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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199versão On-line ISSN 2183-0436

Relações Internacionais  no.85 Lisboa mar. 2025  Epub 30-Ago-2025

https://doi.org/10.23906/ri2025.85a04 

A invasão da Ucrânia e o futuro das Relações Internacionais

A guerra na Ucrânia e o Sul Global

1 ISCTE-IUL, Avenida das Forças Armadas, 1649-026 Lisboa, Portugal | pedro.seabra@iscte-iul.pt.


Resumo

A invasão russa da Ucrânia tem-se caracterizado por uma divisão acentuada entre o Ocidente e o chamado «Sul Global». Este artigo visa proporcionar uma análise preliminar sobre as diferentes perceções relativamente ao conflito que emergiram no Sul Global, e explorar as principais tendências evidenciadas em termos da reação do «resto» do mundo. Em particular, são destacados os impactos no multilateralismo global e regional, as táticas e estratégias de alinhamento adotadas por diferentes países do Sul face ao prolongar do conflito, e a importância acrescida de questões de equidade internacional.

Palavras-chave: Sul Global; multilateralismo; não-alinhamento; Ucrânia

Abstract

The Russian invasion of Ukraine has been characterized by a sharp division between the West and the so-called Global South. This article aims to provide a preliminary analysis of the different perceptions that have emerged regarding this conflict in the Global South and explore the main trends in the reactions from the ‘rest’ of the world. Special attention will be paid to the impacts on global and regional multilateralism, the alignment tactics and strategies adopted in the face of the prolonged conflict, and the renewed importance of issues of international equity are highlighted.

Keywords: Global South; multilateralism; non-alignment; Ukraine

Introdução

A invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, gerou um conjunto de previsões e expectativas sobre o que esperar em termos do seu impacto global nos dias e meses seguintes. Apesar das hostilidades se encontrarem circunscritas ao continente europeu, antecipava-se que a guerra provocaria, desde logo, uma convulsão geopolítica considerável, com implicações multidimensionais e ramificações em diferentes partes do globo, em virtude não só da escala da invasão, mas também do choque suscitado em muitas capitais pelo mundo fora. Esperava-se, acima de tudo, que a violação da integridade territorial ucraniana galvanizasse a comunidade internacional em torno de uma condenação total da agressão russa.

Contudo, em vez da fácil coordenação de um apoio claro e contínuo à Ucrânia, aquilo a que se assistiu foi uma demonstração da complexidade em angariar e sustentar níveis de solidariedade inequívocos por parte de países e regiões dados como adquiridos. Em particular, e em vez de uma quase unanimidade no posicionamento face à eclosão e ao decurso da guerra, acabou por imperar um vincar acentuado das linhas de divisão entre o dito «Ocidente Global», o «Leste Global» e o «Sul Global», com cada um destes blocos a apresentar as suas próprias narrativas sobre as razões subjacentes ao conflito e como o mesmo se deveria enquadrar em debates mais amplos sobre a natureza da ordem mundial do século XXI, e a eventual necessidade (ou não) de reorganização e reforma das normas e instituições internacionais existentes1.

Partindo do reconhecimento desta pluralidade de posições, este artigo visa fazer um balanço preliminar sobre as diferentes perceções relativas à guerra na Ucrânia que emergiram nos últimos anos, com origem a sul. Com base numa revisão dos principais contributos da área de Relações Internacionais entretanto publicados, que tendências foram mais destacadas em termos da reação do «resto» do mundo? Com esse objetivo em mente, importa primeiro proporcionar uma delimitação do conceito de «Sul Global», em reconhecimento da utilidade do termo, mas também de algumas limitações do mesmo. De seguida, são brevemente elencados os principais desenvolvimentos de três anos de guerra em que se registou um envolvimento mais acentuado por parte dos países, regiões e instituições do Sul. São depois identificados três contributos temáticos que se têm destacado e que importa reter, nomeadamente, os impactos no multilateralismo global e regional, as táticas e estratégias adotadas por alguns destes países face ao prolongar do conflito e a importância renovada de questões de equidade internacional.

O conceito de «Sul Global»

Qualquer discussão sobre as implicações da posição do Sul Global neste conflito tem de começar pelo debate em torno da validade deste conceito. De um lado, temos os que entendem tal referencial como uma metacategoria indispensável que permite melhor compreender dinâmicas de desigualdade, poder e solidariedade entre países num mundo pós-colonial2. Visto desse ponto de vista, e abrangendo regiões da África, da Ásia, da América Latina e da Oceânia, o Sul Global refere-se a Estados entendidos como historicamente marginalizados na ordem internacional, que trazem para primeiro plano o impacto duradouro do colonialismo e do imperialismo na formação das hierarquias globais e que argumentam que esses mesmos legados coloniais acabaram por enraizar padrões de dependência. Esses padrões suscitam, por sua vez, reações multifacetadas na forma de contestação às políticas e medidas impostas, por exemplo, por instituições financeiras internacionais, como o Fundo Monetário Internacional ou o Banco Mundial.

Em paralelo, o Sul Global é igualmente invocado como forma de identidade política que une e mobiliza diversos Estados contra desigualdades da governação global3. Historicamente, esta solidariedade é sintetizada pela experiência do Movimento dos Não-Alinhados durante a Guerra Fria, mas também pela criação do Grupo dos 77 (G77) em 1964, enquanto instigador da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento. A este respeito, a Organização das Nações Unidas (ONU) - e especialmente a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), o Conselho Económico e Social e o Conselho dos Direitos Humanos - surge como arena preferencial e regular onde estas posições são publicamente apresentadas, com um enfoque em valores como a defesa da soberania e da integridade territorial, os direitos ao desenvolvimento e a manutenção da paz internacional, em linha com os princípios fundamentais da Carta das Nações Unidas4.

Contudo, o conceito de Sul Global também atrai a sua quota-parte de críticas. Ao abranger um vasto leque de países com diferentes trajetórias históricas, sistemas políticos, capacidades económicas e contextos culturais, a diversidade das suas experiências e interesses corre frequentemente o risco de ser ofuscada por uma excessiva homogeneização de objetivos, interesses e prioridades; basta comparar o interesse de Estados de menor dimensão e com menos recursos com o interesse da China em serem associados com esta suposta metacategoria, sobretudo em virtude da promoção de projetos como a Iniciativa Faixa e Rota (BRI, na sigla inglesa) que assentam na criação de novas relações de dependência entre as restantes nações do Sul Global5.

Por outro lado, a excessiva utilização do conceito tende também a desconsiderar o facto de, pese embora os esforços recorrentes para se alcançar maior autonomia, a taxa de sucesso da influência coletiva do Sul Global na governação global continuar limitada e as principais organizações criadas num contexto pós-Segunda Guerra Mundial ainda não lhe reservarem espaço efetivo, o que gera, por sua vez, questões pertinentes sobre a alegada frente unificada relativamente a tais objetivos. Em suma, o Sul Global tende a funcionar mais como uma categoria excludente, ao identificar países que não pertençam ao Ocidente, do que como um grupo coeso com uma agenda partilhada6.

Importa, portanto, acolher o conceito de Sul Global, mas admitir e reconhecer algumas limitações, e avançar com a clarificação de algumas premissas importantes para efeitos desta reflexão. Em primeiro lugar, tal como Ikenberry refere, «a crítica do Sul Global ao Ocidente Global, em geral, não é que este ofereça o caminho errado para a modernidade, mas que não tenha cumprido os seus princípios nem partilhado suficientemente os frutos materiais da modernidade liberal»7. Por outras palavras, colocar o ónus da aceitabilidade do conceito de Sul Global em requisitos de eficácia concreta pode levar a ignorar o reconhecimento - necessário e importante - de que existem efetivamente queixas pertinentes relativas à composição das principais instituições internacionais que não têm sido acauteladas ou consideradas, tal como o objetivo de assegurar uma participação permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas para um Estado africano, por exemplo. Em segundo lugar, muito embora o Sul Global constitua um termo que careça de delimitação, acaba também por se revelar emocionalmente e estrategicamente apetecível. Esta ampla coligação aqui em discussão acaba assim por ser cobiçada, seja em termos da soma aritmética de apoios em várias organizações multilaterais, seja por conferir legitimidade acrescida às decisões de outras potências ou blocos. Quando confrontados com um conflito da magnitude da guerra na Ucrânia, o Sul Global surge, por isso, como um conceito particularmente apto para sinalizar tendências e linhas de tensão de particular importância na política global que analisaremos neste artigo.

As diversas respostas do Sul Global à guerra na Ucrânia

A forma como os países do Sul Global reagiram e se posicionaram face à invasão da Rússia não é passível de ser reduzida a uma posição única, uma vez que manifestaram desde a primeira hora um espectro amplo de posições, moldadas por múltiplos fatores históricos, económicos e políticos8. Alguns Estados apoiaram abertamente a Ucrânia, enquanto outros apoiaram a Rússia ou optaram por uma equidistância total. Esta diversidade demonstra, acima de tudo, a coexistência de abordagens pragmáticas, por vezes contraditórias entre si, e sobretudo assentes em difíceis equilíbrios entre cálculos instrumentais e considerações normativas.

Em África, a guerra prontamente sublinhou as vulnerabilidades do continente face às flutuações de preços de matérias-primas e disponibilidade de produtos alimentícios. Embora países como o Quénia e o Gana condenassem veementemente as ações da Rússia, outros, incluindo a África do Sul, abstiveram-se, alegando preocupações com a adesão seletiva do Ocidente ao primado do direito internacional. Esta posição do Governo de Pretória refletiu essencialmente os seus laços históricos com a Rússia, bem como a importância da sua pertença aos BRICS9, mas encontrou também eco em várias partes do continente. Sondagens realizadas na África do Sul, no Quénia, na Nigéria, no Senegal, no Uganda e na Zâmbia, por exemplo, concluíram que a maioria da opinião pública considerava a invasão russa contrária aos princípios legais vigentes, que as forças russas deveriam retirar da Ucrânia e que a Rússia era culpada de cometer crimes de guerra na Ucrânia, mas que o continente deveria permanecer, ainda assim, neutro no conflito10.

Esta diversidade de posições marcou igualmente os posicionamentos de países da América Latina. O Brasil, inicialmente com Jair Bolsonaro como presidente, manteve-se equidistante, citando a importância dos fertilizantes russos para o seu sector agrícola. Esta posição continuou no Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que enfatizou a importância das negociações de paz e mostrou alguma ambição em desempenhar o papel de mediador, mas rejeitou qualquer forma de apoio à Ucrânia11. Em contrapartida, a Colômbia, com Iván Duque - mas não com o seu sucessor Gustavo Petro -, e posteriormente a Argentina, após a eleição de Javier Milei, no final de 2023, não tiveram problemas em alinhar com os Estados Unidos da América (EUA) e a Europa na condenação explícita da agressão russa.

Na Ásia, as respostas também foram variadas. A Índia absteve-se de condenar a Rússia e continuou o seu relacionamento económico com Moscovo, particularmente no sector da energia. Esta posição foi essencialmente impulsionada por relações anteriores ao nível de compras de armamento russo e pelo desejo de manter alguma autonomia estratégica para contrabalançar as ameaças fronteiriças da China12. As nações do Sudeste Asiático adotaram abordagens cautelosas, equilibrando os seus laços com os EUA e a China - cujo apoio à Rússia se revelou inequívoco desde a primeira hora - e manifestando preocupação com as ramificações económicas globais do conflito13.

Em todas estas regiões o principal elemento em comum foi alguma resistência e, em muitos casos, oposição frontal, à aplicação dos sucessivos pacotes de sanções a entidades russas. Tal opção parece implicar tomar partido por um dos lados neste conflito. Contudo, a realidade revelou-se mais complexa. Não só tais sanções acarretavam consideráveis riscos para a sustentabilidade de economias locais, com potenciais impactos sociais e políticos de foro interno, como as resistências destes Estados contrastaram com o envolvimento paralelo de um conjunto de países do Sul Global ao lado da Ucrânia. O caso do Ukraine Defence Contact Group é ilustrativo. Criado pelos EUA como fórum para coordenar a doação de ajuda militar à Ucrânia, contou com a participação, em diferentes momentos, de países como a Libéria, o Quénia ou a Tunísia, demonstrando assim o seu apelo além dos Estados-Membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO, na sigla inglesa) e da União Europeia (UE). A transferência de material bélico ou a oferta de treino especializado a militares ucranianos por parte da Colômbia, da Argentina ou do Camboja reforça também esse argumento. Por último, há que sublinhar a falta de uma equivalência direta entre a maioria das posições políticas de países do Sul Global e as sensibilidades da população mundial, inclusive das sociedades desses mesmos países14, o que acrescenta mais uma peça importante neste tabuleiro já de si consideravelmente intricado. Perante tudo isto, dificilmente se consegue ser definitivo quanto a uma posição unânime do Sul Global sobre a invasão da Ucrânia.

Padrões e tendências em três anos de guerra

Face à breve exposição anterior, fica pois claro que o posicionamento do Sul Global em relação à guerra é mais complexo do que possa parecer e não pode ser facilmente sistematizado em categorias simplistas. Com efeito, ao longo dos últimos três anos, foi ficando evidente uma maior ou menor preocupação com as diversas consequências do conflito, a interiorização de algum oportunismo estratégico ou a manifestação de uma dose de indiferença pragmática, sem um padrão necessariamente uniforme15. As principais justificações utilizadas para esta variação conheceram também elas um alcance considerável. Elas incluíram argumentos tão díspares como o facto de a guerra ter criado uma escassez significativa de alimentos e energia à escala global - encarecendo assim o custo de vida em regiões pobres do mundo, com particular enfoque a sul - ou a ideia de que a principal responsabilidade pela sua eclosão residia no alargamento da NATO no leste europeu que teria provocado a agressão russa, eminentemente defensiva16. É certo que Alden argumenta que todas estas diferentes motivações podem ser na verdade agrupadas em três categorias, nomeadamente: (1) uma exasperação face à hipocrisia ocidental relativamente às violações da soberania, seja na Ucrânia, seja em outros contextos; (2) os danos causados pela guerra à agenda de desenvolvimento global; e (3) os efeitos indesejados de uma possível escalada das tensões para um conflito generalizado, aberto e imprevisível quanto ao seu alcance e desfecho17. Mas se mesmo esta síntese não incorpora todas as variações de posições assentes nas idiossincrasias de cada caso individual num Sul Global muito diverso, e atendendo à impossibilidade de descrevermos a posição de muitas dezenas de países, optamos, em vez disso, por nos centrar nalgumas tendências mais significativas. Três em particular merecem destaque.

Grupos em contexto multilateral

A primeira dimensão prende-se com os efeitos sentidos ao nível das estruturas coletivas existentes. Apesar de frequentes avisos quanto a uma suposta crise transversal do multilateralismo, a guerra na Ucrânia acabou por evidenciar o potencial desse tipo de plataformas.

A AGNU assumiu, desde o início, grande centralidade nestas dinâmicas ao concentrar os esforços diplomáticos ocidentais e russos para condenar o outro lado e, ao mesmo tempo, abordar os impactos globais da guerra. Muito embora não detenha o mesmo peso do ponto de vista legal que o Conselho de Segurança, o seu formato universal é o único que permite sinalizar como a maioria da comunidade internacional se posiciona face às principais disputas contemporâneas. Nesse sentido, entre 2022 e 2023, um total de seis resoluções relacionadas com a guerra foram levadas a voto em plenário, forçando todos os 193 Estados-Membros a posicionarem-se publicamente. Duas resoluções assumiram especial importância: em março de 2022, por uma maioria de 141 votos, a AGNU apelou a Moscovo para respeitar a integridade territorial da Ucrânia, e, em outubro do mesmo ano, 143 membros votaram para rejeitar a tentativa de anexação de partes da Ucrânia após referendos em áreas sob ocupação russa. Apesar da sua aprovação por maiorias substanciais com o apoio de países do Sul Global, o aspecto que mereceu mais atenção mediática foi a quantidade de ausências e abstenções - uma média de cerca de 40 países, dependendo da resolução em questão - de Estados como a Argélia, a Índia, o Paquistão ou a África do Sul.

O que nos obriga a regressar aos reais limites deste tipo de fóruns: sem ignorar o significado político destas maiorias, a verdade é que possibilitaram apenas repreensões simbólicas da Rússia e não implicaram a subscrição de medidas mais substantivas e custosas. Ao não conseguir coalescer posições mais consensuais, a AGNU passou a assumir a função de palco mediático para veicular frustrações sobre o andamento da guerra ou avançar propostas de negociação e tentativas de mediação que não eram aceitáveis por todas as partes do conflito18. Significativamente, nenhuma nova resolução sobre este conflito acabou por ser submetida à AGNU de 2023 até janeiro de 2025. Por outro lado, mesmo experiências laterais que contaram com os bons ofícios do secretário-geral, António Guterres, como a Iniciativa dos Cereais do Mar Negro, mediada pela Turquia para facilitar as exportações de cereais da Ucrânia, tiveram uma duração finita, com a sua suspensão, em meados de 2023, a mostrar as limitações do papel reservado à ONU.

O mesmo tipo de impacto verificou-se em organizações multilaterais regionais. A União Africana, por exemplo, enfrentou dificuldades em assegurar uma posição comum dos seus Estados-Membros19, confrontada com uma impossível equidistância face às grandes potências envolvidas, direta e indiretamente, na Ucrânia, ou com a dificuldade em ignorar uma violação do princípio da integridade territorial. Ainda assim, em reconhecimento do seu papel nominal de porta-voz de 55 países, a organização recebeu um convite por parte do Japão para participar da cimeira do G7, em Hiroxima, em 2023. Contudo, o reverso da medalha deste convite consistiu na exclusão da África do Sul, normalmente convidada até então, num gesto que foi interpretado como decorrente das posições pró-russas adotadas por Pretória. Isto apesar de o Governo da África do Sul ter sido forçado a desconvidar Vladimir Putin da cimeira dos BRICS, em Joanesburgo, nesse mesmo ano, em virtude das possíveis implicações judiciais internas do mandado de detenção do Tribunal Penal Internacional contra o líder russo. Tal decisão, no entanto, não afetou o alargamento progressivo dos BRICS, que conheceu relevância reforçada ao possibilitar à Rússia uma forma de contornar as tentativas de isolamento internacional pelo Ocidente20.

O principal ponto que sobressai durante este período é que o multilateralismo não se tornou mais ou menos eficaz em avançar soluções para este conflito. Continuou, isso sim, a ser visto como a forma mais eficiente para angariar e recrutar apoios políticos públicos para um ou outro lado desta guerra. Ironicamente, a cimeira dos BRICS em 2024, realizada em Kazan na Rússia, adotou o mote «Fortalecer o Multilateralismo para o Desenvolvimento Global Justo e Seguro», o que acaba por demonstrar a importância atribuída ao ncontrolo da narrativa em torno da vitalidade das organizações multilaterais existentes, independentemente da sua representatividade ou eficácia concreta.

Entre não-alinhamento e hedging

Uma segunda dimensão fundamental diz respeito à forma como categorizar as estratégias adotadas pelos países do Sul Global para lidarem com as consequências desta guerra e justificarem as suas opções. A esse nível, várias fórmulas têm sido avançadas ou recuperadas do passado.

A mais simples e familiar consiste num chamado «não-alinhamento ativo»21 ou «não-alinhamento 2.0»22. A ideia subjacente passa, como o nome sugere, por revisitar conceitos que surgem no período da Guerra Fria, quando muitos destes países (mas não todos) procuravam encontrar formas de navegar as tensões entre os EUA e a União Soviética. No limite, uma política de não-alinhamento implicava não fazer parte de alianças militares lideradas pelas duas superpotências. Já no século XXI, as dinâmicas de globalização e interdependência pressupõem uma postura mais flexível. A tónica é agora colocada na formulação de posições que sirvam essencialmente os interesses nacionais dos países do Sul Global, sem necessariamente adotar uma vertente ideológica, mas visando mais autonomia estratégica através de uma ação concertada em organismos internacionais. Nestes casos, a componente «ativa» refere-se a uma busca por novas oportunidades num mundo em mudança, avaliando cada uma delas com base nos seus méritos e idealmente resistindo às pressões das grandes potências23.

Esta equivalência com o passado, rapidamente choca com alguns obstáculos. Em primeiro lugar, o contraste com os anteriores não-alinhados é evidente: à altura da criação do Movimento dos Não-Alinhados, a sua posição era definida por uma resistência normativa comum às práticas capitalistas e colonialistas e um objetivo partilhado de igualdade económica e autodeterminação. Inversamente, a ideia de um bloco de não-alinhamento no atual contexto caracteriza-se pela sua vertente marcadamente transacional - como refletido pelo agrupamento de muitos destes países pelo The Economist nos chamados 25T, ou «25 países transacionais», devido à sua relutância partilhada em impor custos à Rússia pela sua guerra de agressão e/ou à sua hesitação em escolher um lado na crescente competição sino-americana24. Em segundo lugar, é um facto que a maioria dos países do Sul Global se apresenta como defensora das normas da soberania nacional, da integridade territorial, da não intervenção e da não interferência nos assuntos internos de outros países; contudo, alguns desses países não se têm também coibido de violar estas normas e princípios da Carta das Nações Unidas quando tal se proporciona - basta pensar em casos de um passado não tão distante relativos à Etiópia e à Eritreia ou à Índia e ao Paquistão - e muito menos os consideram suficientes por si só para manifestarem uma posição explícita face à violação do território ucraniano.

Se quisermos adotar uma abordagem mais teórica no quadro das Relações Internacionais, este tipo de comportamento mais facilmente se enquadra numa lógica realista de hedging25, nomeadamente, estratégias que combinam elementos cooperativos e de confronto, incluindo uma vasta gama de opções de relações com ambos os lados de um conflito ao mesmo tempo que o risco de punição por qualquer um dos beligerantes é manifestamente baixo. A analogia com um fence-sitter - um observador equidistante dos dois lados - é particularmente apelativa e tem acolhido bastantes proponentes26. No entanto, a crescente polarização internacional também significa que os desalinhamentos estratégicos podem ser puníveis a diferentes níveis, desde novas tensões diplomáticas a reduções nas trocas comerciais, a cortes nos empréstimos e na ajuda ao desenvolvimento, e até sanções27. Por outras palavras, os custos associados a esse posicionamento não têm permanecido imutáveis após a invasão da Ucrânia, gerando dúvidas sobre a sua sustentabilidade a médio e longo prazo.

Em suma, independentemente das categorias utilizadas para analisar este tipo de posicionamento, a tendência mais relevante e consensual parece ir no sentido de o Sul Global dar prioridade à sua autonomia estratégica no presente contexto, trabalhando ativamente pela criação de uma ordem global mais multipolar e um sistema internacional menos centrado no Ocidente.

Equidade numa ordem internacional assente em regras e princípios

O terceiro tema que emergiu de forma assinalável no debate sobre o posicionamento face à guerra na Ucrânia diz respeito a questões de equidade internacional. Como referimos, reclamações de justiça e igualdade de representação em instâncias internacionais criadas após a Segunda Guerra Mundial foram centrais para a coligação inicial de países do Sul Global, numa lógica de tensões bipolares. Esta vertente conheceu renovada importância após os ataques do Hamas em Gaza em outubro de 2023 e da resposta israelita que se seguiu.

A prioridade atribuída por grande parte do Ocidente à defesa de uma ordem liberal internacional assente em regras e princípios partilhados, enquanto racional central para a necessidade de apoiar a Ucrânia, passou a ser criticada como uma interpretação de conveniência, uma vez que parecia não se aplicar a outros conflitos. Com efeito, «a principal crítica do Sul Global à resposta do Ocidente à invasão russa não são as regras em si mesmas, mas a forma seletiva como são aplicadas»28. Acusações de dois pesos e duas medidas passaram assim a figurar como argumentos-chave na narrativa de países que esboçavam já posições de equidistância entre a Rússia e o Ocidente.

Esta posição tinha sido antecipada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros da Índia, Subrahmanyam Jaishankar, quando, em maio de 2022, declarou que «os problemas da Europa são os problemas do mundo, mas os problemas do mundo não são os problemas da Europa»29. De acordo com esta linha de raciocínio, os Estados ocidentais desviam-se frequentemente dos seus princípios de política externa ou seguem-nos de forma inconsistente. Como tal, enquanto para uns a invasão russa representa um desafio à ordem internacional vigente e se torna imperativo o restabelecimento da situação ex ante, para os países do Sul Global a guerra na Ucrânia representa algo diferente, nomeadamente, o fracasso recorrente das presentes estruturas internacionais em resolver conflitos e tensões30. Nesse sentido, expectativas redutoras assentes numa lógica dual de «Estados que violam as regras vs. Estados que cumprem as regras» têm-se tornado também elas um catalisador para reclamações mais alargadas sobre a legitimidade dessas mesmas regras e princípios31.

Esta discussão tem implicações mais vastas. Por um lado, os principais críticos do Ocidente pela adoção de dois pesos e duas medidas não estão necessariamente preocupados per se com o futuro da ordem internacional baseada em regras e princípios. Em vez disso, eles procuram, sim, eliminar as regras e os princípios internacionais que lhes são mais inconvenientes; esse grupo inclui principalmente a China, a Rússia e alguns dos seus pares autocráticos. Por outro lado, adotar esta argumentação - por mais legítima que seja face à magnitude paralela daquilo que é observado em Gaza e outros cenários pelo mundo fora - ajuda a desviar as atenções de outras violações das regras internacionais por parte, mais uma vez, de países como a Rússia e a China. Uma ordem internacional sem uma insistência correspondente no respeito por estas regras dificilmente seria do interesse do Sul Global. Em todo o caso, e mostrando as fragilidades da presente ordem normativa global, em última análise, a guerra na Ucrânia tem servido sobretudo para estes países insistirem na sua contínua marginalização nos processos de tomada de decisão na ordem internacional vigente.

Conclusão

Passados três anos do início do conflito, o impacto de uma invasão russa ainda em curso continua a ser impossível de aferir na sua totalidade. Naturalmente, a Ucrânia continua a enfrentar e a viver com as piores consequências decorrentes da decisão tomada por Moscovo. Mas a guerra também criou grandes desafios à disciplina de Relações Internacionais. Mais especificamente, ficam claras as fragilidades na forma como entendemos relações de cooperação e como estudamos conflitos armados32. Contudo, a guerra na Ucrânia tem servido também para sublinhar as complexidades do papel do Sul Global num mundo que permanece tão interligado quão desigual. Por entre tentativas de racionalizar e agrupar uma multiplicidade de posições, importa evitar categorizações fáceis de todos os intervenientes segundo lógicas pretensamente homogeneizadoras e privilegiar, em vez disso, tendências alargadas que sejam efetivamente partilhadas, ao mesmo tempo que se reconhece a complexidade e a diversidade do Sul Global.

Este artigo tentou demonstrar como o multilateralismo pode ter sérias limitações (mas ainda assim ser um palco importante de diplomacia pública), como a complexidade das categorias de alinhamento no conflito pode transparecer visões de uma nova ordem multipolar e como a importância transversal das reclamações por mais equidade na ordem e nas organizações globais foram trazidos para primeiro plano durante os últimos anos. Embora o conflito tenha realçado as vulnerabilidades dos países mais associados com o conceito de Sul Global, é facto que também proporcionou uma oportunidade para afirmarem a sua agência, a sua autonomia estratégica e a sua influência. Estes países continuam, por diferentes meios e assumindo posições bem diferentes, a desafiar o statu quo e a avançar exigências de mais e melhor representação na ordem internacional, esperando que, quando a paz for alcançada, possam também vir a beneficiar dos seus dividendos.

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Notas

1 IKENBERRY, G. John - «Three worlds: the West, East and South and the competition to shape global order». InInternational Affairs. Vol. 100, N.º 1, 2024, p. 121. Para um argumento semelhante, ver também TELLIS, Ashley J. - «The Ukraine War and global cleavages».InBRANDS, Hal -War in Ukraine: Conflict, Strategy, and the Return of a Fractured World. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 2024, pp. 205-223; FRIEDBERG, Aaron L. - «A world of blocs». CSIS/ The Marshall Papers. 2023. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.csis.org/analysis/world-blocs.

2Ver, por exemplo, HAUG, Sebastian; BRAVEBOY-WAGNER, Jacqueline; MAIHOLD, Günther Maihold - «The “Global South” in the study of world politics: examining a meta category». InThird World Quarterly. Vol. 42, N.º 9, 2021, pp. 1923-1944; WAISBICH, Laura Trajber; ROYCHOUDHURY, Supriya; HAUG, Sebastian - «Beyond the single story: “Global South” polyphonies». InThird World Quarterly. Vol. 42, N.º 9, 2021, pp. 2086-2095.

3Ver, por exemplo, BRUN, Élodie - «The meanings of the (Global) South from a Latin American perspective». Oxford Research Encyclopedia of International Studies. 2023. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://oxfordre.com/internationalstudies/display/10.1093/acrefore/9780190846626.001.0001/acrefore-9780190846626-e-800.

4BRAVEBOY-WAGNER, Jacqueline Anne - «Introduction: the Global South and the multipolar moment».InBRAVEBOY-WAGNER, Jacqueline Anne, ed. -Diplomatic Strategies of Rising Nations in the Global South: The Search for Leadership and Influence. 2.ª edição. Cham: Palgrave Macmillan, 2023, pp. 1-30.

5Ver, por exemplo, SHIDORE, Sarang - «China is not the Global South». Foreign Policy. 2024. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://foreignpolicy.com/2024/10/10/china-is-not-the-global-south/. Para efeitos deste artigo, partilhamos desse entendimento, razão pela qual referências diretas à China serão consideradas como autónomas das experiências do Sul Global.

6STUENKEL, Oliver - «The new world order and the Global South». InOxford Review of Economic Policy. Vol. 40, N.º 2, 2024, p. 403. Ver também PATRICK, Stewart; HUGGINS, Alexandra - «The term “Global South” is surging. It should be retired». Carnegie Endowment for International Peace. 2023. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://carnegieendowment.org/posts/2023/08/the-term-global-south-is-surging-it-should-be-retired?lang=en.

7IKENBERRY, G. John - «Three worlds…», p. 124. Salvo indicação em contrário, todas as citações são traduções livres do autor.

8NADKARNI, Vidya,et al.- «Forum: the Russia-Ukraine War and reactions from the Global South». InThe Chinese Journal of International Politics. Vol. 17, N.º 4, 2024, pp. 449-489; MILIBAND, David - «The world beyond Ukraine: the survival of the West and the demands of the rest». InForeign Affairs. 2023. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.foreignaffairs.com/ukraine/world-beyond-ukraine-russia-west.

9Para o caso da África do Sul, ver, por exemplo, BROSIG, Malte - «Aligned or non-aligned: South Africa’s response to the war in Ukraine». InGlobal Policy. Vol. 15, N.º 4 , 2024 , pp. 757-761; VAN DER WESTHUIZEN, Janis - «Ukraine, the 2023 BRICS summit and South Africa’s non-alignment crisis». InContemporary Security Policy. Vol. 45, N.º 4, 2024, pp. 612-626; SIDIROPOULOS, Elizabeth - «How do Global South politics of non-alignment and solidarity explain South Africa’s position on Ukraine?». Brookings. 2022. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.brookings.edu/articles/how-do-global-south-politics-of-non-alignment-and-solidarity-explain-south-africas-position-on-ukraine/.

10«AFRICAN SENTIMENT is favouring Ukraine». Ipsos. 2023. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.ipsos.com/en-za/african-sentiment-favouring-ukraine.

11Para o caso do Brasil, ver, por exemplo, MOTTA, Bárbara Vasconcellos de Carvalho; SUCCI JUNIOR, David Paulo - «Brazilian foreign policy for the war in Ukraine: changing non-alignment, counterfactual, and future perspectives». InGlobalizations. Vol. 20, N.º 7, 2023, pp. 1227-1240; KRAUSE, Felipe - «Explaining Brazil’s stance on the Ukraine War». InBulletin of Latin American Research. Vol. 43, N.º 4, 2024, pp. 326-329; LOPES, Dawisson Belém; VÁZQUEZ, Karin Costa - «Peace as a hypothetical imperative: Brazil’s foreign policy standpoint on the war in Ukraine». InGlobal Policy. Vol. 15, N.º 4, 2024, pp. 752-756; LOPES, Dawisson Belém; VÁZQUEZ, Karin - «Brazil’s position in the Russia-Ukraine War: balancing principled pragmatism while countering weaponized interdependence». InContemporary Security Policy. Vol. 45, N.º 4, 2024, pp. 599-611.

12Para o caso da Índia, ver, por exemplo, VERMA, Raj - «Interests trump principles and values: India’s neutrality in the Russia-Ukraine War». InContemporary Security Policy. Vol. 45, N.º 4, 2024, pp. 585-598; GANGULY, Sumit - «India, Russia and the Ukraine crisis». InThe Washington Quarterly. Vol. 47, N.º 2, 2024, pp. 55-69.

13Para o caso das Filipinas, ver, por exemplo, DE CASTRO, Rentao Cruz - «The Philippines in the face of the Ukraine-Russia War: from confusion and disorientation to critical neutrality». InInternational Politics. Vol. 61, N.º 5, 2024, pp. 1002-1017. Para o caso da Indonésia, ver, por exemplo, WARDHANI, Baiq; DHARMAPUTRA, Radityo - «Indonesia’s ambivalence in the Russia-Ukraine war: balancing equal sovereignty norms with a familial approach». InContemporary Security Policy. Vol. 45, N.º 4, 2024, pp. 627-642.

14Existe uma abundância de dados recolhidos a esse nível ao longo dos últimos três anos. Cf., por exemplo, FOA, Roberto S.,et al.-A World Divided: Russia, China and the West. Centre for the Future of Democrac y. 2022 . Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.bennettinstitute.cam.ac.uk/publications/a-world-divided/; ASH, Garton Timothy; KRASTEV, Ivan; LEONARD, Mark - «United West, divided from the rest: global public opinion one year into Russia’s war on Ukraine». European Council on Foreign Relations. 2023. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://ecfr.eu/publication/united-west-divided-from-the-rest-global-public-opinion-one-year-into-russias-war-on-ukraine/; RITTER, Zacc; CRABTREE, Steve - «Russia suffers global rebuke after invasion». Gallup. 2023. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://news.gallup.com/poll/474596/russia-suffers-global-rebuke-invasion.aspx.

15VERMA, Raj; BROSIG, Malte - «The Russia-Ukraine War, the evolving global order, the Global South and emergence of non-alignment 2.0». InGlobal Policy. Vol. 15, N.º 4, 2024, pp. 794-801.

16KUTLAY, Mustafa; ÖNIŞ, Ziya - «A critical juncture: Russia, Ukraine and the Global South». InSurvival. Vol. 66, N.º 2, 2024, pp. 19-36.

17ALDEN, Chris - «The Global South and Russia’s invasion of Ukraine».InCOX, Michael, ed. -Ukraine - Russia’s War and the Future of the Global Order. Londres: LSE Public Policy Review Series, 2023, p. 361.

18GOWAN, Richard - «The Global South and the Ukraine War at the UN». International Crisis Group. 2023. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.crisisgroup.org/global-ukraine/global-south-and-ukraine-war-un.

19STAEGER, Ueli - «The war in Ukraine, the African Union, and African agency». InAfrican Affairs. Vol. 122, N.º 489, 2023, pp. 559-586. Para um argumento semelhante com relação ao caso do G20, ver MAKARYCHEV, Andrey; WICAKSANA, Gede Wahyu - «Multilateralism at war: Russia’s invasion of Ukraine, the G20 and world order». InGlobal Society. Online first. 2024.

20STUENKEL, Oliver - «The new world order and the Global South»; VAN DER WESTHUIZEN, Janis - «Ukraine, the 2023 BRICS summit and South Africa’s non-alignment crisis»; SCHIRM, Stefan A. - «Alternative world orders? Russia’s Ukraine War and the domestic politics of the BRICS». InThe International Spectator. Vol. 58, N.º 3, 2023, pp. 55-73.

21HEINE, Jorge - «Active non-alignment, the sovereignty paradox and the Russia-Ukraine War». InContemporary Security Policy. Vol. 45, N.º 4, 2024, pp. 698-707.

22VERMA, Raj; BROSIG, Malte - «The Russia-Ukraine War, the evolving global order…».

23HEINE, Jorge - «Active non-alignment, the sovereignty paradox and the Russia-Ukraine War», p. 6; VERMA, Raj - «The Russia-Ukraine War and the Global South’s sovereignty paradox». InContemporary Security Policy. Vol. 45, N.º 4, 2024, pp. 555-569.

24«HOW TO survive a superpower split». InThe Economist. 2023. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.economist.com/international/2023/04/11/how-to-survive-a-super-power-split.

25SPECKTOR, Matias - «In defense of the fence sitters: what the West gets wrong about hedging». InForeign Affairs. 2023. Consultado em: 10 de janeiro de 2025. Disponível em: https://www.foreignaffairs.com/world/global-south-defense-fence-sitters.

26Ver, por exemplo, MINJA, Rasul A. - «Tanzania’s position on the Ukraine crisis: neutrality with a stance or just sitting on the fence?». InThe African Review. Online first. 2024; KUTLAY, Mustafa; ÖNIŞ, Ziya - «A critical juncture…».

27SCHENONI, Luis; LEIVA, Diego; CARVALHO, Thales - «The Ukraine War and the limits of Latin American fence-sitting». InBulletin of Latin American Research. Vol. 43, N.º 4, 2024, pp. 300-304.

28STUENKEL, Oliver - «The new world order and the Global South», p. 399.

29«EUROPE HAS to grow out of mindset that its problems are world’s problems, says S Jaishankar». InThe Economic Times. 2022. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://economictimes.indiatimes.com/news/india/europe-has-to-grow-out-of-mindset-that-its-problems-are-worlds-problems-says-s-jaishankar/articleshow/91988948.cms.

30Para uma discussão mais ampla sobre estes temas, ver, por exemplo, LAWSON, George; ZARAKOL, Ayşe - «Recognizing injustice: the “hypocrisy charge” and the future of the LIO». InInternational Affairs. Vol. 99, N.º 1, 2023, pp. 201-218; BENABDALLAH, Lina - «The liberal international order as an imposition: a postcolonial reading». In Ethics & International Affairs. Vol. 38, N.º 2, 2024, pp. 162-179.

31EISENTRAUT, Sophie - «Standard deviation: views on Western double standards and the value of international rules». Munich Security Conference Brief. 2024. Consultado em: 15 de janeiro de 2025. Disponível em: https://securityconference.org/en/publications/munich-security-brief/standard-deviation/.

32POAST, Paul - «Cooperation, contestation, and context: the study of International Relations and the war in Ukraine». In International Studies Review. Vol. 26, N.º 3, 2024, viae037_1.

Recebido: 30 de Novembro de 2024; Aceito: 22 de Janeiro de 2025

Pedro Seabra, Professor auxiliar do Iscte - Instituto Universitário de Lisboa e subdiretor do Centro de Estudos Internacionais (CEI-Iscte). Exerceu funções de assessor no gabinete da ministra da Defesa Nacional do XXIII Governo Constitucional e foi, anteriormente, assessor no Instituto da Defesa Nacional. Os seus interesses de investigação concentram-se na área de relações internacionais, segurança internacional e dinâmicas regionais do Atlântico Sul.

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