As organizações enfrentam crescentes desafios internos e externos, complexos e multidimensionais que incluem diversas alterações comportamentais, sociais, económicas e ainda barreiras internas, tais como fragilidades ao nível da gestão, insatisfação, burnout e turnover dos trabalhadores (Bourgeault et al., 2010; Burton, 2010).
A avaliação da qualidade e dos processos de trabalho é um componente vital para a manutenção e melhoramento da qualidade dos serviços e desempenho prestado pelas organizações e respetivos trabalhadores (BNQ, 2018).
Os resultados de uma organização, nomeadamente o desempenho dos trabalhadores são muito influenciados pela sua Saúde e Qualidade de Vida (QV) pelo que um cultura organizacional (CO) com uma abordagem focada na promoção de qualidade de vida e nos espaços de trabalho saudáveis (Healthy Workplace) está associada a uma maior satisfação com o trabalho, menos riscos psicossociais no trabalho, e consequentemente melhores outcomes, nomeadamente um melhor desempenho dos trabalhadores e satisfação por parte dos clientes (Burton, 2010; Gaspar, 2020, 2021; Gaspar & Correia, 2020; OECD, 2018, 2019, 2020a, 2020b).
As organizações que têm como pilar estratégico a promoção do bem-estar e saúde dos trabalhadores tendem a prevenir riscos, promover a saúde e resolver problemas ou ocorrências negativas e maior capacidade para atrair, reter e estimular o compromisso dos trabalhadores mais criativos e inovadores (Cameron & Quinn, 2011; Campbell & Wiernik, 2015; Gauld & Horsburgh, 2020). Deste modo, estes aumentam o seu desempenho, a sua criatividade e capacidade de inovação. Por outro lado, permite reduzir fatores de risco e desestabilizadores no trabalho, tais como conflitos, queixas, turnover, absentismo, problemas de desempenho, acidentes e incapacidade (Kock, 2017).
As organizações mais saudáveis apresentam, em média, resultados mais positivos, não apenas ao nível de resultados humanos, mas também dos gestores e da organização como um todo (Guest, 2002; 2017).
Necessidades não satisfeitas podem ser fatores de risco para a saúde e inversamente a preocupação pela segurança, sentido de pertença, satisfação com o trabalho, justiça social, autoestima, autoeficácia e autonomia conduz a um bem-estar e saúde organizacional (Guest, 2002; 2017; Kristensen et al., 2005). a responsabilidade de manter e melhorar o bem-estar e qualidade de vida deve ser partilhada pela organização e pelos trabalhadores.
A identificação e caracterização dos fatores que influenciam a qualidade de vida deve ser prioritária nas organizações (BNQ, 2018; Okunade et al., 2017).
Deve ser fomentada uma CO promotora de saúde e bem-estar. Os fatores de risco para a saúde e qualidade de vida devem ser identificados e eliminados ou quando não for possível eliminá-los, devem implementar-se estruturas e práticas de minimização do seu impacto (BNQ, 2018; Burton, 2010; Gaspar, 2020; Scott et al., 2003).
O modelo da Organização Mundial de Saúde (WHO, 2010) para ambientes de trabalho saudáveis, indica vias de influência, processo e princípios essenciais. Define ambiente de trabalho saudável como aquele em que os trabalhadores e os gestores/chefias em conjunto desenvolvem um processo de melhoria contínua da proteção e promoção da segurança, saúde e bem-estar de todos os trabalhadores e para a sustentabilidade do ambiente de trabalho. Considera o ambiente físico de trabalho e psicossocial, os recursos para a saúde pessoal e o envolvimento da organização na comunidade, estando sempre presente com o compromisso da liderança, a participação ativa do trabalhador e o respeito pelos valores e a ética. O processo implica um ciclo de atividades, nomeadamente mobilizar, reunir, diagnosticar, priorizar, planear, executar, avaliar, melhorar e assim sucessivamente (Figura 1).
Na identificação, caracterização e avaliação devem ser tidos em conta os múltiplos fatores e indicadores de influência pelo que devem ser utilizadas todas as fontes de informação e diferentes variáveis relevantes (Gaspar, 2020; Gaspar et al., 2017; Gaspar et al., 2021; WHO, 1994; 2005). De que são exemplo: a Cultura Organizacional (Cameron & Quinn, 2011), Fatores Psicossociais do Trabalho (stress e burnout, equilíbrio entre vida familiar e trabalho, relações de trabalho, relações com a liderança, satisfação, autonomia, reconhecimento) (Kristensen, 2002; Kristensen et al., 2005), Qualidade de Vida (QV) (Gaspar et al., 2017; WHO, 1994, 2005), Desempenho (Campbell & Wiernik, 2015; Guest, 2002, 2017) e outras variáveis e resultados da organização (BNQ, 2018; Bourgeault et al., 2010; Burton, 2010; Gaspar, 2020; Gaspar et al., 2021).
Estratégias possíveis para a melhoria das condições de trabalho são a restruturação, sistemas de recompensa, ambiente laboral saudável, promoção da participação/autonomia, desenvolvimento de carreira, competências na resolução de conflitos, mais comunicação, promoção de relações positivas e justas entre os trabalhadores, com as chefias, entre outras (Sewang, 2016; Sorensen et al., 2019).
Uma abordagem holística e multidisciplinar é fundamental para o sucesso da implementação das boas práticas. Alguns exemplos de boas práticas identificadas são: envolvimento de stakeholders e representantes dos setores relevantes, intervenção baseada na evidência científica, disseminação das boas práticas, intervenção como um processo com melhoramentos e avaliação contínuos. As principais barreiras ao sucesso são a falta de conhecimento dos gestores, trabalhadores e outros relevantes, constrangimentos financeiros e pressão de tempo. As organizações preferem mais resultados certos e rápidos e por vezes apresentam resistência à mudança e respetivas consequências. As estratégias apontadas passam por melhores políticas e legislação, mais e melhor evidência científica, sensibilização e educação das pessoas e entidades envolvidas e utilização de uma abordagem holística que envolva a organização, mas também a comunidade com ações diretas e indiretas e com uma abordagem multidisciplinar e integração multinível (Braithwaite et al., 2017; Braithwaite et al., 2019).
Este trabalho teve como objetivo estudar, construir e validar um instrumento transcultural e fácil de utilizar de avaliação dos healthy workplaces denominado - Ecossistemas dos Ambientes de Trabalho Saudáveis (EATS) baseado em dois modelos: o Modelo de ambientes de trabalho saudáveis da OMS (WHO, 2010) e Modelo Ecológico Bronfenbrenner (2005), considerando as condições de saúde e estilos de vida dos trabalhadores e a forma como as organizações representam ecossistemas promotores da saúde e bem-estar.
Método
Participantes
O estudo envolveu 460 participantes, 231 (50,3%) do sexo feminino. A idade dos trabalhadores varia entre os 18 e os 67 anos, com média de 44 anos e desvio padrão de 11,36.
A grande maioria dos participantes (62,8%) refere ser casado ou viver em união de facto, 26,7% solteiro, 9,8% divorciado ou separado e 0,7% viúvo. 65,9 refere ter filhos. Ao nível da escolaridade 37,2% tem até ao ensino secundário concluído, 62,6% tem a licenciatura/mestrado/doutoramento.
Quanto à localização da organização, 59,1% das organizações localizam-se na Área metropolitana de Lisboa, 21,3% no Norte & área metropolitana do Porto, 14,3% no Centro, 2,6 no Alentejo e 2,6 no Alentejo. 95% dos participantes refere que a Organização onde trabalha é uma Organização Nacional e 15% refere que a Organização é Internacional.
Em relação ao setor de atividade onde trabalha, os setores mais frequentes são o transporte e armazém (19,3%), Educação (18,7%) e Saúde (13,5%).
Quanto à dimensão da organização 62,1% refere que trabalha numa Grande empresa/organização (250 ou mais pessoas), 20,5% numa Média empresa/organização (50 a 249 pessoas), 8,9% numa Pequena empresa/organização (10 a 49 pessoas) e 8,5% numa Microempresa/organização (1 a 9 pessoas).
Material
O instrumento utilizado integra questões sociodemográficas de caracterização dos trabalhadores e teve como base o instrumento de avaliação da Gestão e Qualidade das Organizações de Saúde (Gaspar, 2019, 2021), a Escala de responsabilidade social percebida (Duarte & Neves, 2014) e informação recolhida em documentos oficiais da Direção-Geral de Saúde (2020) e Organização Mundial de Saúde (OMS, 2010) relacionada com o tema dos ambientes de trabalho saudáveis. Foram incluídos dois itens, uma que avalia a perceção geral da qualidade de vida numa escala de tipo Likert de 5 pontos e um outro que remete para a classificação geral do ambiente de trabalho da sua organização numa escala de 0 (Muito mau ambiente) a 10 (Muito bom ambiente).
O instrumento de avaliação da Gestão e Qualidade das Organizações de Saúde (Gaspar, 2021) é constituído por cinco dimensões num total de 53 itens dos quais 7 itens que medem a perceção de qualidade de vida, 15 itens que medem os Riscos Psicossociais do Trabalho, 5 itens que medem o envolvimento na gestão de desempenho e 8 itens que medem a satisfação com o trabalho. Os níveis de alfa de Cronbach obtidos para cada fator mostram que os mesmos possuem uma consistência interna adequada (entre 0,83 e 0,93).
A Escala de responsabilidade social percebida (Duarte & Neves, 2014) é constituída por 16 itens organizados em três dimensões: a) responsabilidade social face aos trabalhadores, b) Responsabilidade face à comunidade e ambiente, e c) Responsabilidade social económica. Os níveis de alfa de Cronbach obtidos para cada fator mostram que os mesmos possuem uma consistência interna adequada (entre 0,75 e 0,89).
O Instrumento Ecossistemas de Ambientes de Trabalho Saudáveis (EATS) é constituído por um total de 62 itens organizados em 9 dimensões tendo como base o modelo dos Healthy Workplaces proposto pela Organização Mundial de Saúde (WHO, 2010). A dimensão Ética e Valores é constituída por 8 itens, o Compromisso com a Liderança por 6 itens, o Envolvimento dos Trabalhadores por 7 itens, os Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança tem 12 itens, os Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental têm 5 itens, o ambiente Físico tem 5 itens, o teletrabalho tem 3 itens, o Envolvimento com a Comunidade 12 itens e os Recursos para a Saúde Pessoal tem 4 itens. Todas as questões têm uma escala de tipo Likert de 5 pontos.
Procedimento
O instrumento foi resultado de um processo complexo de co construção que envolveu cinco investigadores da equipa de investigação, dois especialistas em psicometria, 40 organizações de diversos setores de atividade e de diferentes dimensões, e ainda, uma comissão de acompanhamento constituída por organizações relevantes, nomeadamente: Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), Fórum Saúde Século XXI, Ordem dos Psicólogos Portugueses, Ordem dos Médicos - Colégio da Especialidade de Medicina do Trabalho, Ordem dos Nutricionistas, SICAD - Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências, CENC - Centro de Medicina do Sono e WHO European Office for Prevention and Control of Noncommunicable Diseases (NCD Office).
O instrumento base foi construído pela equipa de investigação e comentado pela comissão de acompanhamento, de seguida uma primeira versão do instrumento foi enviada para as organizações participantes para serem inseridos comentários e recomendações relacionadas com itens a retirar, itens a integrar e itens a reformular. Este processo foi repetido durante três rondas. No final de cada ronda a equipa de investigação analisava as recomendações, integrava as alterações no instrumento e devolvia aos participantes para mais uma ronda. O instrumento foi submetido e aprovado pela comissão de ética do Hospital do Espírito Santo de Évora.
O presente artigo estuda as propriedades psicométricas da versão final obtida.
Para a realização da recolha de dados foram contactadas organizações (outras que não que fizeram parte da co-construção do instrumento) de diversos setores de atividade, de diferentes regiões do país e de diferentes dimensões. A amostra foi por conveniência. As organizações que concordaram participar receberam o instrumento através de um link e disseminavam o link internamente pelos seus trabalhadores.
O link dava acesso à explicação do estudo, contacto dos investigadores para esclarecimento de dúvidas, informação de confidencialidade, anonimato e o carater voluntário da participação. O participante apenas tinha acesso ao início do instrumento após firmar o consentimento informado.
Resultados
Apresentam-se de seguida um conjunto de estatísticas que ilustram os procedimentos relativos ao estudo psicométrico do instrumento EATS. Foi efetuada a análise da estatística descritiva dos itens e das dimensões do instrumento, análise de correlações, análise da fiabilidade através da consistência interna (alfa de Cronbach), Análise Fatorial Confirmatória das escalas do instrumento e diferenças entre grupos ao nível do sexo, idade e escolaridade e validade concorrente das escalas em relação a indicadores relevantes (Quadros 1, 2, 3 , 4, 5, 6, 7, 8 e 9).
O estudo da estatística descritiva mostra que os participantes revelam valores moderados ao avaliar o ambiente de trabalhos nas diferentes escalas, as escalas com valores médios superiores foram o Ambiente Psicossocial relacionado Conteúdo do Trabalho e Relação Liderança e o Envolvimento dos Trabalhadores e as com valores menos positivos foram os Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental, Recursos para a Saúde Pessoal e Compromisso da Liderança (Quadro 10).
As correlações entre as escalas do instrumento EATS são moderadas e estatisticamente significativas (com exceção da correlação entre o Envolvimento dos Trabalhadores e Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental, Recursos para a Saúde Pessoal). Salienta-se a correlação entre Ética e Valores e Compromisso com a Liderança (r=0,87) e Ambiente Psicossocial do Trabalho relacionado com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança (r=0,72), a correlação entre o Ambiente Psicossocial do Trabalho relacionado com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança e o Envolvimento do Profissional (r=0,72) e com o Envolvimento com a Comunidade (r=0,73).
A consistência interna das escalas revelou-se adequada variando entre α =0,82 na escala de Teletrabalho e α=0,95 na escala Compromisso da Liderança (Quadro 11).
A Análise Fatorial Confirmatória das Escalas do instrumento EATS mostra modelos adequados com valores e Non-Normed Fit Index (NNFI), Comparative Fit Index (CFI) e Root-Mean-Square Error of Aproximation (RMSEA) adequados e indicativos de modelos robustos que confirmam a estrutura fatorial das diferentes escalas (Quadro 12).
Comparando grupos em relação às diferentes escalas do instrumento EATS verificam-se diferenças estatisticamente significativas de sexo, idade e escolaridade na grande maioria das escalas.
Comparando géneros verifica-se que as mulheres apresentam uma representação mais positiva em todas as escalas e menos Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança quando comparadas com os homens. Contrariamente são as mulheres que identificam mais Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental (Quadro 13).
Comparando os trabalhadores mais novos (até 40 anos) e mais velhos (41 anos ou mais) verifica-se que os trabalhadores mais novos apresentam uma representação mais positiva em todas as escalas quando comparados com os trabalhadores mais velhos (Quadro 14).
A comparação quanto à escolaridade revela que mais trabalhadores com escolaridade mais elevada (licenciatura ou mais) apresentam uma representação mais positiva em todas as escalas e mais Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental quando comparados com os trabalhadores com menor escolaridade (até 12º ano de escolaridade) (Quadro 15).
Serão utilizadas como variáveis complementares de estudo do Instrumento EATS, a forma como o trabalhador classifica o ambiente de trabalho da sua organização e a perceção e qualidade de vida.
O instrumento EATS e respetivas escalas revelam uma validade concorrente adequada em relação a indicadores relevantes.
Considerou-se a perceção geral de qualidade de vida que mostrou valores moderados (M=3,52 de 1 a 5, DP= 1,07) e a classificação geral do ambiente de trabalho na organização que também com valores moderados (6,52 numa escala de 0 a 10, DP= 2,41) (Quadro 16).
Foi realizado o estudo de correlações entre as escalas do instrumento EATS e os indicadores selecionados e verifica-se que todas as escalas se encontram correlacionadas de forma moderada e estatisticamente significativa com a perceção geral de qualidade de vida e com a classificação geral do ambiente de trabalho na organização.
Quanto à perceção geral de qualidade de vida salienta-se a correlação com o Ambiente Psicossocial do Trabalho relacionado com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança (r=0,54), Ambiente Físico (r=0,53), a Ética e Valores (r=0,47) e Compromisso com a Liderança (r=0,46).
Em relação à classificação geral do ambiente de trabalho na organização salienta-se a correlação com o Ambiente Psicossocial do Trabalho relacionado com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança (r=0,73), a Ética e Valores (r=0,66) e Compromisso com a Liderança (r=0,64).
Discussão
O projeto teve como objetivo estudar, construir e validar um instrumento de avaliação dos Healthy Workplaces denominado - Ecossistemas dos Ambientes de Trabalho Saudáveis (EATS) com base em dois modelos: o Modelo de ambientes de trabalho saudáveis da OMS (WHO, 2010) e Modelo Ecológico Bronfenbrenner (2005), comtemplando as condições de saúde e estilos de vida dos trabalhadores e a forma como as organizações são ecossistemas promotores da saúde e bem-estar.
O Instrumento Ecossistemas de Ambientes de Trabalho Saudáveis (EATS) proposto é constituído por um total de 62 itens organizados em 9 dimensões (Ética e Valores, Compromisso com a Liderança, Envolvimento dos Trabalhadores, Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança, Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental, Ambiente Físico, Teletrabalho, Envolvimento com a Comunidade e Recursos para a Saúde Pessoal) tendo como base o modelo dos Healthy Workplaces proposto pela Organização Mundial de Saúde (WHO, 2010).
O estudo do instrumento EATS demonstrou ser uma medida psicometricamente sólida e teoricamente válida com propriedades psicométricas adequadas e revelou -se um contributo inovador para a avaliação dos ambientes de trabalho saudáveis e monitorização de políticas e estratégias de melhoria e promoção de organizações mais saudáveis e impulsionadoras de bem-estar do trabalhador e da organização como um todo.
Os resultados indicam que os participantes avaliam de forma moderada o ambiente de trabalhos nas diferentes escalas. As que mais contribuem para a perceção de ambiente de trabalho saudável são o Ambiente Psicossocial relacionado Conteúdo do Trabalho e Relação Liderança e o Envolvimento dos Trabalhadores e as que revelaram valores menos positivos foram os Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental, Recursos para a Saúde Pessoal e Compromisso da Liderança (Braithwaite et al., 2017; Braithwaite et al., 2019).
As correlações entre as escalas do instrumento EATS são moderadas e estatisticamente significativas. Salienta-se a relação entre a Ética e Valores e a de Compromisso com a Liderança e o Ambiente Psicossocial do Trabalho relacionado com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança, a relação entre a escala de Envolvimento do Trabalhadores e o Ambiente Psicossocial do Trabalho relacionado com o conteúdo do trabalho e relações com a liderança. Estes resultados ilustram a relevância da Cultura e Valores da organização, a importância das características da liderança e o envolvimento dos trabalhadores para um melhor ambiente psicossocial do trabalho e melhor gestão e mitigação dos Riscos Psicossociais do Trabalho (BNQ, 2018; Burton, 2010; Gaspar & Correia, 2020; Gaspar, 2020; Gaspar et al, 2021; OECD, 2018, 2019, 2020a, 2020b; Okunade et al., 2017).
O estudo psicométrico do instrumento EATS revelou que a consistência interna das escalas é adequada. A Análise Fatorial Confirmatória das Escalas do instrumento EATS revelaram modelos adequados com valores e NNFI, CFI e RMSEA adequados e indicativos de modelos robustos que confirmam a estrutura fatorial das diferentes escalas, com exceção da escala relacionada com os Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o bem-estar e saúde mental que apresenta um valor de RMSEA muito elevado.
Comparando grupos em relação às diferentes escalas do instrumento EATS verificam-se diferenças estatisticamente significativas de sexo, idade e escolaridades na grande maioria das escalas. Os resultados indicam que que as mulheres, os trabalhadores mais novos e com escolaridade mais elevada apresentam uma representação mais positiva do ambiente de trabalho quando comparados com os homens, com os trabalhadores mais velhos (41 anos ou mais) e os trabalhadores com menor escolaridade (até 12º ano de escolaridade) respetivamente. Contrariamente são as mulheres que identificam mais Riscos Psicossociais do Trabalho relacionados com o Bem-estar e Saúde Mental (Gaspar et al, 2017; OECD, 2018, 2019, 2020a, 2020b). Podem ser identificados grupos de maior risco, tais como, os trabalhadores mais velhos e os com níveis de escolaridade mais baixos e diferenças de sexo em algumas áreas especificas, esta informação remete para a necessidade de adequar a intervenção tendo em conta as necessidades e diferentes níveis de risco (Gaspar et al, 2021; Gaspar et al, 2017; Sewang, 2016; Sorensen et al., 2019).
O instrumento EATS e respetivas escalas revelam uma validade concorrente adequada em relação a indicadores relevantes. Quanto à perceção geral de qualidade de vida e à classificação geral do ambiente de trabalho na organização salienta-se a relação forte que revelaram em relação à grande maioria dos indicadores de um ambiente de trabalho saudável. Um ambiente de trabalho saudável está associado a uma melhor qualidade de vida do profissional e a uma perceção mais positiva da organização onde trabalha (Faia et al., 2013; Gaspar, 2020; Jackson et al., 2020; EU-OSHA, 2009)
O instrumento EATS resultou de um processo complexo de construção que envolveu investigadores, peritos e diversas organizações. O estudo psicométrico revelou resultados coerentes em termos conceptuais e de robustez. Considera-se o instrumento EATS e as respetivas escalas uma ferramenta que vem responder a uma necessidade das organizações para avaliar o ambiente de trabalho saudável numa perspetiva ecológica e permite a monitorização de medidas de promoção da saúde e prevenção dos riscos nas organizações com o objetivo central de melhorar o bem-estar e saúde dos trabalhadores, organizações e a sociedade como um todo.
O estudo produziu um instrumento de avaliação e monitorização dos ambientes de trabalho saudáveis em diferentes setores de atividade tendo como base modelos conceptuais sólidos. Foram estudados sistemas e subsistemas das organizações e analisados o tipo e força das influências entre os diferentes sistemas e subsistemas. Outro contributo revelante é a relação estabelecida entre os valores, a cultura organizacional, o compromisso da liderança e os riscos psicossociais do trabalho.
A menor satisfação com o ambiente foi sentida ao nível do compromisso com a liderança e os recursos para a saúde pessoal.
Como principais recomendações do estudo propomos:
Avaliar e monitorizar o ambiente de trabalho saudável numa perspetiva sistémica e integrativa e de forma periódica;
Envolver de forma ativa todos os stakeholders no processo de avaliação e monitorização;
Os resultados das avaliações devem ser devolvidos e refletidos com todos os stakeholders (ou representantes), devem ser estabelecidos objetivos e metas especificas e realistas, e consequentemente planeadas, implementadas e avaliadas as mudanças necessárias e pré-estabelecidas;
Definir um número adequado de metas e a serem concretizadas em tempos bem calendarizados com uso de recursos realistas;
Os gestores e as lideranças devem ter formação contínua em áreas relevantes para o melhor desempenho das suas funções;
Os trabalhadores devem ter um maior envolvimento, com maior autonomia e responsabilização;
Priorizar a promoção de locais de trabalho saudáveis através da implementação de políticas e atividades com vista à melhoria das condições psicossociais de trabalho, promoção da saúde física, social e mental dos trabalhadores;
Promover maior responsabilidade social e envolvimento da organização com a comunidade.
Agradecimentos
Agradecimento ao contributo das organizações que acompanharam o processo de constrição e validação do instrumento EATS: Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT); Fórum Saúde Século XXI; Ordem dos Psicólogos Portugueses; Ordem dos Médicos - Colégio da Especialidade de Medicina do Trabalho; Ordem dos Nutricionistas; SICAD - Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências; CENC - Centro de Medicina do Sono e external advisor WHO European Office for Prevention and Control of Noncommunicable Diseases (NCD Office), assim como a todas as organizações envolvidas na construção e implementação do instrumento.
Contribuição dos autores
Tania Gaspar: Concetualização, Curadoria dos dados, Análise formal, Investigação, Metodologia; Administração do projeto; Recursos; Software; Supervisão; Validação; Visualização; Redação do rascunho original; Redação - revisão e edição
Manuela Correia: Concetualização; Supervisão; Visualização; Redação - revisão e edição
Maria do Céu Machado: Visualização; Redação - revisão e edição
Miguel Xavier: Visualização; Redação - revisão e edição
Fábio Botelho Guedes: Curadoria dos dados; Metodologia; Software
José Pais-Ribeiro: Visualização; Redação - revisão e edição
Margarida Gaspar de Matos: Visualização; Redação - revisão e edição