SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número42Os limites cronológicos da I Guerra MundialA Grande Guerra e as relações internacionais de Portugal: Da Monarquia à República índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.42 Lisboa jun. 2014

 

CENTENÁRIO DA GRANDE GUERRA

Portugal e as Pequenas Potências na Grande Guerra de 1914-1918

Portugal and the Small Powers in the First World War (1914-1918)

Bruno Cardoso Reis*,1

 

* Investigador auxiliar no ICS-UL. Licenciado e mestre em História Contemporânea pela Faculdade de Letras de Lisboa. Tem o mestrado em Historical Studies pela Universidade de Cambridge (2003). É doutor em História e Teoria das Relações Internacionais – ramo de Segurança Internacional pelo King’s College (2008). Em 2013 co-editou com Andrew Mumford, The Theory and Practice of Irregular Warfare, Routledge. É co-responsável pelo projecto «O papel das pequenas e médias potências na Primeira Guerra Mundial» do IDN em parceria com IHC-UNL, o ICS-UL e o apoio da Comissão Coordenadora das Evocações do Centenário da I Guerra Mundial do MDN.

 

RESUMO

Será que uma Pequena Potência fraca como Portugal em 1914 pode ter algum impacto num conflito de grande escala e intensidade como a I Guerra Mundial? Será que podemos aprender algo relativamente às dinâmicas da intervenção portuguesa comparando Portugal com outras Pequenas Potências envolvidas na guerra? A resposta deste artigo a ambas a questões é sim, apesar de estarmos conscientes do paradoxo que é afirmar que uma Pequena Potência pode ter algum impacto numa grande guerra. Olhar de forma comparativa para a participação de Portugal na I Guerra Mundial ajuda-nos a escapar a um debate simplesmente em termos dos culpados pela intervenção entre os políticos portugueses. Defendemos também que uma maior atenção à autonomia e ao impacto das Pequenas e Médias Potências é algo que falta na revisão em curso da forma como as relações internacionais olham para a I Guerra Mundial.

Palavras-chave: I Guerra Mundial, Portugal, Bélgica, Sérvia.

 

ABSTRACT

Can a weak small power like Portugal in 1914 have some impact on a large-scale and high intensity conflict such as the First World War? Can we learn something about the dynamics of Portuguese intervention in the First World War by comparing it with other small powers involved in the war? The article’s answer to both these questions is yes; despite being aware of the seeming paradox that is to claim that small powers can have an impact in a major war. By analysing the participation of Portugal in the First World War in a comparative perspective helps us escape a debate simply in terms of who among Portuguese politicians of the time is to blame for the high cost and low return of Portuguese intervention. As well as to argue that greater attention to autonomy and the impact of small and medium powers is something missing in the ongoing review of how IR analyses the First World War.

Keywords: First World War, Portugal, Belgium, Serbia.

 

Em 1890, no contexto de uma disputa territorial colonial entre Portugal e a Grã-Bretanha, o então primeiro-ministro britânico, Lord Salisbury, queixou-se de uma Pequena Potência «muito cansativa» que nem fazia exatamente o que lhe era exigido pela Grã-Bretanha, nem a desafiava abertamente apresentado um alvo adequado. Salisbury resumiu a questão nestes termos paradoxais: «os portugueses estão fazendo o máximo uso da sua fraqueza». Reclamações semelhantes a esta – mas em termos ainda mais acrimoniosos e num contexto ainda mais dramático – podem ser encontradas nas relações entre Grandes Potências e Pequenas Potências nas crises que levaram à I Guerra Mundial, nomeadamente no quadro dos ultimata da Áustria-Hungria à Sérvia e da Alemanha à Bélgica em julho e agosto de 19142.

Mas como é que num sistema internacional de anarquia nas relações de entre estados – com estes últimos consequentemente preocupados principalmente com a sua sobrevivência mediante a defesa dos seus interesses recorrendo ao máximo de meios disponíveis – pode ser possível retirar vantagens da fraqueza? E, no entanto, Lord Salisbury, que é corretamente considerado como um Realpolitiker paradigmático, um realista puro e duro, considera que uma potência fraca pode ter poder de influência ou de capacidade de ação. Pode estar errado, mas se o afirmou não foi a partir de qualquer inclinação ideológica ou preconceito nacionalista, mas da sua observação da política internacional. Mas será que é realmente assim, que as Pequenas Potências podem ter alguma capacidade de ação e influência mesmo no caso de uma grande guerra envolvendo Grandes Potências? Responder pela positiva seria ultrapassar o teste muito exigente de uma tal proposição.

Estas perguntas têm a vantagem de nos permitirem pensar de forma diferente: por um lado, o problema das origens, dinâmicas de expansão e conclusão da I Guerra Mundial; por outro lado, mais especificamente, a questão do envolvimento de Portugal no conflito. A este respeito irei avançar com quatro pontos principais.

Há um volume enorme de livros publicados sobre a I Grande Guerra em língua inglesa e se usarmos apenas uma base de dados centrada em livros e artigos académicos como a JSTOR obtemos 30 036 resultados. Uma busca no sítio similar francês Persée indica-nos quase 22 mil resultados3. Evidentemente que se a isto juntarmos obras de todo o tipo – romances, memórias – o resultado será significativamente maior. Porquê tanto interesse e como sintetiza-lo do ponto de vista da nossa análise?

Sem dúvida esta enorme montanha de publicações reflete o impacto traumático da I Grande Guerra numa era contemporânea dominada pela política de massas. Os decisores políticos e militares tinha uma imprensa de massas e um eleitorado massivo perante o qual justificar o desencadear e a condução da guerra. Graças à massificação da alfabetização, sobretudo mas não apenas nos países mais desenvolvidos envolvidos no conflito, entre os milhões que foram mobilizados e afetados por ela em todo o mundo, muitos mais podiam ler e escrever sobre a guerra. Isto significou que este foi também um conflito de propaganda numa escala massiva e global.

É ainda importante sublinhar que durante o passado século esta guerra tem estado no limitar da memória vivida – pelo que muitos dos que têm escrito desde então sobre a I Guerra Mundial ou ainda a viveram, ou cresceram a ouviram histórias vividas durante o conflito pelos seus pais ou avós. Esta não tem sido portanto, durante este último século, uma memória neutra, mas sim, vivida e altamente contenciosa4.

Estes factos em parte explicam que a Grande Guerra de 1914-1918 tenha sido repetidamente discutida neste último século em termos da questão da culpa pelo conflito. Quem, que decisores, que generais, que país/países, que processo(s) foram responsáveis pelos milhões de mortos da I Guerra Mundial e pelas grandes catástrofes políticas e económicas que ela veio inaugurar? Esta tem sido a pergunta algo redutora que tem dominado o debate público sobre um tema ainda frequentemente explosivo.

O nascimento da própria disciplina académica das relações internacionais resultou em boa parte do esforço para analisar com major objetividade e profundidade o tema das origens da guerra. As primeiras cátedras e institutos exclusivamente dedicados às relações internacionais surgiram, após 1918, tendo como primeiro objetivo precisamente perceber não só as origens da guerra em geral, mas também em particular as da Grande Guerra de 1914-1918. Conceitos tão centrais no campo de estudo da segurança internacional – como escalada em espiral, guerra acidental, dissuasão, culto da ofensiva, corrida aos armamentos, política de alianças e dilema de segurança – têm sido muito discutidos em torno das suas implicações para perceber a origem da I Guerra Mundial. A evolução da análise desta última também tem influenciado a discussão destes temas5.

Internacionalmente, ainda durante e logo seguir à I Guerra Mundial houve uma verdadeira guerra dos documentos protagonizada pela maioria dos países beligerantes. Ela consistiu na publicação de volumes reunido frequentemente vastos, mas não exaustivas coleções de documentação diplomática, antes cuidadosamente selecionada e comentada. Foi assim a começar pela Alemanha, Áustria, Grã-Bretanha, França; Portugal envolveu-se neste processo em 1920. Paralelamente surgiu também, no pós-guerra, uma avalancha de memórias dos protagonistas. Como resultado desta massa de documentos a ideia de que apenas a Alemanha e os seus aliados tinham sido culpados pelo desencadear do conflito – como ficou formalmente consagrado no Art.º 231 Tratado de Versalhes que lhe pôs fim – ficou seriamente abalada.

Este novo consenso relativo assente na ideia de responsabilidade múltipla e numa guerra acidental, resultante de alianças rígidas e uma escalada em espiral com decisores políticos incapazes de controlar eficazmente os respetivos chefes militares, sobreviveu à II Guerra Mundial e prosperou na fase inicial da Guerra Fria. O livro de Barbara Tuchman, The Guns of August, representa bem o culminar deste paradigma, muito influente num período em que o receio de uma escalada acidental poder levar a uma III Guerra Mundial era colorido pelo terror de com ela se cair num holocausto nuclear. A obra de Tuchman influenciou o Presidente Kennedy na gestão crise dos mísseis de Cuba, em 1962, o qual declarou ao seu irmão e conselheiro: «Eu não vou seguir um caminho que permita que alguém escreva um livro sobre isto chamado Os Mísseis de Outubro».6 A I Guerra Mundial tinha-se transformado numa lição sobre como evitar a III Guerra Mundial.

A década de 1960 foi, porém, marcada pelo ressurgir do debate. Foi assim primeiramente na Alemanha e sobretudo por causa da enorme polémica em torno da obra de Fritz Fischer. Ele foi o primeiro historiador alemão que defendeu que, não só a II Guerra Mundial, mas também já a I Guerra Mundial tinham sido o resultado de muito ambiciosos e belicosos objetivos imperialistas alemães de expansão. Um projeto de expansão global que surgia associado aos esforços para manter, através de um nacionalismo populista e belicista, um sistema de poder ainda dominado por uma pequena elite aristocrática prussiana numa era de massificação crescente da política7.

O resultado é que desde então os debates internacionais sobre as origens e mesmo o decurso da I Guerra Mundial têm sido dominados pelo que Williamson designou numa síntese muito recente de paradigma alemã. Ou seja, tem sido um debate muito centrado sobre os objetivos, comportamentos e documentos alemães8. O próprio modelo de abordagem de Fischer à I Guerra Mundial, muito focado nas determinantes internas da política externa também se revelou muito influente. Esta perspetiva é, por exemplo, a adotada por Nuno S. Teixeira na análise da beligerância portuguesa9. Este tipo de abordagem vai também ser central numa das obras mais importantes no campo das relações internacionais sobre a temática em termos mais gerais do expansionismo – Myths of Empire de Jack Snyder10.

No caso de Portugal o volume de obras publicado no último século sobre a I Guerra Mundial é bem mais limitado do que internacionalmente – pouco mais de uma centena de publicações segundo o catálogo eletrónico da Biblioteca Nacional de Portugal. O que, mesmo que seja um registo incompleto, dá-nos a ideia de um interesse bem menor pelo tema11. Além de refletir a pequenez do país, tema recorrente neste ensaio, este é provavelmente também o resultado do Portugal de 1914 se encontrar relativamente aquém do limiar de desenvolvimento e massificação da educação, da literacia, da política de muitas outras potências envolvidas no conflito. Pode ainda refletir a perceção de se tratar de um episódio muito negativo na história nacional a ser convenientemente esquecido. Ora, um conflito que resultou num sacrifício/custo em número de mortos portugueses que em quatro anos ultrapassou as baixas mortais sofridas em mais de uma década das Guerras da Descolonização de 1961-1974 certamente merece ser devidamente analisado, sobretudo se, a par do seu interesse histórico intrínseco, se olhar para ele como revelador de grandes tendências das relações internacionais.

Pode-se dizer sinteticamente que, apesar das diferenças, a discussão portuguesa sobre a Grande Guerra também tem sido dominado pela questão da culpa pela desastrosa experiência portuguesa de participação na I Guerra Mundial. Pois apesar de Portugal fazer parte da coligação vencedora do conflito, a Grande Guerra tem sido consensualmente vista, no caso português como no italiano ou grego, como uma vitória pírrica. A questão tem portanto sido a de saber se a culpa por este fracasso custoso deve ser atribuída principalmente ao PRP – Partido Democrático liderado por Afonso Costa e à sua temerária insistência na participação portuguesa na guerra; e sobretudo no voluntarioso envio de um Corpo Expedicionário Português para o teatro de operações mais exigente do conflito do ponto de vista militar – seja em termos de equipamento, seja de organização – a Frente Ocidental, as trincheiras da Flandres. Ou se, pelo contrário, a culpa residiu fundamentalmente na tomada do poder por Sidónio Pais no golpe militar de dezembro de 1917 e na alegada germanofilia sidonista, resultando no, mais ou menos deliberado, enfraquecimento do Corpo Expedicionário Português. O porquê do colapso da frente portuguesa perante a ofensiva alemã de abril de 1918 na dita Batalha de La Lys foi o tema de polémicas violentas ainda durante o conflito e no imediato pós-guerra, mas que se foram mantendo até bem mais recentemente. A tendência na historiografia portuguesa pós-25 de abril pode provavelmente ser sintetizada assinalando que tem ido no sentido de integrar de forma mais rigorosa o debate sobre a I Guerra Mundial no debate mais geral sobre a I República, onde surge como um tema recorrente, mas geralmente subordinado ao de perceber-se as razões da queda do primeiro regime republicano, para a qual contribuiu12.

A tendência mais recente a nível internacional – exemplarmente expressa, nomeadamente, numa obra de grande difusão como The Sleepwalkers de Christopher Clark , tem sido no sentido de questionar o paradigma alemão dominante, que, no entanto, ainda tem defensores de vulto, sobretudo pelo questionar da pertinência de uma análise em termos de culpa, e pelo alargamento do foco de análise para além da Alemanha, olhando com muito mais atenção para as outras Grandes Potências europeias, nomeadamente a Rússia, a Grã-Bretanha e a França13.

No caso mais específico do debate no quadro da disciplina das relações internacionais sobre este tema ele tem sido animado pela tentativa de cruzar desenvolvimentos mais recentes na historiografia sobre a I Guerra Mundial – nomeadamente o questionar da prevalência da crença generalizada numa guerra dominada por rápidas ofensivas – no sentido de saber qual o seu impacto na caracterização dominante deste conflito como muito determinado por um culto da ofensiva alimentando uma preferência nos estados-maiores por uma guerra preventiva14.

Também no caso português se tem notado algum esforço para ultrapassar esta questão da culpa a favor de uma visão mais complexa, desfazendo alguns mitos – foi assim, por exemplo, com as duas obras ambiciosas dedicadas especificamente à I Guerra Mundial, de Severiano Teixeira e de Ribeiro de Meneses. Este último refere-se mesmo expressamente a como seria interessante olhar comparativamente para a questão da polarização opinião sobre a intervenção ou não-intervenção na I Guerra Mundial no caso de Portugal com a Espanha, Itália ou Grécia15.

O facto é que, até ao momento, os debates, internacional por um lado, e nacional pelo outro, se desenvolvem em grande parte de costas voltadas. Se António Telo mostrou a importância geoestratégica do Atlântico português no contexto internacional em que se situa a I Guerra Mundial, este facto foi aparentemente ignorado pela literatura internacional sobre o conflito16. E a exceção que confirma a regra – até por a obra ter sido publicada também em francês – é o livro de Severiano Teixeira. Mas que se trata realmente de uma exceção é-nos confirmado pelo próprio historiador francês que prefacia a obra sublinhando a total ignorância sobre o tema da participação portuguesa na guerra entre os historiadores estrangeiros do conflito17. A obra em inglês de Ribeiro de Meneses sobre Afonso Costa na Conferência de Paz de Versalhes, pode contribuir para contrariar essa tendência, mas deve ser visto como uma segunda exceção a confirmar a regra da ignorância mútua destes debates18.

Diga-se que nisso Portugal não está sozinho. Outras Pequenas Potências, mesmo com um impacto mais evidente e maior na guerra, nomeadamente no seu desencadear, como a Sérvia e a Bélgica, não merecem praticamente atenção19.

Apesar da enorme abundância da literatura sobre a I Guerra Mundial, algo que realmente falta é um real reconhecimento ou até conhecimento do papel das Pequenas e Médias Potências nas origens, dinâmicas e fim da I Guerra Mundial. Uma forma particularmente interessante de cruzar o debate nacional e internacional sobre a I Guerra, contribuindo para alargar a forma como as relações internacionais olham para o conflito, é analisar o caso de Portugal na perspetiva do papel e dos desafios enfrentados pelas Pequenas e Médias Potências no quadro de uma grande guerra. Aqui iremos apenas apontar algumas das implicações analíticas, das pistas interpretativas deste tipo de abordagem.

 

O que são Pequenas Potências? E, por definição, não será limitada a sua autonomia e nulo o seu impacto sistémico, especialmente no caso de Grandes Guerras envolvendo Grandes Potências?

Naturalmente não é possível responder aqui de forma aprofundada a estas questões. Desde logo por elas remeterem para o tema fundamental mas muito genérico e complexo da definição do poder nas relações internacionais em geral, e da dificuldade específica de quantificar claramente o poder dos estados e de os classificar e ordenar em função disso de uma forma inequivocamente relevante para a sua ação política internacional20.

Mas dois pontos fundamentais merecem, ainda assim, ser sublinhados. O primeiro é o de que o poder é cada vez mais entendido nas relações internacionais e na ciência política como algo complexo, multidimensional e não simplesmente material. Esta tendência está bem representada pela moda no contexto das relações internacionais de etiquetas como a de soft power. O que nos importa é que esta tendência ajuda a perceber melhor o papel, ação, impacto das Pequenas Potências, pois mostra que apesar de se terem limitações materiais e/ou de dimensão, podem ter, ainda assim, outras capacidades relevantes no quadro da política internacional21.

O segundo é que a tentativa de elaborar definições muito precisas e quantificáveis de Pequenas (ou Médias) Potências muitas vezes «são altamente artificiais». A principal diferenciação é, em todo o caso, entre Grandes Potências e as restantes potências e mesmo esta linha divisória mais clara nem é total e inequivocamente clara. A definição mais operativa neste campo é, em todo o caso, negativa. E tem sobretudo que ser vista em termos de estados relativamente mais fracos do que outros e não de uma dimensão absoluta. Por outras palavras, um grande território – por exemplo, um grande império colonial, como o português em 1914 – pode esconder grandes fraquezas, a começar pela dificuldades em controlar, defender e explorar esses vastos domínios, e em mobilizar os seus recursos eficazmente. Isto também significa que o poder tem acima de tudo uma dimensão relacional. Devemos, portanto, perguntar sobretudo: Potência mais fraca relativamente a quem? E mais especificamente no caso de conflitos armados devemos perguntar: Poder para se defender contra quem? Poder para se defender de que forma (bem organizada, motivada, com elevada mobilização de todos os recursos; ou ainda, de forma convencional ou não convencional)? E poder para se defender com a ajuda de quem (com que aliados)?22

Em suma, e no mínimo, devemos ter o cuidado de rastrear historicamente qual o papel que as Pequenas Potências efetivamente tiveram num conflito, e não simplesmente presumir a priori que ele foi completamente irrelevante.

Há, efetivamente, obras recentes sobre política e segurança internacional que revelam uma consciência crescente da necessidade de ter em conta as Pequenas e Médias Potências e outros atores aparentemente pouco poderosos. Nem que seja para se compreender melhor as Grandes Potências e as aparentemente paradoxais mas bem reais limitações ao seu poder efetivo, mesmo ao nível dos conflitos armados – como a derrota estratégica dos Estados Unidos no Vietname em 1975, e da URSS no Afeganistão em 1989 demonstraram eloquentemente nas décadas finais da Guerra Fria, para cujo desfecho, aliás, muito contribuíram23. É assim em particular neste tipo de conflito, designados de conflitos assimétricos, cuja prevalência crescente tem obrigado a prestar real atenção mesmo a atores a priori mais fracos no teste último do poder na política internacional que é o recurso à força. Afinal se até organizações não estatais, como grupos terroristas – que, aliás, tiveram o seu papel na crise que levou à guerra em 1914 – merecem atenção, e podem ter impacto significativo na segurança internacional, como negar que isso pode também ser assim com Pequenas Potências, com estados que não são Grandes Potências?24 Mas o que poderá levar estados mais fracos a envolver-se ou até mesmo a iniciar uma grande guerra com Grandes Potências? De que forma podem eles ter um papel significativo? São estes os pontos quer iremos procurar esclarecer olhando para o caso de Portugal, mas também para os casos particularmente relevantes na I Guerra Mundial da Sérvia e da Bélgica, a par de ocasionais referência a outras Pequenas Potências.

 

A I Guerra Mundial mostra que mesmo Pequenas Potências relativamente fracas podem ter um grande impacto em Grandes Guerras

É sobretudo, mas não apenas, assim na sua fase inicial, e por via da Sérvia e da Bélgica. O envolvimento de Portugal na I Guerra Mundial permite mostrar a autonomia mesmo de potências muito enfraquecidas face às Grandes Potências e o seu impacto agregado no processo de difusão global de um conflito de tipo. O fenómeno de contágio é uma característica fundamental definidora deste tipo de conflito – que inevitavelmente rapidamente esgota o número limitado de Grandes Potências, sendo que neste caso, todos os estados inequivocamente com esse estatuto estavam envolvidas desde o início do conflito e portanto para se tornar realmente grande tipicamente requer o envolvimento de Pequenas e Médias Potências25. Mais especificamente a I Guerra Mundial mostra que pequenos estados, em particular, mas não exclusivamente, aqueles que patrocinam formas não convencionais de conflito, podem ter um impacto sistémico. É assim nomeadamente por meio das reações em cadeia que ataques não convencionais podem provocar – mais ou menos deliberadamente – em Grandes Potências; mas isso não anula a importância e a autonomia das ações de provocação ou das reações e opções das Pequenas Potências. É o que procuraremos demonstrar referindo primeiro o caso da Sérvia e depois o da Bélgica, antes de nos debruçarmos sobre o caso de Portugal.

A importância sistémica do conflito entre a Sérvia e o Império Austro-Húngaro deve ser visto no contexto da divisão da Europa em dois blocos relativamente rigidamente alinhados de Grandes Potências. Nesse quadro, o risco de colapso ou grave enfraquecimento da Áustria-Hungria, e a consequente expansão da preponderância da Rússia nos Balcãs teria tido um grande impacto no equilíbrio de poder na Europa. Iria deixar a Alemanha isolada em termos de alianças com Grandes Potências. Este é precisamente o argumento central da carta do imperador Habsburgo Francisco José apelando ao apoio do kaiser Guilherme II e da Alemanha

«O ataque contra o meu pobre sobrinho [o arquiduque Franz Ferdinand] é a consequência direta da agitação feito pelos russos e sérvios pan-eslavistas cujo único objetivo é o enfraquecimento da Tríplice Aliança [Alemanha, Áustria-Hungria e Itália] pela destruição de meu império». O argumento do risco de isolamento foi depois usado também pelo Governo central alemão numa circular explicando a entrada em guerra aos estados federados parte do Império Alemão»26.

Mas é crível que o imperador Habsburgo, dominando boa parte da rica Europa Central, se sentisse realmente ameaçado pela pequena e pobre Sérvia? É certo que o seu chefe do Estado-Maior, o marechal Conrad von Hötzendorf, há muito que vinha defendendo a necessidade de uma guerra preventiva contra a Sérvia. Mas porquê? E sobretudo, porquê só em 1914 conseguiu concretizar o seu objetivo. A verdade é que o velho imperador Francisco José tinha assistido durante o seu longo reinado, iniciado em 1848, à unificação pela força da Alemanha pela Prússia e da Itália pelo Piemonte, em ambos os casos à custa de interesses e territórios dos Habsburgo. Piemonte era precisamente o nome do jornal ultranacionalista da organização (não muito) secreta União ou Morte – mais conhecida por Mão Negra – dirigida pelo chefe dos serviços secretos militares sérvios, coronel Dimitrievic, implicada no atentado de Sarajevo de 28 de junho de 1914. Nas páginas desse jornal defendia-se na edição saída no próprio dia do assassinato de Francisco José que os sérvios deviam continuar na Bósnia o tipo de ação violenta no sentido de (re)unificar todos os territórios sérvios que tinha resultado nas Guerras Balcânicas de 1911-1913 e na duplicação do território da Sérvia27.

Não seriam, porém, as Grandes Potências impulsionadas por um culto da ofensiva e uma corrida armamentista que fazia uma guerra preventiva parecer atraente, ou, pelo menos, inevitável? Não estariam as Pequenas Potências simplesmente a servir de pretexto para os falcões, i.e., os partidários de guerra preventiva no seio das Grandes Potências, como o já referido Conrad em Viena, ou o seu famoso colega o general Moltke Jr., Chefe do Estado-Maior da Alemanha? Se a resposta for sim, isso significará que as Pequenas Potências como a Sérvia ou a Bélgica não são verdadeiros atores mas meros gatilhos da guerra?

Um autor como McMeekin na sua obra recente sobre o papel destes falcões nas decisões da Rússia relativamente ao desencadear da I Guerra Mundial defende que «seria naïf acreditar que a Rússia realmente entrou em guerra em 1914 para defender a Sérvia. Grandes Potências não mobilizam por regra exércitos de milhões para proteger a integridade territorial de pequenos estados-satélite28. Este é provavelmente o principal argumento contrário às teses que aqui defendemos.

Mesmo que as Pequenas Potências fossem os pretextos da guerra, ainda assim alguma importância teriam. Não se pode disparar sem gatilho apesar de uma arma de fogo ter outros componentes. Uma grande guerra precisa de um catalisador mesmo que necessariamente envolva, até pela sua dimensão, múltiplos fatores e atores. As ações das Pequenas Potências podem não ser causas suficientes, mas ainda providenciar causas necessárias da Grande Guerra de 1914-1918. Ou seja, este argumento não retira às potências mais fracas alguma capacidade de ação efetiva, pois significa que nem tudo depende das intenções ou objetivos das Grandes Potências, nem que seja por precisarem de pretextos para agir que não dependem inteiramente de si.

Isso é tanto mais assim quanto é possível argumentar que os falcões de Grandes Potências como a Rússia estavam sendo usados por uma Pequena Potência revisionista como a Sérvia para atingir os seus próprios objetivos estratégicos, que a elite política de Belgrado sabia serem impossíveis de alcançar pacificamente. Por exemplo, o chefe da representação diplomática russa em Belgrado, barão Hartwig, é descrito pelo mais importante historiador das origens da I Guerra Mundial, Albertini, como um «pan-eslavista fanático» que parecia ter dificuldade em distinguir entre interesses nacionais sérvios e russos; a ponto de ser descrito por vários dos seus colegas diplomatas, inclusive de estados aliados da Rússia como a França, como sendo por vezes mais representante da Sérvia na Rússia do que o contrário29.

O facto de os governantes sérvios terem permitido o tipo de organizações nacionalistas envolvidas no assassinato do herdeiro do trono dos Habsburgos, por outro lado, foi uma opção sérvia vital para dar ao general Conrad em Viena um casus belli consensual que até então lhe tinha escapado; nomeadamente por via do veto a políticas belicistas por parte do Governo húngaro no quadro da dupla monarquia dos Habsburgo, e até, suprema ironia, pela oposição do próprio arquiduque Francisco Fernando. O herdeiro do trono assassinado em Sarajevo receava um conflito com a Rússia e desejava reformar a monarquia danubiana para apaziguar e integrar plenamente os eslavos no seio do Império Habsburgo. Como ato de provocação belicista dos terroristas ultranacionalistas sérvios, de facto, nada fazia mais sentido do que assassinar o arquiduque Francisco Fernando30. Mais, o que teria acontecido a todos estes eventuais falcões se a resposta do Governo da Sérvia ao ultimato austríaco tivesse sido aceitá-lo plenamente? Essa foi uma possibilidade real. No entanto, foi tão hábil a resposta evasiva do chefe do Governo sérvio, Pasic, considerado um mestre neste jogo de duplicidade diplomática tão importante para as Pequenas Potências, «que não apenas a opinião pública europeia e as chancelarias da Entente, mas até o kaiser Guilherme [II] e o seu chanceler» tiveram a «impressão de uma capitulação total por parte da Sérvia, que deveria tornar possível uma saída pacífica para a crise». Albertini, por sua vez, cita o insuspeito responsável diplomático austríaco responsável por redigir o ultimato apresentado por Viena em julho de 1914 à Sérvia, que lhe testemunhou a sua impressão de que a resposta do Governo de Belgrado era «o melhor exemplo de habilidade diplomática que conheço». De facto, a não ser que se compare cuidadosamente os dois documentos, a impressão é de uma total capitulação sérvia, que no entanto não cedeu no ponto fundamental do ultimato de Viena que lhe permitiria investigar diretamente o poderoso Estado secreto sérvio, e qualifica sempre todas as demais cedências «ao que seja compatível com o direito internacional», o que permitiria depois renegar as aparentes concessões31.

A elite decisória da Áustria-Hungria parece ter acreditado sinceramente que não podia correr o risco de, mais uma vez, aceitar simples compromissos formais do Governo da Sérvia – que tinham sido repetidamente reafirmados, em vão, desde o golpe nacionalista radical em Belgrado em 1903 – e que, na prática, permitiam ao Estado paralelo e secreto sérvio controlado pelos golpistas ultranacionalistas continuar a dominar o Exército, a guarda fronteiriça ou os serviços secretos. Era portanto lógico Viena exigir condições draconianas, inclusive de interferência nos assuntos internos sérvios, para ter garantias de ser capaz de monitorizar mais eficazmente as redes clandestinas anti-Habsburgo. Um dos mais importantes historiadores sérvios – embora negando a responsabilidade do Governo de Belgrado no atentado de Sarajevo e recusando dar razão a Viena na disputa que culminou na declaração de guerra em 1914, no entanto nota que “havia sinais de um poder paralelo na Sérvia, especialmente na sua política para com a Áustria-Hungria, com o coronel Dimitrievic «e outros ativistas da Mão Negra […] a espalhar a sua rede de agentes pela Bósnia-Herzegovina». O mesmo autor sublinha o peso de uma forte corrente na cultura política e estratégica sérvia favorável à utilização de meios não convencionais que o sucesso do nacionalismo violento italiano e alemão tinha reforçado32. Note-se que, por outro lado, este tipo de duplicidade e de utilização de meios não convencionais fazia todo o sentido na estratégia de uma Pequena Potência revisionista como era a Sérvia.

O ponto fundamental, porém, é que as Grandes Potências europeias, em 1914, simplesmente não estavam acostumadas a tomar a sério atores não convencionais; a valorizar aquela que veio a ser uma das maiores ameaças à segurança internacional dos séculos XX e XXI – estados fracos que patrocinam, treinam, armam grupos de terroristas e de guerrilha para atingirem de forma violenta objetivos revisionistas. A Sérvia foi, portanto, capaz de tirar o máximo partido da sua fraqueza. Belgrado procurou sempre apresentar o ultimato de Viena como um Diktat desproporcionado que escondia ambições geopolíticas de expansão – quando, na verdade, sobretudo o governo húngaro a última coisa que queria era ter mais eslavos a desequilibrar a dupla monarquia. O Governo sérvio pôde portanto procurar apoio das Grandes Potências apelando ao seu «sentimento de justiça» contra a Áustria-Hungria e a Alemanha «em uma luta desigual». O grande objetivo sérvio era garantir que a haver uma guerra ela não ficaria sozinha. Era logicamente vantajoso para Belgrado uma escalada e um contágio do conflito, por forma a envolver ao seu lado contra uma Grande Potência o máximo possível de aliados de peso igual ou superior, em particular a Rússia e a França.

A Bélgica é a outra Pequena Potência com um papel destacado nas origens da I Guerra. Quanto a ela é sem dúvida possível argumentar que é um exemplo da ausência de escolha das Pequenas Potências pois foi invadida pela Alemanha no início do conflito numa tentativa de contornar as defesas francesas. Mas se a Bélgica evidentemente não escolheu ser invadida, teve ainda assim que fazer uma escolha decisiva: combater ou não, e ao lado de quem? Os decisores belgas tiveram doze horas para aceitar ou rejeitar o ultimato alemão de 1 de agosto de 1914. O Conselho do Reino – composto por políticos de todos os partidos com representação no parlamento – convocado por Alberto I decidiu unanimemente rejeitá-lo. Nele Berlim exigia aos belgas a passagem das tropas alemães por uma pequena faixa sul do território belga em troca da garantia de inviolabilidade do resto da Bélgica33.

É legítimo perguntar o que teria sucedido se os belgas tivessem aceite – mais ou menos voluntariamente – os termos do ultimato alemão? Para responder importa recordar que o dito ultimato nomeadamente alegava que a França também estava na iminência de invadir o território belga. E sobretudo importa ter em conta o impacto da decisão belga numa Grã-Bretanha pouco decidida a entrar na guerra, sendo ainda menos certo enviar rapidamente um corpo expedicionário para combater na guerra terrestre no continente europeu34.

O Governo liberal britânico estava muito dividido. Uma série de ministros importantes eram favoráveis à rápida entrada da Grã-Bretanha no conflito por temerem o impacto de uma vitória alemã no equilíbrio de poder na Europa, mas estavam em minoria. Ainda em 31 de julho de 1914 um ministro-chave tinha passado uma nota durante uma reunião governamental britânica: «é claro que este gabinete não vai participar da guerra» europeia claramente iminente. Porém, a 2 de agosto de 1914, o mesmo Conselho de Ministros britânico decidiu que «se se verificar uma violação substancial da neutralidade da Bélgica seremos obrigados a tomar medidas». Nesse mesmo dia, Lloyd George, numa reunião informal dos ministros britânicos favoráveis à neutralidade, dos quais era o líder de facto obteve o compromisso no sentido de que «não estamos preparados para entrar na guerra presentemente, mas que certos eventos poderiam levar-nos a reconsiderar [...] como seja a invasão total da Bélgica». O que é importante sublinhar é como são qualificadas estas declarações britânicas relativas à Bélgica – a violação da sua neutralidade tinha que ser substancial e a invasão total35.

Esta divisão no seio do Governo britânico deu, portanto, um impacto muito grande à decisão da Bélgica de recusar taxativamente a tentativa da Alemanha a coagir a aceitar o trânsito do seu território pelas tropas alemães sem que o considerassem uma invasão. A entrada da Grã-Bretanha e de todo o seu vasto império global no que se transformou muito por isso na I Guerra Mundial resultou diretamente de um apelo formal da Bélgica ao auxílio britânico.

O ministro britânico dos negócios estrangeiros, Sir Edward Grey, teve o cuidado de justificar a entrada na guerra lendo perante o Parlamento britânico um telegrama enviado pelo rei dos belgas, Alberto I, apelando em termos dramática à ajuda britânica. Londres respondeu com um ultimato para a Alemanha retirar completamente desse país do outro lado do canal da Mancha, que Berlim rejeitou, alegando imperiosa necessidades estratégica e rejeitando como um mero pedaço de papel o Tratado de Londres que formalmente garantia o respeito das Grandes Potências pela neutralidade e integridade territorial da Bélgica. Este facto garantiu que como refere um dos historiadores a abordar mais a fundo a questão «a defesa dos pequenos estados» foi a «ponte», se se quiser a bandeira, que permitiu a quase todo o Governo liberal e uma grande maioria do Parlamento britânico apoiar a entrada na guerra sem perder a face «e matar à nascença um potencial movimento antiguerra altamente polarizador»36.

Mais a decisão da Bélgica de resistir militarmente ao avanço alemão pelo seu território atrasou e enfraqueceu a ofensiva alemã visando envolver Paris e forçar a rápida rendição da França. Sem este concurso belga e, por essa via, também britânico, é legítimo questionar se o significativamente chamado Milagre da Batalha do Marne que parou in extremis a ofensiva inicial alemã teria tido lugar. O que sabemos é que ele efetivamente exigiu a conjugação de todos os esforços, não só franceses, mas também belgas e britânicos. Sendo de notar que o corpo expedicionário britânico começou por ter o mesmo número de homens equivalente ao do exército belga – 150 mil homens. Este último ponto é fundamental para nos recordar que, mesmo no decurso de uma guerra em tão grande escala como a I Guerra Mundial, pequenos estados podem fazer pender a balança em momentos-chave entre os blocos militares muito equilibrados de Grandes Potências. Podem também forçar uma decisiva dispersão de forças. Dois corpos do Exército alemão ficaram fixados na ocupação e na frente belga. E mesmo com o seu território invadido podem continuar a lutar ao lado de aliados, e impor ocupações custosas, militar e politicamente. A Alemanha nunca recuperou ao nível da importante guerra de propaganda, nomeadamente em muitos estados ainda neutros, como seja Portugal ou os Estados Unidos, da violação da neutralidade da Bélgica. A primeira intervenção americana significativa na I Guerra Mundial foi uma operação de ajuda humanitária maciça, coordenada pelo futuro Presidente Hoover, para alimentar os belgas famintos sob ocupação alemã. É fácil imaginar o seu impacto na perceção de ameaça americana relativamente à Alemanha37.

Em Portugal a perceção de ameaça alemã foi também colorida pela invasão da Bélgica. Pode-se mesmo afirmar que ela abriu uma janela de oportunidade para os defensores portugueses da intervenção militar na frente europeia, que não pôde ser aproveitada por manifesta incapacidade de lhe dar uma resposta militar pronta. Mesmo o futuro opositor da intervenção Machado dos Santos parecia disponível em outubro de 1914 para lutar pela Bélgica, e o moderado Teixeira Gomes, embaixador em Londres comentou de forma exemplar a questão:

«Não havia na Europa nação cujos interesses fossem mais contrários, do que os de Portugal, ao estado de guerra, para o qual de resto não tínhamos a menor preparação. A forma como a Alemanha iniciou a presente campanha, violando sem hesitação nem escrúpulo a neutralidade de duas pequenas nações […] logo deu aos países mais mal defendidos a exata sorte que lhes estava reservada caso a Alemanha vencesse. Portugal dadas as conhecidas aspirações da Alemanha no que respeito às suas colônias africanas [...] seria sem dúvida uma das primeiras vítimas da Alemanha vitoriosa»38.

Mais, à luz da invasão alemã não provocada da Bélgica, cuja neutralidade garantida por tratado, que credibilidade podia ser dada, mesmo pelos mais céticos quanto a um envolvimento português no conflito, aos desmentidos alemães de que os confrontos armados no Sul de Angola, culminando no desastre de Naulila, em 1914, tivessem sido de iniciativa germânica? Tanto mais quanto as ambições territoriais alemãs relativamente a colónias portuguesas eram amplamente conhecidas.

É, aliás, significativo que ainda que houvesse muitos grupos políticos portugueses que se tenham oposto à entrada portuguesa na guerra, sobretudo na Europa, era impossível encontrar defensores públicos da beligerância portuguesa ao lado da Alemanha – a germanofilia, em Portugal, ou era uma simpatia privada, ou uma era acusação feita a adversários políticos. Este é um facto que merece ser sublinhado e em que Portugal se assemelha aliás a outros países, por exemplo os tão significativos Estados Unidos.

Mas pode Portugal ser realmente comparado à Sérvia ou à Bélgica? Evidentemente que não em termos de importância no desencadear do conflito. Mas sem o efeito de contágio do conflito, necessariamente, como vimos, envolvendo estados que não eram Grandes Potências, esta guerra não seria tão grande, nem tão global. Além disso nunca é demais sublinhar que mesmo potências fracas como Portugal têm formas importantes ainda que indiretas de contribuir para o esforço de guerra – através da concessão de livre passagem por territórios estratégicos, concessão de bases, acesso a recursos estratégicos. Um ponto amplamente demonstrado por António Telo relativamente a Portugal, por exemplo, por via da centralidade estratégica dos Açores, dos seus portos e águas territoriais, dos cabos de telégrafo que neles passavam39.

Um exemplo disso mesmo foi o facto de que na situação militar muito difícil da França, em outubro de 1914, os líderes militares e políticos franceses consideraram que mesmo a pouca artilharia moderna do Exército português podia fazer-lhes falta. Ou que no início de 1916, perante a erosão colossal das marinhas aliadas pelos ataques dos submarinos alemães, os governos de Paris e Londres consideraram que as muitas dezenas de navios dessa nacionalidade que se tinham refugiados nos portos de Portugal, das suas ilhas e do seu império podiam fazer diferença. Ou ainda, que, perante a erosão terrível das forças aliadas e a continuada ocupação do Norte de França pela Alemanha, os militares e políticos franceses considerassem que mesmo algumas dezenas de milhares de tropas portugueses, mesmo com relativa falta de treino e de equipamento ainda assim poderiam ajudar a atenuar esse desgaste, dando o apoio que os falcões no Governo português precisavam para impor os seus pontos de vista sobre a beligerância portuguesa e sobre a participação de tropas portuguesas na frente ocidental ao muito relutante Governo de Londres. Se essa foi uma opção sensata é outra questão, mas que o fica claro que a política belicista de Afonso Costa e dos seus seguidores mais uma vez demonstra que mesmo uma potência muito enfraquecida pode prosseguir uma estratégia própria numa grande guerra40.

Mas será que podemos levar o paralelismo mais longe e ver Portugal como um vizinho vulnerável da Alemanha como o era a Bélgica? Será que Portugal pode ser visto como uma potência revisionista e até como um Estado protetor do terrorismo como a Sérvia? Por paradoxal que pareça a resposta é, em parte, sim. Portugal nas suas colónias em África foi invadido por tropas alemãs. Também os governantes portugueses responderam apelando à Grã-Bretanha e manifestando a vontade de serem cobeligerantes e não simplesmente neutros até por questões de honra, que numa sociedade em que os duelos em defesa da mesma ainda eram uma realidade parece-nos ser de ter em conta, seria um anacronismo simplesmente ignorar esta dimensão. Ao mesmo tempo é verdade que um reforço do poder alemão mediante uma vitória esmagadora das suas tropas na Europa, como pareceu bem possível em 1914, e mesmo depois, dificilmente deixaria de ter reflexos negativos nas regiões vizinhas do poder alemão, o que em África significava Angola e Moçambique, territórios abertamente cobiçados por Berlim.

É verdade que em contraste com a Sérvia, Portugal parecia uma potência satisfeita com o statu quo... Mas essa é uma leitura superficial, ou pelo menos parcial. Não se pode ignorar a insegurança de Lisboa quanto à possibilidade de manter o seu império: mesmo o jovem regime republicano tinha razões para temer uma ordem internacional imposta pela Alemanha vitoriosa em 1914, ou mesmo numa paz negociada, como pareceu provável nos anos seguintes. A República portuguesa estava territorialmente relativamente satisfeita, mas não afastava no seu voluntarismo e cegueira nacionalista alguns ganhos territoriais em África. Sobretudo era um regime novo, uma república considerada radical, nomeadamente no seu anticlericalismo, politicamente revisionista numa Europa de monarquias confessionais. A Áustria justificava a guerra dizendo que não tinha alternativa a combater um estado regicida como a Sérvia – que tinha morto o herdeiro Habsburgo em 1914 e o seu próprio rei moderado sérvio no golpe de 1903. Ora o regicídio português de 1908 era tido como um evento fundador do novo regime português, que o honrava oficialmente, algo que as casas reinantes das respeitáveis monarquias europeias não se cansavam de recordar. Era também conhecido o desejo do rei de Espanha Afonso XIII de intervir em Portugal, argumentando que o regime republicano português era uma ameaça para a paz europeia41. Se a Sérvia fosse punida pela guerra pelos seus crimes contra a ordem monárquica estabelecida, era natural que a situação da República portuguesa não fosse percecionada como segura. Mesmo que estas perceções de ameaça pela elite governante republicana fossem erradas – e pelo menos relativamente ao Império Português, e mesmo a uma eventual ameaça espanhola, não o eram inteiramente – ainda assim parece natural que elas tenham condicionado comportamentos e decisões42.

Portugal, tal como a Bélgica e a Sérvia, também tinha interesse, caso entrasse no conflito, de não ficar inteiramente dependentes de uma única Grande Potência e em participar de pleno direito, ter uma voz na Conferência de Paz, procurando evitar que dela viessem surpresas desagradáveis. Este foi, aliás, um cálculo sempre muito presente na difusão do conflito por outras Pequenas e Médias Potências como a Grécia ou a Roménia. É de notar a este respeito, que relativamente ao fim desta Grande Guerra, a necessidade de as Grandes Potências Aliadas não deixarem cair a Bélgica e a Sérvia foram obstáculos importantes na possibilidade de uma paz negociada. E que a entrada da Grécia e a reentrada da Roménia na guerra na Frente Leste, levando ao colapso da Bulgária, no verão de 1918, marcou o início do colapso dos impérios centrais que, logo a seguir a Sófia ter pedido armistício em setembro de 1918, decidiram pediram também elas o armistício. A ironia deste facto, do ponto de vista da análise de participação portuguesa na guerra, é que em Portugal se recusou a possibilidade de enviar um corpo expedicionário para esta Frente Leste europeia por ser vista como marginal e de segunda ordem.

A real importância e autonomia das Pequenas Potências, não significa, importa sublinhar, que tal como o caso de Portugal demonstra, a sua participação numa Grande Guerra não seja muito arriscada, devido à sua limitada margem de manobra. É verdade que a Sérvia conseguiu transformar-se no núcleo da ambicionada Jugoslávia, no que se pode qualificar provavelmente na maior e mais improvável vitória estratégica da I Guerra Mundial, enquanto o Império dos Habsburgos desapareceu, mas a Sérvia perdeu quase metade da sua população masculina e em 1916 viu todo o seu território ser ocupado pelo inimigo. Também grande parte da Bélgica foi sujeita a uma ocupação brutal durante quase toda a guerra. Mas o que é igualmente interessante é a resiliência destas Pequenas Potências e até dos derrotados, como a Bulgária. Isto, por contraste com a vulnerabilidade de Grandes Potências como o Império Habsburgo, o Império Otomano e a própria Rússia czarista, que entraram em colapso em 1917-1918. E entre as principais potências vencedoras, também a Itália ficou muito aquém do desejado. Como espantar-se que Portugal não tivesse conseguido quaisquer ganhos significativos? Nada perder já era um grande ganho, no caso português, tanto mais quanto o seu esforço para forçar a beligerância ativa a tinha impedido de obter quaisquer concessões prévias à entrada no conflito e o seu desempenho tinha confirmado as piores expectativas dos opositores em Londres e em Portugal de uma beligerância ativa, retirando-lhe trunfos negociais.

 

Quais as implicações desta análise da I Guerra Mundial para as Relações Internacionais?

Em primeiro lugar o caso da Sérvia, da Bélgica, mas mesmo de Portugal, na I Guerra Mundial, mostra que os sistemas internacionais com uma propensão para reações em cadeia (chain-ganging), são particularmente instáveis também porque são vulneráveis a uma escalada de conflitos violentos por contágio promovido por Pequenas Potências. Essa escalada terá provavelmente origem em potências revisionistas e revolucionárias como a Sérvia. Mas pode vir até de potências satisfeitas, pacíficas e normativamente exemplares, como a Bélgica, se se situarem em localizações estrategicamente muito importantes e vulneráveis ameaças ou invadidas por Grandes Potências e lhes forem dadas garantias de segurança formais por Grandes Potências.

É de notar que, ainda que houvesse no seio do partido dominante português – o PRP – Partido Democrático – uma forte corrente favorável à entrada de Portugal na guerra com o envio de um contingente para a Frente Ocidental na Europa, no entanto, nem mesmo Afonso Costa o chefe dessa corrente de falcões alguma vez equacionou uma ação deste tipo que não fosse o resultado de um pedido formal britânico ao abrigo dos Tratados de Aliança bilaterais. Evidentemente que se pode questionar o realismo dos objetivos voluntaristas fixados pelos falcões do PRP-PD. Mas a «colagem agressiva» de Portugal à Grã-Bretanha que tem sido descrita pela historiografia portuguesa não é algo inesperado43. Num contexto de crescente militarização das crises europeias, de consolidação de blocos de alianças e risco de uma grande guerra ou de um grand bargain entre elas era uma resposta lógica da parte de Pequenas Potências procurar um grande protetor.

Pior do que uma grande guerra para uma Pequena Potência, é um conflito com uma Grande Potência em que esteja sozinha face a um poder militar muito superior. Perante essa possibilidade a Sérvia, a Bélgica, Portugal (em África) não hesitaram em procurar escalar o conflito e envolver uma ou preferencialmente várias outras Grandes Potências ao seu lado. Pois depender de uma única Grande Potência como aliada também tem riscos dada a assimetria da relação. Daí ser compreensível que os governantes mais ambiciosos da I República procurassem usar a Grande Guerra para reforçar as suas relações com a França a par da Grã-Bretanha, embora de uma forma que se revelou não ser de todo realista.

Assistimos portanto de forma clara no caso da Sérvia, da Bélgica ou de Portugal a uma dinâmica típica de chain-ganging44. De iniciação de um conflito assimétrico por uma Pequena Potência. Pois parece-nos claro que a declaração de guerra da Alemanha a Portugal foi o resultado de ações portuguesas visando deliberadamente o conflito com a certeza de apoio de uma Grande Potência. T. V. Paul lidou especificamente e em profundidade com estes paradoxos de iniciação `guerra por pequenos e mais fracos poderes identificando como essenciais as razões seguintes: 1. Os líderes acreditam que um objetivo/fait accompli estratégia militar limitada terá sucesso. 2. O Estado mais fraco possuir a curto prazo capacidades militares ofensivas que levam os políticos a acreditar que podem vencer, batendo em primeiro lugar. 3. Líderes acreditam que a sua aliança com uma Grande Potência limitará a escalada pelo adversário mais forte. 4. Um grupo militarista inseguro assume o controle. Destes fatores apenas o segundo parece completamente ausente nos casos que mais temos acompanhado, mas está provavelmente presente, por exemplo no caso da entrada da Itália em 1915 ou da Roménia em 1916. O terceiro está claramente presente em todos, sendo o quarto relevante no caso da Sérvia e de Portugal, mas também da Grécia de Venizelos45.

Como comparar a avaliação final do desempenho de Portugal face a outras Pequenas Potências? O que falhou então no caso de Portugal? Mais, e em termos de uma abordagem a partir das relações internacionais podemos dizer que o falhanço português na I Guerra Mundial deveu-se a um excesso de peso dos fatores mais ideacionais, ideológicos e identitários – nomeadamente de extremismo nacionalista – face a fatores realistas ligados a uma análise fria da posição de Portugal no sistema internacional? De facto, verificou-se no caso dos governantes portugueses do PRP-PD um forte voluntarismo revolucionária, mas que é típico de regimes nascidos de uma rutura revolucionário com a ordem interna, que são geralmente tentados a fazê-lo também face à ordem externa46. E a verdade é que em qualquer dos três casos – e mesmo noutros como o da Roménia, Bulgária ou Grécia – é o elemento ideacional ou ideológico e normativa nacionalista – de defesa da honra a par do interesse nacional – que parece prevalecer em termos de determinar a entrada destas Pequenas Potências em grandes conflitos. Numa lógica puramente de Realpolitik, de fria análise da relação de poder, provavelmente nenhuma das três fracas potências se teria arriscado a envolver no conflito. Isto não significa, no entanto, que a dimensão realista esteja completamente ausente, como já vimos no esforço para garantirem o apoio de Grandes Potências47.

Por outro lado, também há que admitir que uma decisão puramente realista do que fazer em situações limite deste tipo não é necessariamente evidente. Devia a Sérvia, em termos de Realpolitik, ter cedido ao ultimato da Áustria e da Bélgica ao ultimato alemão? Parece difícil de responder taxativamente de forma negativa. Quanto à Bélgica pareceu evidente a liderança da Alemanha que devia fazer uma opção por bandwagon for profit. O general Moltke tinha deixado isso bem claro num encontro, em 1913, com o rei Alberto I: «os países pequenos como a Bélgica fariam bem em juntar-se ao lado do mais forte se quiserem manter a sua independência». Sábio conselho? Ou a Bélgica seria engolida como mais um reino parte de um ainda maior Reich alemão, como os objetivos de guerra do chanceler alemão, de setembro de 1914, deixam entender. O general Gallet, chefe da casa militar do rei dos belgas registou a reação: «foi uma ameaça sem-vergonha». O rei Alberto I optou logo na altura, em 1913, por transmitir as informações sobre o perigo germânico à França. No entanto, um ano depois, o chefe da representação francesa em Bruxelas estava tão convencido de que sim, que tinha preparado já o esboço do telegrama a anunciar que a Bélgica tinha cedido ao ultimato alemão quando foi surpreendido pela resposta negativa dos belgas. O rei Alberto I explicou ao Exército belga que comandava a decisão de combater a Alemanha simplesmente afirmando «que se recusou a perder a nossa honra»48.

Também o primeiro-ministro Pasic da Sérvia deixou claro em resposta ao ultimato austríaco e sobretudo no seu apelo à ajuda de Grandes Potências amigas que não poderia ceder mais sem sacrificar a honra nacional49. E também, no caso de Portugal, este ponto foi muito enfatizado. Seria desonroso além de perigoso, para o novo Portugal republicano, não se envolver, manter-se à margem, cabia a Portugal, segundo o Presidente Bernardino Machado, «pleitear sempre na vanguarda da civilização».50

Esta dimensão ideológica ou normativa será sempre um problema? No caso português ela esteve claramente ligada a um voluntarismo excessivo e a uma visão irrealista das capacidades e das reais possibilidades do país, com o então ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Soares a referir-se à declaração de guerra da Alemanha a Portugal em 1916 como «a sorte grande» que nos garantiria «voz e voto na Conferência de Paz»51. Evidentemente que isso dependeria muito da efetiva capacidade portuguesa de contribuir para a vitória aliada.

Porém, ter um argumento sólido para defender a necessidade da guerra à luz das normas universais e nacionais parece-nos ser muito importante para alcançar a convicção necessária a mergulhar-se num conflito tão intenso e prolongado como uma guerra assimétrica. O grande problema é que na ausência de uma ameaça clara o apelo nacionalista pode não ser suficientemente credível. E um apelo ideológico partidário será mais fonte de divisões do que de unidade, como aconteceu no caso de Portugal – mas também no da Grécia. Enquanto no da Bélgica ou da Sérvia, apesar de evidentemente existirem algumas tensões e divisões, a unidade nacional em torno da prossecução da guerra nunca esteve em questão. Nestes casos era evidentemente que se tratava de uma questão não só de honra mas também de sobrevivência. Combinar a dimensão normativa e a realista da sobrevivência será portanto o ideal para responder com resiliência a uma Grande Guerra. Embora a primeira nos pareça mais importante, pois podia-se sempre argumentar, como acabamos de ver, que a resposta realista era ceder à pressão dos ultimata alemão ou austríaco. O que não era possível era argumentar que essa era a resposta honrosa. Do ponto de vista da posição de Portugal, as incursões alemãs na África portuguesa não foram claramente suficientes desse ponto de vista, até porque se podia argumentar e argumentou que deviam ser combatidas in loco e ser o foco de todas as atenções e esforços, sem desvio de forças portuguesas para operações militares na Europa.

Note-se que esta análise não excluiu uma dimensão da I Guerra Mundial também como guerra diversionária, ou seja, para desviar atenções para a ameaça externa para evitar ameaças internas. Mas também aqui não encontramos uma especificidade portuguesa. A guerra foi vista como servindo para consolidar o regime republicano em Portugal, mas também o czarista na Rússia, o imperial na Alemanha, ou a continuação da Irlanda no Reino Unido. Em todos esses casos, e não só no português, essa aposta acabou por falhar. Até porque, ao contrário, por exemplo da França ou da Bélgica, não houve qualquer esforço para incluir correntes políticas mais críticas – católicos e socialistas no primeiro caso, socialistas e liberais radicais no segundo – no campo da governação em Portugal. Esta falta de um verdadeiro governo de união nacional em Portugal foi uma fragilidade fundamental no esforço de guerra português52.

Não devemos simplesmente pôr de lado, portanto, o contributo da abordagem a partir do Primat des Innenpolitik, mesmo que se procure aqui qualificar, delimitar e comparar este aspeto. Desde logo no sentido de sublinhar que o primado não é a expressão adequada, esta não é a dimensão claramente única ou mesmo prevalente. Ela também não implica uma manipulação fria pelos decisores políticos – fossem eles Afonso Costa, Venizelos, Bratianu ou Pasic – que podiam, de boa fé, achar que esta renovada coesão nacional era expectável e até exigível para o bem do País para se atingir grandes objetivos nacionais, a par de para lhes facilitar a manutenção no poder53.

Há, no entanto, apesar de insistirmos nos muitos aspetos em que Portugal se aproxima de outras Pequenas e Médias Potências, uma diferença fundamental. Portugal ao contrário das outras Pequenas Potências europeias não combateu a partir do seu território. Todas as demais – a começar pela Sérvia (pelo menos enquanto tal lhe foi possível e depois na sua vizinhança imediata) e a Bélgica, mas também Bulgária, Roménia ou Grécia – ou foram invadidas ou invadiram a partir do seu território nacional. Estas forças tinham uma logística e uma legitimação muito facilitadas por combaterem a partir do seu próprio território e na defesa do mesmo. Além disso, todas elas tinham tido o cuidado de apostar no rearmamento intensivo dos seus exércitos, até mesmo a tradicionalmente neutral e pouco belicista Bélgica54. Mais, Portugal passou boa parte do período entre 1910-1914, a planear um exército miliciano de massas que mal passou do papel e uma grande esquadra oceânica ainda mais incomportável pelo orçamento nacional. O que criou tensões com o corpo de oficiais e não poderia nunca ser bem equipado com os meios disponíveis55. Mais, no caso do exército dos estados balcânicos, estes tinham convidado missões militares externas para ajudar a reorganizar e modernizar as suas forças que tinham tido experiência de combate nos anos imediatamente anteriores nas guerras balcânicas56.

Portugal foi a única Pequena Potência a tentar enviar e (supostamente) manter vastos corpos expedicionários – as exceções são extraeuropeias, os domínios britânicos, os EUA ou o Brasil57. O único caso minimamente comparável é o da Grécia e da decisão de enviar forças gregas para a península da Anatólia para procurar anexar uma parte do antigo Império Otomano no que é hoje a Turquia – mas, já na fase do imediato pós-guerra. Decisão que também acabou por se revelar desastrosa.

De facto, projetar poder militar em grande escala à distância, e sustentar depois essas forças por um período prolongado de tempo é sempre um enorme desafio, quer em termos materiais, quer em termos organizacionais, para qualquer potência e mais para uma Pequena ou Média Potência. Ora, Portugal não só o fez para África, como também para a Frente Ocidental e neste último caso numa escala nunca vista na história nacional até 1961. Claro que apesar do enorme esforço feito houve enormes falhas. Faltavam navios a Portugal e os tomados aos alemães tinham sido em boa parte cedidos aos britânicos como preço do apoio britânico à beligerância e do empréstimo necessário para a pagar. Além disso faltava espaço de desembarque de homens e meios nos lotados portos franceses, sobretudo quando começaram a chegar as tropas e equipamento norte-americano. Faltou ainda, por paradoxal que pareça, apesar do enorme esforço que foi mobilizar duas divisões, ainda outra para assegurar uma melhor rotação e descanso das forças na frente. Todos estes problemas se punham antes de dezembro de 1917, quando Sidónio Pais tomou o poder, embora se tenham agravado depois, em parte por razões que escapavam ao controlo de Lisboa, mas até, paradoxalmente, pela vontade deste último em aproximar-se de Londres o levar a pressionar menos no sentido de defender o CEP. No fundo, era com estes problemas que os opositores dos falcões, agrupados em torno de Afonso Costa, argumentavam. Até precisamente porque o apoio das Grandes Potências aliadas ao envio do CEP foi relutante ou mesmo forçado. Isso fica claro até na rapidez com que reconheceram Sidónio Pais após o golpe de dezembro de 1918, sendo este último inclusive «visitado» ainda com as forças revoltosas na Rotunda, pelo adido militar britânico58. Apesar de tudo algum realismo houve do lado português e aliado misturado com o voluntarismo na concretização de um objetivo excessivamente ambicioso. Houve alguma preparação prévia com a criação da Divisão de Instrução de Tancos, e a passagem dos quadros pelas escolas inglesas. As forças portuguesas foram colocadas num setor considerado calmo da linha da frente e foram poupadas – tal como as belgas – à participação nas grandes ofensivas Aliadas da guerra das trincheiras, em que num só dia era possível morrerem mais homens do que todo o CEP! Mesmo o colapso da frente portuguesa na dita batalha/desastre de La Lys, de 9 abril de 1918, além de provavelmente inevitável – toda a frente aliada visada frontalmente pela última grande ofensiva alemã da primavera de 1918 sofreu perdas e recuos – foi, apesar de tudo relativamente limitado no quadro da carnificina massiva da Frente Ocidental, com algumas centenas de mortos e alguns milhares de prisioneiros. E no entanto, foi o suficiente para que o CEP não ter sobrevivido enquanto força combatente, ao confirmar o esgotamento físico e moral das forças, e, sobretudo, os preconceitos dos demais aliados das tropas portuguesas não eram fiáveis como corpo autónomo. E se é verdade que, mesmo a Rússia entrou em colapso a par da Roménia, sendo ambas forçadas a assinar uma paz separada com os Impérios Centrais ainda em 1917. A verdade é que a Sérvia e a Bélgica conseguiram, pelo contrário, apesar de todos os reveses, manter uma força combatente até ao final da guerra – também porque isso era muito importante para a propaganda das Grandes Potências aliadas, o que não sucedia no caso português59.

Igualmente graves e potencialmente ainda mais arriscados para a estratégia nacional foram os desastrosos resultados das campanhas africanas, sobretudo em Moçambique; menos em Angola onde as forças portuguesas foram brutalmente eficazes na repressão do levantamento tribal no sul provocado pelos alemães, que entretanto já se tinham rendido a forças vindas da África do Sul. Portugal tinha experiência e créditos firmados créditos com as ocupações de final do século xix e início do século XX. Mas, sobretudo em Moçambique, por inexperiência dos soldados, incompetência dos comandos, corrupção nos abastecimentos, nomeadamente médicos – o caso mais notório foi o de comprimidos de quinino trocado por adulterações com farinha – e falta de doutrina formalizada, as baixas portugueses em Moçambique, foram enormes por doença – entre 25 por cento e 50 por cento dos efetivos, dependendo das expedições. Isto antes sequer de combaterem as forças de Askaris alemães. O que levou à tendência para paralisia e a ineficácia perante um adversário em inferioridade numérica como era o caso das forças alemãs na África Oriental. Mais uma vez a participação portuguesa longe de prestigiar o País veio confirmar os piores preconceitos no estrangeiro relativamente à eficácia do Estado e do colonialismo português60.

Ainda assim é preciso assinalar que no caso da África Oriental/Moçambique, não só as tropas portuguesas, mas todas as demais forças aliadas foram incapazes de derrotar um dos mais brilhantes líderes militares de todo o conflito, o general Lettow-Vorbeck. Este último utilizou táticas e um conceito operacional não convencional, próximo da guerrilha, numa zona vastíssima de África, pois passou à ofensiva sem se prender à defesa de qualquer território. Apesar disso cabe assinalar o contraste entre a desorganização e incapacidade portuguesa e as bem organizadas e bem comandadas forças belgas, que, a partir do Congo Belga se revelaram capazes de avanços sistemáticos e significativos nos territórios alemães da África Central e Oriental – simbolizados na vitória na Batalha de Tabora em plena Tanzânia. Esses ganhos não foram despiciendos no reforço da posição negocial belga na Conferência de Paz no final do conflito. Ainda assim a beligerância portuguesa terá contado alguma coisa para Bruxelas não conseguir a há muito ambicionada Cabinda portuguesa, mas foram suficientes para obter o Burundi e o Ruanda ex-alemães61.

Em relação precisamente à conclusão da I Guerra Mundial pode argumentar-se que a necessidade de não deixar cair a Sérvia e a Bélgica foram um importante obstáculo ao fim negociado da guerra. Mais, as tropas da Sérvia, reforçadas com um importante corpo expedicionário francês desembarcado em Salónica, e com suplementos importantes de forças gregas, e da Roménia, regressada ao combate ao lado dos Aliados, foram fundamentais para forçar a rendição da Bulgária no final de setembro de 1918. Este colapso da Frente Leste abria potencialmente o caminho para as forças Aliadas avançarem sobre Viena, precipitando a decisão Austríaca e Alemã de pedirem também um armistício.

Em suma, a vida das Pequenas Potências numa grande guerra está longe de ser fácil, mas ao mesmo tempo é impressionante a sua resiliência e impacto, mesmo quando sofreram enormes perdas humanas e territoriais – caso da Sérvia e Bélgica. Isto se, apesar delas, consigam continuar a combater ao lado de Grandes Potências. Um dos fatores que acabou por precipitar o final da I Guerra Mundial foi, portanto, resultado da adesão aos Aliados de várias Pequenas Potências balcânicas e do abandono pelos Impérios Centrais pela sua única Pequena Potência aliada a eles, a Bulgária, que nomeadamente assegurava a ligação estratégica vital por terra entre o Império Alemão, o Império Habsburgo e o Império Otomano. Num quadro evidentemente complexo em que outros fatores entraram evidentemente também em jogo, seria, sublinhamos mais uma vez, errado desvalorizar a resiliência e o impacto de Pequenas Potências numa grande guerra, fazendo pender a balança do poder para um lado ou outro dos blocos de beligerantes. Não foi esse, no entanto, o caso de Portugal, que também por isso acabou por não retirar grandes benefícios da sua participação na I Guerra Mundial.

***

Seria errado deduzir dos argumentos apresentados neste texto que as Pequenas Potências têm uma vida fácil numa grande guerra. O impacto, a autonomia e até os resultados estratégicos que possam vir a obter não são garantidos, e garantidamente não serão fáceis. O risco para elas é a priori maior, pois tem menos espaço de manobra – menos território, menos população e recursos – do que uma Grande Potência. Mas desde que as Pequenas Potências consigam numa grande guerra manter um forte governo de unidade nacional, uma força combatente, e uma população essencialmente leal (mesmo sob ocupação), e fortes aliados entre as Grandes Potências podem resistir com grande sucesso. O Portugal da I República esteve longe de atingir esse pleno na I Guerra Mundial. Talvez o maior indicador do falhanço da ambiciosa estratégia portuguesa seja o facto de a Espanha neutral ter conseguido ser eleita para o Conselho Permanente da nova Sociedade das Nações ao contrário de Portugal apesar de todos os protestos de Afonso Costa na Conferência de Paz. No entanto manteve o regime republicano e o seu vasto território colonial.

Há um ponto relativamente ao qual até provavelmente os mais céticos sobre o impacto de Pequenas Potências numa grande guerra aceitarão que elas fazem uma escolha importante: aliar-se com qual Grande(s) Potência(s) envolvida numa grande guerra? No contexto específico da I Guerra Mundial uma questão particularmente interessante é a de saber, por que é que a maioria das Pequenas Potências que vão entrar no conflito o farão sobretudo pelo lado dos ditos Aliados ocidentais e não pelos Impérios Centrais – sendo a exceção a Bulgária e o Império Otomano? Do nosso ponto vista há razões de credibilidade, de confiança, mas também de interesse e determinantes geoestratégicas que favorecem esta dinâmica.

A Alemanha perdeu necessariamente alguma credibilidade com Pequenas Potências pela invasão da Bélgica62. Mas, por outro lado, é também fundamental ter em conta que os Impérios Centrais eram essencialmente potências continentais. Isso significa que não só tendiam a ser vistas como mais diretamente ameaçadoras para os seus vizinhos de menor dimensão, como a sua capacidade de captação de aliados estava geopoliticamente muito condicionada pelo predomínio naval da Grã-Bretanha e dos seus aliados. Isso ficou evidente, por exemplo, no caso de Espanha ou do México63. É significativo que um processo semelhante se verificou no caso geopoliticamente semelhante da Roménia, relativamente à aliança com uma Rússia demasiado grande e próxima, o que levantou tais reservas em alguns dos governantes romenos que levou à sua demissão em protesto pela decisão de entrada romena na guerra ao lados dos Aliados64.

A atenção às Pequenas e Médias Potências é também fundamental para se alcançar uma visão realmente mais global da I Guerra Mundial, um outro aspeto que tem merecido cada vez mais atenção. Ora a adesão de Pequenas e Médias Potências teve na globalização do conflito, a par do facto de várias das Grandes Potências envolvidas em 1914 serem detentoras de importantes impérios coloniais65. Mas a adesão do Japão, e a importante dimensão colonial de duas Pequenas Potências tiveram importância numa ainda maior globalização da guerra. Portugal e a Bélgica foram fundamentais, fosse pela eficácia ou pela ineficácia, no decurso da guerra terrestre no seu principal teatro extraeuropeu que teve como palco a África Central e Austral66.

Em suma, Grande Potência não deve ser confundida com a omnipotência e Pequena Potência não deve ser considerada equivalente de impotência total. Esta pode parecer, talvez, uma conclusão demasiado óbvia para merecer menção. Mas, por vezes, o óbvio é importante demais para não ser explicitamente sublinhado. Se realmente se der por óbvio o que acabamos de referir, então é preciso retirar daí as devidas implicações. Uma análise da I Guerra Mundial consequente com esta afirmação não pode ignorar a priori como irrelevantes os objetivos, as decisões, as ações das Pequenas e Médias Potências. Como procurámos argumentar, parece-nos evidente que Pequenas Potências podiam ter e tiveram em vários aspetos e momentos fundamentais um impacto significativo no desencadear, na expansão e no fim da Grande Guerra de 1914-1918. Por outro lado, os problemas que Portugal enfrentou neste período podem e devem também ser analisados de forma comparativa nesta perspetiva – dos desafios que a I Guerra Mundial representou para outras Pequenas e Médias Potências e das respostas que estas deram a um conflito que, pela sua escala e intensidade, as afetou mesmo quando permaneceram neutrais.

Os estudos, infelizmente ainda relativamente escassos, no campo das relações internacionais sobre a temática dos conflitos assimétricos ou potências revisionistas revolucionárias podem e devem ser utilizados para perceber melhor e avaliar de forma mais desapaixonada o comportamento de Portugal durante a I Guerra Mundial. Mais, não faz sentido comparar explícita ou implicitamente a intervenção de Portugal na I Guerra Mundial apenas com a França ou a Grã-Bretanha ou a Alemanha, pois desta abordagem só se pode concluir que falhou ou foi irrelevante. A comparação deve ser feita com a Bélgica, ou a Sérvia, ou ainda mais com a Grécia, a Roménia, a Bulgária. É a esse nível que faz sentido avaliar o desempenho de Portugal. Sublinhando o imenso e inédito esforço entre estas Pequenas Potências que foi projetar um corpo expedicionário português no teatro de operações mais exigente da I Guerra Mundial; mesmo que seja para concluir que esta aposta arriscada acabou por ser em boa parte falhada, nomeadamente não deu os resultados estratégicos desejados. Portugal não ganhou autonomia face à Grã-Bretanha, nem prestígio internacional, nem lugares destacados na nova Sociedade das Nações. Também, exceto uma pequena ilhota na fronteira norte de Moçambique, não ganhou território. Apesar de tudo, no entanto, Portugal manteve o seu império colonial e o regime republicano – com a respetiva bandeira e hino, batizados em combate. Um regime republicano português que, embora enfraquecido, acabou por se manter, numa Europa onde, depois de 1919, as repúblicas se tornaram mais numerosas e mais normais. Nem tudo falhou, embora muito tenha falhado.

 

Data de receção: 5 de Maio de 2014

Data de aprovação: 4 de Junho de 2014

 

Notas

1A investigação para este artigo foi realizada no quadro de um projeto do IDN em parceria com o ICS-UL e IHC-UNL apoiado pela Comissão Coordenadora das Evocações do Centenário da I Guerra Mundial do Ministério da Defesa Nacional. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade do autor. Agradecemos a Carlos Gaspar e outros participantes e comentadores no painel organizado pelo primeiro sobre esta temática no quadro do Congresso da APCP de 2014 em Coimbra.

2Roberts, Andrew – Salisbury: Victorian Titan. Londres: Phoenix Press, 2000, pp. 522-23.         [ Links ]

3Ver em Jstor [Consultado em: 14 de abril de 2014]. Disponível em: http://www.jstor.org/action/oBasicSearch?Query=%22First+World+War%22&acc=on&wc=on&fc=offhttp ; Ver Persée [Consultado em: 14 de abril de 2014]. Disponível em: http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/search/?_Prescripts_Search_alterSearchQuery=udAND&_Prescripts_Search_selectedTypes=article&_Pres-cripts_Search_runnedQuery

4É o caso mesmo de uma obra tão recente como a de Clark, Christopher – The Sleepwalkers: How Europe went to War in 1914. Londres: Penguin, 2013, pp. 666 ss.         [ Links ], em que se explica por que é que a obra é dedicada ao seu tio-avô Jim O’Brien, um veterano desse conflito.

5Provavelmente a melhor antologia de partida relativamente à forma como as relações internacionais têm olhado para a I Guerra Mundial é ainda Miller, S. E., Lynn-Jones, S. M. & Van Evera, S. (eds.) Military Strategy and the Origins of the First World War: An International Security Reader. Princeton: PUP, 1991;         [ Links ] relativamente a discussões mais recentes importa ver o dossiê temático sobre as origens na I Guerra Mundial em AA. VV. – Foreign Policy Analysis. Vol. 7, N.º 2, 2011, pp. 139-214,         [ Links ] e o conjunto de textos reunidos em Levy, J. & Vasquez, J. (eds.) – The Outbreak of the First World War, Structure, Politics, and Decision-Making. Cambridge: CUP, 2014.         [ Links ]

6Cit. Gavin, Francis – «History, security studies and the July Crisis» In Journal of Strategic Studies. Vol. 37, N.º 2, 2014, p. 320.         [ Links ] A obra de Tuchman, Barbara – The Guns of August: The Outbreak of World War I. Nova York: MacMillan, 1962 – recebeu o Prémio Pulitzer em 1963.         [ Links ]

7As suas obras mais influentes são Fischer, Fritz – Germany’s Aims in the First World War. Nova York: Norton, 1968 [tradução do original alemão Griff nach der Weltmacht de 1961]; e Idem, War of Illusions: German Policies from 1911 to 1914. Nova York: Norton, 1975.         [ Links ]

8Samuel Williamson, «July 1914 revisited and revised: the erosion of the German paradigm». In Levy, J. & Vasquez, J. (eds.) – The Outbreak of the First World War, Structure, Politics, and Decision-Making, pp. 30-62.         [ Links ]

9Teixeira, Nuno Severiano – O Poder e a Guerra 1914-1918: Objetivos Nacionais e Estratégias Políticas na Entrada de Portugal na Grande Guerra, s.l.: Ed. Estampa, 1996.         [ Links ] Ainda que por via, sobretudo, da historio grafia francesa, o que mostra a ampla difusão deste tipo de abordagem.

10Snyder, Jack – Myths of Empire: Domestic Politics and International Ambition. Cornell UP, 1991.         [ Links ]

11Ver catálogo eletrónico da Biblioteca Nacional de Portugal [Consultado em: 14.4.2014]. Disponível em: http://catalogo.bnportugal.pt/ipac20/ipac.jsp?session=N4011094P82P5.267904&menu=search&aspect=basic_search&npp=20&ipp=20&spp=20&profile=bn&ri=&index=.GW&term=Primeira+Guerra+Mundial&x=0&y=0&aspect=basic_search

12Para uma leitura mais desenvolvida da bibliografia e das suas principais tendências cf. Teixeira, Nuno Severiano – O Poder e a Guerra 1914-1918: Objetivos Nacionais e Estratégias Políticas na Entrada de Portugal na Grande Guerra, s.l.: Ed. Estampa, 1996, pp. 20-33.         [ Links ]

13Clark, Christopher – The Sleepwalkers: How Europe went to War in 1914. Londres: Penguin, 2013, pp.559 e seguintes.         [ Links ]

14Snyder, Jack & Lieber, Keir – «Correspondence: Defensive Realism and the ‘‘New’’ History of World War I». In International Security. Vol. 33, N.º 1, 2008, pp.174-194.         [ Links ]

15Meneses, F. Ribeiro de – União Sagrada e Sidonismo: Portugal em Guerra (1916-18). Lisboa: Cosmos, 2000, p. 63.         [ Links ] Sobre este fenómeno da polarização cf. Medina, João (ed.) – Portugal na Grande Guerra: Guerristas e Antiguerristas: Estudos e Documentos. Lisboa: Centro História Univ. Lisboa, 1986;         [ Links ] Samara, Maria Alice – Verdes e Vermelhos, Portugal e a Guerra no Ano de Sidónio Pais. Lisboa: Ed. Notícias, 2003.         [ Links ]

16Telo, António J. – Os Açores e o Controlo do Atlântico: 1898-1948. Porto: Asa, 1993.         [ Links ]

17Becker, Jean-Jacques – «Prefácio». In Teixeira, Nuno Severiano – O Poder e a Guerra 1914-1918: Objetivos Nacionais e Estratégias Políticas na Entrada de Portugal na Grande Guerra, pp.15-17.         [ Links ]

18Meneses, F. Ribeiro de, Afonso Costa: Portugal. Londres: Haus, 2011.         [ Links ]

19Cornwall, Mark – «Introduction». In Mitrovic, Andrej – Serbia’s Great War. Londres: Hurst, 2007, p. vii;         [ Links ] de Schaepdrijver, Sophie – «Belgium». In Horne, J. (ed.) – A Companion to World War I. Oxford: Wiley, 2010, p. 386.         [ Links ]

20O único texto em português sobre o tema parecer ser o útil ensaio de Gaspar, Carlos – «Os pequenos estados no sistema internacional». I Encuentro Peninsular de Historia de las Relaciones Internacionales. Zamora: Fundación Rei Afonso Henriques, 1998, pp. 113-162;         [ Links ] relativamente à bibliografia internacional o problema é o inverso, de multiplicidade de bibliografia, mas sobretudo focada na cooperação diplomática cf., e.g., Beyer, Jessica L. – Annotated Bibliography on Diplomacy of Small States [Consultado em: 17.3.2013]. Disponível em: http://archive1.diplomacy.edu/SmallStates/Resources/display.asp?Topic=Bibliography        [ Links ]

21Cf. antologia clássica de Lukes, Steven (ed.) – Power. Nova York: NYU Press, 1986;         [ Links ] para debates mais recentes ver, e.g., Lukes, Steven – Power: A Radical View. 2.ª edição revista: Basingstoke, Palgrave, 2005;         [ Links ] Nye, Joseph S. – The Future of Power. Nova York: Public Affairs, 2011.         [ Links ]

22Ver Handel, Michael – Weak States in the International System. 2nd rev. ed., Abingdon: Frank Cass, 1990, maxime pp.41 ff.         [ Links ]; ver também FOX, A. Baker – The Power of Small States: Diplomacy in World War II. Chicago: University of Chicago Press, 1959;         [ Links ] Cooper, Andrew F., e Shaw, Timothy M. (eds.) – The Diplomacies of Small States: Bet ween Vulnerability and Resilience. Londres: Palgrave, 2012, pp. 1-19.         [ Links ]

23Williams, K. P., Lobell, S. E., Jesse, N. G. (eds.) – Beyond Great Powers and Hegemons: Why Secondary States Support, Follow or Challenge. Stanford: SUP, 2012        [ Links ]

24Brown, Michael (ed.) – Grave New World: Security Challenges in the Twenty-First Century, Washington DC. Georgetow n UP, 2 0 0 3 , p p . 2-3;         [ Links ] Paul , T.V. – Asymmetric Conflicts: War Initiation by Weaker Powers, Cambridge, CUP, 1994.         [ Links ] Ver ainda o texto clássico Mack, Andrew – «Why big nations lose small wars? The politics of asymmetric conflict». In World Politics. Vol. 27, N.º 2, 1975, pp. 175-200.         [ Links ]

25Vasquez, John – «Explaining world wars: its Scope, Severity, Duration”, In The War Puzzle Revisited, Cambridge: CUP, 2011, pp.246-284.         [ Links ] O Japão e os Estados Unidos só com a mobilização e os resultados da I Guerra Mundial realmente atingem esse estatuto.

26Carta do imperador Francisco José para o kaiser Guilherme II entregue em Berlim de 5 de julho de 1914 pelo embaixador conde Szögyény-Marich.

27 Mackenzie, David – Apis: The Congenial Conspirator. Boulder: East European Monographs, 1989.         [ Links ]

28Mcmeekin, Sean – The Russian origins of the First World War. Cambridge MA: The Belknap Press, 2011, Loc. 323.         [ Links ]

29Albertini, Luigi – The Origins of the War of 1914. s.l: Enigma Books, 2005, vol. 2, p. 274;         [ Links ] ver também Clark, Christopher – The Sleepwalkers: How Europe went to War in 1914. Londres: Penguin, 2013, p. 87.         [ Links ]

30Williamson, Samuel R. – Austria-Hungary and the Origins of the First World War. Londres: Palgrave, 1990.         [ Links ]

31Citações e comentários de Albertini, Luigi – The Origins of the War of 1914. s.l: Enigma Books, 2005, vol. 2, pp.360-361, 364-372.         [ Links ]

32Mitrovic, Andrej – Serbia’s Great War. Londres: Hurst, 2007, p. 59;         [ Links ] ver também Mackenzie, David – Apis: The Congenial Conspir ator. Boulder: East European Monographs, 1989.         [ Links ]

33Stengers, Jean – «Belgium». In Wilson, K. (ed.) – Decisions For War, 1914. Londres: Routledge, 2003, pp.151 passim. 34 A Grã-Bretanha podia limitar-se a dar apoio naval aos seus aliados,         [ Links ] posição defendida por ministros de peso.

35Cit. Wilson, Keith M. – The Policy of the Entente: Essays on the Determinants of British Foreign Policy, 1904-1914. Cambridge: CUP, 1985, pp. 136-140.         [ Links ]

36Gilbert, Bentley B. – «Pacifist to interventionist: David Lloyd George in 1911 and 1914. Was Belgium an issue?». In The Historical Journal. Vol. 28, N.º 4, 1985, p. 885.         [ Links ]

37Harris, J.P. – Douglas Haig and the First Word War. Cambridge: CUP, 2009, p. 67.         [ Links ]

38Ofício do ministro de Portugal em Londres para MNE (14.11.1914), Portugal na Primeira Gr ande Guerra. Lisboa: MNE, 1997, Vol. 1, Doc. 157.

39Ver nota 14.

40O exemplo acabado, obsessivo disso mesmo é o representante diplomático português em Paris até 1917, Chagas, João – Diário. Lisboa: Rolim, 1987, 3 volumes; ver também Novais, Noémia – João Chagas: A Diplomacia e a Guerra 1914-1918. Coimbra: Minerva, 2006.

41De La Torre Gomez, Hipolito – Na encruzilhada da grande guerra: Portugal-Espanha, 1913-1919. s.l.: Ed. Estampa, 1980.         [ Links ]

42De La Torre Gomez, Hipolito – Na encruzilhada da grande guerra: Portugal-Espanha, 1913-1919.         [ Links ]

43Ramos, Rui – «Revolução republicano e a política externa portuguesa». In Ramos, Rui, e Almeida, João Marques (eds.) – Revoluções, Política Externa e Política Defesa em Portugal, Sécs. XIX-X X. Lisboa: IDN/Cosmo, 2008, p. 81.         [ Links ]

44Cf., e.g., Waltz, Kenneth – Theory of International Politics. Reading: Addison-Wesley Pub., 1979, pp. 189-191;         [ Links ] Christensen, Thomas J., e Snyder, Jack – «Chain gangs and passed bucks: predicting alliance patterns in multipolarity». In International Organization. Vol. 44, N.º 2, 1990, pp. 137-168,         [ Links ] e Christensen, Thomas J., e Snyder, Jack – «Multipolarity, perceptions, and the tragedy of 1914». In International Studies Quarterly. N.º 55, pp. 305-308;         [ Links ] Schweller, Randall L. – «Bandwagoning for profit: bringing the revisionist state back». In International Security. Vol. 19, N.º 1, 1994, pp. 72-107;         [ Links ] Walt, Stephen – The Origins of Alliance. Ithaca: Cornell UP, 1997.

45Paul, T. V. – Asymmetric Conflicts: War Initiation by Weaker Powers. Cambridge, CUP, 1994, p. 15 ss.         [ Links ] incluiu a guerra russo-japonesa e Pearl Harbor, em 1940, mas não é o caso de 1914, ponto para os principais fatores que favorecem isso.

46Walt, Stephen – «Revolution and war». In World Politics. Vol. 44, N.º 3, 1992, pp. 321-368.         [ Links ]

47Cf. a respeito desta dimensão mais ideacional ou normativa em questões de segurança, e.g., Katzenstein, Peter (ed.) – The Culture of National Security: Norms and Identity in World Politics. Nova York: Columbia, 1996;         [ Links ] Desch, Michael et al. – «Correspondence: Isms and Schisms: culturalism versus realism in security studies». In International Security. Vol. 24, N.º 1, 1999, pp. 156-172;         [ Links ] Johnston, Alistair I. – «Thinking about strategic culture». In International Security. Vol. 19, N.º 4, 1995, pp. 32-64.         [ Links ]

48Cit. Albertini, Luigi – The Origins of the War of 1914. Vol. 3, s.l: Enigma Books, 2005, p. 441.         [ Links ]

49Albertini, Luigi – The Origins of the War of 1914. Vol. 2, s.l: Enigma Books, 2005, pp. 272-275;         [ Links ] Djokic, Dejan – Pasic and Trumbic. Londres: Haus Pub, 2010.         [ Links ]

50Cit. Meneses, F. Ribeiro de – União Sagrada e Sidonismo: Portugal em Guerra (1916-18). Lisboa: Cosmos, 2000, p. 85.         [ Links ]

51Cit. Oliveira (2011), p. 186.

52Meneses, F. Ribeiro de – União Sagrada e Sidonismo: Portugal em Guerra (1916-18), p. 100 passim.         [ Links ]

53Delby, Andrew – Eleftherios Venizelos – Greece. Londres: Haus, 2011;         [ Links ] Hitchins, Keith – Ion Bratianu – Romania. Londres: Haus, 2011.         [ Links ]

54Stevenson, David – «Battlefield or Barrier? Rearmament and military planning in Belgium, 1902–1914». In The International History Review. Vol. 29, N.º 3, 2007, pp. 473-507.         [ Links ]

55Cf. Telo, António, in Afonso, Aniceto, e Gomes, Carlos Matos (eds.) – Portugal e a Grande Guerra. Vila do Conde, Verso da História, 2013, p. 250 ss;         [ Links ] e sobre a preparação do CEP cf. fraga, L., in Afonso, Aniceto, e Gomes, Carlos Matos (eds.) – Portugal e a Grande Guerra, p. 265 ss. Esta obra coletiva é o principal volume de referência sobre o tema da intervenção de Portugal na I Guerra Mundial. Para uma síntese centrada na intervenção militar portuguesa na guerra cf. Afonso, Aniceto – A Grande Guerra, Angola, Moçambique, Flandres, 1914-1918. Matosinhos: Quidnovi, 2008.

56A exceção em termos de experiência de guerra recente era a Roménia que, no entanto, a compensou convidando em 1916 uma missão militar francesa que atingiu quase quatro mil oficiais e foi fundamental na condução da guerra. Cf. Torrey, Glenn E. – The Romanian Battlefront in World War I. Lawrence: University Press of Kansas, 2012.         [ Links ]

57O Brasil foi de todos os beligerantes latino-americanos o único a enviar forças para o teatro de operações, especialmente a chamada Divisão Naval em Operações de Guerra (DNOG), que aliás enfrentou dificuldades significativas cf. Maia, Prado – DNOG: Uma Página Esquecida da História da Marinha Brasileira. Rio de Janeiro: Ser viço Documentação Geral Marinha, 1961; Vinhosa, Francisco L. – O Brasil e a Primeira Guerra Mundial. Rio de Janeiro: IHGB, 1990. Sobre os Estados Unidos a bibliografia é imensa, cf., e.g., Doenecke, J. D. – Nothing Less Than War: A New History of America’s Entry into World War I. Lexington: University Press of Kentucky, 2011. Para olhar para a participação portuguesa nesta perspectiva cf. Fraga, L. Alves – D o Inter vencionismo ao Sidonismo, os Dois Segmentos da Política de Guerra da Primeira República. Coimbra: Imp. Univ. Coimbra, 2010.

58Sobre Sidónio a obra de referência é Ramalho, N. M., Sidónio Pais, Diplomata e Conspirador (1912-1917). Lisboa: Cosmo, 2001.

59Cf. Meneses, Filipe Ribeiro de – «A grande aposta da República: o Corpo Expedicionário Português». In Meneses, Filipe Ribeiro de, e Oliveira, Pedro Aires (eds.) – A Primeira República Portuguesa: Diplomacia, Guerra e Império. Lisboa: Tinta-da-China, 2011, pp. 221-244;         [ Links ] Fraga, L., Afonso, Aniceto, e Gomes, Carlos Matos (eds.) – Portugal e a Grande Guerra. Vila do Conde, Verso da História, 2013, p. 310 ss; p. 389 ss e para as estatística ver p. 520 ss.         [ Links ]

60Pélissier, René – As Campanhas Coloniais de Portugal 1844-1941. Lisboa: Ed. Estampa, 2006, p. 352 ss.         [ Links ]

61Note-se que as reclamações belgas nunca foram postas em termos hostis a Portugal, mas sim de troca voluntária por Lisboa em troca de outras concessões territoriais de território ex-alemão, algo que, no entanto, até por razões de interesse próprio nas mesmas os britânicos sempre rejeitaram. Cf. Marks, Sally – Paul Hymans. Londres: Haus, 2012, p. 51 ss. Note-se ainda que as reclamações belgas em relação à neutral Holanda também foram rejeitadas pela Grã-Bretanha.

62Cf. DE de Schaepdrijver, Sophie – «Belgium». In Horne, J. (ed.) – A Companion to World War I. Oxford: Wiley, 2010 e Zuckerman,         [ Links ] Larry – The Rape of Belgium: The Untold Stody of World War I. Nova York: NYUP, 2004.         [ Links ]

63De La Torre Gomez, Hipolito – Na encruzilhada da grande guerra: Portugal-Espanha, 1913-1919, 1980.         [ Links ]

64Hitchins, Keith – Ion Bratianu – Romania. Londres: Haus, 2011.         [ Links ]

65Como referido consideramos a Itália, os Estados Unidos e o Japão como potências médias em maior ou menor ascensão.

66Ver, e.g., Strachan, Hew – The First World War in Africa. Nova York: OUP, 2004.         [ Links ]