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Motricidade
versão impressa ISSN 1646-107X
Motri. vol.10 no.4 Ribeira de Pena dez. 2014
https://doi.org/10.6063/motricidade.10(4).3453
ARTIGO ORIGINAL
Clima motivacional, regulação da motivação e perceção de esforço dos atletas no futebol
Motivational climate, behaviour regulation and perceived effort in soccer athletes
Diogo Monteiro1,*; João Moutão1,2; Pedro Baptista1; Luís Cid1,2
1Escola Superior de Desporto de Rio Maior (ESDRM-IPS), Rio Maior, Portugal
2Centro de Investigação em Desporto, Saúde e Desenvolvimento Humano (CIDESD), Vila Real, Portugal
RESUMO
O objetivo deste estudo foi testar a integração de dois modelos teóricos motivacionais (teoria da autodeterminação e teoria dos objetivos de realização), com o intuito de analisar o impacto do clima motivacional na regulação da motivação e na perceção de esforço. Participaram neste estudo 460 atletas, todos jogadores de futebol do género masculino, do nível distrital e nacional, das categorias de iniciados, juvenis, juniores e seniores, com uma média de idades de 17.42 ± 4.37 anos. A qualidade do modelo de equações estruturais foi examinada através do valor de qui-quadrado, e de alguns índices complementares de ajustamento. Os resultados suportam a adequação do modelo (S-B?²= 288.84, df= 147, p< 0.001, S-B?²/df= 1.96, SRMR= 0.049, NNFI= 0.912, CFI= 0.924, RMSEA= 0.046, 90%IC RMSEA= 0.038-0.054), evidenciando que um clima motivacional orientado para a tarefa tem um efeito positivo significativo sobre a motivação autónoma, que por sua vez tem um efeito positivo significativo sobre a perceção do esforço dos atletas. Por outro lado, um clima motivacional orientado para o ego teve um efeito positivo sobre a motivação controlada, que por sua vez teve um efeito negativo sobre a perceção de esforço, embora não seja significativo.
Palavras-chave: teoria da autodeterminação, teoria dos objetivos de realização, motivação, perceção de esforço, desporto
ABSTRACT
The purpose of this study was to test the integration of two motivational theoretical models (self-determination theory and the achievement goal theory) to analyze the impact of motivational climate in the regulation of motivation and athletes´ effort perception. Participated in the study 460 athletes (male football players at both regional and national level, on the categories of beginners, youth, juniors and seniors, with 17.42 ± 4.37 years-old). The quality of the structural equation model was examined by the Chi-square value and some complementary model fit indices. The results support the model fit (S-B?²= 288.84, df= 147, p< 0.001, S-B?²/df= 1.96, SRMR= 0.049, NNFI= 0.912, CFI= 0.924, RMSEA= 0.046, 90%IC RMSEA= 0.038-0.054), suggesting that a motivational task-oriented climate has a significant positive effect on autonomous motivation, which in turn has a significant positive effect on athletes' effort perception. On the other hand, an ego-oriented environment had a positive effect on the controlled motivation, which in turn had a negative effect on athletes' effort perception, although not significant.
Keywords: self-determination theory, achievement goal theory, motivation, perceived effort, sport
INTRODUÇÃO
A Teoria da Autodeterminação (SDT: Self-Determination Theory) (Deci & Ryan, 1985) e a Teoria dos Objetivos de Realização (AGT: Achievement Goal Theory) (Nicholls, 1984, 1989) são duas teorias motivacionais sociocognitivas que se preocupam em estudar a forma como as pessoas adotam e se envolvem em determinados comportamentos, incluindo o da prática desportiva (Kingston, Harwood, & Spray, 2006; Ntoumanis, 2001). A SDT (Deci & Ryan, 1985) explica os constituintes da Motivação Intrínseca e Extrínseca, bem como os fatores relacionados com a sua promoção (Deci & Ryan, 1985, 2000), tendo em conta os fatores da personalidade em contextos sociais e as causas e consequências do comportamento autodeterminado (Deci & Ryan, 2008). Segundo os seus autores (Deci & Ryan, 1985, 2000), a motivação do sujeito está relacionada com a satisfação de três necessidades psicológicas básicas (BPN: Basic Psychological Needs): necessidade de autonomia (i.e., necessidade de se sentir independente, na medida em que é o próprio indivíduo que regula as suas ações), competência (i.e., necessidade de se sentir competente, ou seja de interagir com sucesso com os estímulos do meio envolvente) e relacionamento (i.e., necessidade de se sentir vinculado a outros, ou seja de ser considerado e apreciado). São estas três BPN que explicam a regulação do comportamento das pessoas, que se estabelece num continuum motivacional, que vai desde a ausência de regulação ou falta de intenção para agir (amotivação) passando pelas formas mais controladas de motivação (i.e., regulação externa e regulação introjetada) e terminando nas formas mais autónomas de motivação (i.e., regulação identificada, regulação integrada e regulação intrínseca). De acordo com Deci e Ryan (2008) esta distinção entre a motivação controlada e autónoma é a característica nuclear da SDT, conforme o enquadramento dado pela subteoria da integração organísmica (OIT: Organismic Integration Theory) (Deci & Ryan, 2000). De uma forma geral, a OIT explora os contextos sociais, percebendo como promovem ou inibem a internalização e integração na regulação do comportamento. São estes dois processos (internalização e integração) que permitem que comportamentos motivados de formas extrínsecas se tornem mais autodeterminados (Ryan & Deci, 2000).
O segundo modelo teórico de suporte deste estudo é a AGT (Nicholls, 1984, 1989), a qual preconiza que as cognições, respostas afetivas e o comportamento das pessoas em contextos de realização são influenciados pelos fatores pessoais e situacionais. Ainda de acordo com Nicholls (1984, 1989), as pessoas são motivadas para demostrarem ou desenvolverem elevados níveis de competência, baseando esta sua avaliação em dois tipos de orientação (i.e., ego e tarefa). A orientação para a tarefa relaciona-se com uma conceção de competência segundo critérios autorreferenciados, ou seja, o êxito pressupõe melhorar e dominar a tarefa na sua modalidade (Álvarez, Castillo, Duda, & Balaguer, 2009). Por outro lado a orientação para o ego, relaciona-se com a conceção de competência segundo critérios normativos, ou seja, o êxito pressupõe uma maximização da demonstração de elevada competência perante os outros (Álvarez et al., 2009). De acordo com Ames (1992), são os fatores ambientais referentes ao envolvimento de realização, onde o indivíduo se encontra, aliado às suas características pessoais, que vão influenciar a motivação através do clima motivacional, o qual é influenciado pelos demais significativos (e.g., treinador, família, amigos).
Dada a consistência e relevância com que cada uma destas teorias tem sido aplicada ao contexto do desporto e exercício, a investigação recente tem-se focado na integração de ambas as teorias SDT e AGT, com o objetivo de proporcionar uma explicação multi-teórica para o comportamento (Chatzisarantis & Hagger, 2007; Hagger & Chatzisarantis, 2008). Assim, se tomarmos em consideração que a SDT sugere que o contexto social afeta os níveis de autodeterminação do sujeito através da facilitação/inibição da satisfação das necessidades psicológicas básicas (Deci & Ryan, 2000; Ryan & Deci, 2002, 2007), então o clima motivacional pode ter um impacto importante na regulação da motivação dos atletas porque pode facilitar ou impedir a satisfação das suas necessidades psicológicas básicas (Sarrazin, Boiché, & Pelletier, 2007). De facto, o ambiente social pode fornecer ou não as condições necessárias para a motivação autónoma, uma vez que os climas controladores normalmente estão associados a regulações externas e introjectadas e climas que dão suporte à autonomia estão associados a regulações identificadas, integradas e intrínsecas (Ryan & Deci, 2007), ou seja, os contextos podem conduzir à motivação controlada se for dada mais importância às recompensas, aos castigos e à realização referenciada, ou conduzir à motivação autónoma se derem suporte/apoio para o desenvolvimento de um comportamento autodeterminado.
Ao fazerem uma breve reflexão sobre as ligações entre a SDT e a AGT, Deci e Ryan (2000) consideraram que existem uma convergência geral entre os dois modelos, uma vez que ao nível das condições ambientais ambas as teorias sugerem que “os ambientes que são menos avaliativos e que dão mais apoio ao desejo intrínseco de aprender promovem a base para aumentar a realização e o bem-estar” (p. 260). Por outro lado, os climas motivacionais orientados para a mestria (tarefa) são promotores de padrões motivacionais adaptativos e estão associados ao aumento do bem-estar psicológico e à persistência no comportamento (Duda, 2001; Duda & Balaguer, 2007; Hagger & Chatzisarantis, 2008; Ntoumanis & Biddle, 1999). Por isso, segundo Ntoumanis e Biddle (1999) e Hagger e Chatzisarantis (2008) um clima motivacional orientado para a mestria é compatível com a motivação autónoma considerando que contextos desta natureza promovem critérios de sucesso mais intrínsecos e estão associados ao aumento da motivação intrínseca. Em contraste, um clima orientado para a performance, que opera numa base onde o critério de sucesso é normativo, pode diminuir a motivação intrínseca por colocar uma maior ênfase nas continências externas.
Assim sendo, quando falamos de diferenças individuais na orientação dos objetivos de realização, podemos dizer que, segundo Kingston et al. (2006) e Wang e Biddle (2007), a orientação para a tarefa parece estar mais associada a maiores níveis de autonomia (mais autodeterminação) e consequentemente a padrões comportamentais mais adaptativos (e.g., mais divertimento, menos aborrecimento, mais persistência) e, ao contrário, a orientação para o ego parece associar-se a menores níveis de autonomia (menos autodeterminação) e consequentemente a padrões mal adaptativos (e.g., menos divertimento, mais aborrecimento, menos persistência). Alguns estudos realizados, nos mais diversos contextos da atividade física, têm demonstrado empiricamente a ligação entre as duas teorias nesse sentido, nomeadamente no contexto do desporto (e.g., Ntounamis, 2001; Pethercik & Weigand, 2002; Spray, Wang, Biddle, & Chatzisarantis, 2006).
De facto, na última década em especial, diversos estudos aplicados ao contexto do desporto têm vindo a demonstrar que as variações dos objetivos de realização (quer ao nível disposicional, quer ao nível situacional) estão associadas a diferentes níveis de autodeterminação (Ahmadi et al., 2012; Álvarez et al., 2009; Calvo et al., 2008; Gómez-López, Granero-Gallegos, Abraldes, & Rodríguez-Suaréz, 2013; López-Walle et al., 2011; Moreno et al., 2010; Ommundsen, Lemyre, Abrahamsen, & Roberts, 2010; Vansteenkiste, Mouratidis, Van Riet, & Lens, 2014), colocando em evidência que um clima/orientação motivacional para a tarefa relaciona-se com a motivação autónoma, enquanto um clima/orientação motivacional para o ego relaciona-se com a motivação controlada. Este tipo de relações também tem vindo a ser demonstrada de forma consistente em outros contextos da atividade física, nomeadamente, na educação física escolar (e.g., Fernandes, Vasconcelos-Raposo, Lázaro, & Dosil, 2004; Murcia, Román, Galindo, Alonso, & Cutre, 2008; Zan, Podlog, & Harrison, 2012) e no exercício físico (e.g., Moutão, Alves, & Cid, 2012; Murcia, Blanco, Galindo, Villodre, & Coll, 2007). Assim como, uma revisão sistemática publicada recentemente (Teixeira, Carraça, Markland, Silva, & Ryan, 2012) colocou em evidência que as formas mais autónomas de regulação do comportamento são preditores positivos da atividade física e exercício, a curto e longo prazo.
Em suma, segundo Chatzisarantis e Hagger (2007), parece evidente de que existe também uma relação (teórica e empírica) entre os construtos subjacentes à AGT (i.e., clima e orientação motivacional) e à SDT (necessidades psicológicas básicas e regulação comportamental), cujo impacto positivo sobre as mais diversas variáveis é inegável, tal como demonstram os estudos aplicados ao contexto do desporto, como por exemplo: menor abandono da modalidade (Sarrazin et al., 2002), mais persistência na modalidade (Pelletier et al., 2001), mais divertimento durante a prática (Spray et al., 2006), melhor estado psicológico (flow) dos atletas (Moreno et al., 2010), maior coesão de grupo (Calvo et al., 2008), mais autoestima dos atletas (López-Walle et al., 2011), mais vitalidade subjetiva percecionada pelos atletas (Ommundsen et al., 2010), e maior satisfação com a performance (Vansteenkiste et al., 2014).
Desta forma, apesar de existirem diferentes estudos que integram a teoria dos objetivos de realização e a teoria da autodeterminação para analisar o impacto das suas variáveis no comportamento e emoções das pessoas (tal como foi mencionado nos estudos acima indicados), existe ainda uma lacuna na literatura no que diz respeito aos estudos que analisam esse impacto especificamente na perceção de esforço dos atletas, justificando-se assim o objetivo principal do presente estudo: analisar as relações causais hipotetizadas num modelo que integra a AGT e a SDT, para compreender qual o impacto do clima motivacional, na regulação da motivação e na perceção do esforço dos atletas na modalidade de futebol.
MÉTODO
Participantes Neste estudo participaram 460 atletas, do sexo masculino, da modalidade de futebol, dos escalões de iniciados (n= 122), juvenis (n= 173), juniores (n= 49) e seniores (n= 116), com idades compreendidas entre os 14 e os 36 anos (M= 17.42, DP= 4.37). Dos 460 atletas, 360 praticavam a modalidade a nível distrital e 100 a nível nacional, sendo que 51 são guarda-redes, 152 defesas, 157 médios e 100 avançados. Os atletas indicaram ainda uma experiência na modalidade que variou entre 1 e 24 anos de prática (M= 8.20, DP= 4.23) e um número de treinos semanais entre 1 e 5 (M = 3.28, DP= 0.57), com uma duração entre 60 a 120 minutos por sessão (M= 97.53, DP= 13.41).
Instrumentos Behaviour Regulation Sport Questionnaire (BRSQ: Lonsdale, Hodge, & Rose, 2008). Este questionário é constituído por 24 itens aos quais se responde numa escala tipo Likert de 7 níveis, que variam entre 1 (“nada verdadeira para mim”) e o 7 (“totalmente verdadeira para mim”). Os itens agrupam-se posteriormente em 6 fatores (com 4 itens cada), que refletem os tipos de motivação subjacente ao continuum motivacional da teoria da autodeterminação (SDT: Deci & Ryan, 1985). Para o presente estudo utilizou-se a versão validada de forma preliminar para a população portuguesa por Monteiro et al. (2013), com recurso a uma análise fatorial confirmatória, numa amostra de 623 atletas da modalidade de futebol, apresentando o seu modelo de medida (6 fatores com 3 itens cada) valores aceitáveis de ajustamento aos dados: S-B?²= 365.6, df= 120, p< 0.001, S-B?²/df= 3.05, SRMR= 0.055, NNFI= 0.907, CFI= 0.927, RMSEA= 0.057, RMSEA 90% CI= 0.051-0.064. No presente estudo, obtiveram-se os seguintes índices de fiabilidade interna: amotivação (a= 0.81), regulação externa (a= 0.83), regulação introjetada (a= 0.68), regulação identificada (a= 0.62), regulação integrada (a= 0.68) e motivação intrínseca (a= 0.72). Motivational Climate Sport Youth Scale (MCSYS: Smith, Cumming, & Smoll, 2008). Este questionário é constituído por 12 itens aos quais se responde numa escala do tipo Likert de 5 níveis, que variam entre o 1 (“nada verdade”) a 5 (“muito verdade”). Os itens agrupam-se posteriormente em 2 fatores (com 6 itens cada), que refletem as formas de percecionar o clima motivacional, subjacentes à teoria dos objetivos de realização (Nicholls, 1984). Para o presente estudo utilizou-se a versão validada de forma confirmatória por Borrego e Silva (2012). No presente estudo o questionário apresentou os seguintes valores de fiabilidade interna para os participantes da nossa amostra: clima motivacional orientado para o ego (a= 0.66) e tarefa (a= 0.68). No entanto, optámos por retirar os itens de cotação invertida (1 e 12), ambos do fator ego, aumentando a sua consistência interna (a= 0.70). Intrinsic Motivation Inventory (IMI: McAuley, Duncan, & Tammen, 1989). Para o presente estudo utilizou-se a versão portuguesa de Fonseca e Brito (2001), mas apenas a subescala da perceção de esforço, constituída por 5 itens (2, 6, 10, 14, 17), aos quais se responde numa escala tipo Likert de 5 níveis de resposta, que variam entre 1 (“discordo totalmente”) e 5 (“concordo totalmente”), salientando que o score dos itens 14 e 17 foi previamente invertido devido à sua formulação semântica. No presente estudo esta subescala apresentou uma fiabilidade interna de 0.64. No entanto, optámos por retirar os itens de cotação invertida, o que aumentou a consistência interna (a=0.71).
Procedimentos Após a obtenção da autorização por parte dos clubes e da assinatura do consentimento informado por parte dos participantes (no caso dos atletas menores de idade foi obtido através dos encarregados de educação), todos os dados foram recolhidos e analisados de forma anónima garantindo assim o princípio da confidencialidade. Realça-se ainda, que os dados dos questionários foram recolhidos no final das sessões de treino, demorando cerca de 20 minutos a sua aplicação.
Análise Estatística A análise de dados foi realizada em função das orientações/recomendações operacionalizadas por Cid, Rosado, Alves e Leitão (2012), sendo o método de estimação utilizado o da máxima verosimilhança (ML), através do teste do qui-quadrado, com a correção de Satorra-Bentler (S-B?²: ver Satorra & Bentler, 1994), que corrige os valores para a não normalidade da distribuição dos dados e produz resultados mais satisfatórios (Chou & Bentler, 1995), pois o valor do coeficiente de Mardia (43.64) indicou uma distribuição multivariada não normal dos dados no presente estudo. Para além do teste S-B?², os respetivos graus de liberdade (df) e o nível de significância (p), foram ainda utilizados os seguintes índices de ajustamento: Standardized Root Mean Square Residual (SRMR), Comparative Fit Index (CFI), Non-Normed Fit Index (NNFI), Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA) e o respetivo intervalo de confiança (90% CI). No presente estudo, para os índices referidos, foram adotados os valores de corte sugeridos por Hu e Bentler (1999): SRMR= 0.08, CFI e NNFI= 0.95 e RMSEA= 0.06. A análise foi realizada com o recurso ao software de análise de equações estruturais EQS 6.1 (Bentler, 2002).
RESULTADOS Como podemos observar na Tabela 1, tomando em consideração os valores de corte adotados (Hu & Bentler, 1999), o modelo inicialmente hipotetizado (modelo 1) não se ajustou de forma aceitável aos nossos dados. Desta forma, analisando os parâmetros individuais, identificámos algumas inconsistências (e.g., valores residuais muito elevados) relacionadas com os itens 4 e 5 da subescala da perceção de esforço (itens da escala com score previamente invertidos), bem como, com os itens 1 e 12 da perceção do clima motivacional orientado para o ego (Figura 1). Por outro lado, também se constatou que os pesos fatoriais dos itens mencionados eram demasiado baixos (< 0.30) para serem considerados relevantes (Hair et al., 2006; Kahn, 2006; Worthington & Whittaker), pelo que optámos pela reespecificação do modelo através da eliminação destes itens. Analisando os resultados relativos ao modelo reespecificado (Figura 2), podemos afirmar que existe uma correlação negativa significativa (r= -0.59), entre a perceção de um clima motivacional orientado para o ego e para a tarefa. Podemos observar também, que a perceção de um clima motivacional orientado para a tarefa tem um efeito positivo significativo sobre a motivação autónoma (ß= 0.62), que por sua vez tem um efeito positivo, também significativo, sobre a perceção do esforço (ß= 0.17). Por outro lado, a perceção de um clima motivacional orientado para o ego tem um efeito positivo significativo sobre a motivação controlada (ß= 0.41), que por sua vez tem um efeito negativo sobre a perceção do esforço (ß= -0.05), porém não significativo. Por último, verificamos, que na sua totalidade, as variáveis do modelo explicam apenas cerca de 4% da variância da perceção de esforço dos atletas.
DISCUSSÃO
Tendo por base o principal objetivo deste estudo, analisar qual o impacto da perceção do clima motivacional sobre a regulação da motivação e a perceção esforço dos atletas na modalidade de futebol, verificámos que o nosso modelo final apresentou valores de ajustamento bastante aceitáveis, pese embora o facto dos índices de ajustamento incrementais (CFI e NNFI) não terem atingido os valores de corte adotados sugeridos por Hu e Bentler (1999). No entanto, aceitamos o modelo como bom pois nem todos os autores aconselham que se generalize os valores de corte sugeridos por Hu e Bentler (Marsh, Hau, & Hen, 2004), apontando-se para 0.90 como valor de corte aceitável de ajustamento (Brown, 2006; Kline, 2005; Marsh et al., 2004; Whorthington & Whittaker, 2006).
Os resultados obtidos evidenciaram que um clima motivacional envolvendo o ego tem um efeito preditivo positivo e significativo com formas de motivação mais controladas, ou seja, menos autodeterminadas, no entanto, o efeito negativo que estas têm sobre a perceção de esforço dos atletas não é significativo. De acordo com Ntoumanis (2001), as pessoas orientadas para o ego possuem uma relação direta com as formas de motivação menos autodeterminadas (motivação controlada) e vários estudos têm corroborado esta afirmação (Álvarez et al., 2009; Calvo et al., 2008, López-Walle et al., 2011; Moreno et al., 2010), pois os seus resultados mostram que um clima motivacional/orientação para o ego estão relacionados negativamente com a motivação autodeterminada (mais autónoma).
Por outro lado, os resultados do nosso estudo também evidenciaram que a perceção de um clima motivacional orientado para a tarefa tem um efeito preditivo positivo e significativo sobre formas de motivação autónomas (mais autodeterminadas), que por sua vez, também têm um efeito positivo e significativo sobre a perceção do esforço. Estes resultados vão ao encontro aos obtidos no estudo realizado por Ahmadi et al. (2012), com 255 jovens atletas iranianos, de diferentes modalidades coletivas (incluindo o futebol), no que diz respeito ao facto de um clima orientado para a tarefa se relacionar positivamente com formas de motivação mais autodeterminadas (i.e., regulação identificada, integrada e intrínseca). Também no estudo de López-Walle et al., (2011), realizado com 651 jovens atletas mexicanos, de modalidades individuais, se verificaram as mesmas conclusões. No que diz respeito ao impacto do clima motivacional e da regulação motivação na perceção de esforço dos atletas, não foram encontrados estudos na literatura que pudessem ser confrontados com os nossos resultados ao nível da perceção de esforço. No entanto, se partirmos do pressuposto teórico subjacente à teoria dos objetivos de realização (Duda, 2001; Roberts, 2001), de que o esforço é uma consequência positiva da motivação do atleta (quando orientada para a tarefa), então os nossos resultados, que evidenciaram uma relação positiva e significativa entre clima motivacional orientado para a tarefa, a motivação autónoma e a perceção de esforço, podem ser corroborados com alguns estudos realizados no contexto desportivo (e.g., López-Walle et al., 2011; Moreno et al., 2010; Pelletier et al., 2001), nos quais foram encontradas correlações positivas significativas entre o clima motivacional orientado para a tarefa, as formas autónomas de regulação da motivação e as consequências comportamentais positivas, autoestima, flow disposicional e persistência na modalidade, respetivamente. Os resultados destes estudos comprovam empiricamente as conclusões de uma revisão de literatura sobre o clima motivacional na atividade física e desportiva, realizada por Ntoumanis e Biddle (1999), na qual os autores identificaram claramente uma associação entre um clima motivacional orientado para a tarefa e consequências comportamentais, cognitivas e afetivas positivas.
Por último, é importante realçar ainda, que o modelo analisado explica apenas uma pequena quantidade da variância da perceção de esforço (4%), o que é muito comum na área das ciências sociais e humanas. De facto, o poder preditivo das teorias explicativas do comportamento é ainda muito modesto no domínio da investigação em atividade física e desportiva (Biddle & Fuchs, 2009), pois muito raramente os modelos propostos pelos investigadores explicam mais do que 20% da variância das variáveis de resultado (e.g., Álvarez, Balaguer, et al., 2009; Álvarez, Castillo, et al., 2009; Ntoumanis, 2001; Sarrazin et al., 2002).
CONCLUSÕES Com os resultados do presente estudo podemos retirar importantes ilações para a prática, uma vez que o modelo testado indica claramente que quando se promove um clima motivacional orientado para a tarefa (i.e., um clima que dá ênfase ao desenvolvimento pessoal e à realização da atividade por critérios autorreferenciados), promove-se a motivação autodeterminada (i.e., a identificação do sujeito com a modalidade, a sua integração no self e o prazer com a sua prática), que por sua vez tem um impacto positivo no comportamento, promovendo uma maior perceção de esforço por parte do atleta na realização das tarefas inerentes à prática da modalidade. Por último, como recomendações para futuras investigações, sugerimos que seja estudada a análise da invariância do modelo em função dos diferentes escalões competitivos, permitindo verificar se os impactos entre as variáveis estudadas, no presente estudo, se mantêm inalteráveis. Por outro lado, também seria importante analisar o efeito mediador das necessidades psicológicas básicas entre o clima motivacional e regulação da motivação, e a sua repercussão na perceção de esforço dos atletas.
REFERÊNCIAS
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Agradecimentos:
Nada a declarar.
Conflito de Interesses:
Nada a declarar.
Financiamento:
Nada a declarar.
Artigo recebido a 01.02.2014; 1ª Revisão 14.03.2014; Aceite 24.04.2014
*Autor correspondente: Escola Superior de Desporto de Rio Maior, Av. Dr. Mário Soares, 2040-413 Rio Maior, Portugal; E-mail: diogomonteiro@esdrm.ipsantarem.pt