INTRODUÇÃO
O desenvolvimento humano habitual é um processo de alta complexidade que inicia no nascimento e envolve o desempenho de áreas motoras e funções cognitivas. Este desenvolvimento percorre a infância e adolescência, e influenciam um bom desenvolvimento da vida adulta. (Haywood & Getchell, 2019). Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, considera-se criança, indivíduos até 12 anos incompletos. A partir dessa idade até os 18 anos os indivíduos são considerados adolescentes (Brasil, 1990). A infância e adolescência são etapas do desenvolvimento que apresentam maior neuroplasticidade. Nestas fases, há a adaptação e consolidação dos comportamentos e funcionalidades motoras, físicas e cognitivas do ser humano (Diamond & Ling, 2016; Payne & Isaacs, 2017).
O desenvolvimento motor, nos primeiros anos de vida, é influenciado pelo crescimento e maturação do sistema nervoso, e nos anos seguintes sofre maior influência das experiências motoras e fatores ambientais. Este é um processo relacionado à idade as descobertas ao longo dos anos, através deste processo é que o ser humano adquire habilidades refinadas de estabilidade, locomoção e manipulação. Fatores como peso, altura, força, capacidades cognitivas, preferências manuais, e ainda, condições ambientais e sociais interferem no desenvolvimento normal de um indivíduo típico (Caruzzo et al., 2020; Costa, et al., 2020).
Considerando os aspectos neurobiológicos durante a infância, verificamos que o processo maturacional das áreas do cérebro como o córtex motor, o córtex pré-frontal e os gânglios da base trabalham em conjunto para planejar, iniciar e controlar movimentos. Essas mesmas áreas também estão envolvidas em processos cognitivos como atenção, planejamento e tomada de decisões. Considerando que na infância e adolescência o processo de aprendizagem acontece em um ritmo acelerado, a criança desenvolve capacidades acomodativas e coordenativas que a auxiliarão na orientação espacial e temporal. Este desempenho reflete nas aptidões físicas, desenvolvimento escolar e motricidade (Mores et al., 2019; Xavier, 2018).
Acompanhar o desenvolvimento motor da criança é de suma importância, visto que este processo pode indicar atrasos ou dificuldades que podem ser encontradas no seu desempenho. Avaliar e diagnosticar possíveis alterações promove um prognóstico favorável e minimiza o prejuízo de consequências às habilidades motoras. Este desenvolvimento abrange o desempenho do movimento que varia desde a coordenação motora grossa, incluindo equilíbrio, até a coordenação motora fina. Todos esses aspectos são necessários para os níveis de atividade e participação como autocuidado, atividades acadêmicas, esportes, manutenção da postura, coordenação e refinamento de movimentos (Bizinotto et al., 2022; Westendorp et al., 2011).
Desordens no desenvolvimento infantil tendem a reduzir a participação da criança em atividades esportivas e escolares. Como consequência, há a diminuição na experiência em práticas que auxiliam o desempenho motor, e ainda pode ocasionar impactos na autoconfiança. Sendo assim, a detecção precoce de atrasos no desenvolvimento é relevante para uma intervenção adequada (Jaikaew & Satiansukpong, 2021; Silva et al., 2021).
Um estudo de Katagiri et al. (2021) demonstra que aproximadamente 6-13% de todas as crianças em fase escolar apresentam alterações motoras. Entretanto, um outro estudo sugere que crianças com dificuldades acadêmicas como, déficits de aprendizagem, distúrbios matemáticos e/ou de escrita, geralmente têm habilidades motoras reduzidas. Isso pode associar-se ao cognitivo (Ferreira-Vasques & Lamônica, 2018).
Ademais, a cognição é definida como a capacidade do indivíduo de desenvolver habilidades que possibilitam a execução de atividades de vida no âmbito pessoal, social e ocupacional. As funções cognitivas proporcionam ao ser humano a capacidade de aprendizagem, comunicação, memória, atenção e interação com o meio ao qual está inserido. É um dos componentes que propiciam o mecanismo de adaptação social, bem como, a capacidade de monitorar intencionalmente os comportamentos e condutas da interação com o meio e/ou interpessoais (Fonseca, 2019).
Tendo em vista que o cognitivo preservado é responsável pela capacidade decisória, bem como, pelo gerenciamento de sua autonomia social e motora, um comprometimento na cognição pode alterar o processo de aprendizagem do indivíduo. Portanto, delimita-se a cognição como o modo de percepção e compreensão do sistema cujo sujeito está inserido. Sendo assim, presume-se que o cognitivo seja o processamento e arquivamento de informações, da aprendizagem e/ou experiências vividas. Logo, a associação entre o desempenho motor e a cognição tem sido alvo de estudos, tendo em vista que as funções motoras e cognitivas são executadas pelas mesmas estruturas cerebrais (Diamond, 2000; Silva, Alvarenga, & Silva, 2019).
Um estudo realizado com o objetivo de investigar a relação entre nível cognitivo e desempenho motor em crianças de 7 a 10 anos de idade com e sem Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC), avaliou 402 crianças de escolas públicas com o teste de coordenação motora Movement Assessment Battery for Children e o teste cognitivo Matrizes Progressivas de Raven. E encontram maior associação entre as pontuações nos testes motor e cognitivo do que entre TDC e nível cognitivo (Barbacena et al., 2019)
Assim, considerando que o desempenho motor e a cognição são importantes marcadores para a saúde de crianças e adolescentes, torna-se necessário analisar a associação entre o desempenho motor e a cognição de crianças e adolescentes entre cinco e quatorze anos.
MÉTODO
Amostra
O cálculo amostral foi realizado no software GPower 3.1.2, considerando o tamanho do efeito mínimo de 2%, poder de teste de 95% e índice de significância de 5% para análises de correlação bivariadas. O ‘n’ amostral obtido foi de 266 escolares participantes. Foram distribuídos 700 convites para participação na pesquisa e 268 crianças aceitaram participar autorizadas pelos pais.
Os critérios de inclusão do estudo são: ter entre cinco e 14 anos; de ambos os sexos, aceitar participar da coleta de dados. Os critérios de exclusão são: participantes que apresentarem alguma limitação no dia da avaliação (exemplo: resfriado, gripe, febre, comprometimento ortopédico que inviabilize a avaliação). Com exceção das crianças que apresentaram tais fatores, todas as crianças que preencheram os critérios de inclusão participaram da pesquisa e foram contabilizados na amostra. A amostra foi composta por um total de 268 crianças, sendo 140 meninos e 128 meninas.
Este estudo está previsto de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas envolvendo seres humanos (Resolução n° 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde). A presente pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/ UEG) sob o Certificado de Apresentação de Apreciação Ética 51565821.9.3001.8113, bem como teve autorização da Secretaria Municipal de Educação e da direção da Instituição, os pais e/ou responsáveis pelos participantes autorizarão a participação das crianças assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
A coleta de dados foi realizada em duas escolas municipais da cidade de Goiânia (GO) em sala reservada para a pesquisa. A equipe de fisioterapia devidamente treinada realizou as avaliações das crianças no período da manhã ou da tarde, conforme a disponibilidade das crianças. Os questionários de informações sobre as crianças foram aplicados com os pais e/ou responsáveis por meio de ligações telefônicas. A fase de organização e análise dos dados foi realizada no Laboratório de Pesquisa em Musculoesquelética da Universidade Estadual de Goiás (LAPEME-UEG). Para minimizar os erros de viés a respeito da coleta, a equipe avaliadora passou por treinamento com uma carga horária de 10 horas. As sessões de treinamento consistiram na leitura e estudo do manual e aplicação prática dos testes com crianças e adolescentes voluntários.
Instrumentos
Para a realização do registro dos dados coletados foram utilizados os seguintes materiais e instrumentos:
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em que os pais ou responsáveis ficaram cientes da coleta de dados, os objetivos gerais da pesquisa, seu caráter voluntário e assim, puderam assinar autorizando a criança/adolescente a participar do estudo;
Termo de Assentimento da Criança (zero a dez anos), em que foi esclarecido, com uma linguagem acessível à criança, os objetivos gerais da pesquisa e seu caráter voluntário;
Termo de Assentimento do Adolescente (11 a 14 anos), em que foi esclarecido ao adolescente os abjetivos gerais da pesquisa e seu caráter voluntário;
Fichas de triagem, para registro dos dados biológicos da criança ou adolescente, aspectos de saúde e sociodemográficos como renda familiar e escolaridade da mãe e do pai;
Mini Exame do Estado Mental (Mini-Mental), adaptado para a criança e adolescente, o qual classifica o funcionamento cognitivo da criança através da avaliação das áreas de orientação espacial, atenção e concentração, retenção e percepção sensorial, memoria, evocação e linguagem (Jain & Passi, 2005). Possui 13 questões e apresenta uma pontuação estimada para cada área do exame. O teste pode ser aplicado em crianças e adolescentes de três a quatorze anos e sua realização dura aproximadamente 10 minutos. Quanto maior a pontuação de um indivíduo, melhor seu desempenho cognitivo O instrumento foi validado para crianças brasileiras típicas e atípicas (Moura et al., 2017).
Motor Competence Assesment (MCA), adaptado para a língua portuguesa, o qual avalia a capacidade da criança em realizar diferentes funções motoras finas e grossas. O instrumento é composto por tarefas de estabilidade (transferência lateral e saltos laterais), locomoção (Shuttle Run e Standing Long Jump) e manipulação (velocidade de lançamento e velocidade de chutar), o escore é padronizado para cada tarefa, posteriormente somado para gerar o escore por categoria e por fim, a média dos escores das categorias transformam-se no escore total da competência motora do indivíduo que pode ser classificada em baixa ou alta (Sá et al., 2021). Todos os testes motores no MCA são quantitativos (orientados para o produto), sem efeito de teto de desenvolvimento (idade) e são fáceis de executar mesmo com pouca prática. O instrumento apresenta validade de construto para crianças e adolescentes (Luz et al., 2016), com valores normativos de 3 a 23 anos de idade estabelecidos (Rodrigues et al., 2019; Rodrigues et al., 2022). Para este estudo, foi utilizada a categoria que contém as tarefas manipulativas de arremesso e chute.
Os equipamentos utilizados para a coleta dos dados foram: caneta esferográfica azul e/ou preta, prancheta, radar de velocidade, cone, alvo, bolas de futebol de diferentes tamanhos, bola de tênis, bola de beisebol, fita crepe, balança, fita antropométrica e estadiômetro.
Procedimentos
As crianças e adolescentes foram avaliados apenas uma vez em cada uma das escolas participantes. A abordagem inicial consistiu na explicação da coleta de dados para a criança ou adolescente, esclarecimento dos objetivos e a relevância dessa pesquisa, além de esclarecimentos de qualquer dúvida sobre ela. Participaram do estudo somente as crianças e adolescentes cujo responsável autorizaram a participação por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Após a criança ser retirada da sala e as explicações a respeito de cada teste, os procedimentos de coleta foram realizados pela equipe. Foram coletadas medidas de peso, altura, circunferência da cintura e dados de saúde pregresso. Todas essas informações foram registradas na ficha de avaliação. Por meio de entrevistas com o responsável, que foi feita via chamada telefônica, e respondidas as questões do roteiro de anamnese, como dados da condição de saúde prévia e atual da criança ou adolescente.
A função cognitiva foi avaliada pelo Teste Mini Exame do Estado Mental adaptado para criança e adolescente por um examinador treinado. O teste abrange vários itens com pontuações específicas. A categoria "orientação" pode chegar a doze pontos, a "atenção e concentração" oito pontos, a "retenção e percepção sensorial" três pontos, "evocação" três pontos e "linguagem" doze pontos. Para a realização de alguns itens do teste utilizaram-se materiais como óculos, caneta e celular para cumprir um comando do teste (Jain & Passi, 2005).
No MCA adaptado para a língua portuguesa, a criança ou adolescente foram posicionadas a uma distância de 6 metros do alvo utilizando uma bola de futebol de circunferência de 62cm (para os indivíduos de cinco a oito anos), 64cm (nove a dez anos) e 68cm (onze a quatorze anos) para calcular a velocidade máxima do chute sem correr. A medida é realizada três vezes e calculada a média entre as tentativas. Para a velocidade do arremesso, foram usadas bolas de tênis (para indivíduos de cinco a dez anos) e bolas de beisebol (onze a quatorze anos). Sendo que o lançamento deve ser feito ao nível do ombro, na maior velocidade possível e sem correr. Também são permitidas três tentativas e será gerada uma média entre elas (Sá et al., 2021).
Para minimizar interferência do ambiente no local da coleta, cada criança foi avaliada individualmente em ambiente seguro e com o mínimo de ruído com a participação de dois avaliadores: um avaliador a aplicava o teste e o outro registrava o desempenho do participante na ficha de registro. Após a realização dos testes, a criança era levada para a sala de aula e outra criança era chamada para realizar as avaliações.
Após essa fase de coleta, foi realizada a organização de todos os dados em códigos na planilha do Excel. A análise baseou– se nas pontuações dos Testes Mini-Mental infantil e MCA. Inicialmente foi feita a caracterização da amostra, a análise do desempenho motor e das funções cognitivas e por fim, a correlação entre elas.
Análise Estatística
Os dados coletados foram organizados em uma planilha do Excel e posteriormente transferidos para o programa Statistical Package for Social Sciences – SPSS (versão 23.0) para a análise estatística. As análises descritivas são apresentadas em números absolutos (f) e frequências relativas (%), juntamente com média e desvio padrão. As variáveis quantitativas foram analisadas pelo teste não paramétrico de amostras independentes U de Mann- Whitney. Inicialmente a normalidade dos dados foi analisada pelo Shapiro-Wilk. Todas as comparações foram realizadas considerando valor de p< 0,05. Os grupos foram comparados entre si quanto ao sexo e o desempenho nas habilidades manipulativas, score do Mini Mental e índice de massa corporal (IMC).
RESULTADOS
A amostra foi composta por 268 crianças, sendo 140 meninos e 128 meninas, divididos em grupos de cinco a 14 anos. A quantidade de participantes por idade está evidenciada na Tabela 1. A princípio, seriam coletados dados de 10 alunos de cada sexo para cada grupo de idade, entretanto, todos os alunos que apresentaram a permissão dos pais e/ou responsáveis assinada e demonstraram interesse em participar da pesquisa foram analisados.
Tabela 1 Caracterização da amostra.
| Grupos por idade (anos) | N° de meninos | N° de meninas | Altura (cm) média DP | Peso (kg) média DP | Valor do IM média DP | Renda mensal (R$) média DP |
|---|---|---|---|---|---|---|
| 5 | 10 | 10 | 1,143 0,054 |
20,5 4,244 |
15,59 2,26 |
2.987,00 1.934,8 |
| 6 | 10 | 17 | 1,197 0,050 |
22,5 4,089 |
15,69 2,25 |
2.250,00 1.301,6 |
| 7 | 12 | 11 | 1,24 0,065 |
27,75 7,73 |
17,52 3,08 |
2.318,57 1.629,14 |
| 8 | 10 | 10 | 1,34 0,068 |
35,2 10,84 |
19,19 4,53 |
2.030,76 1.064,75 |
| 9 | 11 | 16 | 1,37 0,076 |
35,30 14,40 |
18,20 5,50 |
2.615,50 1,097,97 |
| 10 | 10 | 14 | 1,48 0,069 |
40,29 9,30 |
18,22 3,29 |
3.033,55 1.911,12 |
| 11 | 26 | 19 | 1,49 0,075 |
42,63 15,88 |
18,83 5,08 |
2.947,81 1.777,01 |
| 12 | 24 | 12 | 1,55 0,075 |
46,10 8,95 |
18,99 3,15 |
2.918,84 2.792,54 |
| 13 | 14 | 10 | 1,61 0,084 |
56,42 17,40 |
21,29 5,34 |
2.666,42 2.029,60 |
| 14 | 19 | 10 | 1,64 0,076 |
50,97 7,73 |
18,74 2,12 |
2.610,00 1.303,15 |
Na Tabela 1 observa-se média e desvio padrão do peso, altura e valor do IMC por idade, bem como a renda mensal informada pelos responsáveis.
É possível perceber que as crianças do sexo masculino foram mais participativas, visto que, a frequência de meninos é maior ou igual a de meninas nos grupos divididos por idade. Nota-se que para as idades mais avançadas o IMC é maior e tende a ser uma crescente exponencial analisando os grupos por idade. A renda mensal indicada pelos pais teve uma média uniforme entre os grupos.
Na Tabela 3 é possível identificar o desempenho motor para meninos e meninas de cada grupo de idade para as atividades manipulativas do MCA e a nota do Mini-Mental.
Apesar dos valores de IMC analisado terem um valor crescente a classificação do IMC por idade evidenciou que 15% das crianças de 5 anos possuem baixo peso, 21% das crianças de 10 anos apresentam sobrepeso, 45% das crianças de 8 anos já possuem obesidade e o grupo de crianças com a maior porcentagem para a classificação eutrófica foi o grupo de 14 anos, com uma taxa de 91%. A Tabela 2 expressa todas as classificações e suas porcentagens para cada grupo de idade.
Tabela 2 Classificação do índice de massa corporal por idade.
| Grupos por idade (anos) | Baixo Peso (%) | Eutrófico (%) | Sobrepeso (%) | Obesidade (%) |
|---|---|---|---|---|
| 5 | 15 | 70 | 5 | 2 |
| 6 | 0 | 88 | 11 | 0 |
| 7 | 4 | 61 | 13 | 21 |
| 8 | 0 | 45 | 10 | 45 |
| 9 | 4 | 70 | 7 | 19 |
| 10 | 8 | 63 | 21 | 8 |
| 11 | 9 | 67 | 16 | 8 |
| 12 | 3 | 81 | 8 | 8 |
| 13 | 0 | 75 | 4 | 21 |
| 14 | 5 | 91 | 5 | 0 |
Tabela 3 Atividades manipulativas e mini exame do estado mental.
| Grupos por Idade | CHUTE | ARREMESSO | MINI-MENTAL | ||||
|---|---|---|---|---|---|---|---|
| Média | DP | Média | DP | Média | DP | ||
| 5 anos | |||||||
| Meninas | 34,7 | 7,1 | 28,2 | 2,3 | 27,2 | 4,5 | |
| Meninos | 30,1 | 6,6 | 30,6 | 3,9 | 25,8 | 4,5 | |
| Sig bilateral | 0,15 | 0,11 | 0,5 | ||||
| 6 anos | |||||||
| Meninas | 30,0 | 7,7 | 31,0 | 7,5 | 27,7 | 4,7 | |
| Meninos | 31,8 | 5,8 | 32,5 | 8,0 | 26,5 | 6,2 | |
| Sig bilateral | 0,51 | 0,01* | 0,55 | ||||
| 7 anos | |||||||
| Meninas | 31,0 | 7,5 | 31,1 | 4,0 | 32,9 | 3,6 | |
| Meninos | 32,5 | 8,0 | 33,4 | 5,7 | 33,8 | 1,4 | |
| Sig bilateral | 0,63 | 0,29 | 0,42 | ||||
| 8 anos | |||||||
| Meninas | 33,8 | 5,5 | 34,8 | 5,9 | 37,9 | 1,8 | |
| Meninos | 37,0 | 7,3 | 39,5 | 8,8 | 34,7 | 2,2 | |
| Sig bilateral | 0,28 | 0,18 | 0,83 | ||||
| 9 anos | |||||||
| Meninas | 32,9 | 7,4 | 33,1 | 6,8 | 35,3 | 1,9 | |
| Meninos | 38,9 | 6,1 | 42,9 | 7,7 | 35,0 | 1,6 | |
| Sig bilateral | 0,03* | < 0,01* | 0,66 | ||||
| 10 anos | |||||||
| Meninas | 33,4 | 5,8 | 36,8 | 7,7 | 34,9 | 2,6 | |
| Meninos | 39,1 | 8,9 | 49,2 | 10,5 | 35,9 | 1,5 | |
| Sig bilateral | 0,07 | < 0,01* | 0,45 | ||||
| 11 anos | |||||||
| Meninas | 34,6 | 5,2 | 35,3 | 6,0 | 36,2 | 1,3 | |
| Meninos | 43,1 | 6,1 | 43,7 | 9,2 | 35,8 | 1,5 | |
| Sig bilateral | 0,00* | < 0,01* | 0,45 | ||||
| 12 anos | |||||||
| Meninas | 36,8 | 6 | 38,6 | 10,2 | 35,3 | 2,2 | |
| Meninos | 44,1 | 8,8 | 49,5 | 13,7 | 35,6 | 3,4 | |
| Sig bilateral | 0,01* | 0,01* | 0,76 | ||||
| 13 anos | |||||||
| Meninas | 36,3 | 6 | 36,5 | 50,7 | 36,3 | 1,0 | |
| Meninos | 44,1 | 8,8 | 6,1 | 9,1 | 36,4 | 1,1 | |
| Sig bilateral | < 0,01* | < 0,01* | 0,78 | ||||
| 14 anos | |||||||
| Meninas | 36,6 | 4,7 | 38,1 | 6,3 | 36,1 | 1,6 | |
| Meninos | 49,4 | 8,7 | 52 | 10,5 | 36,7 | 0,5 | |
| Sig bilateral | < 0,01* | < 0,01* | 0,19 | ||||
*Diferença significativa.
É possível perceber que a velocidade do chute e do arremesso aumenta à medida que as crianças ficam mais velhas, para ambos os sexos. Entretanto, o aumento da velocidade para as atividades manipulativas no sexo masculino foi mais significativo. Houve uma diferença relevante no chute das crianças de 9, 11, 12, 13 e 14 anos, comparando a velocidade do chute de meninas e meninos. Sendo que os meninos alcançaram velocidades maiores que as meninas. Já na velocidade de arremesso, a diferença entre meninas e meninos ocorreu nas idades de 6, 9, 10, 11, 12, 13 e 14 anos, sendo que novamente o arremesso dos meninos foi mais veloz que o das meninas.
A pontuação do Mini-Mental apresentou um aumento constante e regular para ambos e sexos e em todos os grupos de idade. Contudo, é válido ressaltar que a pontuação das crianças do sexo feminino é ligeiramente maior que a pontuação das crianças do sexo masculino em quase todas as idades na Tabela 3.
Na Tabela 4, apresentamos os resultados dos testes de correlação entre o desempenho nas habilidades manipulativas, Mini-Mental e IMC dos grupos por idade.
Tabela 4 Associações entre atividades manipulativas, mini exame do estado mental e índice de massa corporal.
| Grupos por idade | Arremesso X Mini-mental |
Chute X Mini-mental |
Arremesso X Chute |
IMC X Mini-mental |
IMC X Arremesso |
IMC X Chute |
|
|---|---|---|---|---|---|---|---|
| 5 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,14 | 0,21 | -0,35 | -0,36 | -0,11 | -0,11 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 6 anos | |||||||
| Coef correlação | -0,32 | -0,34 | 0,28 | 0,13 | -0,06 | -0,003 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 7 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,41 | 0,36 | 0,34 | 0,17 | -0,34 | 0,29 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 8 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,16 | -0,37 | 0,76 | -0,13 | -0,09 | -0,1 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | < 0,01* | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 9 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,8 | -0,23 | 0,35 | -0,23 | 0,03 | -0,23 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 10 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,19 | 0,05 | 0,44 | -0,28 | -0,18 | 0,1 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | < 0,05* | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 11 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,24 | 0,11 | 0,35 | -0,22 | 0,004 | 0,06 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | < 0,05* | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 12 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,023 | 0,16 | 0,59 | -0,2 | 0,1 | -0,12 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | < 0,01* | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
| 13 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,28 | 0,27 | 0,75 | 0,27 | 0,3 | 0,41 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | < 0,01* | > 0,05 | > 0,05 | < 0,05* | |
| 14 anos | |||||||
| Coef correlação | 0,28 | 0,28 | 0,84 | -0,1 | 0,24 | 0,22 | |
| Valor p | > 0,05 | > 0,05 | < 0,01* | > 0,05 | > 0,05 | > 0,05 | |
*Diferença significativa.
Ao analisar a Tabela 4 é possível perceber que existem poucas correlações entre as variáveis. Houve correlação significativa entre chute e arremesso para as idades de 8, 10, 11, 12, 13 e 14 anos. Apenas o grupo de 13 anos apresentou correlação positiva entre o IMC e chute. Sendo que as crianças deste grupo apresentam, em sua maioria, com classificação eutrófica de IMC. Logo, o IMC ideal para cada idade pode estar relacionado com o bom desempenho das atividades manipulativas, sobretudo de membros inferiores, vista que a correlação foi significativa para as variáveis IMC x Chute. Nos demais grupos não foram encontradas correlações estatisticamente significativas correlação das atividades manipulativas, Mini-Mental e IMC.
DISCUSSÃO
Este estudo teve como objetivo analisar se há associação entre o desempenho motor amplo e a cognição de crianças e adolescentes entre cinco e quatorze anos. Dentre os achados do estudo, encontra-se a maior participação e aderência das crianças do sexo masculino. Isso pode ser explicado pela preferência de meninos nas atividades de chute e arremesso, tendo em vista que meninos apresentam níveis de coordenação mais elevados quando comparado às meninas, sobretudo pela idade. De acordo com a literatura, os sexos podem se diferenciar por questões culturais, ambientais, oportunidades no meio escolar, influência familiar, e envolvimento mais efetivo do grupo masculino em práticas de atividades físicas (Machado et al., 2019; Silva, Zampier, & Braga, 2019). Sendo possível inferir que crianças do sexo masculino são socialmente mais influenciadas a realizarem atividades manipulativas e por essa questão adquirem uma facilidade maior no desenvolvimento de coordenação, força e mesmo velocidade.
Outra descoberta a partir da análise dos dados foi a classificação do IMC indicando 15% das crianças de 5 anos com baixo peso, 21% das de 10 com sobrepeso, 45% de 8 anos com obesidade e o grupo de 14 anos com quase 100% de crianças eutróficas. Esse achado pode ser associado com o fato de crianças mais velhas, próximas à adolescência, estarem mais preocupadas com a aparência física (Castilha et al., 2022). Além disso, segundo Damassini e Brunch-Bertani (2023), crianças mais novas sofrem maior influência da falta de atividade física e fatores que corroboram com a crescente obesidade infantil.
Ademais, não foi encontrado relação significativa que o IMC influencie nas atividades manipulativas em quaisquer idades entre cinco e 14 anos. Tal achado corresponde ao estudo feito por Fraga et al. (2021) que relacionou o IMC com a competência motora de crianças e concluiu que não há relação entre as duas variáveis.
Também não foi encontrado resultado estatisticamente significativo na relação de IMC e Mini-Mental, ou seja, a função cognitiva das crianças de 5 a 14 anos não sofrem interferência da classificação do IMC ou no desempenho das atividades manipulativas. Essa conclusão está em conformidade com o estudo de Caruzzo et al. (2020), coletaram dados de 357 crianças 3 a 5 anos utilizando a Escala de Maturidade Mental Colúmbia, teste Movement Assessment Battery for Children – 2 e uma ficha de dados sociodemográficos. O resultado encontrado demonstrou que tanto as crianças com desenvolvimento típico, quanto as crianças classificadas com desordem motora apresentaram classificação média na avaliação cognitiva.
Em um estudo de Silva, Zambier, e Braga (2019), participaram 182 escolares de 7 a 15 anos de idade 94 do sexo masculino e 88 do sexo feminino, corroborando com o achado do presente estudo, onde meninos participaram mais que meninas. O instrumento utilizado para a coleta de dados foi o Teste de Coordenação com Bola – TECOBOL. Na comparação entre sexos em cada idade, não encontraram diferença significativa nas habilidades com as mãos. Entretanto, encontraram que meninos e meninas de mesma idade apresentam diferenças significativas apenas nas habilidades com os pés (chute e condução).
O resultado supracitado não está em conformidade com a análise do presente trabalho, visto que para as habilidades de chute e arremesso meninos e meninas apresentaram diferença estatisticamente importante nas idades de 9, 11, 12, 13 e 14 anos para o chute e nas idades de 6, 9, 10, 11, 12, 13 e 14 anos para arremesso. Alguns fatores podem explicar o desempenho superior dos meninos para as habilidades de chute e arremesso, dentre eles fatores biológicos, sociais e culturais. Dentre os fatores biológicos podemos destacar as diferenças musculares e maior densidade óssea, o maior comprimento dos membros inferiores e uma maior proporção de fibras musculares de contração rápida. Dentre os fatores sociais e culturais, podemos destacar o incentivo familiar e escolar para que os meninos desde cedo participem de atividades físicas que desenvolvem força e habilidades motoras, como futebol, basquete e outros esportes que envolvem arremessar e chutar. Esses fatores não são absolutos e há muitas exceções individuais. Além disso, com mudanças nas expectativas sociais e maior incentivo para meninas participarem de atividades físicas e esportes, essas diferenças podem diminuir com o tempo. (Zheng et al., 2022).
Em contrapartida, apesar de não termos encontrado diferenças estatísticas nas pontuações do Mini-Mental entre os sexos, a pontuação das meninas foi ligeiramente superior em relação aos meninos. Isso pode ser explicado pela junção da preferência dos meninos pelas atividades manipulativa e a estimulação de habilidades cognitivas ser mais intensa no ambiente escolar (Mazzoccante et al., 2019; Santos et al., 2020).
O presente estudo apresenta algumas limitações metodológicas como a não utilização de outras modalidades de testes para avaliação do desempenho motor dos participantes. Contudo, os achados do presente estudo trazem informações importantes para a literatura direcionada ao estudo das habilidades motoras associadas a função cognitiva em crianças na idade escolar, além de fornecer conhecimentos relevantes para pais e professores que desenvolvem atividades com estas crianças. Estudos futuros devem investigar melhor as diferenças de desempenho entre meninos e meninas utilizando diferentes instrumentos de avaliação motora e/ou cognitiva.
CONCLUSÕES
O estudo verificou que o desempenho motor para as habilidades de arremessar e chutar não apresentou correlação significativa entre o desempenho cognitivo em crianças e adolescentes de 5 a 14 anos. Quanto às diferenças de desempenho entre os sexos, verificamos que os meninos apresentaram maior velocidade de arremesso e chute em relação às meninas, apesar destas terem apresentado desempenho cognitivo ligeiramente superior. Neste sentido, verificamos que ter um desempenho maior nas atividades manipulativas não é um fator determinante para um bom desempenho cognitivo, pois outros fatores podem estar associados, tais como estrutura biológica, experiência motora e fatores socioculturais. Os nossos achados podem gerar implicações práticas no ambiente escolar e intervenções motoras, no sentido de aumentar o engajamento dos adolescentes na prática de atividades físicas e esportivas, especialmente as meninas.














