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Motricidade

versão impressa ISSN 1646-107Xversão On-line ISSN 2182-2972

Motri. vol.18 no.2 Ribeira de Pena dez. 2022  Epub 28-Nov-2022

https://doi.org/10.6063/motricidade.27134 

ARTIGO ORIGINAL

Estratégias de pacing na Maratona de Berlim de 2004 a 2019

Pacing strategies in Berlin Marathon from 2004 to 2019

João Vitor da Silva Oliveira1 
http://orcid.org/0000-0002-5445-8784

Josária Ferraz Amaral1 
http://orcid.org/0000-0002-9893-8675

Jorge Luis da Silva2 
http://orcid.org/0000-0002-7164-2073

Renata de Faria Leão2 
http://orcid.org/0000-0002-8636-1434

Cristiano Diniz da Silva1 
http://orcid.org/0000-0002-6129-1732

Marcus Vinicius da Silva1  * 
http://orcid.org/0000-0001-8309-2032

1Universidade Federal de Juiz de Fora – Governador Valadares (MG), Brasil.

2Universidade Federal de Juiz de Fora – Juiz de Fora (MG), Brasil.


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo investigar as estratégias de pacing utilizadas por homens e mulheres na Maratona de Berlim entre os anos de 2004 e 2019. Foram analisados os registros dos 20 primeiros atletas no masculino e feminino. A amostra foi dividida em sete grupos: recorde mundial, grupo dos campeões (masculino e feminino), grupo do 2º ao 5º colocado (masculino e feminino) e grupo do 6º ao 20º colocado (masculino e feminino). O tempo realizado nas oito parciais de 5 km e na parcial de 2.195 km foram convertidos em segundos para cálculo de velocidade em metros por segundos. Para análise da estratégia de pacing a velocidade em cada parcial foi normalizada pela velocidade média na prova. Utilizou-se ANOVA de um fator para verificar possíveis diferenças entre os grupos em cada parcial, e para a análise da estratégia de pacing de cada grupo, foi utilizada a ANOVA de medidas repetidas intra-grupo. Os homens recordistas mundiais utilizaram estratégia de pacing constante (p= 0.98). Os grupos de campeões, masculino e feminino, também utilizaram estratégia de pacing constante (p> 0.108). Os grupos do 2º ao 5º colocados, de ambos os sexos, apresentaram estratégia de pacing positiva (homens p= 0.001–0.007; mulheres p = 0.001–0.04). Do mesmo modo, os atletas dos grupos do 6º à 20º colocados masculino e feminino também apresentaram estratégia de pacing positiva (homens p< 0.001; mulheres p< 0.001). Não foram encontradas diferenças na estratégia de pacing entre homens e mulheres vencedores. Conclui-se que a estratégia de pacing constante é aquela que possibilitou melhor êxito na Maratona de Berlim, tanto os recordistas quanto os campeões a utilizaram.

PALAVRAS-CHAVE: estratégias de pacing; corredores de alto nível; maratona

ABSTRACT

This study aimed to investigate the pacing strategies used by men and women in the Berlin Marathon between 2004 and 2019. The records of the first 20 male and female athletes were analysed. The sample was divided into seven groups: world record, champions group (men and woman), 2nd to 5th place group (men and woman) and 6th to 20th place group (men and woman). The time taken in the eight partials of 5 km and the partial of 2,195 km were converted into seconds to calculate the speed in meters per second. To analyse the pacing strategy, the speed in each partial was normalised by the average speed in the test. One-way ANOVA was used to verify possible differences between the groups in each partial. For the analysis of the pacing strategy of each group, the intra-group repeated measures ANOVA was used. World record men used a constant pacing strategy (p= 0.98). The champions groups, male and female, also used a constant pacing strategy (p> 0.108). The 2nd to 5th placed groups of both sexes presented a positive pacing strategy (men p= 0.001– 0.007; women p= 0.00– 0.04). Likewise, the athletes from the 6th to 20th place male and female groups also presented a positive pacing strategy (men p< 0.001; women p< 0.001). No differences were found in the pacing strategy between winning men and women. We conclude that the constant pacing strategy is the reason that made possible the best success in the Berlin Marathon; both the record holders and the champions used it.

KEYWORDS: pacing strategies; high-level runners; marathon

INTRODUÇÃO

Diversos fatores contribuem para o ótimo rendimento dos corredores de alto nível que competem em maratonas, tais como: a potência aeróbia máxima, o elevado limiar anaeróbio e a economia de corrida (Conley, Krahenbuhl, & Burkett, 1981). No entanto, mesmo com altos valores das capacidades supracitadas, se o atleta não gerenciar os esforços ao longo da prova, possivelmente não terá êxito. Nesse sentido, destacamos outra variável importante para o rendimento em corridas de fundo, a estratégia de pacing, que é entendido como a capacidade do atleta em distribuir o esforço momento a mamomento para que ele gaste energia afetivamente prevenindo a fadiga antes da conclusão do evento (Abbiss & Laursen, 2008; Nikolaidis & Knechtle, 2017; Skorski & Abbiss, 2017).

Na maratona, alguns perfis de pacing já demonstraram serem mais utilizados pelos atletas: o perfil constante, que é caracterizado pela manutenção da velocidade durante toda a prova; no perfil de pacing positivo o corredor apresenta a velocidade na parte inicial da prova superior a velocidade da parte final; o perfil de pacing negativo a velocidade na parte inicial da prova é inferior a velocidade da parte final; e no perfil variável, há alterações da velocidade ao longo de toda prova, que podem ser influenciadas pelas acaracterísticas do percurso e/ou ação dos adversários (Casado, Hanley, Jiménez-Reyes & Renfree, 2021; Pryor, Johnson, Yoder & Looney, 2020).

Conhecer as mudanças observadas no padrão de velocidade de corredores durante competições tem sido apontado como relevante para a preparação desses atletas (De Koning et al., 2011), pois, a capacidade de gerenciar de forma adequada a energia, pode ser decisava para o resultado final na prova (Skorski & Abbiss, 2017; Abbiss & Laursen, 2008). No entanto, temos que levar em consideração que diversos fatores podem influenciar a estratégia de pacing adotada, tais como: as regras, o perfil altimétrico (aclives e declives), as condições climáticas (vento, precipitação, temperatura e umidade relativa do ar) e principalmente o objetivo do atleta, que pode ser melhorar marcas ou apenas vencer a prova (Díaz, Fernández-Ozcorta, Torres & Santos-Concejero, 2019; Pryor et al., 2020; Casado et al., 2021).

A literatura tem apontado que existem diferenças entre as provas em que há obtenção de recorde mundial quando comparadas com as provas em que o objetivo do atleta é apenas boa colocação. Geralmente nas provas em que ocorrem a obtenção de recorde, os atletas adotam a estratégia de pacing constante (Thiel, Foster, Banzer, & de Koning, 2012). Nesse sentido, Sousa, Sales, Nikolaidis, Rosemann e Knechtle (2018) fizeram o prognóstico de que para quebrar barreira das duas horas da na maratona masculina, além de diversos outros fatores, seria necessário a utilização da estratégia de pacing constante. Por outro lado, em provas que não há quebra de recorde, os atletas utilizam diversas estratégias de pacing, que muitas das vezes são moduladas pelas estratégias dos adversários (Renfree, Crivoi do Carmo, Martin & Peters, 2015; Hettinga, Konings, & Pepping, 2017; Hanley, 2018).

Diante do apresentado, faz-se necessário investigar, quais estratégias de pacing foram utilizadas por diferentes grupos de rendimento masculino e feminino em várias edições da Maratona de Berlim. Nessa prova, a maioria dos recordes mundiais da maratona masculina, são superados, pois ela reúne diversos fatores favoráveis para isso, tais como: perfil altimétrico, clima, elevada premiação em dinheiro e atletas que correm boa parte da prova no ritmo do recorde, conhecidos como “coelhos” ou pacemakers. Sendo assim, o presente estudo pretendeu analisar as estratégias de pacing utilizadas pelos atletas de elite masculino e feminino (vinte primeiros colocados) da Maratona de Berlim entre os anos de 2004 a 2019.

MÉTODO

O estudo possuiu dispensa do termo de consentimento livre e esclarecido, pois não houve intervenção direta aos atletas, utilizando dados de acesso público. Todos esses procedimentos seguiram as diretrizes da resolução nº510 de 2016, que versa sobre a dispensa de aprovação de comitê de ética, entre outras questões, para estudos com esse desenho metodológico de recolha de dados.

Participantes

Foram incluídos na pesquisa os registros dos 20 primeiros colocados no masculino e no feminino (637 registros), participantes da Maratona de Berlim, entre os anos de 2004 a 2019. Foram excluídos os registros atípicos, ou dados faltantes nos resultados parciais.

Procedimentos

Os tempos executados pelos atletas nas provas foram recolhidos no site oficial da Maratona de Berlim (www.bmw-berlin-marathon.com), que são de acesso público. O acesso ocorreu entre os meses de abril a maio de 2021. O tempo parcial da prova de cada atleta foi reportado no site a cada 5 km (8 segmentos) e os últimos 2,195 km. O tempo em minutos de cada parcial foi convertido em segundos para o cálculo da velocidade em metros por segundo. Os atletas analisados foram divididos em sete grupos: grupo de recorde mundial (masculino), grupo dos campeões (masculino e feminino), grupo do 2º ao 5º colocados (masculino e feminino) e grupo do 6º ao 20º colocados (masculino e feminino).

Análise estatística

Os dados descritivos foram apresentados como média e desvio padrão. Para estatística inferencial, a velocidade média em cada parcial na prova foi normalizada pela média intra-sujeito. Os valores superiores a 100% determinam que o tempo parcial foi mais rápido do que tempo médio. Ao mesmo tempo, valor abaixo de 100% significa o ritmo parcial mais lento que velocidade média na prova.

Para verificar a normalidade da distribuição de todas as variáveis analisadas, utilizou-se o teste de Shapiro-Wilk. Além disso, também foi verificado o pressuposto de homogeneidade de variância pelo teste de Lèvene. Para analisar as diferenças entre os grupos foi utilizado a ANOVA de um fator, e para as alterações nas parciais ao longo do tempo foi utilizada a ANOVA de medidas repetidas intra-grupo. Os dados foram analisados no software SPSS (SPSS 21.0; IBM Corporation, Armonk, NY, EUA) e a significância estabelecida foi p< 0.05.

RESULTADOS

A Tabela 1 apresenta os recordes mundiais masculino estabelecidos na Maratona de 2004 a 2019. Todos estes recordes no masculino aconteceram na maratona de Berlim.

Tabela 1 Recordes mundiais da Maratona masculina estabelecidos entre 2004 a 2019. 

ANO ATLETA Idade (anos) NACIONALIDADE TEMPO VELOCIDADE (km/h)
2007 Haile Gebresellasie 35 Etiópia 2:04:26 20.34
2008 Haile Gebresellasie 36 Etiópia 2:03:59 20.45
2011 Patrick Makau 26 Quênia 2:03:38 20.47
2013 Wilson Kipsang 31 Quênia 2:03:23 20.57
2014 Denis Kimeto 30 Quênia 2:02:57 20.62
2018 Eliud Kipchoge 34 Quênia 2:01:39 20.80

A Tabela 2 apresenta os tempos médios, mínimos e máximos dos 20 primeiros atletas masculino e feminino da maratona de Berlim nas edições de 2004 a 2019. Os atletas foram divididos em seis grupos, sendo estes, grupo de campeões, 2 ao 5º colocados e 6 ao 20º colocado masculino e feminino.

Tabela 2 Tempos médios, mínimos e máximos dos atletas masculino e feminino participantes da Maratona de Berlim nas edições de 2004 a 2019. 

Masculino (n= 320) Feminino (n= 317)
Campeões 2:04:16 (n= 16)
[2:01.39–2:07.41]
2:20:45 (n= 16)
[2:18:11–2:24:51]
2º ao 5º 2:07:45 (n= 64)
[2:02:48–2:15:29]
2:25:19 (n= 64)
[2:18:34–2:35:32]
6º ao 20º 2:14:20 (n= 240)
[2:07:35–2:23:23]
2:38:40 (n= 237)
[2:22:48–2:57:09]

O Gráfico 1 apresenta as estratégias de pacing adotadas pelos 20 primeiros colocados. Os grupo de recordes mundiais e campeões apresentaram estratégia de pacing constante, pois não foi observado nenhuma diferença na velocidade normalizada entre as parciais (p= 1 e p= 0.108– 1, respectivamente). O grupo do 2º ao 5º, apresentou perfil de pacing positivo, parte final da prova (parciais 35 a 42.195 km) com velocidade normalizada inferior a parte inicial 5 a 30 km (p= 0.001– 0.007). O grupo do 6º ao 20º colocado também apresentou a estratégia de pacing positiva, segunda metade da prova (parciais 25 ao 42.195 km) com a velocidade normalizada inferior (p< 0.001) a parte inicial (parciais 5 a 20 km).

Gráfico 1 Estratégias de pacing adotadas pelos homens na Maratona de Berlim entre os anos de 2004 e 2019. 

O grupo de recordes mundiais apresentou a velocidade normalizada nas parciais 10, 15 e 20 km inferior se comparado ao grupo do 6º ao 20º (p= 0.01) e superior na parcial de 40 km (p= 0.03). Os campeões também apresentaram velocidade média inferior nas parciais do 5 ao 20 km se comparado com o grupo 6º ao 20º (p= 0.00– 0.01) e velocidade superior nas parciais de 35 a 42.195 km (p= 0.02). O grupo dos campeões também apresentou velocidade inferior (parciais 10, 15 e 20 km) se comparado com o grupo do 2º ao 5º (p= 0.02– 0.03), porém, a velocidade foi superior na parcial 40 km, quando comparado com a mesma parcial no grupo do 2º ao 5º (p= 0.05).

O Gráfico 2 apresenta a estratégia de pacing adotada pelos homens na maratona de Berlim nas edições em que houve quebra de recorde mundial (2007, 2008, 2011, 2013, 2014, 2018). O grupo de recorde mundial apresentou estratégia de pacing constante, pois não foi observada diferença na velocidade média normalizada entre as parciais (p= 0.98). O grupo do 2º ao 5º apresentou estratégia de pacing positiva, sendo caracterizada pela parte final (parciais 40 a 42.195 km) da prova com a velocidade normalizada inferior as parciais 5 a 35 km (p= 0.001– 0.017). O grupo do 6º ao 20º apresentou estratégia de pacing positiva, sendo observado maior velocidade nas parciais 5 a 20 km quando comparado com as parciais de 30 a 42.195 km (p< 0.001).

Gráfico 2 Estratégias de pacing adotadas pelos homens na Maratona de Berlim nas edições em que os recordes mundiais foram estabelecidos. 

Ao comparar os grupos, o recordistas mundiais apresentaram velocidade normalizada inferior ao grupo 6º ao 20º nas parciais de 5, 10 e 15 km (p= 0.02– 0.04) e superior na parcial de 40 km (p= 0.04).

O Gráfico 3 apresenta a estratégia de pacing do feminino nas edições de 2004 a 2019 da maratona de Berlim. As campeãs apresentaram estratégia de pacing constante, pois não foi observada nenhuma alteração da velocidade média normalizada entre as parciais (p= 1). O grupo de atletas 2ª a 5ª colocadas apresentou estratégia de pacing positiva, pois as parciais do 35 ao 42 km apresentaram velocidade normalizada inferior a parte inicial e intermediária da prova (p= 0.001– 0.04). O grupo 6ª a 20ª colocadas também apresentou estratégia de pacing positiva, a segunda metade da prova (parciais de 25 a 42.195 km) foi realizada em velocidade inferior a primeira metade (parciais 5 a 20 km) (p< 0.001).

Gráfico 3 Estratégias de pacing adotadas pelas mulheres na Maratona de Berlim entre os anos de 2004 e 2019. 

Ao comparar os grupos, as campeãs apresentaram velocidade normalizada superior na parcial de 40 km (p= 0.03). As campeãs apresentaram velocidade normalizada inferior em relação ao grupo 6ª a 20ª, nas parciais de 5 km (p= 0.04) e velocidade superior nas parciais de 35 km (p= 0.04) e 40 km (p= 0.02). O grupo 2ª ao 5ª colocado teve velocidade superior ao grupo 6ª a 20ª colocada na parcial de 25 km (p= 0.001).

O Gráfico 4 apresenta a estratégia de pacing adotada pelos campeões no masculino e feminino na maratona de Berlim nos anos de 2004 a 2019. Os homens e as mulheres campeãs apresentaram perfil de pacing constante.

Gráfico 4 Estratégias de pacing adotadas pelos campeões no masculino e feminino na Maratona de Berlim entre os anos de 2004 e 2019. 

DISCUSSÃO

Este estudo analisou as estratégias de pacing adotadas pelos vinte primeiros atletas homens e mulheres concluintes da Maratona de Berlim entre os anos de 2004 a 2019. Foi observado que os vencedores tanto no masculino quanto no feminino, inclusive nas edições de obtenção do recorde mundial no masculino, utilizaram a estratégia de pacing constante. Já os demais grupos, no masculino e no feminino utilizaram a estratégia de pacing positiva.

A Maratona de Berlim apresenta diversas características propícias para a quebra de recordes. De fato, Díaz, Renfree, Fernández-Ozcorta, Torres e Santos-Concejero (2019), analisaram a estratégia de pacing nas seis maiores maratonas mundiais (Nova York, Londres, Berlim, Boston, Tokyo e Chicago). Segundo os autores supracitados, Berlim apresenta um perfil altimétrico muito propício a estratégia de pacing constante, pois o início da prova tem elevação de 38 m acima do nível do mar e não ultrapassa 53 m, e ainda apresenta declive ao longo dos 15 km finais. Não só o perfil altimétrico pode exercer influência na performance dos atletas em maratonas, de fato, Scheer et al. (2021) analisou a influência das condições ambientais para o recorde mundial na maratona de Berlim de 1974 a 2019, e encontrou que nos anos de quebra de recorde (1998, 2003, 2007, 2008, 2011, 2013, 2014 e 2018) no masculino, a temperatura média foi de 13.07± 4.01°C. A soma dessas condições propícias motivam os atletas a se preparem para uma possível quebra de recorde mundial ou obtenção de melhor marca pessoal.

No presente estudo os homens vencedores das edições, inclusive nas que houveram a quebra de recorde, adotaram a estratégia de pacing constante, apoiando esse achado, o estudo de Hanley (2016) demonstrou que os homens medalhistas do campeonato mundial 2007 a 2011 utilizaram estratégia de pacing constante. Do mesmo modo, Muñoz-Pérez et al. (2020), observaram a estratégia de pacing constante na maratona de Berlim (2017) tanto dos maratonistas treinados (≤ 2:19:00) quanto dos bem treinados (≤ 3:00:00).

O estudo de Díaz, Fernández-Ozcorta e Santos-Concejero (2018) observou que as estratégias de pacing passaram por transformações nos últimos 50 anos (1967 a 2014). Nos anos de 1967 a 1988, os atletas começavam mais rápido do que a velocidade necessária para a quebra de recorde, porém, não sustentavam até o fim, e a partir de 1988, a estratégia mudou para negativa (ritmo mais estável no início e aceleração no final).

Atualmente, parece que correr de forma constante é de fato o melhor para bons resultados e quebras de recordes em provas de resistência (Thiel et al., 2012). De fato, estudo conduzido por de García-Manso, Martínez-Patiño, de la Paz Arencibia e Valverde-Esteve (2021), ao analisar os melhores corredores da maratona de Frankfurt (2008 a 2018), os recordes mundiais masculinos no século 21, os projetos Nike Breaking2 e INEOS, encontraram a estratégia de pacing constante como dominante entre os corredores de alto nível. Nos desafios Breaking 2 e INEOS, por exemplo, carros com luzes iluminando a rua foram posicionados na frente dos corredores, eles trafegaram de forma constante em todo o percurso, na velocidade para a realização dos 42.195 km abaixo de duas horas. No primeiro desafio Eliud Kipchoge ficou a 26 segundos de quebrar a barreiras das 2 horas, já no segundo, ele realizou a marca de 1h59min40s (García-Manso et al., 2021).

Esses achados corroboram resultados da presente pesquisa, tanto os homens quanto as mulheres vencedores utilizaram a estratégia de pacing constante. Parece que a utilização da estratégia constante, garante ao atleta a não fadiga prematura e utilização equilibrada dos substratos energéticos e ativação das vias metabólicas corretamente ao longo de toda a prova.

No presente estudo, as mulheres vencedoras utilizaram estratégia de pacing constante, assim como a pesquisa de Renfree e Gibson (2013), que analisou o campeonato mundial de maratona em Berlim 2009. Da mesma forma, o estudo de Hanley (2016) também demonstrou que as medalhistas dos campeonatos mundiais de atletismo entre 2001 a 2015 e dos Jogos Olímpicos de 2012 apresentaram estratégia de pacing constante. Dentre as edições estudadas no presente estudo não aconteceu quebra recorde no feminino, e isso pode não estar relacionado a estratégia de pacing desfavorável, mas possivelmente pelas condições climáticas para o desempenho das mulheres. De fato, o estudo de Scheer et al. (2021) que analisou a influência das condições ambientais para o recorde mundial em maratonas (masculino e feminino), constatou que nos anos de obtenção de recorde feminino (1977, 1999 e 2001) as condições climáticas foi de temperaturas mais baixas em torno de 13.07± 4.01°C, chuva com média de 5,63 mm, cobertura de nuvens e nenhum sol. Para os homens a temperatura média em quebra de recorde era em torno de 18.61± 2.59°C, em dias predominantemente secos, ensolarados, com pouca chuva (1,22 mm). De fato, o atual recorde feminino da Maratona foi obtido em baixas temperaturas (4– 8°C) em Chicago 2019 pela queniana Brigid Kosgei (2:14.04) (Bannon, 2021).

Nos grupos masculino e feminino do 2º ao 5º colocados, ambos apresentaram estratégia de pacing positiva. Esses atletas podem ter optado por desacelerarem para se pouparem, tendo em vista que entre os quilômetros 20 e 30 já verificaram a impossibilidade de vitória e/ou recorde mundial nessa prova. E ainda, muitas das vezes esses atletas ficam distantes dos líderes, e não se beneficiam dos atletas que atuam como “coelhos”. Esses coelhos são atletas de alto nível que correm cerca de 30 a 35 km na velocidade do recorde mundial.

Outro fator que poderia explicar essa estratégia de pacing positiva é uma possível fadiga antecipada, levando em consideração a elevada velocidade no início da prova e redução da mesma do meio para o fim, sendo assim, essa estratégia parece ineficaz para atletas de alto rendimento Sousa et al. (2018). Os homens desse grupo iniciaram com velocidade normalizada em torno de 102%, com velocidade normalizada superior a dos vencedores, que iniciaram a prova por volta de 100,5% da velocidade normalizada. As corredoras desse grupo iniciaram a prova em torno de 101% da velocidade normalizada até o km 20, ou seja, podem ter saído em uma velocidade incondizente com o nível de preparação atual, as campeãs correram essa mesma parte em torno de 99,5% da velocidade média normalizada. Esses achados tornam claro a importância do bom gerenciamento do ritmo de corida para obtenção de êxito na maratona, principalmente na parte inicial, para o bom resultado na maratona (Abbiss & Laursen, 2008; Skorski & Abbiss, 2017).

Observou-se nos grupos 6º ao 20º colocados tanto no masculino quanto no feminino utilizaram estratégia de pacing positiva, demonstrando queda de velocidade ao longo da prova. Do mesmo modo, Hanley (2016) analisando a Maratona do campeonato mundial de 2007 a 2011, encontrou que os corredores que não obtiveram medalhas realizaram a estratégia de pacing constante até o meio da prova, entretanto, da metade até a parte final diminuíram a velocidade. Nos grupos de 6º ao 20º colocados, os homens saíram a 103% da velocidade média normalizada e as mulheres saíram a 102%. Assim como nos grupos de 5º ao 20º colocado, a elevada velocidade inicial pode ter afetado a possibilidade de se manter uma estratégia constante e consequentemente um bom resultado.

Conhecer as estratégias de pacing em provas com quebra de recorde mundial pode auxiliar melhor o planejamento dos treinadores e consequentemente desempenho dos corredores de alto rendimento. Por meio dos resultados podemos observar que a estratégia de pacing constante tende a ser a mais apropriada para a vitória ou quebra de recorde. Sugere-se para os treinadores e atletas de alto rendimento com objetivo de quebra de recordes em Maratonas, que os treinamentos proporcionem estímulos para o aprimoramento da capacidade psicofísica, para conseguirem correr essa longas distâncias em alta intensidade e de forma constante.

Como limitação desse estudo, destacamos a não realização de intervenção pré e pós com os atletas, para tentarmos identificar as impressões deles sobre o motivo de terem utilizado determinada estratégia, e também não foi analisado o sprint final na prova (últimos 1000 m), pois esses dados não são mensurados e/ou disponibilizados pela organização da prova.

CONCLUSÕES

Concluímos que o êxito na Maratona de Berlim está relacionado a estratégia constante de pacing adotado e também aos diversos fatores favoráveis. Observou-se também que os recordes femininos não foram quebrados na Maratona de Berlim nessas 16 edições analisadas, possivelmente por fatores que não estão relacionados com a estratégia de pacing adotada. Diante disso, a utilização de metodologias de treinamento que aprimorem a capacidade do atleta em correr em ritmo constante, por um período prolongado (distâncias superiores a 30 km) e próximo a intensidade da prova, são necessárias para os Maratonistas que anseiam a quebra do recorde mundial.

Financiamento: nada a declarar.

REFERÊNCIAS

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Bannon, T. (2021). The forecast for Sunday’s Chicago Marathon calls for cooler temperatures — but is that good for runners? Chicago Tribune. [ Links ]

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Conley, D. L., Krahenbuhl, G. S., & Burkett, L. N. (1981). Training for aerobic capacity and running economy. The Physician and Sportsmedicine, 9(4), 107-146. https://doi.org/10.1080/00913847.1981.11711060Links ]

De Koning, J. J., Foster, C., Bakkum, A., Kloppenburg, S., Thiel, C., Joseph, T. & Porcari, J. P. (2011). Regulation of pacing strategy during athletic competition. PloS One, 6(1), e15863. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0015863Links ]

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Recebido: 1 de Julho de 2021; Aceito: 14 de Dezembro de 2021

*Autor correspondente: Rua São Paulo, 745, Centro – CEP: 35010-180 – Governador Valadares (MG), Brasil. E-mail: marcus.silva@ufjf.br

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