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Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 1645-4464

Rev. Portuguesa e Brasileira de Gestão vol.12 no.3 Lisboa set. 2013

 

O papel do capital psicológico na criação de valor para as organizações

The role of psychological capital in value creation for organizations

El papel del capital psicológico en la creación de valor para las organizaciones

por Ana Cristina Antunes*, António Caetano** e Miguel Pina e Cunha***

*Mestre em Políticas de Desenvolvimento de Recursos Humanos (ISCTE-IUL). Prof.ª Adjunta no Instituto Politécnico de Lisboa, Escola Superior de Comunicação Social, Secção de Ciências Humanas, Campus de Benfica do IPL, 1549-014 Lisboa, Portugal. E-mail: aantunes@escs.ipl.pt

**Doutorado em Psicologia Social e Organizacional (ISCTE-IUL). Vice-Reitor do ISCTE-IUL. Professor Catedrático no ISCTE-IUL, ISCTE Business School, Departamento de Recursos Humanos e Comportamento Organizacional, 1649-026 Lisboa, Portugal. E-mail: antonio.caetano@iscte.pt

***Doutorado em Marketing (Universidade de Tilburg). Prof. Catedrático da Faculdade de Economia da Univ. Nova de Lisboa (UNL), Presidente do Conselho Científico da Nova SBE-UNL. Diretor Académico do The Lisbon MBA, UNL, Campus de Campolide da Nova School of Business and Economics,  1099-032 Lisboa, Portugal. E-mail: miguel.cunha@novasbe.pt

 

RESUMO

A aplicação da positividade aos contextos organizacionais tem conhecido uma divulgação crescente, mas vê ainda questionada a sua pertinência para as ciências organizacionais. O objetivo deste artigo é analisar criticamente o papel do capital psicológico, constructo central do comportamento organizacional positivo, na criação de valor para as organizações. A partir da atual concetualização de capital psicológico, são examinadas as relações entre este constructo, o capital humano e o capital social, estes últimos reconhecidos pelo seu valor acrescentado para as organizações. É sugerida uma releitura das relações entre estas três formas de capital, assente na sua demarcação, mas também na sua eventual articulação e integração. Esta reflexão crítica é complementada com uma análise da evidência empírica disponível e dos seus contributos e limitações para a assunção do valor acrescentado do capital psicológico para as organizações.

Palavras-chave: Comportamento Organizacional Positivo, Capital Psicológico, Capital Humano, Capital Social

 

ABSTRACT

Positivity applied to organizational contexts still has its importance questioned for organizational sciences. The aim of this paper is to critically examine the role of psychological capital, a core construct for positive organizational behavior, in value creation for organizations. Based on the current conceptualization of psychological capital, the relationships between this construct and other two forms of capital, human and social capital, are examined. A reinterpretation of the relationship between these three forms of capital, based on its demarcation, but also on their possible coordination and integration, is suggested. This critical analysis is complemented with an examination of the available empirical evidence and their contribution and limitations to the assumption of the added value of psychological capital to organizations.

Key words: Positive Organizational Behavior, Psychological Capital, Human Capital, Social Capital

 

RESUMEN

La aplicación del positivismo en los contextos organizacionales ha tenido una divulgación en crecimiento, pero aún ve cuestionado su importancia para las ciencias de la organización. El propósito de este artículo es examinar críticamente el papel del capital psicológico, constructo central del comportamiento organizacional positivo, en la creación de valor para las organizaciones. Desde la conceptualización actual del capital psicológico, se examina la relación entre este constructo, el capital humano y el capital social, estés últimos reconocidos por su valor añadido para las organizaciones. Se sugiere una reinterpretación de la relación entre estas tres formas de capital, a partir de su demarcación, sino también de su posible articulación e integración. Esta reflexión crítica se complementa con un análisis de la evidencia empírica disponible y sus contribuciones y limitaciones en la asunción del valor añadido del capital psicológico para las organizaciones.

Palabras-clave: Comportamiento Organizacional Positivo, Capital Psicológico, Capital Humano, Capital Social

 

A adoção de uma perspetiva positiva nas ciências organizacionais tem sido saudada por muitos investigadores em virtude de introduzir uma abordagem alternativa salutogénica (Neveu, 2004), face ao modelo baseado nos défices organizacionais, a abordagem dos 4D (dano, doença, desordem e disfunção). Esta perspetiva rompe com a investigação tradicionalmente subordinada ao ponto de vista das partes interessadas (Wright, 2003), ao focalizar-se nos líderes e colaboradores organizacionais e nos processos individuais, grupais e organizacionais positivos. Não obstante estas e outras mais-valias que advêm da aplicação da positividade aos contextos organizacionais, os investigadores têm questionado a pertinência e os contributos decorrentes desta visão positiva.

Situado nesta nova tendência nas ciências organizacionais, o comportamento organizacional positivo, que se refere ao «estudo e a aplicação das capacidades e forças psicológicas positivamente orientadas, que podem ser medidas, desenvolvidas e eficazmente geridas para incrementar o desempenho no trabalho» (Luthans, 2002, p. 59), não escapa a estas invetivas. Esta abordagem foi instada a provar «o valor acrescentado do positivo sobre e para além do negativo» (Bakker e Schaufeli, 2008, p.  147), para poder contribuir substantivamente para as ciências organizacionais.

No entanto, as questões relativas ao valor acrescentado desta abordagem não são apenas relativas à dicotomia positivo-negativo. Atendendo ao seu constructo central, o capital psicológico, essa criação de valor deve ser manifesta face a outras formas de capital, como o capital humano e o capital social, que estão na origem de resultados positivos e de vantagens competitivas para as organizações (e.g., Adler e Kwon, 2002; Nahapiet e Ghoshal, 1998). Esta questão é reconhecida pelos investigadores associados à abordagem do comportamento organizacional positivo, que reivindicam, através do capital psicológico, uma diferenciação face a estas outras formas de capital e contributos específicos deste constructo para as organizações.

Este artigo científico visa proceder a uma reflexão crítica em torno do potencial valor acrescentado que o capital psicológico pode comportar para as organizações. Partindo da atual conceptualização relativa ao capital psicológico, são examinadas as relações entre capital psicológico, capital social e capital humano e as implicações destas relações. Adicionalmente, procede-se à análise da evidência empírica disponível, com o fito de identificar os contributos e as lacunas na pesquisa e examinar em que medida esta potencia ou coarta o eventual valor acrescentado introduzido pelo capital psicológico em contextos organizacionais.

O capital psicológico

O capital psicológico, apresentado como a epítome, o objeto central de estudo do comportamento organizacional positivo (Luthans et al., 2007), é definido como um fator psicológico de positividade, sendo composto pela integração de diversas capacidades psicológicas positivas. Para que uma capacidade psicológica possa ser englobada no capital psicológico tem de cumprir diversos critérios, entre os quais se contam ser uma capacidade positiva, única, mensurável, passível de desenvolvimento e com impacto no desempenho individual (Luthans, 2002).

Atualmente, as capacidades psicológicas que melhor cumprem estes critérios de inclusão são a autoeficácia, o otimismo, a esperança e a resiliência. Estas capacidades psicológicas estão patentes na definição de Luthans et al. (2007), que consideram o capital psicológico como um estado de desenvolvimento psicológico positivo caracterizado por o indivíduo ter um conjunto de atributos: ser confiante e autoeficaz, de modo a manter o esforço necessário para ter sucesso em tarefas desafiantes; efetuar atribuições positivas sobre os acontecimentos presentes e futuros; perseverar em relação aos objetivos e, se necessário, redirecionar as formas de alcançar os objetivos para ter sucesso; ser resiliente perante problemas e adversidades.

A autoeficácia exprime a convicção que cada indivíduo tem sobre a sua capacidade para mobilizar a energia motivacional, os recursos cognitivos e os cursos de ação que necessita seguir para executar com sucesso uma tarefa específica num dado contexto (Bandura, 1977). Ter esperança envolve, segundo Snyder (2000), ser capaz de definir objetivos, encontrar os meios para os realizar e manter-se motivado ao longo desse processo. O otimismo pode ser descrito recorrendo aos estilos explicativos dos indivíduos.

De acordo com Seligman e Schulman (1986), os pessimistas tendem a interpretar os acontecimentos negativos como sendo devidos a causas internas, globais e estáveis, enquanto os otimistas os atribuem a causas situacionais, temporárias ou externas ao indivíduo. Um indivíduo otimista assume o crédito pelo que de positivo ocorre na sua vida e, quando confrontado com situações negativas, continua a encarar o futuro de modo positivo.

A noção de resiliência refere-se a uma classe de fenómenos caracterizada por padrões de adaptação positivos num contexto em que pontificam adversidades e riscos significativos (Masten et al., 2009). Coutu (2002) descreve um indivíduo resiliente como alguém que aceita a realidade, que acredita que a vida pode ser vivida com significado e possui mecanismos adaptativos que lhe permitem improvisar de forma flexível face a situações inesperadas.

Um mecanismo partilhado entre estes quatro recursos é a capacidade cognitiva, agêntica e desenvolvimentista que orienta o indivíduo para uma avaliação positiva das circunstâncias em que este se encontra e aumenta a sua probabilidade de sucesso numa atividade, como resultado do esforço motivado e da perseverança (Youssef e Luthans, 2011). Estas capacidades psicológicas funcionam conjuntamente, coalescendo sinergicamente para dar origem a um constructo de segunda ordem – capital psicológico – que molda o funcionamento cognitivo, afetivo e comportamental do indivíduo.

Para destacar o seu valor acrescentado, os proponentes deste constructo sustentam que o capital psicológico se demarca teoricamente de outras formas de capital, estratégia a ser analisada na próxima secção.

O capital psicológico e a criação de valor

Os investigadores ligados ao comportamento organizacional positivo têm pugnado por uma diferenciação entre o capital psicológico e outras formas de capital, entre as quais avultam o capital humano e o capital social, mas destacando que, tal como estes, o capital psicológico cria valor para as organizações (e.g., Luthans et al., 2004).

Contudo, atualmente, quando se pensa no fator humano e no seu valor acrescentado para as organizações, é a noção de capital humano que surge em destaque. Numa formulação inicial, o capital humano estava enquadrado numa perspetiva economicista, que o associava aos benefícios económicos que podem advir da formação e educação (e.g., Becker, 1962, 1964). Posteriormente, esta noção é alargada, pressupondo-se que os indivíduos possuem um conjunto de capacidades, competências, conhecimentos tácitos e explícitos, atributos diversos e experiências, que constituem o capital humano (Huselid et al., 1997; OCDE, 2001) e contêm valor para as organizações. Além do seu valor económico, o capital humano é considerado uma fonte de inovação e de renovação estratégica (Bontis, 1998) e o mais crítico recurso competitivo de uma organização (Edvinsson e Malone, 1997).

Ao capital social é igualmente reconhecido o seu valor para o coletivo organizacional (Ponthieux, 2004), dado que as redes sociais constituem um ativo valioso para a ação social e organizacional (Nahapiet e Ghoshal, 1998). Embora a sua definição não seja pacífica, dada a plêiade e amplitude de conceitos existentes, podemos afirmar que o capital social se refere às estruturas, às redes sociais em que os indivíduos se movimentam e aos laços sociais que estabelecem, aos recursos que estas redes sociais proporcionam e às normas e regras sociais que lhes estão subjacentes, que definem as expectativas mútuas que regulam as interações sociais (Adler e Kwon, 2002).

Para marcar a distinção concetual do capital psicológico face a outras formas de capital e sustentar que este é um ativo que permite criar valor nas organizações, Luthans e Youssef (2004) e Luthans et al., (2007) recorreram à teoria da empresa baseada nos recursos e aos fatores VRIN (acrónimo para valiosos, raros, inimitáveis e não facilmente substituíveis). Na ótica da teoria da empresa baseada nos recursos, cada organização detém um conjunto de recursos e capacidades único e específico (e.g., Barney, 1991; Peteraf, 1993), que está no âmago das diferenças de desempenho organizacional.

Estes recursos são frequentemente alvo de dicotomização, que distingue os recursos tangíveis dos recursos intangíveis. O capital humano e o capital social são considerados como duas formas de ativos intangíveis (Barney, 1991) que, se forem controlados pela organização, contribuem, direta ou indiretamente, para o processo de criação de valor (Bontis et al., 1999).

Mas os recursos (tangíveis e intangíveis) somente são fontes de vantagem competitiva e criam valor quando preenchem determinados critérios. A proposta de Barney (1991), segundo a qual estes recursos organizacionais têm de ser valiosos, raros, inimitáveis e não facilmente substituíveis – as chamadas características VRIN – tem sido amplamente aceite (e.g., Kristandl e Bontis, 2007; Wiklund e Shepherd, 2003). Contudo, Luthans e Youssef (2004) e Luthans et al., (2007) propõem uma reformulação desta proposta, especificando antes como critérios o ser único, ser cumulativo, estar interligado e ser renovável para identificar se as diversas formas de capital criam valor e constituem vantagens competitivas para as organizações.

Segundo a sua proposta, os colaboradores organizacionais, quanto entram numa organização, dispõem de capital psicológico acumulado ao longo da sua trajetória de vida. Durante a sua permanência na organização, ocorre o desenvolvimento deste capital, sendo esta evolução moldada pelo ambiente social e organizacional que envolve cada colaborador organizacional, o que torna o capital psicológico cumulativo e interconectado.

A unicidade decorre de cada organização adotar formas singulares da gestão e desenvolvimento deste capital, específicas e adaptadas à sua própria realidade (Luthans e Youssef, 2004; Luthans et al., 2007). Com esta análise Luthans e os seus colaboradores pretendem fornecer suporte teórico à noção de que o capital psicológico preenche os critérios suprarreferidos, vetores fundamentais, na sua ótica, para criar valor e adquirir vantagens competitivas.

Esta estratégia constitui um ponto importante para ilustrar e consolidar teoricamente o valor acrescentado introduzido pelo capital psicológico. Contudo, por considerarmos que esta formulação de Luthans e seus colaboradores é interessante, mas não lança luz sobre um conjunto de questões ainda em aberto, iremos, numa perspetiva crítica, explorar os pontos de diferenciação mas também as possíveis relações entre estas três formas de capital.

Na Tabela encontram-se a definição, o enfoque, os componentes e as formas de gestão e operacionalização do capital humano, do capital social e do capital psicológico.

 

 

A noção de capital psicológico representa quem os indivíduos são e em quem se podem tornar. Focaliza-se no potencial presente e futuro de desenvolvimento individual. Em contraponto, o capital social está associado a uma dimensão social enquanto o capital humano surge como uma noção de maior amplitude, relativa ao conhecimento, às capacidades e às competências derivadas da educação e da experiência.

O capital humano e o capital social mantêm um enfoque distinto e uma maior latitude no leque de componentes que abarcam, por comparação com as quatro capacidades psicológicas que compõem o capital psicológico e são usadas para a operacionalização do mesmo. Por contraste, o debate e a controvérsia marcam a operacionalização e as formas de mensuração do capital social e humano (Adam e Roncevic, 2003; Le et al., 2006). Como ambas são de difícil, senão impossível, mensuração direta (OCDE, 2001), são vulgarmente usados proxies.

A gestão e desenvolvimento do capital psicológico são conseguidos através de estratégias diversas, mas específicas a cada uma das capacidades psicológicas que o compõem. Estas propostas diferem claramente dos mecanismos de gestão preconizados para o capital humano e para o capital social.

A análise empreendida, com base na definição, no enfoque, nos componentes e nas formas de gestão e operacionalização sugere que o capital humano, o capital social e o capital psicológico se tratam de constructos distintos.

Contudo, uma reflexão crítica sobre o papel e a criação de valor do capital psicológico para as organizações implica não só distinguir, mas também explorar as possíveis relações entre esta e outras formas de capital. Uma análise circunscrita aos fatores diferenciadores, como se verifica na formulação de Luthans e Youssef (2004) e Luthans et al., (2007), introduz enviesamentos, por não favorecer uma visão global que articule estas formas de capital e por não clarificar devidamente o papel do capital psicológico e o seu valor acrescentado para as organizações.

E se a tentativa de distinguir o capital psicológico de outras formas de capital visa criar um espaço de pesquisa e de intervenção próprios, esta não pode ser desligada de uma reflexão acerca das potenciais relações entre os termos, sob pena de permanecer como uma perspetiva incompleta e fragmentada e, por isso, de menor utilidade para as ciências organizacionais.

No plano teórico, podem ser inventariados argumentos a favor de uma possível inclusão do capital psicológico no capital humano. A noção de capital humano é abrangente, podendo conter as capacidades psicológicas presentes na conceptualização do capital psicológico. O capital humano tem como características distintivas o seu valor e unicidade, dois dos fatores que pontificam como critérios para a inclusão de uma variável no capital psicológico. O capital psicológico pode contribuir para a partilha de conhecimento (Abella e Zapata, 2011), influenciando o capital humano.

Se tomarmos como referência o modelo proposto por Gratton e Ghoshal (2003), segundo o qual o capital humano é composto pelo capital intelectual, pelo capital social e pelo capital emocional, poderemos teoricamente englobar o capital psicológico como uma quarta dimensão, que, a par de outras formas de capital, contribuiria diretamente para o capital humano. Assumindo esta concetualização, o capital psicológico pode contribuir para o desenvolvimento e criação de valor por parte do capital humano.

Capital psicológico e capital social estão também inextricavelmente conectados. O desenvolvimento do capital psicológico decorre dos contextos sociais a que o indivíduo pertence ou se movimenta. Sendo o capital social um facilitador do desenvolvimento do capital humano e intelectual (Coleman, 1988), subjacente à combinação e troca do capital intelectual e à criação de novo capital intelectual (Nahapiet e Ghoshal, 1998), pode estar na origem do desenvolvimento das denominadas competências centrais (core competencies) a nível organizacional (Kogut e Zander, 1996), podendo igualmente contribuir para o desenvolvimento do capital psicológico.

Mas podemos estar na presença de uma relação bilateral. O capital psicológico promove a confiança (e.g., Clapp-Smith et al., 2009) e a qualidade de vida no trabalho (Nguyen e Nguyen, 2012), fatores que podem influenciar os laços sociais mantidos em contextos organizacionais. Este exercício de influência do capital psicológico pode ter um efeito indireto sobre o valor acrescentado que o capital social comporta para as organizações.

A partir desta análise crítica, sugerimos que a articulação entre estas e outras formas de capital (e.g., capital intelectual), seja examinada, para que se possa avançar no conhecimento neste domínio.

O valor acrescentado do capital psicológico: a fundamentação empírica

A revisão de literatura revela que a orientação empírica dominante no comportamento organizacional positivo está centrada nos efeitos do capital psicológico sobre atitudes e comportamentos laborais. Atendendo ao estado de conhecimento atual, parecem subsistir vantagens para as organizações se estas tiverem em atenção o capital psicológico dos líderes e dos seus recursos humanos.

Entre os ganhos que podem advir da aposta no capital psicológico destacam-se os seus reflexos positivos no desempenho individual, na satisfação, no empenhamento e nos comportamentos de cidadania organizacional (e.g., Avey et al., 2011; Norman, et al., 2010). A evidência empírica sugere ainda que o capital psicológico parece exercer um papel benéfico em comportamentos nefastos para a organização, reduzindo o absentismo, os comportamentos desviantes e as intenções de saída da organização (e.g., Avey et al., 2006; Avey et al., 2010).

Os elementos empíricos disponíveis sugerem que o capital psicológico pode trazer dividendos positivos e até valor acrescentado face a outras variáveis que intervêm nos processos e nas dinâmicas organizacionais. Contudo, subsistem ainda lacunas e fragilidades no domínio empírico que podem coartar a relevância destes resultados. Entre estas lacunas conta-se o reduzido número de pesquisas empíricas que examina o papel do capital psicológico sobre resultados organizacionais objetivos.

Não foram ainda traçados com clareza os contornos da relação do capital psicológico com os diversos tipos de resultados constantes da proposta de Dyer e Reeves (1995). Falta realizar estudos multinível e estudos longitudinais que permitam identificar os contextos e processos que potenciam os efeitos benéficos do capital psicológico, assim como analisar o papel dos contextos organizacionais e grupais marcados pela negatividade no desenvolvimento do capital psicológico e no seu impacto sobre atitudes e comportamentos laborais.

Consideramos também como necessário um maior investimento na pesquisa acerca das relações que o capital psicológico mantém com fatores e processos negativos. Até à data é visível uma assimetria que privilegia o estudo de variáveis de pendor positivo associadas ao capital psicológico.

Outras limitações foram já identificadas por Hackman (2009), Lopes e Cunha (2006) e Neveu (2004), as quais devem ser tidas em consideração em desenvolvimentos teóricos e empíricos futuros, para clarificar o papel do capital psicológico para as organizações. Entre estas limitações conta-se a excessiva focalização das pesquisas empíricas na utilização de métodos quantitativos circunscritos ao nível de análise individual, o que não favorece a compreensão dos múltiplos fatores de natureza individual, grupal e contextual que moldam o comportamento nas organizações.

Subsiste a aceitação implícita de falhas e problemas fundamentais no design do trabalho e das organizações. A manutenção de uma visão a-histórica é outra lacuna, pois a credibilidade e os avanços neste campo de estudo são tornados possíveis quando se reconhece e incorpora conhecimentos anteriores. Além disso, trata-se de uma abordagem não balanceada, que se circunscreve aos estados psicológicos para explicar e prever o comportamento organizacional.

Estas limitações devem ser ultrapassadas para que o capital psicológico cumpra a sua promessa de contribuir para uma maior compreensão do comportamento organizacional e possa ser reconhecido como comportando valor acrescentado para as organizações.

Conclusão

Os desafios que se colocam atualmente às organizações obrigam a uma reflexão ampla e aprofundada sobre métodos e estratégias a serem adotados para a sobrevivência e sucesso organizacionais. Nos últimos anos, o fator humano tem sido encarado como fulcral para o sucesso organizacional, tendo a sustentabilidade organizacional sido relacionada com o fator humano (Pfeffer, 2010).

Enquadrado na tendência recente de aplicação da positividade às ciências organizacionais, o capital psicológico perfila-se como um constructo associado a este fator humano. A análise crítica aqui desenvolvida sugere que o capital psicológico tem potencial para criar valor para as organizações. Teoricamente, preenche diversos requisitos associados às características VRIN, sugerindo que tem condições para constituir um valor acrescentado para as organizações.

A revisão de literatura revela que a tentativa de associar o capital psicológico à criação de valor está fundada na sua demarcação de outras formas de capital que são apontadas como fontes de vantagem competitiva e de criação de valor para as organizações. Neste artigo reexaminamos esta demarcação à luz de outros fatores, concluindo que este constructo é teoricamente distinguível do capital humano e do capital social. Contudo, é também empreendida a expedição complementar para examinar as eventuais relações entre estas três formas de capital.

À luz desta análise surgem diversos pontos de conexão entre capital psicológico, capital humano e capital social e a sugestão de englobar o capital psicológico como um dos componentes do capital humano. Esta integração permite ao capital psicológico fornecer um contributo substantivo para o capital humano que tem repercussões sobre a criação de valor. Sugerimos ainda que o capital psicológico pode promover o desenvolvimento do capital social e indiretamente concorrer para o seu valor acrescentado para as organizações.

Concomitantemente, a evidência empírica indicia que o capital psicológico pode trazer dividendos positivos, pelo seu impacto favorável sobre as atitudes e os comportamentos laborais. Contudo, foram também identificadas algumas limitações ao nível empírico. Maiores desenvolvimentos, teóricos e empíricos, são, por isso, necessários para clarificar o papel e o valor acrescentado do capital psicológico para as organizações.

 

Agradecimento

Este trabalho foi financiado pelo Estado português através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia – no âmbito da Bolsa de Doutoramento SFRH/PROTEC/50315/2009.

 

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Recebido em fevereiro de 2012 e aceite em julho de 2013.
Received in February 2012 and accepted in July 2013.

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