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Motricidade

versão impressa ISSN 1646-107Xversão On-line ISSN 2182-2972

Motri. vol.21  Ribeira de Pena jan. 2025  Epub 27-Maio-2025

https://doi.org/10.6063/motricidade.38487 

ARTIGO ORIGINAL

A influência dos pais na iniciação e manutenção da prática desportiva de crianças e jovens segundo a perspetiva dos treinadores

The influence of parents on the initiation and maintenance of sports practice by children and young people from the perspective of coaches

1Instituto Politécnico da Guarda – Guarda, Portugal.

2Sport Physical Activity and Health Research & INnovationCenTer – Guarda, Portugal.


RESUMO

Os principais objetivos deste estudo são conhecer e comparar a influência parental na iniciação e manutenção da prática desportiva de diferentes desportos (atletismo, karaté, basquetebol, voleibol, futebol), de acordo com a perceção de treinadores de crianças e jovens. A recolha de dados foi realizada através de entrevistas semiestruturadas. Os participantes deste estudo foram cinco treinadores (um do sexo feminino e quatro do sexo masculino) com idades entre 27 e 67 anos e com certificação de treinador de nível 2 a 4. Os principais resultados estão divididos em quatro dimensões (social, económica, psicológica, pedagógica). A socialização está presente em todos os desportos abordados. O estatuto socioeconómico dos pais é influenciador nos desportos individuais. Os pais influenciam na iniciação e manutenção da prática desportiva, sendo os principais informadores de dificuldades dos atletas, ou, os pais podem ser influenciadores negativos quando procuram tornar os seus filhos atletas de rendimento, alterando assim o seu estado psicológico. Os desportos coletivos possuem intervenções pedagógicas com regras importantes, sendo os pais muitas vezes uma barreira na aplicação das mesmas.

PALAVRAS-CHAVE: prática desportiva; influência parental; jovens, iniciação desportiva; manutenção desportiva

ABSTRACT

The main objectives of this study are to determine the parental influences on the adherence and maintenance of different sports participation (athletics, karate, basketball, volleyball, football), according to the perception of coaches of children and young people. Data collection was carried out through semi-structured interviews. Participants were five coaches (one female and four male) aged between 27 and 67 years old and with sports degrees between level 2 and level 4. The main results are divided into four dimensions (social, economic, psychological, pedagogical). Socialization is present in all the sports covered. The parents’ socioeconomic status is an influence on individual sports. Parents influence the initiation and maintenance of sports practice, being the main informants of athletes’ difficulties, or parents can be negative influencers trying to make their children performance athletes by changing their psychological state. Team sports have pedagogical interventions with important rules, and parents are often a barrier in their application.

KEYWORDS: sports practice; parental influence; young people; sports initiation; sports maintenance

INTRODUÇÃO

A influência dos pais é determinante para a iniciação e manutenção da prática desportiva das crianças e dos ­jovens. Essa influência pode derivar de vários fatores ou contextos, como por exemplo, dos hábitos familiares, do poder económico da família e até das expectativas dos pais e/ou do acompanhamento parental. O apoio parental afeta positivamente a capacidade dos jovens reconstruírem experiências satisfatórias durante atividades desagradáveis e a aumentarem a sua motivação intrínseca na atividade física (Xie et al., 2021). No entanto, para que o apoio parental seja positivo e favorável para os jovens, estes necessitam de adaptar a sua abordagem perante a criança, acrescentando algumas ­atividades nas rotinas diárias das mesmas, como a socialização com as restantes crianças (Ober et al., 2024).

Hábitos saudáveis ou não saudáveis tendem-se a desenvolver e manter num contexto familiar (Niermann et al., 2018). As crianças com pais que participam ativamente em contextos de atividade física desportiva têm maior ­probabilidade de iniciar a sua prática desportiva (Howie et al., 2018). Nas famílias com maior poder socioeconómico verifica-se uma diminuição do abandono desportivo quando os pais integram e ­acompanham os filhos em atividades físicas regularmente. No entanto, em famílias com poder socioeconómico menor, existe uma maior probabilidade de abandono desportivo, principalmente quando o pai não está presente na atividade física dos filhos. Ou seja, para além do poder socioeconómico das famílias, a presença dos pais na vida ­desportiva dos ­filhos é essencial para a sua manutenção no desporto (Kwon et al., 2016). Para além disso, pais com ­menores níveis de escolaridade tendem a não conseguir suprir todas as necessidades das crianças para que estas mantenham uma atividade física ­regular, sendo necessário informar as crianças sobre os benefícios de um nível adequado de atividade física e a sua necessidade para manter uma saúde e crescimento adequados (Maric et al., 2020). Por sua vez, quando os pais apresentam empenho emocional exagerado relativamente ao desempenho dos ­filhos, o treinador tem um papel importante, podendo intervir de duas formas, indiretamente e diretamente. Primeiramente, o treinador deve servir de exemplo para os pais, definindo as regras das equipas e dando a conhecer aos pais os planos de treinos e competições, agindo indiretamente. Depois, o treinador deve atuar junto com os pais realizando reuniões formais e até mesmo conversando com eles, procurando ter ideia daquilo que os pais querem saber do treinador, como o acompanhamento em caso delesão, as expectativas do ­treinador em relação à participação do filho, entre outras situações (Adelino et al., 2001).

Os motivos dos pais para inscrever os seus filhos no desporto também podem afetar a experiência desportiva das crianças e a continuação do desporto a longo prazo através de climas motivacionais, prazer e comprometimento (Williams et al., 2022). Segundo Villafaina et al. (2021) a pressão competitiva induzida pelos pais nos jovens atletas aumenta em clubes em relação a instituições públicas o que origina a uma diminuição à adesão desportiva por parte dos jovens. Outro fator observado foi que os pais apresentavam valores ­menores de comunicação com treinadores femininos do que com ­treinadores masculinos devido à diferença de género o que poderá ­originar divergências nas relações entre ­treinadores e pais.

A iniciação desportiva é definida pelo período de tempo necessário para que a pessoa aprenda as habilidades motoras fundamentais necessárias para que esta realize a atividade de forma autónoma (Díaz, 2008), estando usualmente associada a três elementos: socialização, competição e intencionalidade educativa. Estes elementos estão interligados com o triângulo da iniciação desportiva descrito por Smoll (1991) sendo identificados três elementos: os pais, o treinador e o jovem desportista. Em grosso modo, a literatura disponível tem identificado alguns dos principais fatores parentais associados à iniciação e/ou manutenção da prática de atividades físicas e desportivas de crianças e jovens, seja na perspetiva dos pais ou dos jovens praticantes, sendo por isso relevante também investigar a perspetiva dos treinadores acerca destas influências. Como tal, o presente estudo foi realizado com o propósito de melhor conhecer como os pais interagem com os filhos, de forma a estes iniciarem e manterem, ou não, a prática desportiva, tendo por base de análise a forma como os treinadores interpretam as suas ações e visões.

Os objetivos específicos deste estudo são conhecer e comparar, com base na opinião dos treinadores, a influência parental na iniciação e manutenção dos atletas nos diferentes desportos, mais propriamente, no basquetebol, no karaté, no atletismo, no voleibol e no futebol. A influência parental poderá integrar diversos fatores e ser tanto positiva como negativa no desenvolvimento da prática desportiva dos jovens de forma a limitar ou a promover o desporto praticado pelos seus filhos.

MÉTODO

Amostra

O desenho metodológico deste estudo é observacional e qualitativo, tendo sido selecionada a amostra através das competências profissionais de cada participante, com o objetivo de enriquecer o estudo através de diferentes experiências vividas.

Na realização das entrevistas utilizamos 5 participantes, recrutados segundo o método de amostragem por conveniência. A primeira entrevista foi realizada a um treinador de atletismo, do sexo masculino, com 67 anos e com grau 3 de treinador o qual exerce essa função há 47 anos. A segunda entrevista foi realizada a uma treinadora de karaté, do sexo feminino, com 39 anos e com grau 2 de treinadora, a qual exerce essa função há 24 anos. A terceira entrevista foi ­realizada a um treinador de basquetebol, do sexo masculino, com 40 anos e com o grau 3 de treinador, o qual exerce essa função há 25 anos. A quarta entrevista foi realizada a um treinador de futebol, do sexo masculino, com 27 anos e com o grau 2 de treinador, o qual exerce essa função há 10 anos. Por último, a quinta entrevista foi realizada a um treinador de voleibol, do sexo masculino, com 50 anos e com grau 3 de treinador, o qual exerce essa função há 20 anos.

Os critérios de seleção na escolha dos treinadores foram o seu grau profissional, a modalidade desportiva, a ou as vertentes em que o treinador está a atuar (educacional ou competitiva), a sua idade, experiência como treinador e o sexo, sendo estas as características necessárias no enriquecimento da amostra.

Na realização destas entrevistas foram garantidos o anonimato e a confidencialidade de todos os dados, a partir de um consentimento informado obtivemos, no qual obtivemos devidas autorizações para realizarmos a entrevista.

Instrumentos

O tipo de entrevista utilizado para realizar a recolha de dados foi a entrevista semiestruturada. Este tipo de entrevista foi escolhido devido ao facto de dar mais liberdade ao entrevistado, de forma a obtermos uma recolha de dados mais rica e completa.

Para realizar a recolha de dados utilizamos um guião, que orientou a mesma para obtermos dados pertinentes ao desenvolvimento do estudo. Este guião consistia em três componentes: caracterização do entrevistado, questões gerais de introdução à entrevista (como por exemplo: identificar que aprendizagens eram adquiridas na prática desportiva, quais as principais barreiras ou obstáculos identificados na realidade desportiva) e questões específicas (como por exemplo: o que entende por influência parental na prática desportiva, papel ou responsabilidade do treinador na gestão da influência que os pais possuem em relação à prática desportiva dos jovens e principais desafios que os treinadores de crianças e jovens enfrentam em relação à influência dos pais no desporto).

Também foi utilizado um gravador áudio para registar as informações transmitidas pelos entrevistados, sendo as entrevistas transcritas de forma literal (ad verbatim).

Procedimentos

Os entrevistados foram contactados pessoalmente ou virtualmente, por sms ou chamada telefónica, sendo informados dos propósitos e termos da pesquisa. Após o seu consentimento, procedeu-se à recolha de dados num local calmo, com o mínimo de ruído.

Após a realização das entrevistas procedemos à sua transcrição, resultando num total de 15 páginas que foram sujeitas à seguinte análise de dados.

Análise dos dados

Para a análise de dados recolhidos das entrevistas recorremos à análise de conteúdo, procedendo-se à codificação dos dados em certas categorias decorrentes da revisão da literatura ou do discurso dos participantes (Bardin, 2013). Inicialmente, procedeu-se à “redução dos dados”, através de um desmembramento do texto transcrito em unidades (categorias) de ordem superior, segundo reagrupamentos (ana)lógicos, o qual consiste em reduzir unidades de aprendizagem em subcategorias, subcategorias em categorias e categorias em temas e padrões. Depois de se conhecer os temas e padrões encontrados na análise dos dados, como por exemplo, o uso das tecnologias, a presença dos pais na prática desportiva dos filhos, os fatores socioeconómicos das famílias dos praticantes, entre outros, começamos a analisar esses temas e a comparar as opiniões dos treinadores, o que nos permitiu organizar os dados em quatro categorias distintas, mas associadas: social, económica, psicológica, pedagógica.

Durante a análise dos dados as categorias determinadas foram refletidas através da experiência profissional dos treinadores, podendo comparar as perceções dos treinadores em cada uma das categorias, podendo assim generalizar este estudo para o contexto desportivo no geral.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Neste estudo fomos capazes de identificar diferentes dimensões (social, económica, psicológica, pedagógica) ao longo da recolha e análise de dados, as quais que nos permitiram analisar as diferentes perspetivas e semelhanças dos treinadores de diferentes modalidades. A Figura 1 apresenta uma matriz de categorias resultantes do processo de análise de conteúdo.

Figura 1 Fatores relacionados com os pais que influenciam a prática desportiva de jovens atletas. 

A dimensão social apresenta-se dividida em trabalho de equipa e valores éticos sendo extremamente importantes para todos os tipos de desportos e sendo os valores éticos superiores entre atleta-treinador em relação aos valores éticos introduzidos pelos pais.

A dimensão psicológica incide na influência das tecnologias e no quanto a falta de informação e conhecimento por parte dos pais em relação ao uso das tecnologias pode ­prejudicar a prática desportiva dos jovens atletas.

A dimensão económica estende-se pela economia ­parental e pelo apoio económico da modalidade, sendo verificada a importância do poder económico parental relativamente aos desportos menos valorizados pela sociedade e pelo estado, diminuindo a adesão à sua prática o que não acontece em desportos mais valorizados onde verificamos que o poder económico parental é pouco significante e o apoio económico da modalidade é elevado.

A dimensão pedagógica é fundamentalmente abrangida pelos cursos formadores e pelo apoio/interesse parental, sendo verificado que os cursos formadores dão bases necessárias para a modalidade, mas não formam totalmente na maioria dos casos, sendo possível afirmar que muitos aspetos são aprendidos apenas na prática, como por exemplo, como o treinador deve lidar com os pais, entre outros. O apoio/­interesse parental, segundo os treinadores, pode ser tanto positivo como ­negativo para a prática desportiva das crianças e jovens atletas havendo casos que favorece a prática desportiva dos atletas e havendo casos que as suas intervenções prejudicam o seu desenvolvimento na modalidade.

Estas dimensões permitem-nos identificar e conhecer as principais influências causadas pelos pais no desporto. A dimensão social estabelece parte do desenvolvimento inicial do atleta promovendo a interação entre este, a equipa e o ­treinador diminuindo influências parentais devido aos valores promovidos pelo treinador. A dimensão psicológica permite-nos perceber que a influência parental está pouco desenvolvida no ramo da tecnologia e percebendo que os ­treinadores têm um trabalho extra a desenvolver com os pais e os atletas neste aspeto. A dimensão económica permite-nos compreender as dificuldades parentais em manter os seus educandos em alguns desportos. A dimensão pedagógica engloba a inclusão parental no ensino do desporto, sendo possível perceber que há um trabalho a ser feito para que a sua inclusão não seja prejudicial ao desenvolvimento do atleta.

Dimensão social

Relativamente à dimensão social, na importância da prática desportiva todos os treinadores defenderam que a prática desportiva é essencial para a formação pessoal do indivíduo, sendo frisada pelos treinadores de atletismo e de karaté a importância do trabalho de equipa.

Entrevista do treinador de atletismo:

“Desde a formação geral, a formação social para mim esta é muito importante e o espírito de grupo, apesar de ser atletismo, os meus atletas, todos eles entendem que é competição por equipas.”

Entrevista da treinadora de karaté:

“…é fundamental a parte da ética, parte do comportamento, a parte do saber estar com os outros, trabalhar em equipa, porque isto, a meu ver, vem depois influenciar o resto da vida toda, porque depois na escola vai ter também saber trabalhar em grupo em equipa, um dia no trabalho, assim é também.”

Embora as narrativas anteriores dos treinadores sejam de desportos individuais, estes afirmam que o trabalho de equipa é de enorme importância nas suas disciplinas e que é uma das tarefas principais a trabalhar com os atletas, referindo também que o treinador possui um papel muito importante na iniciação e manutenção da prática desportiva (além dos pais), influenciando a vida pessoal do atletas pois, segue o exemplo do treinador e os próprios pais muitas vezes pedem aos treinadores para ajudarem os filhos em assuntos pessoais e educarem- nos, pois o respeito que os atletas têm pelos treinadores pode até ser maior do que o respeito que eles têm pelos pais.

Entrevista da treinadora de karaté:

“Eu acho que o desporto, seja qual for a modalidade, tem ou deveria ter isso como base independente da atividade que a gente faça o crescimento, o exemplo temos de lhes dar o que transmitimos, porque eles estão a formar, uma, e depois ainda por cima temos esta característica que deve acontecer com todos os treinadores, que é esta parte que os alunos parece que nos escutam mais a nós do que até aos pais. Eu tenho muitos pais que dizem isso, diga lá qualquer coisa, porque ele não me escuta, escuta mais a si, então temos de ter isto muito, muito na nossa mente.”

De acordo com a literatura, esta formação é realizada através da comunicação entre treinador e pais, sendo importante desde o início o esclarecimento de regras e objetivos para que o atleta desenvolvia espírito desportivo, assim como Adelino et al. (2001) indica o treinador deve servir de exemplo aos pais, definir as regras das equipas e dar a conhecer aos pais os planos de treinos e competições e após isso deve acompanhar os atletas juntamente com os pais definindo metas e objetivos, promovendo os relacionamentos e a socialização do atleta para que este atinga o desejado sucesso desportivo.

Esta dimensão compreende os valores transmitidos pelos pais e pelos treinadores, sendo necessário haver uma concordância entre eles para o desenvolvimento saudável do atleta e o desenvolvimento social do trabalho em equipa para atingir objetivos em conjunto, sendo a influência parental necessária para promover o mesmo.

Dimensão económica

Relativamente à dimensão económica, as entrevistas apresentaram perspetivas semelhantes nos desportos individuais, sendo verificada uma perceção dos treinadores na quantidade de atividades praticadas pelos jovens e a (in)capacidade monetária dos pais para os filhos realizarem as atividades.

Segundo a entrevista da treinadora de karaté:

“A falta de tempo dos pais, eu noto há pais “coitados”, trabalham muito e não têm a mesma possibilidade também, se calhar na parte financeira, não sei, apesar que há muitas atividades hoje em dia que até nem acarreta muitos gastos, mas talvez a parte financeira.”

Segundo a entrevista do treinador de atletismo:

“Em segundo lugar os pais limitam mais também a possibilidade dos atletas treinarem mais, porque os põe em 500 atividades e em 500 explicações.”

Já o treinador do desporto coletivo, é da opinião de que a economia familiar não é uma condição para a prática desportiva devido ao facto do seu clube ter a facilidade de apoiar as famílias mais necessitadas relativamente à mensalidade e a alguns custos monetários podendo até mesmo “fazer um desconto ou não pagar”. Segundo os outros treinadores de desportos coletivos, o fator económico do país não é tão relevante para a prática desportiva das modalidades. De acordo com a entrevista do treinador futebol:

“- Assim no contexto que nós estamos sei que existe essa, existem bolsas e que ajuda pronto em questão de dificuldades monetárias e financeiras o clube ajuda sempre de alguma maneira de uma forma generalizada (…) também acho que sim honestamente pelo menos eu nunca vivenciei uma pessoa, um miúdo que deixasse jogar futebol por falta de pagamento, isso nunca me aconteceu (…) e não estou a dizer que eventualmente não tenha acontecido um ou dois não pagarem, acho que há sensibilidade na parte de quem gere em todos os clubes; acho que existe essa sensibilidade também de perceber as coisas.”

Segundo a entrevista do treinador de voleibol:

“- Eu sei que há modalidades que influencia-se um bocadinho, são mais seletivas, o material desportivo; aqui não voleibol eu penso que não, no entanto há clubes que têm esta parte social, cariz social enquanto se deteta então um atleta que tenhs tido dificuldade e que não vai porque é preciso pagar quotas, tem mais irmãos querem praticar a maior parte dos clubes já fazem isso, fazem o preço mais acessível para todos atletas sejam irmãos ou até um atleta que queira praticar e não tenha condições. Os clubes ajudam nesse sentido, penso que aí, hoje em dia daquilo que tenho ouvido a maior parte dos clubes têm cariz social que está aberto a ajudar os atletas.”.

Com estes dados, podemos verificar que, comparando com artigos já publicados, o poder económico dos pais é relevante para a prática desportiva das crianças e jovens havendo uma preocupação por parte da família com os custos da prática desportiva e do material envolvente na mesma assim como transporte e mensalidades. Para além da vertente económica, o fator disponibilidade também é relevante sendo percetível a necessidade de tempo para acompanhar estes jovens e promover uma atividade física regular e saudável assim como Kwon et al. (2016) indica não só o fator económico como o fator da disponibilidade são fatores impactantes para a prática desportiva dos jovens atletas, o que pode ser reforçado pelo que Howie et al. (2018) afirma, sendo a participação parental um reforço positivo para que os filhos pratiquem um desporto com consistência.

A dimensão económica define a prática desportiva dos jovens atletas, no entanto, já há algum apoio em algumas modalidades, embora que seja apenas nas mais conhecidas. Alguns desportos estão prejudicados dado ao apoio do estado, sendo necessário o apoio económico parental nesses casos para que o jovem atleta mantenha a prática da modalidade.

Dimensão psicológica

Na perspetiva dos treinadores, também se verifica uma certa falta de informação e conhecimento dos pais em relação à influência da tecnologia dos jovens e como esta pode afetar a sua prática desportiva. Na opinião de todos os treinadores, os jovens estão muito agarrados às tecnologias, fazendo com que estes não queiram sair de casa, assim como a professora de karaté indica, “quando estão aos outros dias em casa, estão ao telemóvel e quando vem ao Karaté, não estão em que eles associam que a nossa for ao Karaté não vou jogar, então começam a dar desculpas ou que já não gostam”, ou seja, esta é uma situação inibidora da manutenção da prática desportiva e o conhecimento dos pais acerca da tecnologia poderá ajudar ao controlo da mesma, de forma a ajudar o atleta a ter motivação para ir treinar e praticar desporto.

Segundo o treinador de basquetebol:

“Quando houve a parte da pandemia as pessoas foram obrigadas a ficar em casa e dificultou ainda mais porque estamos num tempo em que os jovens gostam de estar cada vez mais agarrados ao telemóvel e computador e essa parte dificultou mais um bocadinho, portanto tentamos que haja mais treinos e mais horas que é para tentar combater essa dificuldade que temos.”

Segundo o treinador de futebol:

“Hoje não os pais estão estão a ver, estão a avaliar a nós também quer pedagogicamente quer na parte desportiva cada vez mais agora com a Internet e com essas coisas cada vez mais o pai tem tem tem capacidade para nos avaliar a nós também e depois claro que noto cada vez mais a nível social nós temos dificuldades em sermos influentes naquilo que é e que são as nossas ações perante o jogador…”

Na literatura atual, são visíveis poucos estudos acerca da influência das tecnologias nos jovens atletas, no entanto, segundo alguns estudos como por exemplo, segundo Tandon et al. (2021) mais atividade física e menos tempo ao ecrã promove um aumento de saúde mental sendo necessário dosear o tempo ao ecrã em crianças e jovens e segundo Whiting et al. (2021) à medida que o tempo de ecrã e as atividades sedentárias aumentam, atividades ao ar livre e atividade física diminuem, provocando um sedentarismo nas crianças e sendo essencial promover a atividade física. Segundo as entrevistas realizadas aos treinadores a tecnologia está a ser prejudicial no empenho desportivo e na formação desportiva dos atletas sendo usada tanto pelos atletas como pelos pais diminuindo a prática desportiva e afetando a intervenção dos treinadores.

Nesta nova era da tecnologia os pais ainda não estão adaptados a lidar com o uso da mesma, havendo uma falta de conhecimento dos pais acerca do tempo de uso das tecnologias e quão prejudiciais estas podem ser para o desenvolvimento desportivo dos seus filhos. Os resultados deste estudo vão de encontro à literatura atual que indica que a tecnologia pode ser uma barreira à prática desportiva.

Dimensão pedagógica

A dimensão pedagógica está presente na manutenção da prática desportiva, sendo que neste caso obtivemos diferentes opiniões dos treinadores comentando a favor ou contra a influência parental na prática desportiva dos filhos, tanto diretamente como indiretamente.

Entrevista do treinador de basquetebol:

“…a principal dificuldade vem mesmo quando não há esse apoio dos pais, como é que eu hei de dizer? Em ter que ajudar os filhos a entender o porquê dos treinadores serem exigentes, haver regras. Fazê-los entender que essas regras vão ajudá-los no futuro. Na maior parte das vezes, se calhar os meninos chegam a casa e os pais querem dar razão, que não devem dar porque os treinadores, quando, quando fazem determinadas coisas é para o bem do próprio atleta portanto existindo regras isso no futuro vai ajudá-los neste caso.”

Entrevista do treinador de atletismo:

“…Eu não gosto de pais no desporto. Mesmo, eu assisto aqui aos jogos de futebol, assisto aos comentários, por isso é que eu não. Eu tive uma Máxima, eu tive um professor que chamou Vítor Frade. Quem conhece futebol, ele é o indivíduo que criou a periodização tática que agora toda a gente fala, foi ele. Ele dizia, assim, vocês não queiram camadas jovens. Por que chateiam a cabeça os paizinhos dos filhos, os filhos deles são os melhores, eles são os melhores jogadores do mundo e não joga.”

Entrevista da treinadora de karaté:

“Sem dúvida, sem dúvida, os pais são continuam a ser fundamentais porque há fases, há fases porque como nós não é, nós vemos os adultos, nós às vezes a inscrever- me no ginásio começam, depois, faltam dia, faltam outro e quando dou conta, já não vou lá há 1 mês ou 2, acontece o mesmo às crianças e se não houver alguém a dizer não, não há, mas hoje não me apetece, não, não, mas tens que ir a um compromisso e uma responsabilidade que tens, tens que cumprir esse compromisso e vais ver. E normalmente até vêm, ficam muito mais bem-dispostos e corre bem, mas se não forem os pais a irem insistindo, os miúdos são sempre a das duas uma, ou não vêm, ou está sempre a mudar a modalidade, também acontece muito. Aí hoje já nunca karaté quero experimentar futebol há já não gosto agora quero acontece muito isso também e se não forem os pais dizer assim não, pelo menos agora tens, tens de compromisso, eu tenho pais que fazem, por exemplo, olha o que escolhem em Setembro tem pelo menos se manter uma época, ou seja, é uma responsabilidade e um haver um compromisso, porque se não hoje não me apetece.”

Entrevista do treinador de basquetebol:

“Acaba por ser grande, há muitos pais que ajudam, portanto, que ajudam os atletas compromisso. Não só obriga ninguém a fazer aquilo que não se gosta, claro, mas tem de na parte desportiva, mas há outros que claramente dificultam, e acredito que não seja por mal, mas se calhar, às vezes o senti do de proteção do filho nem sempre leva a ver as coisas como elas são.”

Entrevista do treinador de voleibol:

“- É um aspeto muito importante porque eles podem influenciar um aspeto muito positivo, temos casos situações em que nos apercebemos disso, ou de uma forma muito negativa mas eu como treinador sinto muito isso durante as épocas que há pais que condicionam muito a formação, a evolução das atletas muito colocam muita pressão nos escalões base em que eles estão numa fase de aprender se divertir e de crescer como atletas e já nesses escalões, certos pais impõem e põem muita pressão de pressão sobre esses mesmos atletas de forma a atingir rapidamente algumas etapas e que não devia ser assim por isso os pais têm uma influência muito forte na evolução.”

Segundo a literatura, alguns pais podem intervir negativamente na formação desportiva dos jovens, contrariando os treinadores o que pode originar divergências pedagógicas. Deste modo, deve haver uma relação entre treinador e pais de forma a compreenderem-se e trabalharem em conjunto para melhorar a formação desportiva do atleta. Segundo Williams et al. (2022), os motivos para os pais inscreverem os filhos no desporto poderão ser promotores ou prejudiciais à prática do mesmo, sendo que estes motivos, poderão refutar ou argumentar as decisões pedagógicas dos treinadores. Villafaina et al. (2021) argumentam estes factos afirmando que a pressão para o rendimento provocada pelos pais reduz a adesão desportiva.

Na dimensão pedagógica, podemos concluir que a influência parental está dividida em duas vertentes, tanto pode ser positiva como negativa, e a literatura aponta que divergências pedagógicas podem prejudicar o desenvolvimento do atleta, mas convergências pedagógicas otimizam o desenvolvimento do mesmo.

CONCLUSÕES

Neste estudo pudemos verificar que os treinadores apontam os pais como principais influenciadores, tanto positiva, como negativamente na prática desportiva dos jovens e crianças. Estes têm o controle sobre as atividades que os filhos praticam e quando as praticam. A prática desportiva é essencial para o desenvolvimento da dimensão social, sendo ambiente desportivo promotor de valores éticos adquiridos com os treinadores e promotor do trabalho em equipa, este que é essencial para a vida pessoal e social do jovem que posteriormente irá refletir-se nas relações com os colegas da escola e do trabalho.

As tecnologias são um fator importante na dimensão psicológica, estas são um ponto negativo no ambiente desportivo proporcionando um desfoco desportivo nos jovens e fazem com que as crianças e os jovens fiquem em casa, diminuindo o empenho desportivo dos mesmos. Alguns pais usam as mesmas como auxiliar para avaliar a capacidade formadora dos treinadores duvidando dos mesmos.

Segundo os treinadores, os fatores económicos dos pais acabam por ser mais relevantes em desportos menos frequentados e menos apoiados, mas, no entanto, parecem ser pouco relevantes em desportos coletivos, como o é o caso do futebol ou até mesmo o basquetebol e o voleibol. Os pais têm parte da responsabilidade pelo abandono ­desportivo devido ao facto de estes poderem limitar os treinos dos ­filhos e/ou os deixarem à vontade para ficarem em casa com as tecnologias, ao invés de irem treinar e aproveitarem para socializarem com os restantes atletas.

Segundo os treinadores entrevistados, os pais necessitam de mostrar interesse e apoiar os filhos na atividade desportiva, no entanto, quando estes demonstram interesses na classificação do jovem no desporto e pressionam os filhos para o alto rendimento em escalões mais baixos origina uma ­divergência entre os objetivos parentais e os objetivos do treinador sendo necessário consciencializar os pais acerca da formação desportiva do atleta.

Com base nos dados recolhidos nas entrevistas dos ­treinadores, verificamos que existem fatores de influência parental na iniciação e/ou manutenção da prática ­desportiva que poderão ser alvo de formações e/ou intervenções que ­consciencializem e empoderem os pais com estratégias e ações que melhorem a prática desportiva das crianças e ­jovens praticantes.

Este estudo teve como principais limitações o número reduzido de entrevistas e de modalidades desportivas envolvidas. Para adquirir dados mais precisos sobre este assunto de relevante importância, aconselhamos que futuros estudos incluam amostras de treinadores de um número superior de modalidades.

Em suma, denota-se que a influência dos pais é um assunto cada vez mais importante para a prática desportiva dos jovens e das crianças, sendo este estudo de extrema relevância para compreender que fatores estão ligados à ­influência parental na prática desportiva e de que modo é a ligação entre pais e ­treinadores, podendo promover no desporto uma maior adesão e melhor manutenção na prática desportiva por parte dos jovens. Futuras investigações poderão basear-se em como melhorar a influência parental no desporto, recorrendo a estudos experimentais, sendo possível observar o desenvolvimento dos atletas perante o comportamento dos pais.

REFERÊNCIAS

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Financiación:nada que declarar.

Recebido: 24 de Outubro de 2024; Aceito: 16 de Março de 2025

*Autor correspondente: Instituto Politécnico da Guarda, Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto, Avenida Doutor Francisco Sá Carneiro, 50 – CEP: 6300-559 – Guarda, Portugal. Email: anasantospereira2005@gmail.com

Conflito de interesses:

nada a declarar.

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