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Revista Lusófona de Educação

versão impressa ISSN 1645-7250

Rev. Lusófona de Educação  no.23 Lisboa  2013

 

Editorial

 

António Teodoro, José Viegas Brás & Maria Neves Gonçalves

 

1. Fazer uma revista científica a partir de um centro de investigação de uma Universidade, nestes tempos de crise, não é tarefa fácil. No plano oficial, a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) cortou, em 2012, o magro apoio financeiro que até então dava para pagar uma parte da impressão. No plano da produção da revista, a pressão sentida pelos professores e investigadores em (praticamente) todos os países aumentou consideravelmente os artigos recebidos e que, nos termos das normas de avaliação fixadas, exige um rigoroso processo de revisão científica e um cuidadoso processo de edição.

No panorama internacional, com o patamar de qualidade atingido pela Revista Lusófona de Educação (RLE), poucas são as revistas que ainda são produzidas deste modo. A maioria foi absorvida por editoras, havendo um processo de concentração editorial que, a prazo, pode colocar sérios problemas de liberdade de publicação.

Uma revista científica não tem (praticamente) receitas. As exigências dos indexadores para colocar os artigos em open acces não permite a venda avulso nem um razoável número de assinaturas institucionais. Esta situação devia merecer por parte das autoridades científicas, em particular da FCT, uma reflexão e um apoio, mediante uma séria avaliação das revistas existentes, que permita a permanência das revistas que atingiram uma dimensão internacional, como é o caso da RLE, possivelmente a mais internacional das revistas publicadas em Português (incluindo as revistas brasileiras) no campo das Ciências da Educação.

Esta não é uma situação única na Europa. Por isso, a RLE esteve na primeira linha de um movimento de revistas europeias, no campo das ciências da educação, que procuram formas de cooperação que valorizem a produção científica neste campo e respondam a processos de “afuninalamento” que estão em curso, sejam de natureza linguística – onde o Inglês tende a assumir-se como a (única) língua de difusão científica, sejam de natureza comercial – onde a publicação só se torna possível mediante o prévio pagamento por parte do(s) autor(es) de um valor, em geral, bastante elevado (cerca de USD 500,00).

A processos que, a todo o custo, elegem a competição como o único meio de superação humana e de progresso social, há que responder com o valor da cooperação e da solidariedade, criando espaços cosmopolitas de partilha de conhecimento e de saberes. A racionalidade neoliberal, infelizmente, penetrou em todos os domínios sociais e, muito particularmente, nas políticas de educação superior e de investigação, pelo que é tarefa de todos os académicos e intelectuais apostados em superar este período negro (e perigoso para a democracia e os direitos sociais) encontrar respostas em todos os planos da ação humana. Esse é, no plano limitado da publicação científica, o propósito deste movimento, que terá na próxima European Conference of Educational Research (ECER), em Istambul, a oportunidade de trocar informações e procedimentos e reforçar a cooperação entre estas revistas europeias.

A RLE espera prosseguir, apesar de todas as dificuldades, o caminho iniciado em 2003 de construção de uma revista que, sendo lusófona, se abrisse a outros espaços linguísticos e culturais. Para isso, contou com a confiança de muitos professores e investigadores que aceitaram integrar o Conselho Editorial e o Conselho de Redação, e/ou ser parecerista, dando uma valiosa contribuição para a afirmação e a qualidade reconhecida da revista. A recente inclusão da plataforma SCIELO (onde a RLE se encontra indexada) na Web of Knowledge (onde esteve com Impact Fator atribuído entre 2009 e 2012) obrigará a uma reorganização (e renovação) destes conselhos, pelo que aqui fica um público agradecimento a todos pelo contributo que deram à RLE.

2. Procurar melhorar a educação não é obra fácil e imediata. Exige de todos nós um grande trabalho de reflexão e persistência. Sabemos que as opções a tomar não são unânimes. Precisamos encontrar os consensos possíveis nos pontos críticos indispensáveis. Para isso é necessário uma cultura de diálogo que nos leve a encontrar o melhor argumento possível. É neste sentido de abertura que editamos mais um número da Revista Lusófona de Educação. Desejamos que ela continue a despertar a curiosidade e o interesse dos investigadores em Educação, animando o debate científico e contribuindo para esclarecer dúvidas e levantar novos problemas.

A revista abre com o artigo de Manuel Barbosa que coloca a educação e o desenvolvimento em discussão sob o imperativo do crescimento, alertando-nos para a necessidade da sua ressignificação através da reafirmação da centralidade das vidas das pessoas nas perspetivas futuras de educação e desenvolvimento. Segundo o autor, o que importa é não sacrificar a educação a uma visão excessivamente reducionista do desenvolvimento.

Rosanna Barros assina o segundo artigo intitulado O Movimento das Histórias de Vida e a Educação de Adultos de Matriz Crítica: ideias e conceitos em contexto, onde vem mostrar o panorama internacional da educação de adultos dando importância ao movimento das histórias de vida. Neste artigo, discute alguns aspetos inerentes à prática das histórias de vida em educação e formação de adultos (EFA), entendidas como ferramenta de investigação, de intervenção e de formação. A autora apresenta-as como um processo dialógico e em mutação, inserindo-as na esfera das relações interpessoais.

O terceiro artigo tem como título Liderança singular na escola plural: as culturas da escola perante o processo de avaliação externa. A autora, Leonor Torres, vem trazer para a nossa reflexão o problema da liderança unipessoal, centrada na figura do Diretor de escola/agrupamento. A partir dos Relatórios de Avaliação Externa das Escolas produzidos durante o I ciclo avaliativo (2006-2011), a autora pretende apreender os modelos implícitos de cultura de escola e de liderança bem como as ligações que se podem estabelecer com o quotidiano escolar.

No artigo O diretor de turma: perfil e competências, Clara Boavida e Óscar de Sousa estudam as conceções que os Alunos e os Diretores de Turma possuem relativamente ao perfil e às funções do Diretor de Turma, bem como analisam as competências que os Diretores de Escola privilegiam num docente para exercer o cargo de Diretor de Turma. Este é assumido como sendo uma figura de gestão intermédia da escola, depositário de responsabilidades particulares no que concerne à coordenação dos professores da turma, à promoção do desenvolvimento social e pessoal dos alunos e à sua integração no ambiente escolar, assim como ao relacionamento estabelecido entre a escola, os encarregados de educação e a comunidade escolar.

A autarquia na expansão e desenvolvimento da rede pública da educação pré-escolar em Portugal é o título do quinto artigo da autoria de José María Fernández Batanero e Adélia Abreu da Silva. A finalidade deste estudo foi perceber como a autarquia foi desenvolvendo a sua intervenção numa correspondência com as competências que lhe têm sido atribuídas no domínio da expansão e desenvolvimento da rede pública da educação pré-escolar. Os autores concluem que a autarquia foi adquirindo neste cenário um aumento gradual dos seus poderes locais.

No sexto artigo, subordinado ao título Um olhar sobre as políticas curricula-res para formação de professores no Brasil e em Portugal na transição do século XX para o XXI, Lucinalva Almeida, Carlinda Leite e Eliete Santiago colocam em evidência que os processos de reformulação curricular não ocorrem numa disposição linear, pois as conceções imprimem diferentes direcionamentos de desenvolvimento. As autoras centram a sua abordagem na formação de professores, em ambos os países, relacionando-as com as questões curriculares emergentes da Educação Básica- Educação Fundamental, no limiar do novo século.

Ana Raquel Simões e Maria Helena Araújo e Sá assinam o artigo A cultura linguística de alunos do 9.º ano: reflexões em torno dos resultados de um inquérito por questionário aplicado no distrito de Aveiro, onde refletem sobre a diversidade linguística e cultural característica da sociedade globalizada de hoje. Com base num questionário aplicado a alunos do 9.º ano do referido distrito, as autoras, através dos resultados que obtiveram, concluem que os alunos, apesar de terem consciência do papel e da importância da aprendizagem de línguas, apresentam nos seus projetos curriculares e nas circunstâncias de contacto com as línguas, uma visão linguística muito limitada e condicionada pelas representações que têm das línguas e dos povos.

O oitavo artigo é da autoria de Carlos Nogueira. O autor revisita Emília de Sousa Costa, uma notável escritora, professora, conferencista e feminista militante que viveu entre 1877-1959. O estudo centra-se na obra literária da escritora -dirigida sobretudo ao público infantil e juvenil -não deixando, contudo, de serem abordadas outras vertentes do seu pensamento e da sua ação.

Por fim, no último artigo intitulado Conceção e implementação de um projeto de educação sexual na turma: legislação vs literatura, Jorge Ribeiro, Angela Pontes e Maria Luísa Santos analisam a legislação relativa à conceção e implementação de um projeto de educação sexual na turma e comparam as suas indicações com as propostas pela literatura. Os autores concluem que, de forma global, a legislação portuguesa corresponde às exigências inerentes à implementação de projetos de educação sexual, se bem que a disponibilidade e o perfil dos docentes para integrarem este tipo de projetos não sejam considerados pela legislação, contrariamente ao que é recomendado pela literatura.

Na secção Recensões, Manuela Marques procede a uma análise detalhada da obra Em busca da boa escola. Instituições eficazes e sucesso educativo, de Jorge Ávila de Lima, obra essa que, segundo o autor, surgiu quer do ensejo de investigar “o que é uma boa escola” quer de saber se as escolas produzem efeitos no desempenho e desenvolvimento dos estudantes. O livro recenseado mostra, por um lado, que o movimento da eficácia estimulou, de forma informada, a reflexão e a autoavaliação dos professores e das instituições educativas e, por outro, que a eficácia depende não só da produtividade escolar, mas também da adaptabilidade e da coesão organizacional.

A secção Sítios Digitais, a cargo de Vasco Graça, disponibiliza informação sobre publicações -em inglês, espanhol e francês -que agregam contributos internacionais diversos para a reflexão educacional e proporcionando artigos interessantes que podem ser consultados e/ou integralmente baixados. Alguns dos sítios indicados possuem um amplo acervo de artigos publicados.

No cumprimento de uma das rubricas da política editorial da Revista Lusófona da Educação, divulgam-se alguns dos resumos de Teses de Doutoramento defendidas no Instituto de Educação da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias.

Lisboa & S. Paulo, maio de 2013