Estudos relatam que o apoio social é condição básica durante o processo de desenvolvimento humano, especialmente em períodos de maior vulnerabilidade emocional, possivelmente ocasionados por situações de mudanças e/ou transições na vida (Osório et al., 2018).
O ciclo gravídico-puerperal seria uma dessas fases, a qual a chegada do novo membro vem modificar a rotina da mulher e dos entes próximos, como família, amigos e cônjuge. Além disso, a necessidade de reestruturação e reajustamento se dá em virtude da nova definição de funções e desempenho de papéis (Guimarães et al., 2019).
Segundo Cobb (1976), o apoio social favorece o indivíduo na percepção de se sentir amado, cuidado e valorizado pelos entes a sua volta, bem como se insere em uma rede de comunicação e obrigações recíprocas, portanto é considerado um processo dinâmico e complexo, envolvendo relações interpessoais e entre suas redes sociais, propiciando os recursos pessoais que possuem para confrontar-se diante de novas situações (Gonçalves et al., 2011). Desta forma, o conceito de apoio social se apoia em quatro pilares: na quantidade de pessoas com as quais se relaciona, na estrutura e qualidade que essas relações se dão, nos atos executados e na percepção que a pessoa mantém sobre todos esses aspectos.
Esse construto, de acordo com Arrais e Araújo (2017), atua como um fator de proteção aos efeitos adversos advindo tanto de causas físicas como psicológicos decorrentes de situações de crises, consequentemente, de extrema relevância quando se trata de transformações vinculados ao desenvolvimento humano, como é o caso da gravidez.
É um construto multidimensional envolvendo o conforto, a assistência e/ou informações que alguém recebe de contatos sociais formais ou informais, estando ainda relacionado com a percepção que a pessoa tem do seu mundo social, com as estratégias para estabelecer vínculos, os recursos que lhe são oferecidos, bem como à proteção frente às situações de risco (Rapoport & Piccinini, 2006).
Evidências sugerem que a qualidade, adequação ou satisfação com apoio social tende a ser moderadamente estável ao longo da vida e generalizável para outras situações interpessoais. No que se refere à rede de apoio social, a renda familiar tende a estar relacionada ao tamanho da rede, visto que melhores condições econômicas podem interferir no processo de desenvolvimento e manutenção de redes (Silva & Coutinho, 2005).
Método
Foi realizada uma revisão integrativa de literatura sobre o Apoio Social na gestação. No intuito de conferir maior confiabilidade ao estudo foram utilizadas as seis etapas metodológicas da revisão integrativa (Ercole et al., 2014). Iniciou-se com a definição da questão norteadora do estudo: “Qual importância do Apoio Social na Gestação?”.
Com a elaboração da questão, foram definidas as palavras-chave, de acordo com os descritores em ciências da saúde (DeCS) e o Medical Subject Headings (MeSH), sendo: gravidez, Apoio Social e Pregnancy, Social Support, respectivamente. As bases de dados acessadas foram a Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências Sociais e da Saúde (LILACS), Banco de Dados em Enfermagem (BDENF), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) por meio da Biblioteca Virtual da Saúde (BVS) e a Scientific Electronic Library Online (SciELO).
Seguida pelo estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão para a seleção dos recursos e informações e, posteriormente, formou-se um banco de dados, com o intuito de organizar e sumarizar as informações em tabelas específicas. Em seguida, deu-se encaminhamento a análise crítica dos estudos frente ao delineamento da pesquisa, realizou-se a comparação entre dados e identificação de lacunas e, por fim, a construção de uma conclusão baseada nos resultados evidenciados pela análise crítica.
Como critério de inclusão, selecionaram-se artigos que tinham sido publicados entre os anos de 2014 a 2018, inseridos nas bases de dados citadas, texto completo, de livre acesso e que atendiam aos objetivos do estudo, optando-se, ainda, por selecionar publicações nos idiomas português, inglês e espanhol. Serão excluídos do estudo os artigos de revisão sistemática e estudos que envolvam Apoio Social e óbito fetal, Apoio Social e má-formação fetal e Apoio Social e o desenvolvimento infantil.
No plano de análise dos dados, considerando as características dos mesmos, optou-se por usar categorias pré-estabelecidas. Assim, após a realização de uma leitura cuidadosa de cada texto, as informações foram sistematizadas em categorias cientométricas. Os resultados foram descritos na forma de tabelas, destacando as informações sobre base de dados, resultados preliminares e total após leitura e análise, bem como autor e ano de publicação, objetivo do estudo, desenho de pesquisa e principais resultados.
Resultados
Conforme demonstra o Quadro 2, foram identificados 750 artigos na BVS e 92 na SciELO. Com a aplicação dos filtros dos critérios de inclusão e exclusão ficaram 26 da BVS e 30 da SciELO para leitura do título e posterior leitura do resumo. Permaneceram 08 artigos para inclusão do estudo e análise dos dados, dos quais dois são brasileiros e seis pesquisas estrangeiras (2 México, 1 Japão, 1 Turquia, 1 Colômbia e 1 Portugal).
Por meio dos dados apresentados no Quadro 1 as produções científicas, em sua maioria, foram publicadas em 2014, 2018 e 2017, com duas pesquisas cada ano. Observou-se que as pesquisas, em sua maioria, objetivavam verificar possíveis associações entre o apoio social e sintomas depressivos na gestação ou pós-parto, bem como conhecer a percepção do apoio social no ciclo gravídico puerperal.
Quanto ao desenho do estudo, nota-se a prevalência de estudos que utilizaram o método quantitativo, com aplicação de questionários e escalas validadas. Estudos revelam que as participantes com traços afetivos positivo apresentam menor risco obstétrico, enquanto que as mulheres com maior traço afetivo negativo demonstram menor planejamento da gravidez e maior percepção de disfunção familiar (Osório et al., 2018). De acordo com Coburn et al. (2016) níveis moderados e altos de apoio social atenuaram o risco de depressão devido a estressores familiares e os estressores interpessoais e diários no pré-natal afetam negativamente a saúde mental das mulheres após o nascimento e o apoio social poderia mitigar alguns desses efeitos.
Segundo os dados mães adolescentes que possuem apoio social e familiar adequado conseguem atingir um nível favorável de adaptação materna (Esteves et al., 2018), tendo a predominância do sendo apoio instrumental, seguido dos apoios informativos e emocionais (Cremonese et al., 2017). Já na pesquisa de Braga et al. (2014) foi possível identificar percepções mistas da gestação sendo de apoio, oriunda da família, porém de abandono do companheiro, amigos e profissionais da saúde.
Foi verificado, também, que os sintomas depressivos pré-natais previram acentuado declínio na qualidade dos relacionamentos-chave no período puerperal e esse fato poderia estar associado a depressão e baixa qualidade do apoio social, além de ter um risco aumentado de depressão perinatal em gestações subsequentes (Senturk et al., 2017). Fato ratificado por dados de Morikawa et al. (2015) que sugere que ter um número maior de pessoas de apoio durante a gravidez ajuda a proteger contra a depressão pós-parto.
Autor/Ano | Objetivo | Desenho da pesquisa | Principais resultados |
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Osório et al., 2018 | Comparar as manifestações afetivas em suas dimensões positivas e negativas, a modo de traço e de estado, com variáveis ginecobstétricas e de funcionamento familiar em mulheres gestantes | Estudo quantitativo com 229 mulheres que deram entrada em uma instituição prestadora de serviços de saúde em Medellín. Foram utilizados os questionários PANAS (Robles & Páez, 2003), APGAR-familiar (Smilkstein, 1978) e um inquérito de variáveis sociodemográficas. | Descobriu-se que as gestantes com maior traço afetivo positivo apresentam menor risco obstétrico, enquanto as mulheres com maior traço afetivo negativo demonstram menor planejamento da gravidez e maior percepção de disfunção familiar. Conclui-se que a percepção de apoio familiar e os traços emocionais positivos são componentes que favorecem a saúde gestacional, enquanto o afeto negativo é um obstáculo para a adaptação à maternidade e para as relações familiares percebidas. |
Esteves et al., 2018 | Avaliar a influência da resiliência e de um apoio social efetivo numa adolescente que tenha experienciado gravidez e/ou maternidade precoces. | Estudo de caso não experimental, qualitativo, de follow-up. Avaliação e intervenção familiar desenvolvida em 3 momentos distintos, tendo sido utilizados como instrumentos de recolha de dados: entrevista, questionários, escalas e observação, tendo como referencial teórico-operativo o Modelo Dinâmico de Avaliação e Intervenção Familiar | Mães adolescentes que beneficiam de um apoio social e familiar adequado, e que possuem fatores protetores de ordem individual e relacional conseguem atingir um nível favorável de adaptação à maternidade. |
Cremonese et al., 2017 | Conhecer o apoio social recebido no ciclo gravídico-puerperal, na percepção da puérpera adolescente. | Pesquisa qualitativa, por meio de entrevista semiestruturada e mapa falante, com 11 puérperas adolescentes, que tiveram seus filhos em um hospital escola no interior do Rio Grande do Sul, Brasil. Os dados foram submetidos à análise de conteúdo temática. | O apoio social que as puérperas adolescentes receberam teve a predominância do apoio instrumental, seguido dos apoios informativos e emocionais, os quais foram recebidos, principalmente, por familiares |
Braga et al., 2014 | Analisar as percepções de adolescentes sobre apoio social na maternidade | Pesquisa qualitativa, com entrevistas semiestruturadas e a elaboração de mapa de rede, e seguiu-se a análise de conteúdo temático. Participaram da pesquisa 20 adolescentes de 10 a 19 anos, que vivenciaram a maternidade | Identificou-se percepções de apoio e de abandono. A primeira oriunda da família, do companheiro, dos amigos e pelo acesso aos serviços de saúde e a segunda denotada pela ausência de apoio social, principalmente do companheiro, amigos e profissionais da saúde |
Senturk et al., 2017 | Investigar associações entre sintomas depressivos pré-natais e alterações subsequentes na qualidade percebida dos principais relacionamentos familiares | Uma coorte perinatal de mulheres na Turquia urbana e rural com 730 mulheres. | Os sintomas depressivos pré-natais previram acentuado declínio na qualidade dos relacionamentos-chave no período pós-natal. Isso pode explicar algumas das associações contemporâneas entre depressão e pior apoio social, além de aumentar o risco de depressão perinatal em gestações subsequentes. |
Filipa et al., 2014 | Examinar a associação entre sintomas depressivos pós-natais e um conjunto de fatores demográficos e psicossociais | 604 mulheres que frequentaram um hospital público para atendimento pós-natal na Cidade do México | A probabilidade cumulativa de apresentar PND na presença simultânea dos fatores psicossociais foi de 67,0%; no entanto, isso pode ser reduzido para 5,5% por meio de medidas preventivas que trabalham para eliminar o baixo apoio social, gravidez não planejada e exposição à VPI severa durante a gravidez. |
Morikawa et al., 2015 | Examinar prospectivamente se o apoio social durante a gravidez afetava a depressão pós-parto. | 877 gestantes no início da gravidez e um mês após o parto | Sugerem que ter um número maior de pessoas de apoio durante a gravidez ajuda a proteger contra a depressão pós-parto e que esse efeito é maior em mulheres grávidas depressivas do que não depressivas |
Coburn et al., 2016 | Verificar o apoio social como potencial de atenuar o impacto negativo do estresse. | Estudo quantitativo comparativo com 269 mulheres mexicanas para estresse pré-natal (aborrecimentos diários, estresse familiar, estresse por parceiro e estresse por cultura) em relação aos sintomas depressivos 6 semanas após o parto | Níveis moderados e altos de apoio social atenuaram o risco de depressão devido a estressores familiares. Os estressores interpessoais e diários no pré-natal afetam negativamente a saúde mental das mulheres após o nascimento, mas o apoio social pode mitigar alguns desses efeitos |
Discussão
A disponibilidade de sistemas e de pessoas significativas que proporcionam apoio e reforço às estratégias de enfrentamento do indivíduo diante das situações de vida, é definida como rede de apoio social (Arrais et al., 2014). A rede de apoio social pode incluir a família extensa, os amigos, colegas de trabalho, relações comunitárias e serviços de saúde, de credo religioso ou político, incluindo tanto as relações íntimas como aquelas ocasionais (Silva & Coutinho, 2005).
Nessa perspectiva, a literatura revisada vem apontando sobre a atuação do Apoio Social como fator de proteção no desenvolvimento da depressão pós-parto, revelando assim, a necessidade de se dar um enfoque maior na qualidade da rede apoio e suporte as gestantes durante o ciclo gravídico puerperal, sendo responsável não só a família, mas também os serviços de saúde, amigos e companheiros (Frizzo et al., 2019).
Consequentemente, poderá contribuir na adaptação ao novo ciclo de vida e desenvolvimento da maternidade de forma saudável ao binômio (Piccinini et al., 2014). Porém, faz-se necessária a realização de novos estudos para melhor elucidar a problemática, através do aprofundamento da revisão integrativa, ampliando as bases de dados e comparando artigos, bem como realizando pesquisas empíricas sobre o tema.