As demandas crescentes da sociedade por serviços ininterruptos como indústria de manufaturados, atividades policiais e militares, setores energético, de transporte e serviços de saúde, são oferecidos em regime de turnos (James et al., 2017). Estudos indicam que estes horários atípicos de trabalho alteram o ritmo circadiano e este desalinhamento afeta o ciclo comportamental alimentação/jejum, sono/vigília com efeitos adversos na saúde destes trabalhadores (James et al., 2017). Dentre as alterações observadas estudos têm apontado para osteoporose (Bukowska et al., 2018), diversos tipos de câncer (Liu et al., 2018a) como de mama (Ijaz et al., 2013), cólon (Papantoniou et al., 2018) e próstata (Gan et al., 2018), resistência a ação da insulina, (Qina & Scheer, 2016), síndrome metabólica (Almoosawi et al., 2019), distúrbios psicológicos e de sono (Schneider & Harknett, 2018), obesidade (Son et al., 2015), dislipidemia (Joo et al., 2019) e disfunção gastrintestinal (Knutsson & Boggild, 2010).
Com relação ao consumo alimentar, trabalhadores em turnos são mais propensos a alimentação desequilibrada, devido à indisponibilidade de meios de preparo de refeições durante o horário de trabalho (Balieiro et al., 2014), com ingestão significativamente maior de energia, maior consumo de ácido graxo total, colesterol, carboidratos e sacarose em comparação aos diurnos (Peplonska et al., 2019). Freitas et al. (2015) ao analisarem a relação entre trabalho em turnos e comportamento alimentar, detectaram que os trabalhadores noturnos realizavam maior número de refeições/dia e maior inadequação nos horários das refeições do que os diurnos. Concluíram assim que o turno de trabalho noturno pode influenciar negativamente no comportamento alimentar de trabalhadores desse período.
Esta prática de alimentação durante a noite assim como o horário em que os trabalhadores noturnos realizam suas refeições têm sido apontados como fatores relevantes a serem estudados (Bonham et al., 2018). Denomina-se crononutrição o campo do conhecimento que estuda os efeitos do comportamento alimentar na saúde dos indivíduos, considerando-se além do horário das refeições, outras dimensões como frequência e regularidade (Almoosawi et al., 2019). Quando ajustado, o primeiro fator pode auxiliar na prevenção da obesidade e várias outras patologias metabólicas, configurando-se como preditor da saúde dos trabalhadores em turnos (Asher & Corsi, 2015). Neste sentido, considerando a crescente demanda de trabalhadores em turnos para manutenção da sociedade 24 horas (Costa et al., 2018), há uma escassez de pesquisas que sistematizem os fatores associados ao comportamento alimentar e estado nutricional desses profissionais, inseridos no contexto de ritmicidade circadiana.
Diante do exposto, este estudo objetivou sistematizar o conhecimento científico produzido entre 2015 e 2019 acerca dos efeitos do trabalho em turnos no comportamento alimentar e no ritmo circadiano desses trabalhadores.
Método
Para o estudo, utilizou-se uma revisão integrativa como delineamento de pesquisa para sintetizar o conhecimento científico acerca de determinado tema investigado, a qual pode ter seus resultados e achados de pesquisa aplicados a prática clínica (Mendes et al., 2019), seguindo-se as etapas: estabelecimento da hipótese ou questão de pesquisa; amostragem ou busca na literatura; categorização dos estudos; avaliação dos estudos incluídos na revisão; interpretação dos resultados; síntese do conhecimento e apresentação da revisão (Mendes et al., 2008).
A pergunta norteadora deste estudo foi baseada na estratégia PICO, que orienta a construir perguntas que comtemplem os seguintes aspectos: P: paciente ou população estudada; I: intervenção ou condição que se deseja avaliar; C: comparação ou grupo que se quer comparar a intervenção e O: resultados esperados (Santos et al., 2007). Optou-se por priorizar a população estudada (P: trabalhadores em jornada de turnos), a condição/intervenção que se deseja avaliar (I: trabalho em turnos), comparação (C: consumo alimentar e ritmo circadiano nos diferentes turnos) e resultados esperados (O: efeitos na saúde do trabalhador), obtendo-se a seguinte questão norteadora: “Quais os registros em publicações científicas sobre os efeitos do trabalho em turnos no ritmo circadiano e no comportamento alimentar desses trabalhadores?”.
Foram pesquisados sistematicamente artigos no dia 26 de agosto de 2019, com coleta combinada nas seguintes bases de dados: PubMed (US National Library of Medicine National Institutes of Health), Web of Science (Periódicos CAPES) e Science Direct, utilizando-se os seguintes descritores controlados em saúde (DeCS): “Shift Work Schedule” and “Food Consumption” and “Circadian Rhythm”. Tais fontes foram escolhidas, pois contabilizaram maior número de manuscritos que preencheram os critérios de inclusão: textos completos, originais, publicados entre 01 de janeiro de 2015 a 26 de agosto de 2019, disponíveis eletronicamente, em idioma português, inglês e espanhol, que utilizaram exclusivamente modelo epidemiológico e que retratassem o tema de estudo.
Os artigos duplicados nas bases de dados foram excluídos. Posteriormente a aplicação dos critérios de inclusão, realizou-se hand search, totalizando 11 artigos conforme apresentado na figura 1.
A etapa seguinte configurou-se na leitura criteriosa de todos os resumos para verificar a aderência ao tema e a capacidade de responder ao objetivo definido para esta revisão, com posterior extração e transcrição das informações contidas no artigo em instrumento elaborado e validado (Ursi, 2005). Assim, extraíram-se os seguintes dados: título, autoria, ano de publicação, base de dados, nível de evidência, amostra (n), instrumento utilizado, palavras-chave, delineamento do estudo, síntese dos resultados e conclusões. Acrescentou-se o periódico onde o estudo foi publicado, o país onde a pesquisa foi desenvolvida e o idioma do artigo (Quadro 1).
Com relação ao nível de evidência, a classificação baseou-se no delineamento da pesquisa: nível 1- revisões sistemáticas ou metanálises e relevantes ensaios clínicos randomizados; estudos controlados ou oriundos de diretrizes clínicas baseadas em revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados controlados; nível 2- evidências derivadas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado; nível 3- ensaios clínicos bem delineados sem randomização; nível 4- estudos de coorte e de caso-controle bem delineados; nível 5- revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos; nível 6- evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo; nível 7- evidências oriundas de opinião de autoridades e/ou relatório de comitês de especialistas (Melnyk & Fineout, 2005).
Resultados
Foram encontrados onze artigos que responderam a pergunta norteadora deste estudo e atenderam aos critérios de inclusão estabelecidos. Respectivamente, estavam indexados na base de dados PubMed, Web of Science (Periódicos CAPES) e Science Direct, 02, 06 e 01 artigos, e outros dois foram acrescentados à amostra por hand search realizada em artigos da base Web of Science.
Ao longo do período analisado, houve uma homogeneidade com relação ao ano de publicação dos artigos, sendo dois (18,1%) de 2015 (Ramin et al., 2015; Hemiö et al., 2015), três (27,3%) de 2016 (Varli et al., 2016; Hulsegge et al., 2016 e Yoshizaki et al., 2016) e dois (18,1%) nos anos de 2017 (Rosdoken et al., 2017; Molzof et al., 2017), 2018 (Sathyanarayana et al., 2018; Lim et al., 2018) e 2019 (Peplonska et al., 2019; Martins et al., 2019). A maioria dos artigos foram publicados em periódicos estrangeiros (n=10/90,9%), em língua inglesa (n=11/100%), conduzidos nos Estados Unidos (n=2/18,1%) (Ramin et al., 2015 & Molzof et al., 2017) e 9,1% (n=1) nos países citados, a saber: Finlândia (Hemiö et al., 2015), Turquia (Varli et al., 2016), Holanda (Hulsegge et al., 2016), Japão (Yoshizaki et al., 2016), Alemanha (Rosdoken et al., 2017), Índia (Sathyanarayana et al., 2018), Malásia (Lim et al., 2018), Polônia (Peplonska et al., 2019) e Brasil (Martins et al., 2019). O tamanho da amostra (n) envolvida nos estudos variou de 40 (Sathyanarayana et al., 2018) a 54.724 (Ramin et al.,2015) e o perfil dos profissionais em turnos analisados está retratado no Quadro 2, havendo predomínio de profissionais de saúde (n=6/54,5%).
Quanto ao nível de evidência, predominaram os artigos (n=10/90,9%) classificados como IV, e um não citou o delineamento do estudo, não sendo possível categorizar o nível de evidência.
Os objetivos dos artigos desta amostra revelam a intenção dos pesquisadores em avaliar a influência do trabalho em turnos no comportamento e ingestão alimentar (n=5/45,4%) (Hemiö et al., 2015; Hulsegge et al., 2016; Yoshizaki et al., 2016; Sathyanarayana et al., 2018; Peplonska et al., 2019), no estado nutricional (n=1/9,1%) (Varli et al., 2016) e na qualidade do sono (n=2/18,2%) (Rosdoken et al., 2017; Sathyanarayana et al., 2018); determinar possíveis associações entre trabalho em turnos e síndrome metabólica (n=1/9,1%) (Lim et al., 2018), câncer e doenças cardiovasculares (n=1/9,1%) (Ramin et al., 2015), potencial inflamatório da dieta e fator de risco para síndrome cardiometabólica (n=1/9,1%) (Molzof et al., 2017) e ainda determinar associação entre modelos dietéticos e nível de sonolência (n=1/9,1%) (Martins et al., 2019) entre trabalhadores em turnos. Alguns artigos possuíam mais de um objetivo, conforme anteriormente exposto.
Com relação ao consumo alimentar, foi encontrado que trabalhadores em turnos apresentam maior ingestão calórica total (Ramin et al., 2015; Varli et al., 2016; Hulsegge et al., 2016 & Peplonska et al., 2019), de carboidratos (Varli et al., 2016; Rosdoken et al., 2017; Peplonska et al., 2019), de gorduras saturadas entre mulheres (Hemiö et al., 2015), gorduras totais (Varli et al., 2016; Peplonska et al., 2019), de colesterol e sacarose (Peplonska et al., 2019), além de estar associado com padrão dietético inadequado (Yoshizaki et al., 2016) e menor consumo de frutas e vegetais em homens (Hemiö et al., 2015) quando comparado com os trabalhadores diurnos, além do que o trabalho em turnos colabora para horários irregulares das refeições levando ao aumento de índice de massa corporal (IMC) (Yoshizaki et al., 2016), maior prevalência de obesidade (Ramin et al., 2015) e constitui-se como fator de risco para síndrome metabólica (Molzof et al., 2017; Lim et al., 2018).
O trabalho em turnos impactou negativamente no padrão de sono destes trabalhadores com redução da duração do sono (Ramin et al., 2015; Varli et al., 2016; Lim et al., 2018), piora da qualidade de sono (Sathyanarayana et al., 2018 & Lim et al., 2018), aumento de distúrbios do sono (Lim et al., 2018), em contrapartida observou-se que um padrão dietético saudável diminui a sonolência destes trabalhadores durante o dia (Martins et al., 2019).
Discussão
Os artigos analisados estavam indexados na Web of Science (Periódicos CAPES), temática variada acerca do conhecimento (Graziosi et al., 2013); PubMed, que aborda temas relacionados às áreas médica e biomédica; e Science Direct, com foco em ciências biológicas, saúde, ciências sociais e humanas, engenharias e física (Figueiredo et al., 2017).
Estima-se que 20% da força de trabalho execute suas atividades em turnos noturnos (Straif et al., 2007), o que têm despertado o interesse de pesquisadores em investigar os efeitos desta alteração no ritmo circadiano, no comportamento alimentar e no padrão de sono destes indivíduos. Estudos investigando possíveis relações entre trabalho em turnos e hábitos alimentares têm sido publicados desde a década de 60 (Lowden et al., 2010), o que explica a produção científica distribuída de forma homogênea ao longo dos últimos cinco anos, e estudos com esta temática sendo desenvolvidos em vários países do mundo.
No que tange ao perfil da amostra, verificou-se o predomínio de artigos envolvendo profissionais de saúde (Varli et al., 2016; Yoshizaki et al., 2016; Rosdoken et al., 2017; Molzof et al., 2017; Sathyanarayana et al., 2018; Peplonska et al., 2019) em que a jornada de trabalho em turnos, especialmente o trabalho noturno, é recorrente em serviços de saúde, devido ao funcionamento ininterrupto necessário a assistência dos pacientes, especialmente em ambiente hospitalar (Pepłonska et al., 2019), perfazendo 10,9% do total de trabalhadores em turnos nos Estados Unidos (United States Department of Labor, 2004).
Com relação ao risco de sobrepeso e obesidade, houve aumento do índice de massa corporal (IMC) (Yoshizaki et al., 2016) e maior prevalência de obesidade (Ramin et al., 2015) entre trabalhadores em turnos que diurnos, achados esses corroborados por meta-análise composta por 26 estudos envolvendo 311334 trabalhadores em turnos, em que o trabalho em turnos está positivamente associado com risco de sobrepeso ENT#091;RR: 1,25; intervalo de confiança 95%: 1,08-1,44ENT#093; e obesidade (RR: 1,17; intervalo de confiança 95%: 1,12-1,22) (Liu et al., 2018b), bem como em coorte chinesa (n=3.871), na qual trabalhadores em turno noturno tinha m risco de sobrepeso e obesidade aumentados, com odds ratios (ORs) de 1,17 (95% CI, 0,97-1,41) e 1,27 (95% CI, 0,74-2,18), respectivamente, quando comparados com trabalhadores do dia (Sum et al., 2018).
A associação entre privação de sono e obesidade é sustentada por estudo conduzido no Brasil, após ajustados os fatores confundidores, uma vez que a prevalência de obesidade foi significativamente maior nos grupos com menor duração de sono diário, classificados como aqueles que dormiam cinco horas ou menos de sono contínuo, com ou sem descanso adicional (Canuto et al., 2014). A qualidade do sono combinada ao impacto da escala de trabalho pode acarretar alterações lipídicas de acordo com Charles et al. (2016) que avaliaram o nível de lipídios em 360 policiais, apesar de não terem encontrado esta associação neste estudo.
Além disso, obesidade diagnosticada por porcentagem de gordura corporal (método DEXA - Dual X-ray absorptiometry) foi maior entre trabalhadores em turnos coreanos (Son et al., 2015). Hulsegge et al. (2018) verificaram que os trabalhadores em turnos apresentaram mais sobrepeso (OR= 1,44, 95% CI ENT#091;1,06-1,95ENT#093;) e maior índice de massa corporal (IMC) ((= 0,56kg/m², 95% CI ENT#091;0,10-1,03ENT#093;) que diurnos, com significativa diferença no IMC entre trabalhadores com cronotipo vespertino ((= 0,97kg/m², 95% CI ENT#091;0,21-1,73ENT#093;), mas não entre os cronotipos matutinos ((: 0,04kg/m², 95% CI: 0,85-0,93). Ainda, o cronotipo juntamente com idade, gênero e tipo da escala de serviço pode facilitar ou dificultar a adaptação dos profissionais ao trabalho em turnos (Smith & Mason, 2001).
Sobre o consumo alimentar dos trabalhadores em turnos, estudos apontaram para pior qualidade nutricional (Yoshizaki et al., 2016), especificamente em relação ao maior consumo de calorias (Ramin et al., 2015; Varli et al., 2016; Hulsegge et al., 2016; Peplonska et al., 2019) e de carboidratos diários (Varli et al., 2016; Rosdoken et al., 2017; Peplonska et al., 2019). O maior consumo de gordura saturada e açúcar nos trabalhadores em turnos (Hemiö et al., 2015; Peplonska et al., 2019) é corroborado por Souza et al. (2019). Associações entre curta duração do sono e maiores consumo energético e lipídico foram observadas, bem como evidência limitada para menor consumo de frutas e dieta de pior qualidade (Dashti et al., 2015). Em contrapartida, não houve diferença significativa na ingestão calórica entre trabalhadores do dia e em turnos, sugerindo que outros fatores como desalinhamento circadiano, horário das refeições, escolhas alimentares podem influenciar nas taxas aumentadas de obesidade observada nos trabalhadores em turnos (Bonham et al., 2016), enfatizando a necessidade de desenvolvimento de estudos com esta temática.
A falta de recomendações específicas para esta classe de trabalhadores referentes ao tamanho das porções e o horário das refeições geram certa confusão acerca de qual comportamento adotar. Neste sentido, estudo inovador foi realizado durante simulação de trabalhos noturnos e concluiu-se que participantes que consumiram refeição durante a noite de trabalho sentiram menos fome, menor desejo para alimentar-se, menos pensamentos relacionados a comer, e maior saciedade, comparados com aqueles que consumiram um lanche ou que não se alimentaram (Gupta et al., 2019).
Referente ao ritmo circadiano, pesquisas têm apontado menor duração (Ramin et al., 2015; Varli et al., 2016; Lim et al., 2018), piora da qualidade (Sathyanarayana et al., 2018; Lim et al., 2018) e aumento de distúrbios do sono (Lim et al., 2018). Lajoie et al. (2015) observaram pior qualidade do sono (>5) no escore global de Pittsburgh Sleep Quality Index (OR=2,10, 95% CI: 1,20 - 3,65) e baixa eficiência de sono (≥2) (OR=2,11, 95% CI: 1,16 - 3,84) em trabalhadores em turnos, sendo reforçados pelos 65,5% de trabalhadores em turnos (n=885) classificados como tendo sono de qualidade ruim ou distúrbios de sono, avaliado pelo mesmo instrumento validado (Andrade et al., 2017), sugerindo que o trabalho em turnos é um desencadeante destes distúrbios.
Além disso, alterações no ritmo biológico sono/vigília podem reduzir produção de leptina e aumentar níveis de grelina (Lopez et al., 2016), hormônios que atuam como sinais periféricos e reguladores da ingestão alimentar (Farooqi & O´Rahilly, 2014), aumentando consumo alimentar e fome, especialmente relacionada a alimentos com alta densidade energética (Pereira et al., 2018). Aumento de 10% na ingestão calórica durante a noite implica aumento de 3% de biomarcador inflamatório proteína C reativa (PCR) (Marinac et al., 2015), podendo configurar-se como fator de risco para síndrome metabólica (Molzof et al., 2017; Lim et al., 2018). Em outro estudo, mais de metade da amostra (53,6%) teve sua ingestão alimentar aumentada e seu estado nutricional prejudicado (94,6%) devido a mudanças no padrão de sono durante os turnos (Varli et al., 2016), que induz mudança na sinalização endócrina reguladora do apetite, a qual pode levar ao ganho de peso (Farooqi & O´Rahilly, 2014), sendo esta uma das várias consequências do trabalho em turnos.
Neste sentido, a privação de sono e o desalinhamento circadiano impactam negativamente no desempenho ocupacional com repercussões na produtividade e segurança do trabalho (Graw et al., 2004). Estudos futuros com o objetivo de minimizar os efeitos desta jornada em horários atípicos na qualidade de vida do trabalhador devem focar no conhecimento sobre o cronotipo do trabalhador, pois pode predizer sobre a sua adaptação aos possíveis turnos de trabalho (Cheng & Drake, 2019), uma vez que a desincronização e resincronização inerente ao trabalho em turnos pode alterar a ritmicidade circadiana, causando ou acelerando o surgimento de patologias (Brum et al., 2015). Para esta categoria de trabalhadores, a constante alternância entre o ritmo convencional sono/vigília, e o fato de estar acordado durante a noite e dormir durante o dia, altera o ciclo claro/escuro afetando não somente o relógio circadiano endógeno, mas também o padrão alimentar (Reid & Abbott, 2015). Com relação a alimentação durante o turno de trabalho, o jejum durante a noite parece reduzir o risco de distúrbios metabólicos nesses indivíduos (Bonham et al., 2016; Grant et al., 2017), o que não parece ser rotineiro entre estes indivíduos.
Em relação às limitações metodológicas observadas, 63,6% (n=7) dos estudos são transversais (nível de evidência IV), o que impossibilita estabelecer relação de causalidade entre efeito e exposição (Kecklund & Axelsson, 2016; Lima et al., 2018; Gonçalves et al., 2018), não podendo inferir se as mudanças no comportamento alimentar e no ritmo circadiano são de antes ou após o início do trabalho em turnos. Resultado similar aos 90,1% artigos de delineamento transversal encontrados em revisão sistemática (n=33) realizada por Souza et al. (2019), que apesar das limitações inerentes ao delineamento, os fatores de associação identificados são relevantes para a produção de conhecimento acerca desta temática.
O crescimento relevante do número de trabalhadores noturnos e em turnos em função das demandas da sociedade moderna remetem à necessidade de pesquisas com intuito de esclarecer as implicações desta modalidade de trabalho na saúde do trabalhador (Brum et al., 2015), prioritariamente aquelas com delineamento mais robusto, que analisem os efeitos de intervenções na elaboração de recomendações que apoiem cada vez mais a atuação clínica (Jorge, 2011).
A presente revisão integrativa apontou para a associação entre trabalho em turnos, comportamento alimentar inadequado e desalinhamento no ritmo circadiano, o que afeta negativamente a qualidade de vida do trabalhador, configurando-se como possível mediador entre trabalho em turnos e doenças crônicas.
A compreensão dos mecanismos responsáveis por tal associação apontam para a necessidade de desenvolvimento de estratégias e programas voltados para melhorar hábitos alimentares, estado de saúde, incentivo a prática de atividade física e padrão de sono adequado, tanto durante as folgas quanto nos dias de serviço, em abordagem individualizada.
Diante dos impactos anteriormente expostos, sugere-se que o trabalho em turnos seja considerado como um problema de saúde pública, com implementação de ações tanto em organizações públicas quanto privadas.
Contribuição dos autores
Paula Corrêa: Conceituação, Metodologia, Análise Formal, Investigação, Redação - Versão original, Aprovação da versão final
Roselma Lucchese: Redação, Revisão e Aprovação da versão final
Moisés Lemos: Redação, Revisão e Aprovação da versão final
Ivânia Vera: Redação, Revisão e Aprovação da versão final
Graciele Silva: Conceituação, Supervisão, Escrita, Revisão e Aprovação da versão final