Envelhecer mostra-se ser um desafio mundial, intrínseco ao ser humano (Cavalcanti et al., 2016). Os idosos encontram-se cada vez a viver mais tempo, com mais condições e qualidade de vida (von Humboldt & Leal, 2014; von Humboldt et al., 2013, 2014a, 2014b; World Health Organization, 2018). Portugal tem uma população envelhecida, com mais população idosa, do que com população jovem a residir no país. Segundo o Ministério da Saíde (2018), cerca de 21% dos portugueses têm 65 anos ou mais, e 14% têm menos de 15. São, assim, um milhão de pessoas com idade igual ou superior a 75 anos.
As crenças são estabelecidas ao longo dos tempos orientando os comportamentos dos indivíduos (Badaró et al., 2014) e como tal, o Modelo das crenças da saúde (Feio & Oliveira, 2010) foi um dos primeiros modelos a ser criados para verificar os comportamentos dos mesmos. Com este modelo percebeu-se que as crenças relativas à saúde, influenciam o comportamento de cada individuo (Badaró et al., 2014), e especificamente a crença de que a prevenção de doenças pode estar interligada com a alimentação, persiste até aos dias de hoje (Silva et al., 2007). A alimentação da população tem um grande impacto no estado nutricional e na saúde da população em geral. A Organização Mundial de Saúde (OMS) mostra-nos que entre dez fatores de riscos para o desenvolvimento de doenças crônicas, cinco encontram-se relacionados com a alimentação e dieta, e com a falta de exercício físico (Pereira et al., 2018). Relativamente à terceira idade, a maioria dos idosos detém uma dieta pobre em nutrientes, o que consequentemente vai prejudicar a sua saúde, expondo-os a diversas doenças (Maciel et al., 2015; Oliveira et al., 2021; Pacheco et al., 2020).
Por doenças crónicas entende-se todas as condições de saúde adversas, de longa duração e progressão lenta (Aguilera et al., 2016), e segundo a International Agency for Research on Cancer (2018) surgem, mundialmente, cerca de 18 milhões de novos casos de cancro por ano e ocorrem cerca de 10 milhões de mortes relacionadas com o cancro. Em Portugal, surgem cerca de 58 000 novos casos a cada ano e 29 000 mortes encontram-se associadas a esta doença.
Os idosos representam a população com crescente risco de cancro. A prevenção do cancro visa retardar ou prevenir o aparecimento de novos casos de cancro e aumentar a expectativa de saúde, bem como a expectativa de vida. O Ministério da Saúde (2018) mostra-nos que as doenças crónicas concluem cerca de 80% da mortalidade em países europeus. São fatores de risco para as doenças crónicas excesso de peso, sedentarismo, hábitos alimentares não saudáveis, tabagismo e alcoolismo. Os hábitos alimentares pouco saudáveis da população portuguesa constituem o primeiro fator de risco de perda de anos de vida. Segundo a Direção Geral da Saúde (2020), os hábitos alimentares são o quinto fator de risco que mais contribui para a perda de anos de vida saudáveis para a população.
O envelhecimento da população, implica um número crescente de diagnósticos de cancro nos idosos (White et. al., 2014), sendo que o cancro se encontra frequentemente associado à perda de peso e por sua vez uma intervenção dietética pode ser recomendada nesses casos. Um estudo europeu mostrou que mais de 70% dos idosos com cancro apresentavam desnutrição, definida como perda de peso de cerca de 10% ou mais (Paillaud et al., 2006).
A promoção de hábitos alimentares mais saudáveis visa prevenir o aparecimento de doenças. Em Portugal um em cada dois portugueses não ingere a quantidade recomendada pela OMS de fruta e hortícolas. 17% da população portuguesa, refere ingerir pelo menos um refrigerante ou néctar por dia e a ingestão de açucares simples traduz ainda outra das problemáticas, existindo uma ingestão de 30,7% de açucares simples por parte dos portugueses (Ministério da Saúde, 2018). Neste sentido, o presente estudo tem como objetivo avaliar se as crenças sobre a alimentação influenciam a prevenção do cancro dos idosos.
Método
Participantes
A amostra constitui-se por 25 participantes idosos, 80% mulheres e 20% homens, com idades compreendidas entre os 65 e os 89 anos (M=71,72; DP=6,073), com cancros da mama, garganta, pulmão, estômago, cólon, intestino, próstata e linfomas, ativos e em remissão.
Material
O presente estudo de natureza quantitativa exploratória, foi realizado através da passagem de um questionário sociodemográfico e a escala das Crenças de Doença e Alimentação, validada com boas qualidades psicométricas (Costa et al., 2017), onde se analisaram as crenças referentes ao estilo de vida, à ideologia alimentar e à alimentação e doenças crónicas (Costa et al., 2017).
Procedimento
A divulgação do protocolo de investigação, através de questionários, realizou-se por via online e presencialmente. Foi entregue a cada participante o consentimento informado seguido do protocolo de investigação que inclui um Questionário sociodemográfico, que permite recolher informação acerca do género, da idade, das habilitações literárias e do rendimento social. Foi pedido aos participantes que enunciem se são portadores de uma doença e se a mesma é crónica. De seguida, foi entregue a Escala das Crenças de Doença e Alimentação, que visa avaliar as crenças sobre a alimentação prevenir o cancro, na população oncológica, sendo constituída por sete itens categorizados numa escala de Likert em 5 pontos - Discordo Bastante a Concordo Bastante e é constituída por 3 dimensões, “Estilo de vida”, “Ideologia Alimentar” e “Alimentação e Doenças Crónicas”.
A recolha de dados concretizou-se com a ida da entrevistadora a locais públicos, e instituições como a Liga Portuguesa contra o Cancro (LPCC), à Universidade da Terceira Idade no concelho de Azambuja (UTICA) e na Instituição Movimento Vencer e Viver.
Foi realizada uma análise de diferenças, através do teste t-student entre o género masculino e feminino e entre as idades (65-72; 73-89). A análise dos dados foi realizada através da utilização da aplicação informática de tratamento e análise estatística SPSS (Statistical Package for the Social Siences), versão 28.0.1.
A realização do presente estudo foi autorizada pelo ISPA - Instituto Universitário.
Resultados
Procedeu-se à recodificação dos itens invertidos da Escala das Crenças de doença e alimentação (Costa et al., 2017). Para testar a normalidade, recorreu-se ao teste de Kolmogorov- Smirnov, e para avaliar a homogeneidade das variâncias utilizou-se o teste de Levene (Mâroco, 2014).
Para avaliar o objetivo do presente estudo, realizou-se um realizou-se um teste T- Student, para amostras independentes. De acordo com o teste t-Student, 80% dos participantes acreditam que as crenças alimentares podem influenciar a prevenção do cancro. Relativamente à variável Género, (t(23) = ,680; p = ,503 (Quadro 1) e à variável Idade, (t(23) = -,275; p =,785 (Quadro 2). Como tal, é possível concluir que não existem diferenças significativas tanto para o género quanto para a idade.
Discussão
As crenças alimentares têm um papel de peso na adoção de uma alimentação saudável (Coelho et al., 2017) e especificamente a crença de que os alimentos podem prevenir doenças crónicas, como o cancro, encontra-se cada vez mais presente, e segundo o Ministério da Saúde (2018), a promoção de hábitos alimentares saudáveis na população em geral, proporciona uma prevenção do aparecimento de doenças. Sendo assim, o presente estudo teve como objetivo avaliar se as crenças sobre a alimentação influenciam a prevenção do cancro dos idosos, quanto ao género e à idade, e foi possível verificar que, em relação às crenças por parte dos idosos, 80% acredita que as crenças alimentares podem influenciar a prevenção do cancro, contudo, relativamente às variáveis género e idade, não se verificaram diferenças significativas.
No estudo de Rodrigues et al., (2020), verifica-se que a maioria dos participantes de ambos os sexos acreditam que alimentarem-se de forma correta pode prevenir e diminuir o avanço da doença oncológica. No estudo de Ngune et al. (2007), verificam-se dois resultados. Aqui, a maioria dos participantes acredita que a dieta desempenha um papel importante na prevenção do cancro. E especificamente os participantes dos grupos de foco revelaram entender os benefícios de uma boa alimentação, após os 60 anos para a prevenção do cancro.
Já no estudo de Harnack et al. (1998), verificam-se resultados significativos em relação ao género. Aqui, os homens apresentaram níveis de crenças sobre a alimentação e o cancro mais baixos do que as mulheres. No estudo de Palmquist et al. (2012), verificam-se diferenças significativas entre o género, onde as mulheres garantem que existe uma relação entre a alimentação saudável prevenir o cancro com mais frequência que os homens. Estes dois resultados vêm contrariar os resultados do presente estudo. Com o presente estudo exploratório, podemos verificar que por parte da população idosa existe uma relação entre as crenças alimentares prevenirem o cancro, contudo não existem diferenças significativas a entre o género e a idade.
Este estudo apresenta algumas limitações tais como, uma reduzida dimensão da amostra, sendo que se tornou desafiante chegar à população idosa, com cancro. A recolha de dados incluiu participantes com diversos tipos de cancro em diferentes estádios da doença, e o facto de não se ter diferenciado os diversos tipos de cancro, foi também uma limitação. Para além da amostra, temos como limitação a existência de um único instrumento. Apesar das limitações, este estudo contribui para o aumento do conhecimento da temática das crenças, alimentação e doença crónica para os profissionais de saúde de diversas áreas. Adicionalmente, este estudo sublinha a importância de uma alimentação equilibrada e saudável e a exploração desta crença associada a prevenção e tratamento do cancro. Em conclusão, as crenças sobre a alimentação e a relação com prevenção de doenças estão presentes, indicando que as pessoas estabelecem uma relação entre estas e a prevenção do cancro.
Contribuição dos autores
Andrea Costa: Concetualização; Curadoria dos dados; Análise formal; Investigação; Metodologia; Visualização; Redação do rascunho original; Redação - revisão e edição.
Sofia von Humboldt: Supervisão; Validação; Visualização; Redação do rascunho original; Redação - revisão e edição.
Isabel Leal: Supervisão; Redação - revisão e edição.