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Revista Lusófona de Educação
versão impressa ISSN 1645-7250
Rev. Lusófona de Educação no.20 Lisboa 2012
Editorial
António Teodoro, José V. Brás & Maria Neves Gonçalves
1. Um dos elementos mais preocupantes na grande crise mundial (e, sobretudo, europeia) é o aumento considerável do desemprego, em particular dos jovens. Na Europa, a taxa de desemprego jovem é, em geral, dupla da média global. Em Portugal, para um desemprego estimado em Março de 2012 de 15,3%, o desemprego jovem alcançava um valor superior a 36%. Tal situação conduz a um enorme contrassenso: é a população mais qualificada e na força da sua atividade produtiva que é mais atingida pelo desemprego, incluindo o de longa duração. Mas, associada a esta situação já de si dramática, está também a qualidade do emprego daqueles que o conseguem obter: em Portugal, mais de 60% dos jovens tem um rendimento inferior a 600 euros e cerca de 85% um vínculo de trabalho precário.
Uma tal situação não pode deixar de, a prazo, ter profundas consequências na escolarização e formação das jovens gerações. Enquanto que o discurso político continua a insistir no aumento sucessivo das taxas de escolarização em todos os níveis, nomeadamente na educação secundária e superior (ver os objectivos fixados pela União Europeia no âmbito da chamada Estratégia 2020), o tecido económico não gera os empregos necessários à inserção das jovens gerações no mundo do trabalho.
Alguns autores (e certos responsáveis políticos, nomeadamente do campo conservador) têm remetido a responsabilidade desta situação para o campo das políticas educativas, apelidando-a de "inflação escolar" ou "inflação de diplomas" e responsabilizando o campo da educação de desconhecimento das "necessidades da economia". Outros, preferem sublinhar as consequências para a população jovem, sobretudo da originária das camadas médias e baixas da sociedade, cujas famílias (e os próprios jovens, muitas vezes trabalhadores-estudantes) fazem enormes sacrifícios para que os seus filhos sejam a primeira geração a chegar à universidade e a possuir um diploma universitários. O que se lhes insinua é que o mérito, medido pelo êxito e percursos escolares, gera uma almejada ascensão social. Mas, paradoxalmente, o que estão a constatar é que esse fortíssimo investimento, material e simbólico, tem um retorno escasso, marcado pelas dificuldades em encontrar emprego e, quando encontrado, remunerado com valores iguais ou pouco superiores ao salário mínimo nacional (em geral, inferiores aos de seus pais, com menor formação), associado a vínculos precários e sem direitos laborais. É, no dizer de autores britânicos (P. Brown e A. Green), uma verdadeira opportunity trap ("armadilha das oportunidades"). Nestes tempos de crise, a tensão entre educação e emprego será, seguramente, uma questão-chave que marcará o campo social e das políticas de educação nos anos próximos.
2. Um dos grandes objectivos da investigação está na sua divulgação. Se bem que seja de elevado interesse investigar, não menos interessante é criarmos oportunidade de crítica, de debate acerca do que se vai pesquisando. Também a investigação necessita de ser governada por uma cultura democrática. A ciência não pode ser entendida como um dogma, fazendo silenciar a dúvida da imaginação e da invenção. Como nos diz Karl Popper, a transição que se verificou da sociedade fechada para a sociedade aberta constituiu uma das mais profundas revoluções operadas pela humanidade. Esta passagem deve também registar-se no domínio da ciência. As colisões provocadas pelas controvérsias são necessárias não só para validarmos o conhecimento mas também conseguirmos ver o que não é visível. Ninguém consegue ver sem saber. É nesse espírito de promover e provocar a luz do debate que agora apresentamos aos leitores mais um número da nossa revista. Com os artigos que se seguem convidamos o leitor a uma reflexão sobre uma pluralidade de problemáticas.
Emilio Lucio-Villegas, no artigo A construção da cidadania participativa através da educação, parte do pressuposto de que a participação e a cidadania estão inter-relacionadas na medida em que os indivíduos só são cidadãos de pleno direito se tiverem possibilidades de participar na res publica. Apresenta quatro experiências relacionadas com o Orçamento Participativo adoptado na cidade de Sevilha, priorizando, neste estudo, a Investigação Participativa enquanto metodologia de desenvolvimento do processo de participação,
O segundo artigo, intitulado Formação e supervisão: o que move os professores?, da autoria de Maria de Nazaré Coimbra, Anabela Teixeira Marques e Alcina Oliveira Martins, tem como objectivo identificar e determinar o perfil dos professores que frequentam o Curso de Mestrado em Ciências da Educação, com especialização em Supervisão. Aplicando uma metodologia mista, qualitativa e quantitativa, este estudo tem o mérito de mostrar a importância da formação docente para uma supervisão formativa e democrática, enquanto motor estratégico de mudança da prática lectiva e do clima e cultura da escola.
Oscar Espinoza Díaz, Dante Castillo Guajardo, Luis González Fiegehen, Javier Loyola Campos & Eduardo Santa Cruz Grau, no texto Fatores intraescolares associados ao abandono escolar no Chile: um estudo de caso, pretendem identificar os fatores de caráter intraescolar que têm maior incidência no abandono escolar numa zona da cidade de Santiago do Chile. Os autores evidenciam o tipo de ações que os próprios estabelecimentos de ensino poderiam adotar para obviar a este problema.
O quarto artigo, Docentes e a Biblioteca Escolar: uma relação necessária, é da autoria de Ângela Balça e Maria Adelina Fonseca. O estudo apresentado aborda a temática das relações entre a Biblioteca Escolar e os Docentes de uma Escola Secundária com 3.º Ciclo. Com esta investigação, as autoras constataram a utilização da biblioteca pelos docentes de uma forma mais participada, diversificada e frequente do que habitualmente acontecia.
Ser professor hoje. O que pensam os professores das suas competências foi o título escolhido por Cristina Conceição e Óscar de Sousa para problematizarem os novos papéis atribuídos ao professor na sociedade globalizada do mundo de hoje. Este estudo teve como base uma pesquisa qualitativa e quantitativa, baseada em testemunhos de professores dos ensinos básico e secundário de escolas do concelho de Almada. Foram identificadas não só as competências que o grupo de docentes julga essenciais como também a forma de as assumirem, enquanto profissionais de ensino, nos seus diversos papéis e actuações.
Gianni Montagna, Cristina Carvalho, Hélder Carvalho & André Catarino, no artigo O Designer de Produto como Elemento de Ligação nas Equipas Multidisciplinares, reflectem sobre o trabalho de design que é cada vez mais complexo e exigente. Deve ser potenciado pela cooperação e multidisciplinaridade das equipas requerendo aos estudantes uma dimensão intelectual e também pragmática, que assegure uma correta abordagem e interpretação do dualismo forma/ função. Assim, os autores sustentam, por um lado, que as diferenças entre a universidade e a indústria devem ser reduzidas com o empenho de ambas as partes e, por outro, advogam a relação estreita que deve existir entre o design e as tecnologias para se obterem melhores resultados.
No sétimo artigo, A Construção do Texto na Ciência: as implicações da leitura e da escrita no processo de produção do conhecimento científico na Universidade, Marcos António da Silva aponta alguns preceitos reputados importantes na escrita científica. Partindo do pressuposto de que a comunidade científica deve ter como práxis a crítica e a autocrítica, discute o que se pode entender por texto científico e as relações entre dois processos complementares fundamentais (a leitura e a escrita).
Armando Ferreira Loureiro, no oitavo artigo intitulado "Novos" territórios e agentes educativos em sociologia da educação: o caso da educação de adultos, enfatiza a necessidade de intensificar o olhar sobre a educação não formal, advogando a maior interligação investigativa entre a sociologia da educação e outras modalidades educativas não formais.
Revista "Atlantida": a educação elementar em Portugal e no Brasil nas primeiras décadas do século XX, da autoria de Silvana Fernandes Lopes, constitui o nono artigo. Trata-se de uma revista publicada entre 1915 e 1920 que tinha como principal objetivo contribuir para a integração luso-brasileira. Redigida e divulgada por uma elite intelectual próxima ao poder de ambos os países, o periódico dá destaque à literatura, abordando também as questões sociais, políticas, económicas, culturais e educacionais.
Na secção In Memoriam, André Robert prestou uma homenagem a Jean-Claude Forquin, distinto professor de Ciências da Educação que morreu a 9 de Novembro de 2009. É desta maneira que André Robert nos dá a conhecer a obra de Jean-Claude Forquin, colocando-o no lugar de destaque que merece por direito próprio. A projecção do seu trabalho e o reconhecimento público que angariou coloca-o sem qualquer sombra de dúvida nessa tribuna reservada apenas aos que se destacam por ousarem subir a escada do mérito. Como André Robert refere a respeito de uma publicação especial da revista Revue Francaise de Pédagogie, que saiu precisamente na sequência de um colóquio organizado em honra de Jean-Claude Forquin, aquando da sua aposentação, um dos autores que lhe presta homenagem, Olivier Reboul, que teve a particularidade de ser codirector da sua tese de doutoramento, diz-nos que ele contribuiu com uma das reflexões educativas mais importantes do nosso tempo. Jean-Claude Forquin foi majestoso no diálogo que estabeleceu entre a filosofia e a sociologia, quebrando barreiras que tradicionalmente impediam a inovação e o desenvolvimento do conhecimento. Com André Robert podemos atravessar a obra magnífica de Jean-Claude Forquin.
Na secção Recensão, Carlos Nogueira recenseia três obras dirigidas a um público infantil e juvenil, A Maior Flor do Mundo, de José Saramago, publicada em 2001, A Biblioteca do Avô, da autoria de Maria do Rosário Pedreira, editada em 2005 e O Canteiro dos Livros, assinado por José Jorge Letria e dado à estampa em 2007. As narrativas aqui seleccionadas têm como linha isotópica o gosto pelo livro e pela leitura mergulhando o leitor no maravilhoso, no fantástico e no imaginário, propiciando, no dizer de Carlos Nogueira "o jogo dos livros e da Literatura".
Ana Sofia António pela recensão que faz do livro Movimentos Sociais e Educação de Adultos na Ibero-América. Lutas e desafios, de António Teodoro e Edineide Jezine, dá-nos a conhecer o nascimento da Rede Ibero-Americana de Investigação em Políticas Educacionais (RIAIPE). O RIAIPE é constituído pela Argentina, Brasil, Chile, Espanha, México, Portugal e Uruguai e tem a nobre missão de colocar em diálogo os investigadores destes países no domínio das políticas da educação, dando-se especial destaque aos movimentos sociais e à educação de adultos. A referida obra, editada em 2011 pela LiberLivro, foi lançada no XI Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, que decorreu na Universidade Federal da Bahia, no dia 8 de Agosto de 2011.
Em Notícias dá-se conta quer da assinatura do Protocolo entre o Centro de Estudos e Intervenção em Educação e Formação (CeiEF) e a Sphaera Mundi, quer de seminários realizados na Universidade Lusófona no âmbito das actividades do CeiEF (Políticas e Práticas em educação: que desafios actuais no Brasil e em Portugal?, Calvet de Magalhães: Vida e Obra. Contributos para a Educação, Percursos do Associativismo e Sindicalismo Docentes em Portugal (1890-1990) e Pensar os problemas educativos como duração. A Investigação em História da Educação), quer ainda de outros eventos científicos em que participaram investigadores do CeiEF, de que destacamos o Painel "Equidade e Coesão Social no Ensino Superior da América Latina" no 8.º Congresso Internacional "Universidad 2012" que se realizou em Cuba.
No cumprimento de uma das rubricas da política editorial da Revista Lusófona da Educação, divulgam-se alguns dos resumos de Teses de Doutoramento e de Dissertações de Mestrado defendidas no Instituto de Educação da Universidade Lusófona.
Lisboa, abril de 2012