A Demência é caracterizada por um declínio cognitivo gradual e significativo comparativamente ao desempenho prévio num ou mais domínios, com alterações comportamentais e psicológicas (Dyer et al., 2018). Segundo o World Alzheimer Report (2018) em 2018 foram diagnosticadas com demência 50 milhões de pessoas, estimando-se que em 2050 sejam atingidos os 152 milhões, o que afirma a necessidade de intervir no sentido de manter a qualidade de vida da pessoa (Abraha et al., 2017), atendendo, não só aos cuidados físicos que a patologia requer, como também ao nível psicológico, quer da pessoa com demência, quer do seu cuidador (García et al., 2019).
No que respeita às intervenções para a Demência, as terapias farmacológicas são consideráveis imprescindíveis, devendo ser complementadas com as intervenções não farmacológicas (NF) (Ljaopo, 2017; Mapelli et al., 2013). As Intervenções NF têm apresentado promissores resultados no tratamento dos sintomas comportamentais e psicológicos associados à demência (García, 2018) melhorando ou retardando, também, o deterioro cognitivo (Maki et al., 2018). Estas intervenções podem, assim, ser decisivas em relação ao atraso do ingresso da pessoa com demência em estruturas de cuidados de longa duração (Maki et al., 2018), podendo contribuir para a redução da medicação prescrita (Maki et al., 2018) e melhorar a qlidade de vida do cuidador (Ljaopo, 2017).
A Estimulação Cognitiva (EC) é um dos tipos de intervenção não farmacológica mais amplamente aplicada na demência, apresentando resultados que sustentam a sua eficácia, não interferindo com a farmacoterapia e não apresentando efeitos secundários para a pessoa com demência (Aguirre et al., 2013). A EC mantém ou retarda o comprometimento das funções cognitivas, aumenta a longevidade com uma melhor qualidade de vida (Capotosto et al., 2016) promove a autonomia, autoestima, autoeficácia e envelhecimento saudável (Agustín & Tortajada, 2014).
O impacto da EC na demência, deve-se à neuroplasticidade (Gómez et al., 2020), ou seja, à capacidade do sistema nervoso se adaptar a novas circunstâncias, inclusivamente quando há alguma lesão cerebral, compensando esse dano (Gómez et al., 2020). Desta forma a EC recorre a um conjunto de estratégias para trabalhar as diversas funções cognitivas (Capotosto et al., 2016; Mapelli et al., 2013) desenvolvendo aprendizagens/estratégias cognitivas, que contribuam para o aumento da densidade sináptica, bem como da plasticidade cerebral (Souza & Chaves, 2005). Para tal, é fundamental que as atividades de EC sejam aplicadas de forma regular (Chariglione & Janczura, 2013), com graus de dificuldade variados (Mapelli, et al., 2013) e sobretudo personalizadas e adaptadas a cada pessoa, de modo a mantê-la motivada e cognitivamente ativa (García-Betances et al., 2014).
As intervenções cognitivas aplicadas a idosos podem recorrer a novas tecnologias (e.g. Astell et al., 2018; Dethlefs et al., 2017; García-Casal, et al., 2016). A Realidade Virtual (RV) é uma das intervenções que tem vindo a ganhar maior ênfase (e.g. Corriveau, et al., 2018; Gamito et al., 2018). A RV permite à pessoa viajar por ambientes estimulantes agradáveis e significativos, alheando-se do contexto onde se encontra, podendo, assim, constituir uma estratégia de promoção do bem-estar geral (Appel et al., 2020). A RV pode ser conciliada com as tarefas típicas da EC (Corriveau et al., 2018) e pode, ainda, permitir a realização de treino no local onde a pessoa se encontra, sem ter de se deslocar (Varela-Aldás et al., 2019). A estimulação cognitiva com recurso à realidade virtual pode, assim, ser uma intervenção imersiva, que possibilita à pessoa situar-se num ambiente naturalista e realista (Rizzo et al., 2001), com imagens que permitem relembrar atividades da vida diária e acontecimentos passados (Rose et al., 2001), proporcionando uma sensação de envolvimento nos ambientes expostos (Gamito et al., 2015). Os conteúdos expostos devem corresponder aos interesses da pessoa idosa, tal como na estimulação cognitiva tradicional, não descurando os comprometimentos ao nível cognitivo, sensorial e físico (Appel et al., 2020). É recomendado um equilíbrio na estimulação, não devendo ser demasiado estimulante, dando primazia a imagens relacionadas com a natureza, uma vez que, por exemplo, para pessoas que residem em instituições, são geralmente espaços que raramente frequentam (Appel et al., 2020).
Alguns estudos revelam a eficácia da RV na promoção das funções cognitivas no geral e, mais especificamente, na memória a longo prazo, memória episódica, memória imediata e atenção seletiva, uma vez que requer concentração para determinado estímulo, bem como uma melhor codificação da informação (e.g. Man et al., 2011; Optale et al., 2009). A RV permite estimular as habilidades cognitivas, permitindo transferir essa aprendizagem para a vida diária (Optale et al., 2009; Suchat et al., 2012) e aumenta o interesse e motivação para a realização das atividades devido aos conteúdos realistas projetados (Suchat et al., 2012).
Este estudo pretende desenvolver e analisar o impacto de uma intervenção individualizada de EC com recurso à realidade virtual com uma pessoa idosa a residir numa Estrutura Residencial para Pessoas idosas com quadro de demência.
Método
Trata-se de um estudo caso em relação ao qual é feita uma descrição qualitativa decorrente da observação das sessões.
Participante
O Caso analisado diz respeito a uma utente com 81 anos de idade que se encontra a residir numa Residência Estrutural para Pessoas Idosas (ERPI) há cerca de 7 anos. A utente apresenta diagnóstico de Perturbação Neurocognitiva Ligeira. Apresenta evidências de declínio cognitivo no instrumento de avaliação cognitiva (ACE-R, no qual obteve 49 pontos), em praticamente todas as funções cognitivas, à exceção da orientação espacial e autopsíquica e da capacidade visuo-espacial que parecem ainda estar relativamente preservadas. Apresenta, ainda, Perturbação de Ansiedade Generalizada, Insónias, e ainda Perturbação Depressiva Persistente, apresentado como resultado da aplicação da Geriatric
Material
Avaliação Cognitiva de Addenbrooke (ACE-R). O ACE-R foi adaptado para a população portuguesa por Firmino, Simões, Pinho, Cerejeira e Martins (2006), sendo interpretada de acordo com a idade e escolaridade dos sujeitos, em que uma maior pontuação reflete um maior desempenho (Ferreira et al., 2012)MAth. Este instrumento avalia diferentes domínios, tais como a orientação, retenção, atenção, concentração, memória, linguagem, capacidade viso-espacial e ainda, a fluência verbal (Hodge & Mioshi, 2005; Ferreira et al., 2012). Assim, o ACER-R é um instrumento de rastreio cognitivo que permite a identificação de fases precoces de patologias como as demências, com sensibilidade para diferenciar a doença de Alzheimer e demência Frontotemporal (Mathuranath et al., 2000).
Escala de Depressão Geriátrica (GDS-15). A GDS-15 avalia a sintomatologia depressiva de pessoas idosas, sendo uma versão reduzida da GDS-30. A versão reduzida, comparativamente à integral, para além de manter a boa precisão diagnóstica, sensibilidade e confiabilidade, também permite que o sujeito não se sinta fatigado durante a sua aplicação, pois o seu tempo de aplicação é menor (Apóstolo et al., 2014).
Treino Cognitivo com Realidade Virtual e Terapia de Orientação para a Realidade. A presente intervenção apresenta duas modalidades de aplicação semanal: uma dedicada ao treino cognitivo recorrendo à utilização da RV, e a outra recorre às ditas tarefas tradicionais de “papel e lápis”. Nas sessões de RV, para além de ser estimulada a atenção da utente para determinados detalhes do vídeo, é também realizada uma ficha com questões sobre o vídeo, de modo a trabalhar a memória de curto e longo prazo (com questões de memória semântica). Para além do treino cognitivo, em todas as sessões é realizada igualmente a TOR, em que a utente preenche uma ficha que pretende estimular a orientação para a realidade.
Procedimento
Após a apresentação da possibilidade de intervenção à utente e da mesma aceitar participar, foi realizada uma entrevista semiestruturada e o rastreio do estado cognitivo (ACE-R) e emocional (GDS-15). Seguiu-se o planeamento individualizado das sessões de intervenção tendo em consideração a opção pela realização da EC com o auxílio da realidade virtual pretendeu potenciar efeitos positivos nas funções cognitivas, proporcionando ainda benefícios na saúde global da pessoa idosa, desde a vertente mental, social e emocional, permitindo ainda, colmatar o sentimento de solidão, proporcionando sensação de bem-estar e ainda redução de sintomatologia depressiva
Foram realizadas 9 sessões com uma duração de 45 minutos, duas vezes por semana, entre 28 de janeiro e 4 de março de 2020 apesar de inicialmente terem sido programadas 29 sessões. Esta alteração deveu-se à interrupção abrupta da intervenção condicionada pela situação pandémica provocada pelo COVID-19.
Resultados
As 9 sessões, e intervenção foram iniciadas com a aplicação da TOR, e posteriormente com as atividades de EC. Estas eram intercaladas entre as atividades com o auxílio da realidade virtual, e as tarefas de estimulação cognitiva ditas tradicionais. Assim, nas sessões que requeriam a utilização da realidade virtual, era apresentado um vídeo até três vezes, sendo instruído à utente para prestar atenção aos vários elementos que apareciam no mesmo. No final de cada sessão a utente preenchia uma ficha onde tinha várias questões sobre o conteúdo do vídeo, dedicando especial atenção à promoção de funções cognitivas como a atenção e a memória. Nas sessões, de 28 de janeiro a 4 de março de 2020, foram realizadas atividades de treino da praxia construtiva, gnosias e funções executivas, recorrendo a várias atividades e materiais, como plasticina e outros, de modo a promover uma maior motivação e interesse por parte da utente.
Sessão 1 - Sessão de Realidade Virtual Áreas cognitivas trabalhadas: memória de trabalho, memória semântica, memória sensorial e a atenção. |
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Nesta sessão foi apresentado um vídeo de uma paisagem natural, com florestas, montanhas e neve, onde se procurou que a utente mantivesse a atenção nos diversos espaços, bem como foi estimulada a movimentar a cabeça para entender como esta tecnologia funcionava. Após ter visualizado o vídeo duas vezes foi apresentada uma ficha com questões acerca do que passou no vídeo. No final foi ainda apresentada uma questão sobre o que a presente paisagem a fez relembrar, permitindo assim trabalhar a memória autobiográfica (Reminiscência Simples). A utente realizou as atividades propostas com sucesso e entusiasmo. |
Sessão 2 - Palavras cruzadas Áreas cognitivas trabalhadas: funções executivas (cálculo). |
Nesta sessão foi apresentada uma tarefa de palavras cruzadas adaptada, isto é, em vez de palavras, esta permite realizar cálculo. A utente realizou apenas metade da tarefa, pois referiu era um dia em que não se encontrava bem emocionalmente e fisicamente, tendo-se permitido ventilação emocional. |
Sessão 3 - Símbolos Áreas cognitivas trabalhadas: atenção. |
Nesta sessão pretendia-se que a utente tinha de preencher diversas figuras com símbolos de acordo com as regras mencionadas. A utente desempenhou esta atividade com sucesso, contudo demonstrou perfecionismo na execução da tarefa. |
Sessão 4 - Sessão de Realidade Virtual Áreas cognitivas trabalhadas: memória de trabalho, a evocação categorial e a atenção. |
Nesta sessão foi apresentado um vídeo com diversas paisagens, como rios com barcos, neve, mar, cavalos, entre outros. Após ter visualizado o vídeo duas vezes foi apresentada uma ficha com questões acerca do que passou no vídeo. No final foi ainda apresentada uma questão sobre o que as diferentes imagens lhe permitiram relembrar, trabalhando assim a memória autobiográfica (Reminiscência Simples). A utente realizou as atividades propostas com sucesso e entusiasmo. |
Sessão 5 - Cópia de Desenhos Áreas cognitivas trabalhadas: praxia construtiva. |
Nesta sessão foi apresentada uma ficha com diversas figuras com grau de execução variado, pretendendo-se que a utente realizasse uma cópia desses desenhos para uma outra folha de papel, permitindo assim trabalhar a prazia construtiva. Contudo a utente apenas realizou 3 dos desenhos, pois constantemente apagava o que fazia de modo a ficar o melhor possível. Nesta sessão permitiu-se ainda ventilação emocional. |
Sessão 6 - Sessão de Realidade Virtual Áreas cognitivas trabalhadas: memória de trabalho, memória semântica e a atenção. |
Nesta sessão foi apresentado um vídeo com diversas divisões de uma casa de campo. Após ter visualizado duas vezes foi a apresentada a ficha com diversas questões acerca do que havia visto. Após ter visualizado o vídeo duas vezes foi apresentada uma ficha com questões acerca do que passou no vídeo. No final foi ainda apresentada uma questão sobre como era a sua casa, permitindo assim trabalhar a memória autobiográfica (Reminiscência Simples). A utente realizou as atividades propostas com sucesso e entusiasmo. |
Sessão 7 - Ligação de Figuras Áreas cognitivas trabalhadas: gnosias (reconhecimento visual). |
Nesta sessão foi apresentada uma ficha com diversas figuras, em que numa coluna tinha as imagens reais e na outra as suas sombras, em que o objetivo é ligar a figura à sua sombra real. A utente realizou esta atividade com sucesso, apresentando apenas algumas dificuldades nas figuras finais, uma vez que eram mais complexas. |
Sessão 8 - Cópia de Desenhos Simétricos Áreas cognitivas trabalhadas: praxia construtiva, atenção e funções executivas. |
Nesta sessão apresentou-se uma ficha com diversas figuras em papel quadriculado, em que o objetivo passa pela utente copiar os desenhos, simetricamente, ao lado destes. Apesar de inicialmente a utente ter errado na primeira cópia, a instrução foi dada novamente, e a utente realizou a atividade com sucesso. |
Sessão 9 - Sessão de Realidade Virtual Áreas cognitivas trabalhadas: memória de trabalho e atenção. |
Nesta sessão apresentaram-se dois vídeos, com paisagens, em que ambos tinham em comum o mar. Desta forma no final de se apresentar ambos os vídeos duas vezes, realizou-se a ficha que, inicialmente tinha questões individuais para cada uma, e no final, uma questão de escolha múltipla para que a utente identificasse o que havia em comum em ambos os vídeos. No final havia ainda uma questão acerca da praia, de modo a relembrar acontecimentos passados, permitindo assim a estimulação da memória autobiográfica através da reminiscência simples. |
Ao longo das 9 sessões realizadas a vertente emocional foi sempre considerada, sendo aplicadas as técnicas cognitivo comportamentais de ventilação emocional, questionamento socrático e psicoeducação, com o objetivo de reduzir a sintomatologia depressiva e ansiosa.
Durante as 9 sessões (descritas na Tabela 1), foi possível constatar através da observação melhorias significativas ao nível cognitivo e emocional. Ao nível emocional a utente aumentou o seu estado de ânimo, verificando-se uma quebra nos pensamentos ruminantes comuns na depressão, bem como uma melhoria no estado de sono, uma vez que a utente referia bastantes vezes frases como “Aquelas paisagens eram lindas. Até sonhei com elas; parecia mesmo que estava lá dentro; quando vou dormir vejo logo aquelas paisagens; recordar é viver”, bem como as funcionárias referiam que a utente falava imenso sobre os vídeos, especialmente quando eram paisagens. Destaca-se ainda, o aumento da motivação da utente perante as sessões desde o seu início.
Quanto ao funcionamento cognitivo, o facto de a utente relembrar facilmente os vídeos das sessões anteriores, referindo aqueles que tinha gostado mais (“Aquelas paisagens eram lindas”) ou até mesmo prestando comentários acerca dos mesmos (“A minha casa era mais requintada que aquela”) revela melhorias nas funções cognitivas, como na memória a longo prazo, uma vez que semanalmente relembrava esses mesmos vídeos, especialmente o primeiro (referente a uma paisagem). A memória imediata e a atenção foram igualmente duas funções nas quais se verificaram melhorias sessão após sessão, uma vez que os exercícios propostos eram executados com maior facilidade (especialmente nas atividades de RV). Um comportamento que espelha estas melhorias, uma vez que demonstra prazer e motivação para a ação (que na utente estavam ausentes), foi o facto de a utente, por iniciativa própria, ter começado a escrever num caderno seu, pequenos textos sobre como se sentia, ou até simplesmente redigir o seu nome várias vezes “porque é a treinar que melhoro a minha caligrafia”.
Em termos de orientação para a realidade, a utente a partir da primeira sessão, conseguiu responder corretamente às questões relativas ao dia, mês e ano em que se encontrava.
Discussão
O presente estudo visa descrever a observação das sessões delineadas, tendo como principal objetivo analisar o impacto de uma intervenção de EC com o auxílio da RV numa pessoa com demência a residir numa ERPI. A intervenção consistiu em 9 sessões e a utente manteve, ao longo das mesmas uma postura colaborativa, motivação e interesse perante as atividades apresentadas em cada sessão. De salientar que, a relação empática que se desenvolveu durante a intervenção com a utente poderá ter sido determinante no sucesso da presente intervenção psicológica (Queiroz, 2017).
Considerando todo o quadro clínico da utente, optou-se por uma intervenção que assenta nos pressupostos de uma intervenção individualizada, centrada e adaptada aos interesses e características da pessoa. Este modelo de intervenção parece ter sido fundamental no decorrer das sessões, pois parece ter contribuído positivamente para gerar uma maior motivação na utente como o referido na literatura (García-Betances et al., 2014; Mapelli et al., 2013). De facto, as intervenções individualizadas são benéficas para as pessoas idosas, uma vez que é tido em conta as idiossincrasias de cada pessoa, ou seja, os seus valores, crenças, preferências, bem como os próprios objetivos (Chappell et al., 2007).
Em relação à intervenção realizada, no que respeita às atividades de EC circunscritas a atividades de “papel e lápis”, o facto de a utente ter iniciativa própria para começar a redigir pequenos textos, demonstrou a importância de manter as atividades de EC ditas tradicionais, que para além de incentivar a leitura, envolvem também a escrita, permitindo trabalhar diferentes domínios cognitivos, o que foi constatado igualmente noutros estudos (e.g. Pérez & Menor, 2014). Da observação verificada do seu comportamento ao longo dos dias, verificou-se também melhorias na capacidade de comunicação e por conseguinte, na capacidade de raciocínio, não só evidenciado para com os colaboradores da instituição como também com as suas colegas. De acordo com a literatura, a comunicação é realmente uma das áreas que a EC pretende promover, assim como melhorar a autonomia, independência, autoestima, autoconceito, entre outros (Mendonça & Macedo, 2010; Pinheiro & Gomes, 2014).
A introdução da realidade virtual revelou-se igualmente uma estratégia benéfica com a utente, uma vez que que era algo que lhe suscitava motivação, o que corrobora a literatura acerca desta técnica (e.g. Corriveau et al., 2018; Gamito et al., 2018). O facto da utente recuperar os conteúdos visualizados nas sessões de RV demonstra o impacto positivo da realidade virtual na utente em termos cognitivos, o que vai ao encontro da literatura, uma vez que a mesma incide na promoção do funcionamento cognitivo através da utilização da RV (Man et al., 2011; Optale, et al., 2009), bem como ainda permite transmitir essas aprendizagens para a vida diária (Optale, et al., 2009; Suchat et al., 2012). Nomeadamente, a memória a longo prazo foi dos domínios nos quais se verificaram melhorias significativas pois, para além de outros aspetos já mencionados, as atividades de EC com o recurso à RV, estimularam igualmente na utente, a recuperação da memória autobiográfica o que vai ao encontro de outro da literatura (Man et al., 2011; Optale et al., 2009). A memória imediata e a atenção seletiva, também mencionadas na literatura como áreas cognitivas passíveis de promoção no recurso à RV, foram domínios que realçaram o desempenho da utente nas sessões de recurso à RV, uma vez que a utente desempenhava sempre acertadamente essas tarefas (Man et al., 2011; Optale et al., 2009).
Quanto à TOR, uma vez que a utente passou a lembrar-se sempre do dia, mês e ano atual permite inferir melhorias no que respeita à orientação temporal, o que corrobora a literatura uma vez que um dos seus propósitos é reorientar a pessoa ao nível espacial e temporal (Arroyo-Anlló et al., 2012; Menna et al., 2016).
Em termos emocionais o facto de a utente se pronunciar positivamente acerca dos vídeos, referir que sonhava com os mesmos, poderá indicar melhorias ao nível do sono, indica melhorias significativas no seu estado de ânimo ao longo do dia, nomeadamente na redução da sintomatologia depressiva. Vários autores (e.g. Lin et al., 2018; Varela-Aldás et al., 2019) referem exatamente estes benefícios que ultrapassam o impacto positivo ao nível das funções cognitivas, melhorando, também, a saúde global da pessoa idosa e reduzindo a sintomatologia depressiva .
Assim, os resultados decorrentes da aplicação destas 9 sessões sugerem os benefícios associados da realidade virtual associada à EC, desde melhorias ao nível cognitivo a benefícios em termos emocionais, corroborando estudos prévios (e.g. Lin et al., 2018; Varela-Aldás et al., 2019). Este estudo de caso permitiu perceber o quão motivador e estimulante pode ser a RV como ferramenta de trabalho à EC, apoiando a literatura, que enfatiza a RV como elemento que potencia o interesse e motivação para a realização das atividades devido aos conteúdos realistas projetados (Suchat et al., 2012), especialmente em pessoas a residir em instituições, uma vez que lhes permite ter contacto com outros lugares apesar da impossibilidade da pessoa se deslocar fisicamente (Varela-Aldás et al., 2019).
O presente estudo possui algumas limitações nomeadamente o facto de se tratar de um estudo de caso, que apenas permite uma primeira exploração do impacto. Contudo, a principal limitação deste estudo de caso foi a impossibilidade de obter dados quantitativos provenientes de avaliações da pós intervenção para analisar de forma mais detalhada e objetiva o impacto das sessões. Estas avaliações foram, de facto, inicialmente previstas, mas a interrupção do acompanhamento devido às restrições da pandemia Covid-19 impediu a aplicação da totalidade das sessões e a realização da avaliação pós intervenção. Ainda assim, este estudo permitiu observar de notórios benefícios em termos cognitivos e emocionais com a implementação de sessões de EC e RV individualizadas e personalizadas. Estes resultados afirmam a necessidade de se desenvolver um estudo metodologicamente mais robusto sobre o impacto de intervenções individualizadas, de modo a desenvolver intervenções que promovam melhorias no estado de ânimo e no funcionamento cognitivo capazes de melhorar a dignidade e qualidade de vida das pessoas com demência.
Contribuição dos autores
Lídia Lobo: Concetualização, Análise formal, Redação do rascunho original, Redação - revisão e edição
Andreia Sousa: Concetualização, Análise formal, Supervisão, Validação
Magda Reis: Concetualização, Análise formal, Supervisão, Validação
Rosa Marina Afonso: Concetualização, Análise formal, Supervisão, Validação, Redação - revisão e edição