi); (“Por começarem a sair cada vez mais cedo e com mais frequência” - F); (“Possibilidade de frequentar espaços noturnos sem companhia masculina” - Ab).

Igualdade de género: O aumento do consumo feminino é ainda entendido por três grupos como resultante da procura de igualdade de género pelo sexo feminino: (“Para as mulheres mostrarem que não são inferiores aos homens” - Mi); (“Têm necessidade de se mostrarem tão resistentes como o homem” - M); (“Existe a típica competição do “eu consigo beber mais do que tu” - F).

3.4.Fatores Ambientais

Acessibilidade. A maior facilidade de acesso a bebidas alcoólicas para o sexo feminino, foi identificada por um grupo como fator de risco para o aumento do consumo: (“Estão mais perto do consumo de álcool” - Mi);

4. Fatores de Proteção Relacionados com o Consumo de Bebidas Alcoólicas

Os fatores de proteção associados ao consumo de álcool resultaram da análise dos dados relativos à questão “Há jovens que não consomem álcool ou fazem-no raras vezes. Porque é que os estes jovens não bebem bebidas alcoólicas regularmente?” (Tabela 6).

4.1.Fatores Individuais

Ausência de curiosidade. A ausência de curiosidade relativamente aos efeitos do álcool foi mencionada por dois grupos, nomeadamente o grupo masculino e o grupo misto: (“Porque não têm interesse, nunca tiveram curiosidade” - M); (“O álcool é indiferente para eles” - Mi).

Estratégias de divertimento alternativas. A capacidade de divertimento sem recurso a bebidas alcoólicas foi referida por dois grupos como fator protetor do consumo de álcool: (“Porque não necessitam de o fazer para se divertirem” - F); (“Não precisamos do álcool para nos divertirmos, não se depende do álcool se não o fizermos um hábito” - Ab).

Prazer/sabor. O facto de alguns jovens não apreciarem o sabor das bebidas alcoólicas ou não sentirem prazer com o seu consumo foi referido como fator de proteção para o consumo por todos os grupos: (“Não gostam do sabor” - Mi); (“Depende do gosto de cada um” - M); “Há alguns que não gostam da sensação (…) uns não bebem porque não gostam”(F); “Não gostam do aspeto/sabor/odor”(Ab).

Conhecimentos e crenças. O conhecimento dos riscos associados ao consumo de álcool foi identificado por dois grupos como fator de proteção para o consumo de álcool: (“Devem ter consciência dos perigos que o álcool pode trazer” - Mi); (“Sabem os malefícios das bebidas alcoólicas” - Ab).

Prática de exercício físico. A prática de desporto, enquanto fator protetor para o consumo de álcool, foi referida apenas pelo grupo misto (“Outros porque fazem desporto”).

Doença. A impossibilidade de ingestão de álcool devido a problemas de saúde foi referida por todos os grupos: (“Uns por doença” - Mi);(“Porque têm problemas de saúde” - M); (“Porque não podem” - F); (“Por várias razões (…) por saúde (…) não podem ingerir” - Ab).

Estratégias de coping adequadas: Ter competências de copinga dequadas para lidar com as pressões dos pares, gerir emoções negativas e lidar com acontecimentos adversos, não sendo necessário o recurso ao consumo de álcool, foi mencionado por três grupos como um fator de proteção para o consumo: (“Não sentem necessidade de abstraírem-se” - F); (“Não se deixam influenciar, não têm esta necessidade” - M); (“Têm confiança necessária nas relações sociais” - Ab).

Experiências negativas com álcool: Ter experienciado, no passado, acontecimentos negativos devido ao consumo de álcool foi referido por todos os grupos enquanto fator protetor do consumo: (“A terceira razão serão as más experiências” - Mi); (“Porque tiveram más experiências anteriormente” - M); (“Porque já ficaram com ressaca devido às bebidas consumidas” - F); (“Têm exemplos práticos das consequências da ingestão de álcool” - Ab).

4.2.Fatores Microssociais

Não frequência de contextos recreativos. Não sair à noite foi referido por três grupos como fator protetor do consumo: “Porque nunca saem à noite”(M); “Porque se calhar não saem muito à noite”(F); “Porque não saem à noite”(Ab).

Grupo de pares não consumidores. Pertencer a um grupo de pares não consumidores de álcool foi referido apenas pelo grupo de não consumidores: “Porque o seu grupo de amigos não bebe e não fazem pressão para ele beber”.

História familiar de alcoolismo. Um historial familiar de alcoolismo foi identificado pelo grupo feminino como fator protetor do consumo “Alguns têm história de bêbados na família”.

Disponibilidade financeira. As dificuldades económicas foram mencionadas por todos os grupos como fator de proteção do consumo de álcool: “Os amigos quando estão bêbados ou são ricos é que nos oferecem”(Mi”); “Porque se calhar não têm dinheiro”(M); “Alguns não têm dinheiro”(F); “Não têm dinheiro para gastar com este vício”(Ab).

Atitudes dos pais face ao consumo. A opção de não consumir por proibição parental, foi referida apenas pelo grupo masculino (“Por causa dos pais proibirem”).

4.3.Fatores Macrossociais

Valores de vida/religião. Foi mencionado por dois grupos enquanto fator de proteção do consumo de álcool: “Uns não bebem porque é contra os ideais, religião”(F); “Devido à religião”(Ab).

4.4.Fatores Ambientais

Acessibilidade. As dificuldades de acesso a bebidas alcoólicas, como fator protetor do consumo, foram apenas referidas pelo grupo masculino (“Nem sempre estão disponíveis essas bebidas”).

 

DISCUSSÃO

Embora o alcoolismo nos adultos seja um problema de saúde, social e económico grave e muito prevalente, o consumo abusivo de álcool por adolescentes e jovens tem consequências diferentes das evidenciadas nos adultos, devido à fase de desenvolvimento em que se encontram (Pechansky, Szobot, & Scivoletto, 2004). Assim, torna-se relevante identificar os fatores de risco para a experimentação e para o consumo regular de álcool, com base em diferenças de género, com o intuito da construção de programas preventivos mais eficazes e direcionados para as necessidades reais dos jovens.

No presente estudo, a experimentação dos participantes ocorreu, em média, aos 15 anos de idade, o que está de acordo com os dados do último relatório do HBSC (2012)onde se regista um aumento da prevalência do consumo de álcool com a idade, sendo este tendencialmente mais elevado aos 15 anos. Não se registaram diferenças entre o sexo masculino e o feminino no que respeita à idade de início de consumo.

Relativamente aos locais de primeiro consumo, enquanto os rapazes referiram locais privados como a casa do próprio ou a casa de amigos, as raparigas parecem tender a iniciar os consumos em locais públicos como cafés, bares e discotecas e em alturas de festas ou comemorações. No mesmo sentido, no sexo feminino não se registou referência à presença dos pais aquando da experimentação de bebidas alcoólicas, contrariamente ao registado no sexo masculino. Estas diferenças podem ficar a dever-se a crenças relacionadas com os papéis de género, que tornam mais aceitável, no seio da família, o consumo de álcool masculino, comparativamente com o feminino. Ainda no que respeita às pessoas presentes aquando da experimentação, todos os grupos mencionaram a presença de amigos/as, tal como descrito na literatura sobre o tema que refere a influência dos amigos como um dos principais fatores de risco para o consumo (Hong, Lee, Grogan-Kaylor & Huang, 2011; Danielsson, Wennberg, Tengström & Romelsjö, 2010; Llorens, Barrio, Sánchez & Suelves, 2011).

Quanto aos fatores associados à experimentação de bebidas alcoólicas, a curiosidade foi referida por todos os grupos de consumidores, não tendo sido referida pelo grupo de abstémicos. Parcos conhecimentos dos riscos associados e a atitude dos pais/familiares face ao consumo foram fatores que surgiram associados essencialmente ao sexo masculino, não tendo sido referidos nem no grupo feminino nem no grupo misto. Ambos os fatores estão presentes na literatura, sendo que a atitude dos pais/familiares face ao consumo se revela bastante mais influente do que a primeira (Nash, McQueen & Bray, 2005; Mares, Vorst, Engels & Lichtwarck-Aschoff, 2011).Contudo, estes dados parecem apontar para a hipótese das atitudes dos pais e familiares face ao consumo poderem exercer maior influência no sexo masculino, comparativamente ao feminino, possivelmente decorrente de crenças associadas a papéis de género.

A oferta de bebidas alcoólicas pela família e a norma social (crença de que a maioria das pessoas consomem bebidas alcoólicas) foram referidos por todos os grupos como fatores de risco para a experimentação, estando de acordo com a literatura que frequentemente demonstra a forte associação entre o consumo de bebidas alcoólicas pelos progenitores, e consequente oferta de bebidas aos adolescentes, e o consumo de álcool dos jovens (Chartier, Hesselbrock & Hesselbrock, 2011; Mares, Vorst, Engels & Lichtwarck-Aschoff, 2011; Donovan, 2004).A literatura tem demonstrado que os primeiros consumos de bebidas alcoólicas tendem a ocorrer na família, sendo os comportamentos da mesma um dos fatores de risco com maior influência para o consumo de álcool dos jovens (Martino, Ellickson & McCaffrey, 2009; Mares, Vorst, Engels & Lichtwarck-Aschoff, 2011). No mesmo sentido, alguns estudos mostraram a relação entre aquilo que os jovens creem ser o expectável face ao consumo de álcool (norma social) e o consumo de bebidas alcoólicas pelos próprios (Svensson, 2010; Kuntsche, Rehm, & Gmel, 2004).

Não foram identificados fatores ambientais por nenhum dos grupos relativamente à experimentação de álcool. Este dado parece indicar que os jovens têm alguma dificuldade em identificar a influência de fatores ambientais, como a geografia do país, a acessibilidade a bebidas alcoólicas, entre outros, como fatores de risco a atuarem na experimentação de bebidas alcoólicas.

O prazer decorrente do consumo de bebidas alcoólicas, a pertença a um grupo de pares consumidores, a disponibilidade financeira e a norma social, foram identificados por todos os grupos como fatores de risco para o consumo regular de álcool. A par das atitudes e comportamentos dos pais e familiares face ao consumo, as atitudes e comportamentos dos grupos de pares face a bebidas alcoólicas são os fatores de risco mais frequentemente referidos na literatura como fortemente associados ao consumo de álcool (Zarzar, et al., 2012; Svensson, 2010;Bekman, Cummings & Brown, 2010). A disponibilidade financeira, ou o dinheiro disponível para despesas pessoais, embora menos referida pela literatura, surge igualmente como fator de risco para o consumo (Donath et al., 2012).Embora no presente estudo o prazer decorrente do consumo de bebidas alcoólicas tenha sido identificado por todos os grupos enquanto fator de risco para o consumo regular, o mesmo raramente é referido pela literatura. De ressalvar que a “pressão dos pares” para o consumo e o “estatuto social” decorrente do mesmo, foram igualmente identificados por três grupos como fatores de risco para o consumo. Num país vitivinícola em que o álcool é uma substância socialmente aceite, utilizada no quotidiano e onde existe um modelo hegemónico de recreação centrado no consumo de álcool (Calafat et al, 2004), não beber bebidas alcoólicas pode ser motivo de exclusão entre pares ou pelo menos de menor integração nas práticas de diversão dos jovens.

De salientar ainda que, tal como referido na literatura, os dados apontam no sentido de o consumo de álcool entre os jovens servir a gestão de emoções negativas perante as quais não têm estratégias emocionais e cognitivas para lidar (Chartier, Hesselbrock & Hesselbrock, 2010; Schulte, Ramo & Brown, 2009).No que respeita às diferenças de género, a “baixa autoestima” enquanto fator de risco para o consumo regular de álcool, foi unicamente identificado pelo grupo feminino, sugerindo que mais frequentemente o consumo de álcool possa ser utilizado pelas raparigas como forma de aumentar a autoconfiança, comparativamente com os rapazes. A facilidade de acesso a bebidas alcoólicas enquanto fator de risco para o consumo foi identificada unicamente pelo grupo misto como fator de risco para o consumo regular, sendo contudo um fator frequentemente presente na literatura (Kuntsche, Rehm, & Gmel, 2004; Brook, et al., 2011).

No que concerne aos fatores de risco associados ao aumento do consumo feminino, as “mudanças sociais face ao papel da mulher”, ou seja a alteração das crenças associadas a papéis de género, e a “igualdade de género”, isto é, a procura da igualdade de género pelo sexo feminino, foram os fatores de risco que reuniram maior consenso entre os grupos como associados ao consumo feminino. No que respeita a diferenças de género, apenas o grupo masculino identificou a “normal social” como fator de risco para o aumento do consumo feminino.

Relativamente aos fatores protetores do consumo de álcool, não gostar do sabor das bebidas alcoólicas ou a ausência de prazer decorrente do seu consumo, a existência de uma doença impeditiva do consumo, as experiências negativas passadas decorrentes do consumo de bebidas alcoólicas e ter pouca disponibilidade financeira foram os fatores de risco identificados por todos os grupos como protetores do consumo de álcool. No mesmo sentido, possuir estratégias de coping adequadas e a não frequência de contextos recreativos foram identificados por três grupos como fatores protetores do consumo de bebidas alcoólicas. Outros fatores presentes neste estudo relacionaram-se com estratégias de divertimento alternativas, conhecimentos e crenças acerca do consumo de álcool e valores de vida ou religiosos. De salientar, que apenas o grupo de jovens abstémicos identificou a não pertença a um grupo de pares consumidores como fator protetor do consumo.

De forma geral, a maioria dos fatores de risco associados ao consumo de álcool implicam a expetativa de receber uma gratificação decorrente deste consumo seja por prazer e diversão, seja para evitar mal-estar emocional e psicológico e lidar com situações adversas ou para a aceitação familiar e social. No entanto, este consumo também implica um importante potencial de danos, quer a nível físico, psicológico e/ou social, a curto ou a longo prazo. O limite da idade mínima para o consumo de álcoolprende-se com a incapacidade do organismo para metabolizar o álcool, ou seja, pelo fato do fígado ser imaturo até à maioridade, segregando pouca quantidade de enzima álcool-desidrogenase (ADH) que converte o álcool em acetaldeído (sendo este produto mais tóxico que o próprio álcool) e pela idade mínima para assumir a responsabilidade judicial por condutas ilegais ou perigosas.

Os dados do presente estudo sugerem que os programas de prevenção do consumo de álcool devem ter em conta as diferenças de género relativas aos fatores de risco e protetores associados ao consumo de álcool, e desenvolver ações preventivas com base nessas diferenças. Assim, é relevante que estes programas se centrem essencialmente em três dimensões: o desenvolvimento pessoal e social dos jovens, permitindo-lhes a aprendizagem de estratégias de coping, a promoção da autoestima e do autodesenvolvimento; o trabalho com os pais e encarregados de educação, no sentido de os sensibilizar para os perigos do consumo de bebidas alcoólicas por menores de idade, conscientizando-os para os efeitos da modelagem e para a relevância das atitudes que apresentam face ao consumo de álcool relativamente ao impacto que estas exercem no consumo dos filhos, bem como a importância da gestão do dinheiro disponibilizado e da monitorização e supervisão parental (ex. saídas noturnas e grupos de amigos); e, por fim, o terceiro aspeto a trabalhar é a influência do grupo de pares, com o treino de estratégias de resistência a pressões externas que incentivem os jovens ao consumo.

Sendo a escola o local onde os jovens passam grande parte da sua vida, este poderá ser o lugar ideal para se intervir em educação e promoção para a saúde, em geral, e em prevenção dos consumos, em particular, através de um Projeto Educativo (Calafat & Munar, 1999), que envolva, simultaneamente, uma formação adequada junto de pais e professores. Neste contexto, os psicólogos surgem como os profissionais mais habilitados para a elaboração de programas preventivos do consumo de substâncias, podendo desenvolver um papel crucial no trabalho com os jovens, na formação de professores, bem como no trabalho com os pais e encarregados de educação.

 

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Recebido em 08 de Agosto de 2014

Aceite em 21 de Novembro de 2015

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