INTRODUÇÃO
O termo idoso representa o diferente espectro de idades e capacidades fisiológicas, onde tipicamente se incluem indivíduos com idades iguais ou superiores a 65 anos (ACSM, 2021). A evidência científica aponta para inquestionáveis benefícios de saúde para os idosos, decorrentes da prática de atividade física e exercício físico, tendo um papel cada vez mais importante na prevenção e no tratamento de múltiplas doenças crónicas (e.g., doenças metabólicas ou doenças cardiovasculares), outros problemas de saúde, bem como de fatores de risco associados (ACSM, 2021), numa fase em que a população se encontra cada vez mais envelhecida. De facto, e de acordo com os Censos de 2021 (INE, 2021), o número de pessoas em Portugal com 65 anos ou mais de idade aumentou 20,6% nos últimos 10 anos, representando, atualmente, 23,4% da população. Atualmente, o índice de envelhecimento da população traduz-se em 182 idosos por cada 100 jovens (INE, 2021).
Tendo por base esta evidência demográfica, o termo “envelhecimento ativo” surgiu no final dos anos 90, sendo adotado pela Organização Mundial de Saúde, significando o processo de otimização das oportunidades para a saúde, a participação e a segurança, com o objetivo de efetuar melhorias na qualidade de vida (QdV), á medida que as pessoas envelhecem (Couto, 2003). Von Faber et al. (2001) caracterizam o envelhecimento ativo como um processo adaptativo do percurso de vida de forma a obter um funcionamento físico, psicológico e social ótimos. Assim, a prática de exercício físico, parece estar relacionada com os diferentes benefícios para esta população (Antunes et al., 2022; Teixeira, Nunes, Ribeiro, Arbinaga, & Vasconcelos-Raposo, 2016).
Os efeitos da prática regular de exercício físico, de forma regular, têm sido reportados pela literatura de forma muito consistente (e.g., Shinn, Salgado, & Rodrigues, 2020), sendo de destacar os efeitos positivos na QdV do individuo, diminuição do risco de doenças crónicas geralmente comuns entre os idosos tais como doença coronária, hipertensão, diabetes, doenças metabólicas, doenças degenerativas e perturbações emocionais, nomeadamente depressão. Aumenta ainda a capacidade de desempenho em diferentes atividades físicas, aumenta os níveis de bem-estar, e melhora a autoestima e a autoeficácia, reduzindo eventuais problemas associados á falta de autonomia física (Porto, Guedes, Fernandes, & Reichert, 2012).
Um estudo recente (Mohammad, Nasser, Mojtaba, Zahra, & Masoumeh, 2019) em que participaram 724 mulheres com idade compreendidas entre os 65 anos e os 75 anos identificou diferenças significativas na comparação da QdV e composição corporal em idosas sedentárias e fisicamente ativas. Além destes benefícios ao nível da saúde física do idoso, importa também compreender que outros benefícios da prática regular de exercício físico ou atividade física, nomeadamente ao nível do seu bem-estar, QdV e sintomatologia depressiva e ansiosa.
Segundo Diener (2006) o bem-estar subjetivo (BES) é considerado como uma avaliação cognitiva (satisfação com a vida) e afetiva (afetos positivos e negativos) que os indivíduos fazem sobre as suas próprias vidas,, mas também avaliações baseadas em sentimentos, incluindo estados de espírito e emoções (Diener & Chan, 2011). Segundo Diener, Suh, Lucas e Smith (1999) a intensidade emocional com que os idosos experienciam a vida diminui durante o processo de envelhecimento. Estudos apontam para um aumento da satisfação com a vida e uma diminuição da intensidade das experiências afetivas com o avançar da idade, enquanto a intensidade das experiências afetivas diminui (e.g., Antunes et al., 2018).
A satisfação com a vida, segundo Diener, Emmons, Larsen e Griffin (1985) refere-se ao julgamento cognitivo que o indivíduo faz acerca da sua vida em relação a determinados contextos (e.g., família, saúde, trabalho, entre outras) É, em conjunto com indicadores físicos e mentais, um indicador de QdV (Diener et al., 1985; Kahneman, Diener, & Schwarz, 1999). Os afetos positivos são emoções de prazer (e.g., felicidade, alegria, entre outras) (Diener et al., 1985; Galinha, 2008). Enquanto os afetos negativos estão associados a sentimentos negativos que se caraterizam por uma vivência desagradável (e.g., solidão, tristeza, culpa, entre outras) (Crawford & Henry, 2004). Empiricamente, parece existir uma relação entre as nossas emoções e o nosso comportamento, verificada por uma tendência para a procura de atividades nas quais podemos sentir maior prazer e bem-estar, sendo expectável a repetição dessas mesmas atividades no futuro (Jekauc & Brand, 2017).
A literatura tem associado, positivamente o BES à prática de exercício físico, em diferentes idades, destacando igualmente que indivíduos com uma prática regular de exercício físico apresentam níveis de BES mais elevados do que aqueles que são sedentários (Miranda Neto, Lima, Gomes, Santos, & Tolentino, 2012; Oztekin & Tezer, 2009).
A preocupação com a QdV do idoso deverá, igualmente, ser um foco importante de investigação especialmente tendo em conta o envelhecimento demográfico a que temos vindo a assistir sendo por isso importante garantir, não só o aumento da esperança média de vida, como também o aumento da qualidade e produtividade desses mesmos anos (Kanesarajah, Waller, Whitty, & Mishra, 2018). Este conceito, embora seja comumente usado, muitas das vezes não é claramente definido ou compreendido (Vanleerberghe, De Witte, Claes, Schalock, & Verté, 2017). Desta forma, a prática de exercício físico e atividade física assume-se como um importante promotor de QdV e bem-estar na população idosa, exercendo ainda um efeito positivo nos diversos domínios da QdV do idoso (e.g., Antunes et al., 2022). O exercício físico proporciona oportunidades para a extensão dos anos ativos na vida do individuo diminuindo simultaneamente os distúrbios, e por consequência, incrementando a QdV em pessoas idosas (Becker, 2013).
Além das preocupações com a caracterização da QdV e bem-estar do idoso, a saúde mental do mesmo tem suscitado, igualmente, a atenção da literatura (e.g., Teixeira et al., 2016). A depressão afeta o funcionamento do individuo sendo uma carga para a saúde associada a uma baixa QdV (Al-Qahtani, Shaikh, & Shaikh, 2018). Atualmente sabe-se que a depressão afeta mais de 350 milhões de pessoas em todo o mundo (Kim, 2022). Dados recentes revelam que cerca de 716 mil pessoas em Portugal, com 15 ou mais anos, registam sintomas depressivos (INE, 2020). Segundo a mesma fonte, destas pessoas, 60% evidenciam sintomas depressivos ligeiros e 40% manifesta sintomas depressivos graves. A depressão é uma perturbação de humor e caracteriza-se pela presença de humor deprimido, perda de interesse ou prazer, culpa aumentada, baixa autoestima, alteração do apetite, baixa energia e concentração (Camero, Hobbs, Stringer, Branscum, & Taylor, 2012; Kim, 2022). As características comuns das perturbações depressivas são a presença de humor triste, vazio ou irritabilidade, acompanhado de alterações somáticas e cognitivas que afetam significativamente a capacidade funcional do individuo (APA, 2013).
A adoção de um estilo de vida saudável tem um papel importante na saúde mental e pode estar associada a melhorias significativas no tratamento de psicopatologias (Schuch & Stubbs, 2019). Segundo o mesmo autor, a prática de atividade física proporciona ao individuo efeitos antidepressivos, o que explica as melhorias significativas nos sintomas depressivos através da atividade física ou do exercício físico.
Teixeira et al. (2016) conclui que a prática de atividade física na população idosa influência os níveis de autoestima e de depressão, sendo que os idosos fisicamente ativos revelaram níveis de autoestima elevados e níveis de depressão reduzidos. Um outro estudo concluiu que a prática de exercício físico, de forma regular, se encontra associada a uma menor incidência de depressão (Sui et al., 2009).
As perturbações de ansiedade encontram-se também elas, à semelhança das perturbações depressivas, entre os problemas de saúde mais comuns, com uma prevalência que se estima encontrar-se entre 7 a 15% na Europa (Baxter, Scott, Vos, & Whiteford, 2013). Segundo um estudo realizado no nosso país em 2013, Portugal apresenta conjuntamente com a Irlanda do Norte as taxas de prevalência de doenças psiquiátricas na Europa mais elevadas (Almeida et al., 2013). Existem evidencias de que também os sintomas de ansiedade podem ser melhorados com o exercício físico (McDowell, Dishman, Gordon, & Herring, 2019; Rimer et al., 2012). Segundo Carek, Laibstain e Carek (2011) alguns estudos têm indicado que a prática de exercício físico apresenta uma eficácia semelhante na redução da ansiedade generalizada comparativamente à aplicação de terapias cognitivo-comportamentais.
O bem-estar subjetivo percecionado por idosos parece, segundo a literatura, estar associados a uma melhor perceção de QdV (e.g., Neri, 2007; e a uma menor prevalência de sintomas de ansiedade e depressão (e.g., Malone & Wachholtz, 2017). Por outro lado, a literatura tem reportado igualmente uma associação negativa entre a sintomatologia de ansiedade e depressão e a QdV (Mittal, Fortney, Pyne, Edlund, & Wetherell, 2006; Rapaport, Clary, Fayyad, & Endicott, 2005).
Assim, o objetivo do deste estudo consiste na caracterização dos níveis de bem-estar subjetivo (satisfação com a vida e afeto positivo e negativo), qualidade de vida e sintomatologia depressiva e ansiosa numa amostra de idosos portugueses. É ainda objetivo realizar uma análise comparativa destas variáveis em função da frequência semanal de prática de exercício físico. Por último pretende-se analisar as correlações existentes entre as variáveis analisadas.
MÉTODO
Amostra
A amostra deste estudo foi constituída por 92 idosos portugueses, com uma média de idade de 76,55± 9,73 anos. Destes, 26 (28,3%) eram do sexo masculino e 66 (71,7%) do sexo feminino. Os idosos foram recrutados, por conveniência, em lares e centros de dia e de programas comunitários municipais, na zona centro de Portugal. Relativamente à frequência semanal de prática de exercício físico (com supervisão de profissional, em contexto do programa comunitário ou da instituição), 25 (27,2%) reportaram não ter qualquer prática semanal, 39 (42,4%) apenas 1 ou 2 vezes por semana, e 28 (30,4%) uma frequência semanal de exercício físico, com supervisão de um profissional, igual ou superior a 3 vezes.
Procedimentos
Após o contacto com as direções das instituições (lares, centros de dia e câmaras municipais), foi agendado um dia com cada grupo/turmapara a recolha de dados. Foram preenchidos os instrumentos, num contexto de sala, em pequenos grupos (grupos de 6 a 8 indivíduos) havendo por parte dos investigadores a disponibilidade para esclarecimento de todas as dúvidas levantadas.
Foram tidos em consideração os pressupostos da declaração de Helsínquia.. Foi igualmente garantido a todos os participantes a salvaguarda do seu anonimato no preenchimento dos questionários, bem como foi solicitado a todos que assinassem o consentimento informado para a participação no estudo, sendo igualmente informado que poderiam optar por abandonar o programa de intervenção a qualquer momento, se assim fosse o seu desejo.
Instrumentos
Foi preenchido pelos participantes um questionário sociodemográfico, com questões relacionadas com a idade, o sexo, a localidade, bem como caracterizar a frequência de prática de exercício físico do idoso.
Para a avaliação do bem-estar subjetivo foram usadas duas escalas: Satisfaction With Life Scale (SWLS traduzido e validado para a população portuguesa por Neto (1993), constituída por 5 afirmações, cujas respostas para cada item são dadas através de uma escala tipo Lickert de 7 pontos, variando entre 1 (“Não concordo totalmente”) a 7 (“Concordo totalmente”). A pontuação total poderá oscilar entre 5 (corresponde a uma baixa satisfação com a vida) e 35 pontos (alta satisfação com a vida); Positive and Negative Affect Shedule (PANAS) traduzido e validado para a população portuguesa por Antunes et al. (2020), na sua versão reduzida, constituída por 10 itens aos quais se responde numa escala tipo Likert de 5 pontos, que variam entre 1 (“Nada ou muito ligeiramente “) e 5 (“Extremamente”). Posteriormente os itens são agrupados em 2 fatores que representam o grau do afeto positivo (e.g., “interessado”, “forte”, “entusiasmado”) e negativo (e.g., “perturbado”, “assustado”, “zangado”).
Para avaliar sintomatologia depressiva e ansiosa foi utilizada a versão portuguesa da Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS: Pais-Ribeiro et al., 2007). Esta escala apresenta 14 afirmações numa escala de likert de 0 a 3 valores. Posteriormente resulta em duas dimensões: sintomatologia de depressiva e sintomatologia ansiosa. A pontuação total varia entre 0 e 21 pontos (ponto corte 11) e os valores cotados para cada subescala (ansiedade e depressão) são os seguintes: 0 a 7, ausência de sintomatologia; 8 a 10, sintomatologia considerada leve; 11 a 14, sintomatologia considerada moderada; 15 a 21, sintomatologia considerada severa.
Para a avaliação da QdV foi utilizada a versão portuguesa do questionário EUROHIS-QOL-8 (Pereira, Melo, Gameiro, & Canavarro, 2011; Power, 2003). Esta escala é constituída por 8 frases com uma escala de resposta que varia entre 1 e 5. O resultado é um índice global respetivo ao somatório dos oito itens, no qual um valor elevado corresponde a uma melhor perceção de QdV. Todas as escalas de resposta apresentam um formato de cinco pontos, variando entre “Nada” e “Completamente”.
Análise estatística
Considerando que o tamanho da amostra é superior a 50 assumiu-se a normalidade da distribuição, tendo por base os pressupostos da teoria do limite central (n> 30), conforme preconizado por Hair, Black, Babin e Anderson (2019). Posteriormente foi realizada uma análise descritiva, através de algumas medidas de tendência central e de dispersão, incluindo o intervalo de confiança 95%, para a totalidade da amostra.
Para a comparação entre grupos (em função da frequência semanal) recorreu-se à técnica estatística paramétrica one-way ANOVA. Por último, e com o objetivo de analisar as correlações entre as variáveis, recorreu-se ao coeficiente de correlação de Pearson, sendo considerados os seguintes intervalos: 0,10–0,30 (correlação fraca); 0,31–0,50 (correlação moderada); > 0,50 (correlação forte) (Cohen, 1988).
Para a referida análise foi assumido um valor de p< 0,05 para rejeitar a hipótese nula (Ho, 2014). Os dados foram analisados com recurso ao software estatístico SPSS v.27.
RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta a estatística descritiva da totalidade da amostra estudada, onde constam os dados relativos à frequência semanal de prática de exercício físico, bem como os valores de bem-estar subjetivo (satisfação com a vida, afeto positivo e negativo), sintomatologia depressiva e ansiosa e ainda os níveis de QdV. Importa destacar que os níveis de afeto positivo percecionados são superiores aos de afeto negativo, apresentando ainda os elementos da amostra valores semelhantes na sintomatologia depressiva e ansiosa.
n (%) | Média | Mediana | |||
---|---|---|---|---|---|
média± dp | (IC95%) | ||||
Frequência semanal de prática | |||||
Sem prática | 25 (27,2) | ||||
1 ou 2 vezes por semana | 39 (42,4) | ||||
3 ou mais vezes por semana | 28 (30,4) | ||||
Satisfação com a vida | 4,31± 1,16 | (4,07–4,55) | 4,50 | ||
Afeto Positivo | 2,90± 0,77 | (2,74–3,06) | 3,00 | ||
Afeto Negativo | 2,17± 0,89 | (1,99–2,36) | 2,00 | ||
Sintomatologia ansiosa | 7,90± 3,95 | (7,08–8,72) | 8,00 | ||
Sintomatologia depressiva | 7,90± 3,69 | (7,14–8,67) | 7,50 | ||
QdV | 59,21± 14,86 | (56,13–62,28) | 60,94 |
dp: desvio padrão; IC95%: intervalo de confiança 95%.
Relativamente à comparação entre os 3 grupos (sem prática de exercício físico; com frequência de prática de 1 ou 2 vezes por semana; com frequência de prática de 3 ou mais vezes por semana) verifica-se que existem diferenças significativas na variável afeto positivo (com os indivíduos sem prática a apresentarem valores mais reduzidos de afeto positivo que os outros grupos) e na variável sintomatologia depressiva (com os elementos com uma maior frequência de prática a apresentarem uma menor sintomatologia depressiva que os elementos sem prática) (Tabela 2).
Sem prática (n= 25) | 1 ou 2 x (n= 39) | 3 ou mais vezes por semana (n= 28) | Z | Valor p | Post-hoc | |
---|---|---|---|---|---|---|
Satisfação com a vida | 4,12± 1,18 | 4,25± 1,28 | 4,58± 0,93 | 1,15 | 0,32 | |
Afeto positivo | 2,50± 0,74 | 3,05± 0,78 | 3,04± 0,67 | 2,69 | 0,01* | 0< 1; 0< 2; |
Afeto negativo | 2,12± 0,94 | 2,37± 0,85 | 1,94± 0,86 | 2,08 | 0,13 | |
Sintomatologia ansiosa | 8,12± 3,71 | 8,44± 3,89 | 6,96± 4,21 | 1,18 | 0,31 | |
Sintomatologia depressiva | 9,72± 4,35 | 7,97± 3,10 | 6,18± 3,07 | 6,88 | 0,01* | 0> 2 |
QdV | 54,75± 17,33 | 58,89± 13,58 | 63,62± 13,40 | 2,44 | 0,09 |
Z: valor do teste da ANOVA; p: nível de significância.
No que diz respeito à correlação entre as variáveis em estudo, na Tabela 3, destacam-se as correlações significativas da satisfação com a vida com o afeto positivo (correlação moderada), com a QdV (correlação forte) e, em sentido inverso, com a sintomatologia ansiosa (correlação forte) e depressiva (moderada). Já o afeto positivo apresenta uma correlação de sentido negativo com a sintomatologia ansiosa e depressiva (ambas moderadas), e com a QdV (correlação forte). O afeto negativo apresenta uma correlação com a sintomatologia ansiosa (forte) e depressiva (moderada) e, em sentido inverso, com a QdV (forte). Deve ainda realçar-se a correlação entre a sintomatologia ansiosa e depressiva (forte) e destas variáveis, com a QdV (ambas em sentido negativo, e fortes).
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | |
---|---|---|---|---|---|---|
1.Satisfação com a vida | 1 | -- | -- | -- | -- | -- |
2.Afeto positivo | 0,46** | 1 | -- | -- | -- | -- |
3.Afeto negativo | -0,46** | -0,03 | 1 | -- | -- | -- |
4. Sintomatologia ansiosa | -0,51** | -0,29** | 0,68** | 1 | -- | -- |
5. Sintomatologia depressiva | -0,39** | -0,48** | 0,40** | 0,50** | 1 | -- |
6. QdV | 0,66** | 0,53** | -0,54** | -0,58** | -0,57** | 1 |
**p< 0.001
*p< 0,05.
DISCUSSÃO
O presente estudo teve como objetivo a caracterização dos níveis de bem-estar subjetivo (satisfação com a vida e afeto positivo e negativo), qualidade de vida e sintomatologia depressiva e ansiosa numa amostra de idosos portugueses. Outro objetivo foi a análise comparativa destas variáveis em função da frequência semanal de prática de exercício físico bem como a análise das associações existentes entre as variáveis analisadas.
Com base na Tabela 1, onde se encontram descritos os dados da amostra, pode observar-se que apenas 27,2% da amostra refere não praticar exerc∼icio físico, enquanto 42,4% refere praticar 1 ou 2 vezes por semana e 30,4% refere praticar 3 ou mais vezes por semana.. Assim, estes resultados podem ser considerados positivos, nomeadamente se tivermos em consideração o que é referenciado pelos dados mais recentes do Eurobarómetro, que nos revelam que em Portugal, 91% da população com mais de 55 anos refere que “nunca ou raramente” pratica exercício físico ou desporto (Eurobarómetro, 2022). Por sua vez, segundo as diretrizes mais recentes, os idosos devem apresentar uma prática de atividades físicas variadas aumentando a sua capacidade funcional e prevenindo eventuais quedas (Bull et al., 2020).
Na Tabela 2 podem observar-se as comparações entre grupos, em função da frequência semanal de prática de exercício físico, das variáveis estudadas. Pode verificar-se a existência de diferenças significativas nas variáveis afeto positivo e sintomatologia depressiva, com os idosos que reportaram maior frequência de prática semanal a apresentarem também níveis inferiores de sintomatologia depressiva e níveis mais elevados de afeto positivo. Estes dados parecem corroborar algumas evidências da literatura sobre o papel da prática regular de exercício físico em idosos, especialmente ao nível do aumento do afeto positivo (Antunes et al., 2018; Oztekin & Tezer, 2009; Schmidt, Raque-Bogdan, Piontkowski, & Schaefer, 2011). Outros estudos que incidiram sobre o bem-estar subjetivo, felicidade e atividade física em idosos, concluíram que os idosos que praticavam atividade física (pelo menos 1 vez por semana) possuíam uma maior perceção de bem-estar subjetivo em comparação com aqueles que não praticavam (Buecker, Simacek, Ingwersen, Terwiel, & Simonsmeier, 2021; Miranda Neto et al., 2012). Os dados deste estudo, parecem igualmente corroborar as evidências da literatura, que indica que a prática de exercício físico contribui, também, para uma menor sintomatologia depressiva (Kim, 2022). Com efeito, os presentes resultados parecem reforçar o papel que a prática regular de exercício físico na prevenção da sintomatologia depressiva, mas também nos níveis de bem-estar subjetivo.
Analisandoos dados da Tabela 3, que faz referência à análise da associação entre as variáveis em estudo, podem observar-se correlações significativas entre o bem-estar subjetivo e a QdV percecionada pelos elementos da amostra, o que vem confirmar os indicadores já reportados pela literatura anteriormente (e.g., Marques, 2017). Da mesma forma, foram verificadas associações entre o bem-estar subjetivo (associação positiva da satisfação com a vida e do afeto positivo e associação negativa do afeto negativo) com a sintomatologia ansiosa e depressiva, algo que corrobora, igualmente, os indicadores já reportados pela literatura nesta população (e.g., Soósová, Timková, Dimunová, & Mauer, 2021). Estes resultados parecem ser muito relevantes, especialmente se entendermos o papel significativo que o bem-estar subjetivo parece ter, particularmente em populações idosas, podendo igualmente contribuir positivamente para a prevenção de patologias associadas e perturbações emocionais (Seligman & Csikszentmihalyi, 2000). Por último a QdV associou-se, de forma negativa, com a sintomatologia depressiva e ansiosa, algo que parece poder ser compreendido com a associação entre estas variáveis, já verificada em diferentes amostras (e.g., Chachamovich, Fleck, Laidlaw, & Power, 2008; Silvertsen, Bjorklof, Engedal, Selbaek, & Helvik, 2015).
Considerando os resultados do presente estudo, e estando comprovado cientificamente o papel da atividade e exercício físico no bem-estar subjetivo e QdV da população idosa, destaca-se a importância de não só consciencializar a população no geral para as temáticas estudadas, como também a importância de cada vez mais os técnicos do exercício que trabalham com esta população estarem despertos para a monitorização destas variáveis (bem-estar subjetivo, QdV e sintomatologia ansiosa e depressiva) de forma a avaliar o impacto que a prática de exercício físico pode ter na vida das pessoas com quem trabalham, particularmente numa sociedade onde o envelhecimento demográfico é uma realidade um pouco por todo o mundo, e onde se devem procurar as melhores estratégias para melhorar a QdV e o bem-estar das pessoas em idade avançada.
Uma possível limitação deste estudo prende-se com o tamanho da amostra, bem como com o facto de se tratar de uma amostra de conveniência, que acaba por não permitir qualquer tipo de generalização dos resultados. Da mesma forma, seria importante a realização de estudos longitudinais que permitam analisar o efeito do exercício físico nas variáveis em estudo, nomeadamente com recurso a outros indicadores como o tipo de treino/atividade e o seu respetivo volume. Além disso seria igualmente importante que a monitorização do exercício físico fosse feito com recurso a meios mais objetivos(por exemplo, com recurso a acelerometria).
CONCLUSÃO
Os resultados do presente estudo permitem-nos concluir que os elementos, da nossa amostra, com maior frequência de prática de exercício físico apresentaram níveis mais elevados de afeto positivo e, simultaneamente, níveis mais reduzidos de sintomatologia depressiva. Foram também identificadas associações entre as diferentes variáveis em estudo, nomeadamente entre as variáveis do bem-estar (afeto e satisfação com a vida) com a QdV e com a sintomatologia depressiva e ansiosa. De forma geral, os resultados parecem reforçar o papel que a prática regular de atividade física ou exercício físico parece ter, não apenas na saúde física do idoso, mas igualmente na sua perceção de bem-estar, QdV, e ainda na sua saúde mental.