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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.40 Lisboa dez. 2013

 

AS DIMENSÕES EXTERNAS DA SEGURANÇA INTERNA

 

A interface interna-externa da segurança no espaço oceânico o caso da criminalidade marítima

The internal-external security nexus in the maritime security: the case of maritime criminality

 

Gilberto Carvalho de Oliveira*

*Doutorando em Politica Internacional e Resolução de Conflitos na Faculdadede Economia e no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, onde prepara uma tese sobre «“Guerra contra a pirataria”: uma perspetiva crítica sobre a intervenção das Nações Unidas contra a pirataria nas costas da Somália»,apoiada financeiramente pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

 

RESUMO

Com base nos casos da pirataria nas costas da Somália e do roubo armado contra navios no Sudeste Asiático, este artigo traz para o contexto da segurança marítima o debate sobre o nexo interno-externo da segurança. O objetivo é mostrar que o esforço de securitização da criminalidade marítima nessas regiões constitui uma espécie de dispositif de governação que tem interferido nos tradicionais arranjos da espacialidade oceânica e na tradicional divisão de tarefas relativas à segurança marítima, levando a uma interpenetração das suas dimensões interna e externa.

Palavras-chave: Nexo interno-externo da segurança, criminalidade marítima, segurança marítima, securitização

 

ABSTRACT

Based on the cases of piracy off the coast of Somalia and armed robbery against ships in Southeast Asia, this article brings to the maritime context the debate on the internal-external security nexus. The aim is to show that efforts to securitize the maritime crime in these regions constitute a kind of dispositif of governance that interferes with traditional arrangements of the ocean space and the traditional division of tasks in the maritime security domain, leading to an interpenetration of their internal and external dimensions.

Keywords: Internal-external security nexus, maritime criminality, maritime security, securitization

 

Introdução

O oceano tem sido construído, pelos discursos geopolítico e geoestratégico, como um grande espaço «vazio», como um espaço «fora» da territorialidade, reservado ao uso militar, à livre circulação comercial e à exploração de riquezas naturais pelos estados1. Dessa perspetiva, o espaço marítimo é construído como um espaço de recursos e uma superfície de fluxo, livre das relações sociais em microescala e das possibilidades de controlo social por populações indígenas que usam o mar como seu meio de sobrevivência2; por outros termos, o mar é visto como um espaço «fora da sociedade», idealmente perpetuado como um «vácuo» através do qual o poder relativo dos estados pode ser exercido sobre os seus competidores3. Assim construída, essa imagem dominante apaga a «realidade material» e as «contradições sociais» experimentadas por aqueles que vivem o seu dia a dia à margem da construção capitalista da espacialidade oceânica4. Quando muito, as manifestações de tais contradições são vistas como meras «perturbações», como «anomalias» a serem geridas por estratégias coercivas de policiamento pelos estados. Afinal, num mundo liberal globalizado onde 90 por cento do comércio internacional é feito via marítima e os oceanos tornam-se cada vez mais atrativos como fonte de desenvolvimento, a visão idealizada do mar como uma superfície «livre de fricções» tem de ser mantida a todo o preço. É essa construção idealizada do espaço oceânico que a criminalidade marítima, emblematicamente traduzida pela recente onda de pirataria nas costas da Somália, faz estremecer. É tentando reagir a esse estremecimento que os estados e as organizações internacionais se mobilizam, numa escala nunca antes imaginável, para enfrentar o que a comunidade estratégica e as agências de segurança têm chamado uma «nova ameaça global»5.

A história dessa «nova ameaça», porém, não é assim tão nova. O saque ao comércio marítimo é um fenômeno que vem da Antiguidade, atinge o apogeu entre os séculos xvi e xviii ao ser instrumentalizado sob a forma do corso pelo Estado moderno europeu, e declina no século xix perante o Estado nacional consolidado e detentor do monopólio legítimo da força. Daí em diante, o grande ator da história da pilhagem dos mares, o pirata, perde a visibilidade e atravessa o século xx como um aventureiro romantizado que já não mais pertence aos novos tempos. O facto, porém, é que o ataque ao comércio marítimo motivado por fins privados permanece presente em muitas regiões ao longo do século xx. Sua percepção, todavia, acaba circunscrita ao âmbito da indústria marítima6, que «aprende» a lidar com o problema como se fosse uma questão comercial a ser tratada através das relações rotineiras entre as companhias de navegação e as seguradoras marítimas.

O argumento central deste artigo é que essa «nova ameaça» e a publicidade por ela alcançada nos últimos anos não resultam de uma mudança substancial na natureza da criminalidade marítima, mas sim dos discursos e das práticas institucionais securitizadoras que, perante a decadência das grandes esquadras oceânicas da Guerra Fria, tentam construir a criminalidade marítima como um problema de segurança global, a fim de justificar novos papéis para as marinhas de guerra e novas formas de governação do espaço oceânico. Partindo desse argumento, o propósito do artigo é mostrar que o movimento de securitização da criminalidade marítima tem interferido nos tradicionais arranjos da espacialidade oceânica e na tradicional divisão de tarefas relativas à segurança desses arranjos espaciais. Esse processo tem-se refletido de diversas formas: tentando, e às vezes conseguindo, quebrar a soberania de um Estado sobre o seu mar territorial; nacionalizando os eventos ocorridos no alto mar, ou seja, dando uma dimensão interna a incidentes que ocorrem em águas internacionais; atribuindo às marinhas de guerra, tradicionalmente devotadas à defesa externa do Estado, uma função policial típica da dimensão interna; ou dissolvendo a fronteira público-privada no desempenho das tarefas de segurança.

Em geral pouco explorado nos debates sobre segurança que emergem no pós-Guerra Fria7, o espaço oceânico e a sua governação mostram interfaces e tensões entre as dimensões interna e externa que podem contribuir para a nascente agenda de investigação sobre o nexo interno-externo da segurança. Dentro dessa agenda, podem ser observadas, de modo geral, duas grandes linhas de argumentação. Uma delas tem suas raízes no debate sobre novas guerras e olha para o nexo interno-externo da segurança como se ele fosse uma consequência da fusão entre guerra e criminalidade no contexto das guerras assimétricas do pós-Guerra Fria. Essa linha de argumentação tende a focar na ameaça e nas capacidades e meios necessários à sua neutralização, considerando que as agências de segurança e os formuladores de políticas apenas respondem a problemas objetivos do mundo social8. A interface interna e externa, desse ponto de vista, é uma decorrência natural da complexidade e das mudanças na natureza dos desafios colocados à segurança no pós-Guerra Fria9. De outro lado, uma linha de argumentação alternativa tenta questionar essa naturalização das ameaças, argumentando que elas são socialmente construídas e que as dimensões interna e externa da segurança se interpenetram em função dessa construção e não de características essenciais da ameaça ou de mudanças substanciais na natureza da guerra ou da criminalidade. Dessa segunda perspectiva, a bibliografia normalmente adota uma posição crítica, questionando não só a legitimidade dessas construções, mas também as implicações éticas das escolhas políticas que levam à interpenetração das esferas interna e externa da segurança10.

Este artigo procura situar-se nesse segundo polo mais crítico, propondo uma contribuição empírica para o debate sobre o nexo interno-externo no contexto da segurança marítima. Focalizando os casos da pirataria somali e do roubo armado contra navios no Sudeste Asiático, o artigo, nas duas primeiras partes, apoia-se numa combinação das abordagens linguística e sociológica à teoria da securitização para examinar a construção da criminalidade marítima como um problema de segurança internacional, entendendo que esse processo resulta não só do uso de uma linguagem de excepcionalidade e dos efeitos performativos daí decorrentes, mas também das práticas e hábitos próprios das comunidades e burocracias de segurança11. Dadas as limitações impostas pelo formato e pelo propósito deste artigo, não se propõe aqui realizar um estudo pormenorizado desse processo de securitização. O artigo considera que esse nível de aprofundamento analítico já foi realizado pelos autores a serem referidos e pelo próprio autor deste artigo no âmbito de sua tese de doutoramento. Com base nesses casos, o artigo procura destacar, na terceira parte, as principais interpenetrações entre as dimensões internas e externas da segurança observadas no processo de securitização da criminalidade marítima. Considerando que esse processo e a pressão por ele exercida nos tradicionais arranjos interno e externo da segurança marítima fazem parte de um processo maior e mais complexo relacionado à governação do espaço oceânico, o artigo procura finalmente mostrar de que forma esse dispositivo de governação cria um ethos «oportunístico» que mobiliza um amplo leque de atores interessados em explorar a criminalidade marítima para atingir os seus próprios objetivos de segurança.

 

A fusão das dimensões Interna e Externa no conceito de Pirataria do IMB: O poder securitizador de uma definição

Desde o início dos anos 1990, o departamento marítimo da Câmara Internacional de Comércio, denominado International Maritime Bureau (IMB), tem sido cada vez mais reconhecido como uma autoridade e uma voz competente para falar sobre a criminalidade marítima, graças à produção regular de estatísticas e análises especializadas através de seu Centro de Informação sobre Pirataria situado em Kuala Lumpur, Malásia. Em termos de pirataria, portanto, o IMB funciona como uma espécie de porta-voz da indústria marítima e, como tal, vê o problema como uma questão dos estados, a ser gerido através da imposição da lei e da ordem no mar, e não um problema a ser administrado pelo setor marítimo. Uma vez que a pirataria gera custos adicionais com medidas de proteção, seguros e prejuízos provocados pelo roubo da carga ou pagamento de resgates nos casos de sequestros de navios e de suas tripulações, a indústria marítima vê o envolvimento dos estados e de suas forças navais no combate à pirataria como um caminho potencial para reduzir as suas perdas financeiras e obter maior segurança do seu património material e humano. Por essa razão, a principal estratégia do IMB, assumida explicitamente em diversos discursos e relatórios, é pressionar os estados e as organizações governamentais internacionais a perceberem «a necessidade urgente de tratar a pirataria como uma ofensa grave» e tentar mostrar que «os governos podem desempenhar um papel crucial no combate à pirataria»12.

Dentro dessa estratégia de sensibilização para o problema da criminalidade no mar, o IMB decide, em 1994, adotar uma definição abrangente de pirataria para efeitos de produção de estatísticas e relatórios, passando a ignorar a questão jurisdicional que, dentro do direito internacional, é fundamental para definir as dimensões interna e externa da violência privada no mar. De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar, são definidos como pirataria apenas os atos de violência privada contra navios cometidos no alto mar ou em águas não submetidas à jurisdição de algum Estado13. Todas as demais situações de violência privada no mar, como as ações criminosas cometidas contra navios dentro do mar territorial dos estados ou nos portos, são definidos como «roubos armados contra navios» conforme resolução da Organização Marítima Internacional (agência especializada da onu para os assuntos marítimos)14. Esses aspetos legais têm desdobramentos cruciais do ponto de vista da gestão interna-externa da criminalidade no mar: se de um lado o crime de pirataria só pode ser legalmente configurado no alto mar – e, portanto, deve ser policiado por navios de guerra ou navios civis governamentais pertencentes a qualquer Estado transitando em águas internacionais15(dando à pirataria uma dimensão externa) –, por outro, o roubo armado contra navios ocorre dentro das águas territoriais e instalações portuárias de um Estado particular e, como tal, deve ser tratado pelas polícias e guardas costeiras nacionais (o que dá ao roubo armado contra navios uma dimensão interna).

A distinção entre essas duas categorias, portanto, é meramente jurisdicional. Afastando-se dessa caracterização legal, por considerar que a natureza dos dois tipos de ocorrência e dos danos substantivos causados à comunidade marítima é a mesma, o IMB resolve mesclar o crime de pirataria com os roubos armados contra navios, adotando uma só definição, onde a pirataria contemporânea passa a ser vista como o «ato de abordar qualquer navio com a intenção de cometer roubo ou outro tipo de crime e com capacidade de usar a força na realização do ato»16. Dois aspetos são cruciais nessa manobra conceptual do IMB. O primeiro é que ela suprime a questão jurisdicional, o que faz com que a fronteira que separa as dimensões interna e externa da criminalidade marítima seja dissolvida. O segundo é que ela elimina o termo «particular» que, do ponto de vista legal, qualifica a finalidade da violência praticada pela pirataria e pelo roubo armado contra navios; em consequência, todos os crimes cometidos no mar, incluindo os realizados com fins políticos (como o terrorismo marítimo, por exemplo), passam a ser tratados indistintamente sob o rótulo de pirataria. Essa redefinição abrangente da pirataria não tem, obviamente, efeitos legais e alguns analistas têm interpretado essa decisão do IMB como uma estratégia para aumentar o número de ocorrências de pirataria em seus relatórios estatísticos e, com isto, «chocar» os governos e sensibilizá-los para uma ação mais vigorosa no combate à criminalidade no mar17. O número global de casos de pirataria, se for considerado dentro da sua definição legal (ou seja, apenas os ataques ocorridos no alto mar), é significativamente menor que o número de ataques ocorridos no mar territorial ou nos portos e chega a ser insignificante se comparado às estatísticas de criminalidade em terra. Mak faz esse tipo de análise no caso específico do Sudeste Asiático (um dos maiores focos de criminalidade marítima na atualidade) e o próprio IMB reconhece esse facto18. Desse modo, ao agregar em suas estatísticas, sob o rótulo de pirataria, todos os tipos de crimes cometidos no mar, o IMB mostra uma situação global bem mais alarmante do ponto de vista quantitativo. Do ponto de vista qualitativo, essa manobra traz para a criminalidade marítima como um todo uma carga conceptual e simbólica historicamente vinculada ao termo pirataria, potencializada pela associação ao terrorismo marítimo, que sugere uma solução «à moda século xix», ou seja, o uso da força militar, independente da motivação (privada ou política) ou da jurisdição das águas onde os ataques acontecem (nacional ou internacional).

Dada a sua posição de autoridade especializada enquanto único órgão a produzir dados regulares sobre a pirataria em escala global ao longo das três últimas décadas, o IMB funciona como um importante portA-voz da indústria marítima, possui uma cadeira de membro consultivo não governamental na Assembleia Geral da Organização Marítima Internacional e, como tal, tem exercido um papel relevante no processo de securitização da criminalidade marítima, não só do ponto de vista dos seus atos de fala, mas principalmente do ponto de vista técnico enquanto provedor de estatísticas e relatórios especializados que se têm mostrado altamente influentes no âmbito das burocracias de segurança dos estados e das organizações regionais e internacionais envolvidas com o problema.

 

O movimento des securitização da criminalidade marítima e seus efeitos: os casos do Sudeste Asiático e da Somália

Nos últimos vinte anos, diversos atores têm buscado construir um sentido para a criminalidade marítima que vá além de uma mera questão comercial a ser equacionada dentro da relação rotineira entre companhias de navegação e de seguro. Com esse propósito, tais atores têm procurado traduzir os atos de violência privada no mar através de uma linguagem mais dramática, tentando com isso elevar o problema a uma posição de maior prioridade dentro da agenda de segurança global. Dentro desse esforço de securitização da criminalidade no mar, o IMB é, inequivocamente, uma peça-chave e, desde o início dos anos 1990, vem chamando a atenção para os principais focos de pirataria do mundo. Embora outros atores mais poderosos se tenham juntado a esse movimento ao longo dos últimos vinte anos – como os Estados Unidos, o Japão, a União Europeia e seus estados, a Organização Marítima Internacional, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e o Conselho de Segurança das Nações Unidas – o IMB continua a exercer um papel protagonista nesse processo, conforme mostram os casos do roubo armado contra navios no Sudeste Asiático e da pirataria somali a seguir examinados.

 

A securitização do roubo armado contra navios no estreito de Malaca

Uma das particularidades do Sudeste Asiático é que, dada a característica arquipelágica e a profusão de canais e estreitos na região, a criminalidade marítima ocorre quase sempre nas águas territoriais de algum Estado. No estreito de Malaca – um corredor marítimo de quase 900 quilómetros de extensão onde, segundo o IMB, existe o maior foco de criminalidade marítima da região – qualquer incidente ocorre dentro do mar territorial de um dos seus três estados costeiros: Malásia, Singapura e Indonésia. À luz do direito internacional, portanto, não existe pirataria na região, mas sim roubos armados contra navios que, por ocorrerem em águas territoriais, configuram um problema doméstico a ser tratado pela polícia marítima do Estado que detém a soberania das águas onde o incidente acontece. O movimento de securitização iniciado pelo IMB nos anos 1990 e posteriormente liderado por Singapura, Estados Unidos e Japão tenta construir um quadro mais dramático, rotulando os roubos armados ocorridos no estreito de Malaca como pirataria e procurando dar à questão uma dimensão externa. Ao mostrar o problema como um dos maiores focos de pirataria endémica do globo, potencialmente propenso a ligações com o terrorismo, esse tipo de discurso tem por objetivo justificar não só uma resposta mais robusta e conjunta dos três estados costeiros, mas principalmente a intervenção de forças militares estrangeiras (principalmente do Japão e dos Estados Unidos) no patrulhamento das águas da região.

A respeito da atuação do IMB como ator de securitização, é importante enfatizar que, embora ele não seja formalmente um ator político com capacidade de decisão sobre os assuntos de segurança (tal como defendido na abordagem mais conservadora originalmente proposta pela Escola de Copenhaga), ele busca essa autoridade em sua capacidade técnica e especializada. Desse modo, sua legitimidade enquanto ator de securitização é consequência não só do seu papel de porta-voz da indústria marítima para os assuntos de pirataria e da sua capacidade de influenciar organizações e estados (principalmente os comités de segurança e estados-membros da Assembleia Geral da Organização Marítima Internacional, onde participa como membro consultivo não governamental), mas também de sua capacidade técnica e especializada enquanto único órgão provedor de informações sistematizadas e regulares sobre a pirataria. Isso faz dos seus relatórios e estatísticas uma importante ilustração contextualizada do problema que contribui para a construção de uma imagem ameaçadora da pirataria em escala local, regional e global.

Desse modo, chamando a atenção principalmente para as águas do estreito de Malaca, o discurso securitizador do IMB procurava destacar, no início da década de 1990, não só o aumento na quantidade de ataques de pirataria naquela região, mas também o risco de um desastre ecológico caso um navio atacado por piratas fosse deixado à deriva e acabasse provocando uma colisão dentro do estreito. Esse tipo de discurso com apelo ecológico foi acrescido, a partir de 2001, de um novo ingrediente: o «nexo» pirataria-terrorismo. Na sequência dos ataques terroristas aos Estados Unidos em setembro de 2001, o discurso do IMB passou a refletir o temor de que terroristas se aliassem aos piratas, aproveitando as suas habilidades marinheiras para sequestrar navios tanques carregados de óleo bruto ou gás liquefeito de petróleo para serem usados em ataques suicidas contra instalações litorâneas ou outros navios no mar19. Após o ataque bombista ao navio-tanque francês Limburg no golfo de Adem em 2002, o temor de uma convergência do terrorismo com a pirataria passou a refletir-se de forma mais intensa nas declarações de diversos estados e orga nizações internacionais (como o Japão, os Estados Unidos, a Organização Marítima Internacional e a ONU, por exemplo), criando uma espécie de «discurso de coalizão» que, sustentado pelas estatísticas do IMB e por seus reiterados alertas de nexo pirataria-terrorismo, passaram a defender a intensificação do patrulhamento no estreito de Malaca, inclusive com a participação de forças navais estrangeiras20. Nessa mesma época, pressionado internamente para exercer um papel mais ativo na segurança regional, o Japão, que compartilha com o IMB uma definição abrangente de pirataria, passou a coordenar uma série de iniciativas sobre a segurança marítima no Este Asiático, colocando-se à disposição para contribuir com navios de sua guarda costeira para o patrulhamento do estreito de Malaca21. Essas iniciativas, porém, tiveram um impacto relativamente baixo na Malásia e na Indonésia até que, em 2004, perante a aproximação de Singapura com os Estados Unidos e a declaração do chefe do Comando Naval do Pacífico, afirmando que os Estados Unidos podiam contribuir para o patrulhamento do estreito de Malaca e do mar territorial de Singapura, a prioridade da questão junto aos governos malaio e indonésio foi enfim elevada22.

A Malásia e a Indonésia, porém, olharam com desconfiança essa aliança Singapura-Estados Unidos, interpretando-a como uma tentativa de corroer a norma de soberania dos estados-membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático, nomeadamente do princípio de não intervenção por atores externos. Do ponto de vista das autoridades malaias e indonésias, o que estava por trás dessa aliança pouco tinha a ver com a criminalidade marítima na região, mas fazia parte das iniciativas de combate ao terrorismo conduzidas pelos Estados Unidos, fundadas numa nova interpretação do conceito de soberania que enxergava a autoridade legal como algo distinto da habilidade de exercer o efetivo controlo sobre o território; por outras palavras, numa conceção de soberania que era função da capacidade das autoridades no poder de controlarem o seu território e não de um princípio legal intocável. As autoridades malaias e indonésias consideravam que essa flexibilização da norma de soberania abria espaço para intervenções externas por potências que considerassem algum Estado incapaz de manter a lei e a ordem interna23. Levando em conta essa preocupação, as autoridades governamentais malaias e indonésias e suas burocracias de segurança convergiram para um tipo de discurso que considerava as estatísticas do IMB uma espécie de estratégia com um propósito bem específico: elas exageravam a situação da criminalidade marítima na região com o propósito de configurar uma incapacidade de os estados costeiros policiarem as suas águas territoriais e, com isto, justificar uma intervenção naval externa24. Do ponto de vista da Malásia e da Indonésia, portanto, o que colocava uma ameaça existencial à sua segurança nacional não era a criminalidade marítima ou o terrorismo, mas a possibilidade de que potências estrangeiras interviessem em suas águas territoriais. Em função dessa posição, as iniciativas do Japão e dos Estados Unidos de contribuir com seus próprios meios para o patrulhamento do estreito não chegaram a nenhum resultado, mas produziram um efeito colateral: a fim de afastar o fantasma da intervenção externa em seus respetivos mares territoriais, a Malásia e a Indonésia assinaram com Singapura, em 2004, um acordo de cooperação trilateral, conhecido pela sigla MALSINDO25, para aumentar a segurança do estreito de Malaca. Apesar de inicialmente prejudicada por sensibilidades políticas relacionadas à soberania e pela falta de capacitação e recursos26, a operacionalização desse acordo tem alcançado melhores resultados nos últimos anos graças à maior integração de esforços entre os três estados costeiros e à construção de capacidades através de formação, equipamentos e tecnologias de vigilância provenientes de ajuda externa, principalmente do Japão e dos Estados Unidos27. Desse modo, embora a Malásia e a Indonésia tenham rejeitado o patrulhamento externo, a questão da criminalidade marítima no estreito de Malaca ocupa hoje uma posição elevada na agenda de segurança regional e tem sido combatida por um conjunto de medidas: a intensificação do patrulhamento coordenado entre as marinhas de guerra da Malásia e da Indonésia e a guarda costeira de Singapura; a implantação de um centro de inteligência em Singapura; e a instalação de um sistema de radares de vigilância (fornecido pelos Estados Unidos) ao longo de todo o estreito. Esse conjunto de medidas tem sido comemorado, inclusive pelo IMB e pelos Estados Unidos, como a fórmula de sucesso no combate à criminalidade marítima contemporânea28.

 

A securitização da pirataria Somali

Desde meados dos anos 1990, diversos atores têm tentado articular a criminalidade marítima ao largo da costa somali dentro de uma gramática de segurança, declarando a pirataria como uma ameaça grave a uma série de objetos referenciais e chamando a atenção para a necessidade urgente de agir através de medidas robustas, inclusive com o uso da força militar. Esse processo, que atingiu o ápice em 2008 com o envolvimento do Conselho de Segurança das Nações Unidas, começou ainda nos anos 1990 no âmbito da indústria marítima. O IMB, nos moldes de sua atuação no caso do Sudeste Asiático, buscava convencer tomadores de decisão (governantes e líderes de organizações internacionais como a Organização Marítima Internacional, ONU e Conselho de Segurança) e burocracias de segurança (Comité de Segurança da Organização Marítima Internacional, ministérios da Defesa e Marinhas dos estados e representações permanentes do Conselho de Segurança) de que a pirataria nas costas da Somália era um problema de segurança internacional e, por essa razão, necessitava de uma resposta eficaz da parte dos estados e das organizações governamentais internacionais – eficácia que, segundo os atos de fala da indústria marítima, só podia ser alcançada através da mobilização de forças militares e do uso da força contra os piratas. Dentro dessa estratégia de persuasão, os discursos eram fortemente sustentados por dados estatísticos sobre o crescente número de ataques nas águas da região e procuravam enfatizar, de modo geral: a guerra civil na Somália, a inexistência de controlo estatal nas águas do país, as condições ideais que daí decorriam para o estabelecimento de bases e refúgio da pirataria dentro do mar territorial, o facto de os piratas somalis operarem a longas distâncias da costa, empregando armas pesadas típicas de um contexto de guerra e, a partir de 2007, o risco de que a pirataria pudesse se aliar à Al-Shabab (milícia somali vinculada à Al-Qaeda) para ações de terrorismo marítimo.

Em meados de 2000, uma sequência de ataques e sequestros a navios do World Food Program (WFP) precipitou o envolvimento da ONU. Nesse contexto, os executivos do WFP e da Organização Marítima Internacional adotaram um discurso dramático sobre a situação humanitária na Somália, retratando os piratas como uma ameaça existencial à sobrevivência das populações pobres afetadas pela seca e pela guerra civil no país. O argumento humanitário mostrou-se altamente eficaz no convencimento das audiências-alvo, em especial do secretário-geral da ONU, dos membros do Conselho de Segurança e de alguns estados e organizações regionais (em particular, a França, a União Europeia e a NATO), cujas burocracias de segurança (estruturas de defesa e marinhas de guerra) passaram a justificar o uso de forças navais na proteção dos comboios de ajuda humanitária do WFP destinados à Somália. Esse processo culminou em 2008 com o envolvimento inédito do Conselho de Segurança na gestão da violência privada no mar, resultando em cinco resoluções contra a pirataria somali aprovadas sob os poderes do Capítulo VII da Carta29. Durante as negociações dessas resoluções, dois aspetos críticos destacaram-se: a construção do conceito de pirata a vigorar nas resoluções (criminoso civil ou combatente?) e a questão da quebra da soberania da Somália. Embora, em princípio, o envolvimento do Conselho de Segurança com a questão da pirataria tivesse por propósito principal criar um dispositivo jurídico que projetasse no mar territorial da Somália as mesmas regras legais de policiamento que já se aplicavam no alto mar, os rascunhos das resoluções colocados em discussão podiam levar a uma interpretação ambígua, criando espaço para uma interpretação de que hostilidades militares contra os piratas poderiam ser adotadas como se eles fossem combatentes (nos moldes da «guerra contra o terrorismo»)30. No contexto da Resolução 1851 (a mais robusta das resoluções aprovadas em 2008), um discurso do delegado da Costa Rica dava a entender que, durante as negociações prévias, alguns membros teriam defendido um regime de suspensão, entendendo que uma referência explícita ao direito internacional no texto «limitava ou tornava insignificante a parte operativa da resolução»; discordando dessa posição, o representante da Costa Rica enfatizava que seu país só concordara com a resolução após mudanças significativas realizadas no texto de modo a clarificar que o uso da força contra os piratas só se justificava dentro do contexto do direito internacional, inclusive considerando o direito internacional humanitário e os direitos humanos31. Igualmente sensível nessas negociações foi a questão da quebra da soberania. Conforme mostraram os discursos de alguns delegados, em especial os da Indonésia, China e África do Sul, os seus países só concordavam com as resoluções porque elas se aplicavam «excecionalmente ao caso da Somália» e não incluíam nenhuma provisão que pudesse «tocar na soberania de outros países»32 ou «estabelecer direito costumeiro internacional»33.

Se, de um lado, essas negociações levaram à posição consensual de que o pirata devia ser visto como criminoso e não como combatente – e, portanto, protegido pelo direito a julgamento e defesa – e que o uso da força devia ser usado na proporção necessária para cumprir os mesmos procedimentos já previstos no direito internacional quanto ao policiamento no alto mar – «parar, visitar e inspecionar navios suspeitos de pirataria», bem como «capturar a embarcação… prender os piratas e apreender as propriedades existentes a bordo»34 – de outro lado, o texto aprovado na Resolução 1851 ia um pouco além quando autorizava ações em terra na Somália. A esse respeito, é importante notar que essa resolução, proposta e negociada pelos Estados Unidos, refletia claramente o plano estratégico americano para contenção da pirataria no Corno de África aprovado nos últimos momentos da Administração Bush. Esse plano, que descrevia a pirataria somali como uma ameaça global e defendia medidas imediatas «para prevenir, romper e punir os atos das organizações piratas da Somália», acrescentava ainda que, para atingir esse objetivo, eram «necessárias ações em terra para reforçar as medidas tomadas no mar e privar os piratas dos lucros provenientes dos resgates»35. O ponto crucial a destacar, portanto, é que esse plano definia não só medidas para reprimir a pirataria através de «forças de patrulhamento marítimo», mas também «a rutura e o desmantelamento das bases da pirataria em terra», bem como das suas ligações financeiras em escala global36. A Resolução 1851 é um espelho dessa estratégia americana, o que instaura, de certo modo, uma ambiguidade: embora as resoluções configurem o pirata como criminoso e não combatente, as provisões da Resolução 1851 dão margem para a entrada de aeronaves no espaço aéreo somali com o propósito de bombardear as bases da pirataria em terra. Isso configura um grau de letalidade no uso da força que não parece proporcional ao tipo de tratamento normalmente dado às questões de. criminalidade37.

Passando a atuar como um ator de securitização unitário após a aprovação das resoluções, o Conselho de Segurança articulava a pirataria somali como uma ameaça aos diversos objetos de referência definidos em todos os movimentos anteriores: rotas marítimas internacionais, vida dos tripulantes e passageiros, pessoas na Somália, ajuda humanitária e, culminando, a paz e a segurança internacionais na região do Corno de África. Em função dessa ameaça, as resoluções justificavam uma resposta excecional – o uso da força militar no mar territorial e em terra na Somália – e buscavam mobilizar uma audiência em nível global (estados e organizações regionais governamentais que dispusessem de capacidades militares para intervir, ou seja, navios de guerra e aeronaves militares). Os efeitos desse processo já podiam ser notados no fim de 2008 e início de 2009, quando diversos estados (Japão, China, Rússia, Índia, Malásia, Coreia do Sul, Arábia Saudita, Irão e Iémen) e três coligações marítimas multinacionais (uma liderada pelos Estados Unidos, outra liderada pela União Europeia e uma terceira liderada pela NATO) deslocaram-se para a região.

Hoje, aproximadamente trinta estados encontram-se militarmente envolvidos no combate à pirataria somali, não só no patrulhamento do Índico Ocidental, mas principalmente na proteção do corredor de trânsito estabelecido no golfo de Adem, denominado Internationally Recommended Transit Corridor, por onde os navios mercantes podem navegar protegidos pelas forças navais das três coalizões multinacionais que operam na região. A mobilização contra a pirataria somali envolve ainda a participação da Organização Marítima Internacional e de outras agências da ONU principalmente o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, que coordena capacitação jurídica e a instalação de prisões na Somália e em alguns estados vizinhos. Para além disso, foi estabelecido um mecanismo consultivo no âmbito da ONU integrado por cerca de 60 países e 20 organizações governamentais e não governamentais (Grupo de Contacto contra a Pirataria ao Largo da Costa da Somália) com o propósito de propor recomendações em cinco áreas: coordenação dos esforços militares no combate à pirataria; promoção da infraestrutura jurídica necessária à punição dos piratas; fortalecimento dos mecanismos de autoproteção dos navios mercantes; promoção de uma campanha educativa e de divulgação regional sobre os perigos colocados pela pirataria; e identificação e desmantelamento das redes financeiras envolvidas na pirataria. O mais recente desenvolvimento nesse esforço internacional, ainda envolto em polémicas, é o emprego de guardas privadas e o uso de armas a bordo dos navios mercantes que transitam nas águas do Corno de África, o que acrescenta mais um degrau na tendência de privatização da segurança que já se observa, há algum tempo, na formação e no desempenho das tarefas de policiamento na Somália38.

 

A interface interna-externa na Securitização da Criminalidade Marítima

O que se vê, com base nos casos analisados, é que o processo de construção da criminalidade marítima como um problema de segurança internacional tem pressionado alguns arranjos espaciais, institucionais e normativos que tradicionalmente separam a dimensão interna da dimensão externa da segurança no mar. Essa pressão é clara nas tentativas de redefinição da pirataria por agências não estatais, como o IMB, ou por alguns estados, como o Japão e os Estados Unidos, que compartilham em suas legislações e planos estratégicos nacionais um entendimento similar ao do IMB, ou seja, definem a pirataria de uma forma abrangente. Essa expansão conceptual subverte completamente a definição construída na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que entende que a pirataria, enquanto crime de jurisdição universal, só pode ser configurada no alto mar, ou seja, em águas internacionais e nunca nas águas jurisdicionais de um Estado particular39, muito menos em terra. Ao expandir o conceito para enquadrar como pirataria os ataques ocorridos no mar territorial e, como previsto no plano estratégico americano para contenção da pirataria somali40, até mesmo as conexões em terra (como bases, negociadores de resgates, prestadores de apoio logístico, redes de financiamento e branqueadores de capitais), esses movimentos claramente constroem um sentido mesclado para a pirataria, onde a sua tradicional dimensão externa é fundida com uma dimensão doméstica até então inédita.

Os casos aqui analisados mostram, também, que o processo de securitização da criminalidade marítima tem desafiado um dos arranjos nucleares da espacialidade oceânica: a delimitação entre o que é mar territorial (doméstico) e o que é o alto mar (internacional). Esse aspeto pode ser claramente notado na pressão externa exercida sobre a soberania de alguns estados em relação ao seu mar territorial em nome do combate à criminalidade marítima. Se no caso do estreito de Malaca essa pressão externa (principalmente dos Estados Unidos) tem contado com a forte resistência da Malásia e, principalmente, da Indonésia, por outro lado, no caso da Somália, a interferência do Conselho de Segurança tratou de efetivamente eliminar qualquer vestígio da soberania em nome do combate à pirataria41. Embora as resoluções contra a pirataria somali tivessem tomado o cuidado de assegurar que todos os estados deveriam solicitar permissão prévia ao Governo Federal de Transição na Somália (GFT) para entrar em seu mar territorial ou em terra nas operações de combate à pirataria, o facto é que esse embrião de governo criado pela comunidade internacional estava longe de ser um governo central em qualquer sentido prático; na verdade, o GFT mal conseguia controlar alguns quarteirões da capital Mogadíscio com a ajuda das forças de peacekeeping da União Africana, sem qualquer influência sobre o restante do país ou reconhecimento e legitimidade junto à população42. Embora a existência do GFT tenha permitido que o Conselho de Segurança agisse como se estivesse lidando como uma autoridade legítima no governo de um Estado centralizado, na prática esse não era o caso, e ainda que o caráter transitório desse governo tenha alcançado, em 2012, um estatuto permanente, não se pode dizer que a situação no país tenha evoluído substancialmente. Essa espécie de faz de conta mostra, conforme observa Cronin, que as instituições internacionais e os estados ainda não descobriram como trabalhar com espaços e políticas que não se ajustem ao modelo de Estado-Nação centralizado43.

Os casos examinados deixam ver um terceiro aspeto relevante: a adaptação das marinhas de guerra ao papel de policiamento. Se há vinte anos essa era uma questão polémica, rejeitada por oficiais ainda presos ao papel estratégico glorioso das grandes esquadras de águas azuis44, hoje, as funções de patrulhamento marítimo, abordagem e aprisionamento de criminosos no mar, formação de polícias portuárias e guardas costeiras é uma missão assumida até mesmo pelas marinhas de guerra das potências navais e pela aliança atlântica. Desse modo, as chamadas funções «constabulares» (onde se enquadram as tarefas de policiamento marítimo) e o emprego das marinhas de guerra no combate ao terrorismo, à pirataria, ao tráfico de drogas, etc., já figuram, ao lado das tradicionais operações navais, nas doutrinas militares e nos planos e conceitos estratégicos de muitos estados, organizações regionais e NATO45.

Não se pode deixar de observar, ainda, que o intercâmbio tecnológico, as missões de formação e especialização de pessoal, a instalação de sistemas de vigilância por radares e a convergência de informações para centros de inteligência são características marcantes nos dois casos analisados. Essa cooperação tecnológica, já destacada por Bigo no âmbito da europeização da assistência tecnológico-militar, gera uma comunidade de especialistas e cria laços transnacionais entre esses profissionais da segurança que passam a compartilhar e a produzir os mesmos medos e inseguranças46. Ainda no domínio da especialização, é importante notar o surgimento de uma comunidade de profissionais privados da segurança marítima. Se a privatização da segurança já era uma tendência observada nos teatros terrestres das guerras do Afeganistão e do Iraque, a pirataria somali abriu a oportunidade para uma multiplicação na quantidade de companhias privadas de segurança marítima (baseadas principalmente no Reino Unido ou nos Estados Unidos e constituídas, em geral, por pessoal militar reformado). Segundo Bigo, há uma luta pela globalização e «de-territorialização» da segurança no campo dos profissionais de segurança que parece ainda mais necessária no âmbito das agências privadas, na medida em que o argumento da «ameaça transnacional» permite justificar o seu duplo envolvimento tanto nos problemas internos, quanto nos externos. Para o autor, a fusão das dimensões interna e externa da segurança tem sido, em grande medida, reflexo dessas práticas próprias do campo dos profissionais de segurança e de sua luta para mostrar a sua capacitação e justificar a sua prontidão para o exercício de um duplo papel47.

 

A securitização da criminalidade marítima como dispositif de Governação do espaço oceânico

Alguns analistas têm considerado que o impressionante envolvimento internacional com o caso da pirataria somali vai além da gestão desse problema específico. Os Estados Unidos, por exemplo, têm defendido a ideia de uma Parceria Marítima Global48 e algumas discussões informais na Assembleia Geral da ONU têm-se referido à pirataria somali como um «estudo de caso» que oferece a oportunidade para «repensar a governação da segurança marítima de uma forma mais abrangente»49. É importante notar, porém, que a visão de que essa governação é resultado de um conjunto de ações deliberadas, arquitetadas e implementadas de forma coordenada dentro de arenas bem definidas – como entendem Bueger e Stockbruegger50, por exemplo – não consegue perceber que esse arranjo de governação não é assim tão centralizado, coordenado e mecânico, mas funciona como um dispositif no sentido foucaultiano/bourdieusiano do termo, ou seja, como um conjunto de convicções, práticas e instituições pulverizadas que criam as condições de possibilidade num campo particular51. Desse ponto de vista, o dispositif é mais do que um mero mecanismo; ele é uma «capacitação para a governação ou a disposição de um campo em direção a um modo de governação»52.

Entendendo a securitização nesse sentido, como uma espécie de dispositif de segurança, pode-se dizer que a construção da criminalidade marítima como uma ameaça global move a questão na direção de um modo particular de governação, centrado nas convicções, hábitos, práticas, normas e instituições da segurança, onde a segurança passa a ser um objetivo em si mesmo. Conforme explica Salter, «o dispositif de segurança cria seus próprios objetos», ou seja, «ele define o que deve ser governado em nome da segurança»53. Porém, o dispositif tende a focar na norma da segurança em si, perdendo o foco da situação concreta individual em questão; em consequência, o seu objeto – no caso aqui em questão, a criminalidade marítima – torna-se obscurecido e a normatização da segurança em si é expandida indefinidamente, permitindo que um mosaico cada vez maior de atores se envolva com esse tipo de política e que um espaço cada vez maior se abra para a segurança operar.

Dada essa racionalidade expansiva, que dá ao dispositif uma «habilidade quase infinita de criar objetivos de segurança autojustificáveis»54, a securitização da criminalidade marítima abre as portas para que uma variedade de atores – forças armadas, governos, organizações internacionais, organizações regionais, agências especializadas governamentais e não governamentais e companhias de segurança privadas – envolvam-se na gestão do problema, muitos deles agindo oportunisticamente no sentido de atingir seus próprios objetivos de segurança. Desse modo, a criminalidade marítima no Sudeste Asiático serviu como uma oportunidade para a pressão externa (principalmente dos Estados Unidos) no sentido de integrar os estados regionais nos esforços contra o terrorismo e justificar a vigilância e a militarização do estreito de Malaca (uma das linhas de comunicação vitais para as Forças Armadas americanas no Iraque e no Afeganistão). O Japão, pressionado internamente a adotar um papel mais ativo na segurança regional, viu na criminalidade marítima no estreito de Malaca a oportunidade para expandir o perímetro operacional de suas forças navais, após mais de cinquenta anos de reclusão. Do mesmo modo, a pirataria somali tem sido uma rica oportunidade para definir novos papéis para as marinhas de guerra, as organizações regionais e a aliança atlântica, bem como para redefinir seus conceitos estratégicos. Construída como uma ameaça estratégica global, a pirataria tem servido para justificar o envolvimento de forças navais em operações de presença e projeção de poder no Corno de África (NATO, Estados Unidos, União Europeia, China, Índia e Irão são apenas alguns exemplos de atores dirigidos por interesses estratégicos naquelas águas); para buscar prestígio internacional no caso dos países com pequenas marinhas; para manter o treinamento das tripulações e testar a prontidão dos navios numa situação real; para justificar a necessidade de um maior aporte de recursos orçamentais; ou para desenvolver a interoperabilidade, particularmente no caso de países como a China e a Rússia que têm tido a oportunidade, pela primeira vez, de se aproximarem das forças navais da NATO a fim de trocar informações e procedimentos operativos no combate a um «inimigo comum». Para a NATO, os esforços antipirataria têm sido uma oportunidade para expandir o seu raio de ação e redefinir o seu conceito estratégico para além das fronteiras transatlânticas; para a União Europeia, a pirataria tem justificado a colocação em prática e o teste de sua estrutura naval multinacional sob a Política Comum de Segurança e Defesa; para os Estados Unidos, a pirataria somali tem servido como uma grande oportunidade para reforçar a militarização das águas do Corno de África, adicionalmente aos esforços navais já em curso desde 2001 no contexto da guerra contra o terrorismo. Para além dessas oportunidades no campo militar, a pirataria tem servido para justificar o fortalecimento do embrião de governo central na Somália apoiado pelas potências ocidentais e a implementação de um aparato legal/jurídico ocidentalizado sob a supervisão da ONU – as chamadas cortes antipirataria especializadas na Somália – que seja capaz de liberar a comunidade internacional da responsabilidade de julgar e aprisionar os piratas capturados nas operações navais internacionais. As oportunidades exploradas pelas empresas privadas são também significativas, produzindo uma verdadeira explosão nos negócios das companhias privadas de segurança marítimas nos últimos quatro anos. Essas companhias, geralmente formadas por pessoal militar reformado, têm sido contratadas não só para desempenhar funções de segurança armada a bordo dos navios mercantes, mas também para atuar na formação e na composição das guardas costeiras e polícias marítimas no âmbito do embrião de um governo central da Somália, mas também dos governos dos estados de Puntland e Somaliland55. Em síntese, esse ethos «oportunístico» orienta o tratamento da criminalidade marítima para uma moldura coerciva (centrada na criação de corredores e espaços protegidos por forças militares e guardas privadas e de um aparato punitivo para os piratas) onde a governação do espaço oceânico torna-se sinónimo da produção de mais segurança.

O ponto crucial a observar com base nos aspetos aqui destacados é que a construção da criminalidade marítima como um problema de segurança internacional não resulta necessariamente de uma agenda clara, objetivamente definida, e nem se limita às declarações explícitas do discurso político. Ainda que a dimensão linguística da securitização, explorada principalmente na segunda secção deste artigo, seja importante para compreender como a criminalidade marítima emerge e ganha visibilidade na agenda de segurança internacional, ela pouco esclarece sobre as práticas, o contexto, as relações de poder e os interesses estratégicos que compõem o dispositif que, de forma descentralizada e muitas vezes não declarada, atua de modo igualmente relevante na construção e na perpetuação da criminalidade marítima como questão de segurança. Isso significa que o tipo de securitização aqui observado é um processo complexo que possui dimensões discursivas e não discursivas; que resulta não só de processos centralizados de deliberação política em alto nível, mas também de decisões burocráticas descentralizadas quotidianas; que envolve agentes governamentais e agentes privados; que persegue objetivos explícitos, mas também interesses estratégicos não declarados; que se mostra diretamente no texto, mas também na manipulação de normas e conceitos, na produção de estatísticas, na gestão de tecnologias de comunicação e vigilância, e na formação e intercâmbio de redes de profissionais especializados em segurança. Assim, ainda que o papel dos atos de fala seja central na compreensão do momento que faz a criminalidade marítima emergir como uma ameaça excecional no âmbito do discurso político, não se pode deixar de considerar igualmente relevante a compreensão das condições de possibilidade da construção desse sentido compartilhado de ameaça – normas, definições, instituições, interesses estratégicos, declarações especializadas, capacitação tecnológica e profissional, rotinas burocráticas, estatísticas, etc. – que só uma abordagem mais pragmática e contextualizada, nos moldes defendidos pela abordagem sociológica da securitização, pode alcançar. Enfim, parafraseando Balzacq, o processo de securitização examinado fica entre o repertório semântico da segurança e as suas circunstâncias contextuais56, o que justifica a combinação das abordagens linguística e sociológica aqui adotadas.

 

Conclusão

Se a construção geoestratégica do oceano como um «vazio fora da sociedade» deve ser perpetuada ad eternum – a fim de conservar esse espaço como uma superfície destinada à livre circulação de mercadorias, como um manancial universal de recursos e como um campo de força reservado às aventuras militares dos estados57– é de se esperar que um conjunto de instituições, atitudes e normas se dedique permanentemente a reproduzir essa construção. Ao mostrar, porém, que o mar é também uma arena de conflito social e de reivindicação de um «direito» alternativo à riqueza58 que não se encaixa nessa construção, a criminalidade marítima produz uma fricção inaceitável que deve ser controlada a qualquer preço. O que os casos aqui examinados permitem observar é um esforço extraordinário dos guardiões institucionais, burocráticos e normativos dessa construção idealizada do espaço oceânico no sentido de colocar a criminalidade marítima dentro de uma moldura que permita o seu tratamento eficaz. Essa eficácia passa pela articulação do problema através de uma racionalidade securitária que cria sentidos de ameaça, medo, risco e insegurança que levam à justificação de respostas mais robustas de pacificação e controlo.

No âmbito desse processo de domesticação de espaços turbulentos – sejam tais espaços as águas anárquicas do alto mar ou as águas soberanas de algum Estado «fraco» – o ponto crucial a observar, com base nas análises realizadas neste artigo, é o facto de que as dimensões interna e externa da segurança marítima se têm mesclado dentro do que parece ser um dispositif de governação, onde a norma da soberania não mais parece ser um princípio inviolável e a dissolução das tradicionais fronteiras interna e externa resulta mais da justificação de novos papéis e de interesses próprios da comunidade de segurança (marinhas de guerra, alianças de defesa, órgãos de inteligência, setores de segurança das organizações regionais, companhias privadas de segurança marítima) do que de alguma mudança substantiva na maneira de olhar o problema da criminalidade marítima. Dessa perspetiva, o que se vê não é uma nova governação do espaço oceânico em construção, mas a continuidade, numa direção cada vez mais radical, da velha construção geoestratégica da espacialidade oceânica como uma superfície de fluxo, livre de fricções. Dentro dessa conceção, só há espaço para estratégias de pacificação e controlo, não restando qualquer margem para uma construção alternativa que encare o oceano como um espaço social, onde as contradições e conflitos possam ser tratados de uma forma mais transformadora.

 

Data de receção: 31 de agosto de 2013 | Data de aprovação: 23 de outubro de 2013

 

Notas

1Não é de estranhar, portanto, que o mar territorial de cada Estado tenha sido fixado como uma estreita faixa costeira (apenas 12 milhas marítimas) na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982. Embora a extensão dessa faixa até 200 milhas náuticas como zona económica exclusiva (zee) e para além desse limite em algumas situações especiais possam ser entendidas como um crescente movimento de «territorialização» da plataforma continental adjacente a cada Estado, o facto é que essa extensão tem sido construída mais como um espaço de desenvolvimento do que como um espaço especial e fechado, nos mol-des do território nacional controlado por cada Estado soberano. Ou seja, esses espaços permanecem fora da territorialidade dos estados, ainda que lhes seja garantida a exclusividade na exploração dos recursos vivos e não vivos. Para uma discussão abrangente, ver Steinberg, Philip E. – The Social Construction of the Ocean. Cambridge: Cambridge University Press, 2001, pp. 11-20.         [ Links ]

2Jackson, S. E. – «The water is not empty: cross-cultural issues in conceptualizing sea space». In The Australian Geographer. Vol. 26, N.º 1, 1995, pp. 87-96.         [ Links ]

3Steinberg, Philip E. – The Social Construction of the Ocean, pp. 34 e 207.

4Ibidem, 208.

5Ver, por exemplo, o plano estratégico de contenção da pirataria emitido pelo Conselho Nacional de Segurança dos Estados Unidos, onde a pirataria é entendida como uma ameaça global («Countering Piracy Off the Horn of Africa: Partnership & Action Plan», US National Security Council, dezembro de 2008). Diversas doutrinas militares também têm incorporado a pirataria como uma «nova ameaça» da atualidade, tais como: NOC 10 – «Naval Operations Concept 2010», US Navy, US Marine Corps and US Coast Guard, 2010, p. 35 (Consultado em: 20 de outubro de 2011). Disponível em: http://www.navy.mil/maritime/noc/NOC2010.pdf; nato– «Committee report– Maritime security: natoand euroles and coordination», NATO Parliamentary Assembly, 2010. (Consultado em: 20 de outubro de 2011). Disponível em: http://www.nato-pa.int/default.asp?SHORTCUT=2087.

6A definição legal de pirataria também se aplica à violência com fins privados provocada por tripulantes ou passageiros de aeronaves, o que estende esse tipo de preocupação também à indústria aérea. Embora a emergência desse tipo de pirataria, principalmente a partir dos anos 1960, tenha despertado a atenção para o problema, o foco deste artigo limita-se à pirataria marítima.

7Ao contrário da farta bibliografia sobre o ambiente marítimo dentro dos estudos estratégicos, raras têm sido as abordagens sobre a segurança marítima produzidas dentro dos debates alternativos surgidos desde o fim da Guerra Fria. Entre essas iniciativas, ver: Pugh, Michael (ed.) – Maritime Security and Peacekeeping: A Framework for United Nations Operations. Manchester: Manchester University Press, 1994;         [ Links ] Oliveira, Gilberto C. – «Naval peacekeeping and piracy: time for a critical turn in the debate». In International Peacekeeping. Vol. 19, N.º 1, pp. 48-61;         [ Links ] Oliveira, Gilberto C. – «“New wars” at sea: a critical transformative approach to the political economy of Somali piracy». In Security Dialogue. Vol. 44, N.º 1, 2013, pp. 3-18.         [ Links ]

8Bigo, Didier – «The Möbius ribbon of internal and external security(ies)». In Albert, M., Jacobson, D., e Lapid, Y. (eds.) – Identities, Borders, Orders: Rethinking International Relations Theory. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2001, p. 92.         [ Links ]

9Para um panorama da bibliografia dentro dessa linha geral de argumentação, ver: Eriksson, Johan, e Rhinard, Mark – «The internal-external security nexus: notes on an emerging research agenda». In Cooperation and Conflict. Vol. 44, N.º 3, 2009, pp. 243-267.         [ Links ]

10Didier Bigo é uma das referências centrais dentro dessa perspetiva crítica (Bigo, Didier – «Internal and external aspects of security». In European Security. Vol. 15, N.º 4, 2006;         [ Links ] Bigo, Didier – «The Möbius ribbon of internal and external security(ies)».

11Este autor considera que as diferentes abordagens à teoria da securitização são tipificações ideais, o que implica dizer que os estudos empíricos de securitização não se limitam ou se enquadram exclusivamente numa dessas abordagens específicas (linguística ou sociológica). Desse modo, buscando uma análise mais abrangente, opta-se neste artigo por uma combinação entre a abordagem discursiva da Escola de Copenhaga (W?ver, Øle – «Securitization and desecuritization». In Lipschutz, Ronnie D. (ed.) – On Security. Nova York: Columbia University Press, 1995; Buzan, Barry, W?ver, Øle, e De Wilde, Jaap – Security: A New Framework for Analysis. Londres: Lynne Rienner, 1998) e a abordagem mais contextualizada, ou sociológica, defendida principal-mente por Bigo ou Balzacq (Bigo, Didier, e Tsoukala, Anastassia – «Understanding (in)security». In Bigo, Didier, e Tsoukala, Anastassia (eds.) – Terror, Insecurity and Liberty: Illiberal Practices of Liberal Regimes after 9/11. Abingdon: Routledge, 2008, pp. 1-9; Balzacq, Thierry (ed.) – Securitization Theory: How Security Problems Emerge and Dissolve. Abingdon: Routledge, 2011).

12Imb– «Piracy and armed robbery against ships: annual report 1 January-31 December 1999». Londres: ICC International Maritime Bureau, 2000, pp. 12 e 19.

13Unclos – «United Nations Convention on the Law of the Sea», 1982, artigo 101.º (Consultado em: 22 de agosto de 2013). Disponível em: http://www.un.org/depts/los/convention_agreements/texts/unclos/unclos_e.pdf.

14A.1025(26) – «Code of practice for the investigation of crimes of piracy and armed robbery against ships». Organização Marítima Internacional, 2010, Anexo, parágrafo 2.2. (Consultado em: 22 de agosto de 2013). Disponível em: http://www.imo.org/OurWork/Security/PiracyArmedRobbery/Guidance/Documents/A.1025.pdf

15Unclos – «United Nations Convention on the Law of the Sea», artigo 105.

16Mak, J. N. – «Securitizing piracy in Southeast Asia: Malaysia, the International Maritime Bureau and Singapore». In Caballero-Anthony, Mely, Emmers, Ralf, e Acharya, Amitav (eds.) – Non--Traditional Security in Asia: Dilemas in Securitisation. Hampshire: Ashgate, 2006, p. 72.         [ Links ]

17Ibidem, p. 72.

18Imb– Special Report, May 1992, citado em: Mak, J. N. – «Securitizing piracy in Southeast Asia: Malaysia, the International Maritime Bureau and Singapore», p. 72.

19Mak, J. N. – «Securitizing piracy in Southeast Asia: Malaysia, the International Maritime Bureau and Singapore», pp. 73 -74.

20Ibidem, p. 83.

21Rahman, Chris – «The international politics of combating piracy in Southeast Asia». In Lehr, Peter (ed.) – Violence at Sea: Piracy in the Age of Global Terrorism. Abingdon: Routledge, 2007, pp. 189-191.         [ Links ]

22Ibidem, pp. 193-194.

23Mak, J. N. – «Securitizing piracy in Southeast Asia: Malaysia, the International Maritime Bureau and Singapore», p. 85.

24Ibidem, pp. 85-86.

25Sigla formada pelas letras iniciais dos três estados costeiros (Malasya--Singapore-Indonesia).

26Rahman, Chris – «The international politics of combating piracy in Southeast Asia», p. 195.

27Ibidem.

28Jamiola, Donald R. – The Strait of Malacca Formula: Success in Counter--Piracy and its Applicability to the Gulf of Aden. New Port: Naval War College, 2009, pp. 3 -4.         [ Links ]

29Ou seja, autorizando o uso da força (Resoluções S/RES 1816, 1838, 1844, 1846 e 1851, todas de 2008).

30Heinze, Eric A. – «A “global war on piracy?”». In Struett, Michael J., Carlson, Jon D., e Nance, Mark T. (eds.) – Maritime Piracy and the Construction of Global Governance. Londres: Routledge, 2013, pp. 54-55.         [ Links ]

31S/PV.6046 – «Security Council 6046th meeting record», United Nations, 2008. (Consultado em: 28 de novembro de 2009). Disponível em: http://www.un.org/Depts/dhl/resguide/scact2008.htm.

32S/PV.5902 – «Security Council 5902th meeting record», United Nations, 2008. (Consultado em: 28 de novembro de 2009). Disponível em: http://www.un.org/Depts/dhl/resguide/scact2008.htm.

33S/PV.5987 – «Security Council 5987th meeting record», United Nations, 2008 (Consultado em: 28 de novembro de 2009). Disponível em: http://www.un.org/Depts/dhl/resguide/scact2008.htm.

34Unclos – «United Nations Convention on the Law of the Sea», artigos 105 e 110.

35«Countering piracy off the Horn of Africa: partnership & action plan», US National Security Council, 2008, p. 6.

36Ibidem, p. 12.

37Heinze, Eric A. – «A “global war on piracy?”», p. 56.

38Para uma visão abrangente sobre a mobilização internacional contra a pirataria, ver: Haywood, R., e Spivak, R. – Maritime Piracy. Londres: Routledge, 2012, pp. 39-55;         [ Links ] Homan, K., e Kamerling, S. – «Operational challenges to counterpiracy operations off the coast of Somalia». In Ginkel, B., e Putten, F. (eds.) – Response to Somali Piracy: Challenges and opportunities. Leida: Martinus Nijhoff, 2011;         [ Links ] Murphy, M. – Somalia: The New Barbary? Piracy and Islam in the Horn of Africa. Londres: Hurst, 2011, pp. 123-137;         [ Links ] Bueger, Christian, e Stockbruegger, Jan – «The practices of counter-piracy governance». In Struett, Michael J., Carlson, Jon D., e Nance, Mark T. (eds.) – Maritime Piracy and the Construction of Global Governance, pp. 99-124.         [ Links ]

39Dutton, Yvonne – «Maritime piracy and the impunity gap: domestic implementation of international treaty provisions». In Struett, Michael J., Carlson, Jon D., e Nance, Mark T. (eds.) – Maritime Piracy and the Construction of Global Governance, pp. 73-74.         [ Links ]

40«Countering piracy off the Horn of Africa: partnership & action plan», U S National Security Council, 2008.

41Nance, Mark T., e Struett, Michael J. – «Conflict constructions: maritime piracy and cooperation under regime complexes». In Struett, Michael J., Carlson, Jon D., e Nance, Mark T. (eds.) – Maritime Piracy and the Construction of Global Governance, p. 138.         [ Links ]

42Oliveira, Gilberto C. – «“New wars” at sea: a critical transformative approach to the political economy of Somali piracy», p. 13.

43Cronin, Bruce – «Conclusion». In Struett, Michael J., Carlson, Jon D., e Nance, Mark T. (eds.) – Maritime Piracy and the Construction of Global Governance, p. 195.         [ Links ]

44Pugh, Michael – «Is Mahan still alive? State naval power in the international system». In Journal of Conflict Studies. Vol.16, N.º 2, 1996.         [ Links ]

45NOC 10 – «Naval operations concept 2010», U. S. Navy, U. S. Marine Corps and U. S. Coast Guard, 2010; «Committee report – Maritime security: natoand euroles and coordination», NATO Parliamentary Assembly, 2010.

46Bigo, Didier – «Internal and external aspects of security».

47Ibidem.

48Kraska, James, e Wilson, Brian – “The Global Maritime Partnership and Somali Piracy”. In Defence & Security Analysis. Vol. 25, N.º 3, 2009, pp. 223-234.         [ Links ]

49Bueger, Christian, e Stockbruegger, Jan – «The practices of counter--piracy governance», p. 101.

50Bueger, Christian, e Stockbruegger, Jan – «The practices of counter--piracy governance».

51Duffield, Mark – «The liberal way of development and the development--security impasse: exploring the global life-chance divide». In Security Dialogue. Vol. 41, N.º 1, 2010, p. 56.         [ Links ]

52Salter, Mark B. – «Imagining numbers: risk, quantification, and aviation security». In Security Dialogue. Vol. 39, N.º 2-3, 2008, pp. 243-266.         [ Links ]

53Ibidem, p. 249.

54Ibidem, p. 262.

55Oliveira, Gilberto C. – «“New wars” at sea: a critical transformative approach to the political economy of Somali piracy», pp. 13-14.

56Balzacq, Thierry – «A theory of securitization: origins, core assumptions, and variants». In Balzacq, Thierry (ed.) – Securitization Theory: How Security Problems Emerge and Dissolve. Abingdon: Routledge, 2011, pp. 14, 27.         [ Links ]

57Steinberg, Philip E. – The Social Construction of the Ocean. Cambridge: Cambridge University Press, 2001, p. 4.         [ Links ]

58Oliveira, Gilberto C. – «“New wars” at sea: a critical transformative approach to the political economy of Somali piracy», pp. 10 -11.