INTRODUÇÃO
A sociedade atual vem evidenciando problemas sociais, econômicos, e problemas para a saúde física e mental das pessoas. Com as novas condições de trabalho, cenários de incertezas, mudanças e o que resultou da pandemia da covid-19, os ambientes organizacionais ficaram mais propícios ao surgimento de doenças psicológicas, destacando o “Burnout”. O termo Burnout surgiu nos Estados Unidos, caracterizando um tipo de estresse ocupacional, onde a pessoa chega ao seu limite, levando-a a um estado de cansaço, irritabilidade até comportamento agressivo. O Burnout foi descrito pela primeira vez em 1974, pelo médico Herbert Freudenberger, pioneiro na conceituação do burnout (Freudenberger, 1975).
Somente em 1990 surgiram no Brasil os primeiros grupos de pesquisa sobre o tema, que, cada vez mais, vem afetando a vida de profissionais em diversas áreas. Desde então, a doença tem associação próxima com o contexto de trabalho. A Síndrome de Burnout é amplamente reconhecida como um estado de esgotamento mental e físico decorrente da vida profissional (Alves et al., 2022; Barbosa Neto et al., 2024; Carlotto, 2002; Ferreira & Pezuk, 2021; Lima et al., 2023; Lima et al., 2024; Ribeiro et al., 2024). Autores como Ferreira e Pezuk (2021, p. 485) corroboram essa definição, ao referirem que trabalhadores de diversas áreas “sofrem diretamente os efeitos das circunstâncias laborais no que tange a crescentes desafios e novas perspectivas, não apenas no campo profissional, mas também no âmbito social, econômico e tecnológico”, que se manifesta num “estado máximo de esgotamento mental e físico causado por questões relacionadas ao trabalho” (Ferreira & Pezuk, 2021, p. 486).
Segundo Freudenberger (1974), o Burnout é uma consequência do estresse ocupacional duradouro, que está relacionado a um conjunto composto por comportamento de isolamento, esgotamento e desilusão do profissional referente ao seu trabalho. Essa síndrome afeta diretamente a qualidade de vida do trabalhador, da família e das suas inter-relações. Desta forma, o trabalho que é visto como forma de realização tornou-se fonte de risco para a saúde, pois o trabalhador é visto como uma “máquina” no processo produtivo e pouca atenção têm sido dadas aos aspetos de proteção ambiental no trabalho (Maslach & Leiter, 1999). O trabalho que deveria possibilitar satisfação, crescimento, reconhecimento e independência pessoal e financeira, também pode acarretar sérios problemas de saúde (Lima et al., 2023; Barbosa Neto et al., 2024). Desse modo, tanto os profissionais como as empresas devem estar atentos a qualquer sinal de indiferença de seus colaboradores, visto ocuparem grande relevância em suas vidas e na ocupação do seu tempo (Ribeiro, 2020).
Para Vasques-Menezes e Codo (1999), a fragilidade emocional provocada pela falta do suporte afetivo e social traz grande sofrimento, uma vez que o reflexo dessa situação não fica restrito à vida privada, ampliando-se para o campo das relações de trabalho. O trabalhador, ao sentir-se sem alternativa para compartilhar suas dificuldades, anseios e preocupações, tem aumentada sua tensão emocional, o que pode levar ao surgimento da síndrome de Burnout e/ou do estress ocupacional (Prado, 2016). É imprescindível a necessidade de haver uma relação de satisfação com o ambiente de trabalho, pois este irá afetar diretamente as diversas áreas da vida humana e o desempenho do indivíduo dentro da organização (Ribeiro, 2020; Santos et al., 2022; Silva et al., 2023).
Em janeiro de 2023, a síndrome do esgotamento profissional passou a ser reconhecida como doença ocupacional pela OMS (2024). De acordo com essa nova classificação, a doença será tratada de forma diferente e as empresas passarão a ter maior responsabilidade sobre a saúde física e mental de seus colaboradores, pois irão atuar na prevenção, como também prestando auxílio para àqueles que já se encontram com a síndrome. Com essa nova definição os trabalhadores acometidos por Burnout, passarão a ter os mesmos direitos trabalhistas e previdenciários previstos nas demais doenças relacionadas ao trabalho.
O objetivo deste trabalho é conhecer e esclarecer a síndrome de Burnout, abordando seus conceitos, sintomas, causas, consequências e formas de tratamento. Além disso, pretende-se apresentar relatos de casos reais, analisando como a síndrome é tratada por organizações vinculadas aos casos apresentados. O estudo busca compreender como a síndrome de Burnout afeta o desempenho dos funcionários, por meio de uma abordagem teórica, enriquecida por relatos reais, dada a escassez de literatura que explora este aspecto específico.
REFERENCIAL TEÓRICO
As doenças psicossomáticas, que também são conhecidas como transtornos de sintomas somáticos, são condições provocadas por alterações emocionais e que, de alguma forma, acabam causando, ou agravando uma doença física, isso é a prova de que existe ligação entre o sistema nervoso e o sistema imunológico (Freudenberger, 1974), este é um tema que está em evidência na atualidade, visto a quantidade de incidência e afastamentos no trabalho. De acordo com dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT, 2019), aproximadamente 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a síndrome de Burnout, uma doença ocupacional reconhecida e classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022. Atualmente, o Brasil é o segundo país com mais casos diagnosticados no mundo.
De acordo com Almeida e Merlo (2008) as causas para o aparecimento da síndrome de Burnout são amplas, indo desde a carga elevada de trabalho (fator organizacional) até perfeccionismo (fator pessoal). Desse modo, observa-se que, dentre os fatores que culminam para a síndrome de Burnout o estresse ocupacional é predominante, uma vez que é um sentimento de frustração, ansiedade e hostilidade e, como salienta Lipp (2005), em cada sujeito as manifestações desta síndrome ocorrem de forma diferente, pois estão relacionadas ao ambiente social de trabalho, ao clima organizacional, a personalidade do trabalhador e as condições de trabalho. A economia, o trabalho, as alterações sociais e as evoluções no âmbito do trabalho exercem forte influência no processo saúde-doença e na qualidade de vida da população em geral (Benevides Pereira, 2002; Benevides Pereira, 2003; Bergamini & Tassinari, 2008). As constantes transformações e competições do mercado de trabalho estão cada vez maiores e isso não é mais nenhuma novidade, diante desse cenário, os profissionais que estão inseridos no mercado sofrem diversas pressões e inseguranças para acompanhar essas constantes evoluções e tendências, as causas do Burnout também são multifatoriais (Benevides Pereira, 2002). Trata- se da confluência de características pessoais, do tipo de atividade realizada e da constelação de variáveis oriundas da instituição onde o trabalho é realizado. As características pessoais sozinhas não podem ser consideradas como fatores desencadeadores do Burnout, mas sim a junção entre as características físicas e do ambiente de trabalho a classificação multifatorial (Bergamini & Tassinari, 2008; Prado, 2016). Embora haja relatos que a principal causa dessa doença é o excesso de trabalho, muitos profissionais quando estão trabalhando esquecem totalmente da sua vida pessoal, tendo seu tempo e atenção voltados somente para o trabalho. A incidência do Burnout tem alertado não somente o meio científico, mas também o meio organizacional, uma vez que seus efeitos interferem de forma negativa nos níveis individual, profissional e organizacional. Sem contar que os prejuízos também atingem essas três esferas, pois pode ocasionar o abandono da profissão, a ruptura de laços afetivos, a imagem de eficiência da organização, custos com funcionários, contratação e treinamento de novos profissionais (Benevides Pereira, 2002; Benevides Pereira, 2003; Santos et al., 2022).
O Ministério da Saúde e a Organização Pan-Americana da Saúde (2001) indicam como tratamento da síndrome de Burnout o acompanhamento psicoterápico, farmacológico e intervenções psicossociais, contudo, intervenções individuais, organizacionais e combinadas podem ser realizadas visando sua prevenção através da diminuição do estresse ocupacional.
Como mencionado, Burnout é uma doença que pode ser tratada, mas também pode ser prevenida, e para as organizações é melhor agir de forma preventiva do que reativa, pois envolve questões que vão prejudicar diretamente nos seus resultados e imagem. Por isso é tão importante as empresas se atualizarem e buscarem conhecer a síndrome e seu desenvolvimento, pois o Burnout se dá de forma lenta e silenciosa, então o primeiro passo para prevenção é que as organizações conheçam suas manifestações, para a devida identificação e então fazer o encaminhamento necessário. O Burnout, como uma doença, precisa de acompanhamento com especialistas e tratamentos específicos. O tratamento com um psicólogo é o primeiro passo a ser tomado. Com o atendimento especializado o paciente se sentirá mais seguro e conseguirá desabafar, tirando assim um “peso enorme de suas costas”, o que o fará sentir-se melhor (Maslach & Leiter, 2016). Além disso, algumas medidas podem ser tomadas como: reorganizar o trabalho, diminuindo a carga horária ou as tarefas pelo qual são responsáveis, possibilitando, aumentar o convívio com familiares e amigos, realizar atividades relaxantes, exercício físico, dentre outras (Robbins et al., 2010; Schaufeli et al., 2017; Silva et al., 2023). Dessa forma o tratamento da síndrome de Burnout deve ser abordado de forma global, que vai desde mudanças no trabalho na organização, até tratamento psicológico, pois o tratamento do Burnout não se dá somente pela mudança de hábitos do paciente, a organização também deve se reorganizar (WHO, 2019).
MÉTODO
Estudo de caráter qualitativo, com aplicação de questionário estruturado, com perguntas abertas, realizado no final de 2022, no retorno “a normalidade” após a pandemia. Os respondentes foram duas pessoas que já foram acometidas pela síndrome, e que hoje não tem mais a doença, mas continuam em terapia. Uma do setor nacional de serviços de grande porte, do sexo masculino (entrevistado A); outro do setor da indústria de grande porte, do sexo feminino (entrevistado B). Ambos com idade entre 25 e 30 anos, estudantes em nível superior na área de Gestão, um na pós-graduação, outro na graduação, ambos trabalhavam, pelo menos, 10 horas por dia, com salário médio em torno de 4 mil reais.
Por se tratar de uma doença relacionada ao ambiente de trabalho não foi possível realizar análise dos casos de Burnout dentro das organizações. Esse trabalho é um estudo com análise de narrativas não conclusivas. Segundo Bauer e Gaskell (2002, p. 202) “A análise de conteúdo nos permite reconstruir indicadores e cosmovisões, valores, atitudes, opiniões, preconceitos e estereótipos e compará-los entre comunidades.”
Foram preservadas as identidades e ambos os participantes fizeram o Termo de Aceite e Confidencialidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após a coleta de dados, observamos que ambos os entrevistados, afirmaram não conhecer a doença e nem suas manifestações, desse modo não conseguiram perceber que o que estavam sentindo se tratava de uma doença relacionada ao ambiente de trabalho. Sobre conhecimento da doença:
“Eu realmente não estava bem, nunca tinha sentido aquelas sensações, senti um desânimo muito grande, que eu nunca havia sentido, não tinha mais ânimo para prestar serviço para a empresa, e olha que era o meu sonho aquele emprego, mas nada fazia sentido, não estava sendo prazeroso, me sentia muito ansioso e constantemente preocupado em não dar conta do projeto, sendo que eu já estava acostumado a executar, mas naquele momento me sentia incapaz muito limitado.”(Entrevistado A).
“Eu conhecia por alto a terminologia, mas não sabia o real significado da doença, estava sentindo coisas que nunca havia sentido. Eu sabia que não estava bem e que realmente algo estava errado, pois meu corpo estava dando muitos sinais, algo realmente estava acontecendo.” (Entrevistado B).
A Síndrome de Burnout foi descrita pela primeira vez em 1974, por Herbert Freudenberger nos Estados Unidos, em um estudo sobre a perda da motivação e do comprometimento involuntariamente. Embora este não seja um termo novo, foi visto o quanto funcionários e organizações ainda estão leigos quanto a esta doença. Um funcionário está doente e a empresa não consegue detectar que ele está doente e que o problema que a pessoa está enfrentando é uma doença que está ligada diretamente ao ambiente de trabalho.
Em janeiro de 2023, a OMS (Organização Mundial da Saúde) reconheceu a síndrome de Burnout como uma doença ocupacional, que representa uma responsabilidade maior para as empresas, que devem prestar mais atenção e cuidar melhor da saúde mental dos seus colaboradores e proporcionar um ambiente saudável que não seja propício à ocorrência de doenças relacionadas ao trabalho. A Síndrome de Burnout é uma doença relacionada ao ambiente de trabalho e vêm aumentando em proporção devido às exigências do trabalho e aos estilos de vida adotados atualmente. Há uma preocupação tão grande com o trabalho e com as demandas diárias, que não se percebe os sinais que o corpo está apresentando. Muitas vezes nem se percebe os primeiros sintomas, apesar de os sintomas do transtorno se assemelharem muito aos de ansiedade ou depressão.
Nos relatos ouvidos, o diagnóstico foi realizado por pessoas que estavam próximas, pois a empresa não teve a sensibilidade de perceber, nem se preocupou em prestar subsídios para que o funcionário tivesse uma boa recuperação.
Sobre identificação/sintomas da doença:
“Em uma das visitas a um cliente ele percebeu que meu estado estava grave e que não se tratava apenas de um cansaço, ele já havia tido um quadro de Burnout e conhecia bem a doença, logo me disse: “A” se cuide, pois seu caso é Burnout! no momento eu só conseguia me perguntar o que significava aquela terminologia, logo que cheguei em casa fui pesquisar sobre o assunto e foi nesse momento que a ficha caiu e então decidi procurar ajuda.’’ (Entrevistado A).
“Meus amigos começaram a perceber e me alertar, eles estavam percebendo que meu comportamento estava diferente, eu vivia estressada, meu corpo estava todo intoxicado, no fundo eu percebia que havia algo errado comigo e que eu não estava bem.” (Entrevistado B).
A Síndrome de Burnout é uma doença que se desenvolve tão lentamente que os trabalhadores nem percebem que estão doentes, desse modo, é importante que as organizações estejam atentas às manifestações da doença para poderem as manifestações que os funcionários possam vir a apresentar e, em seguida, intervir. Pois a doença não afeta somente o indivíduo acometido, ela afeta os níveis grupal/social e institucional.
Sobre causas da doença:
“Minha rotina era muito conturbada, meus horários eram muito inconstantes, pois eu tinha que me adequar aos horários do cliente. Havia dias que a noite ainda estava em reunião, e não tinha lugar certo para ficar, hoje estava aqui, amanhã já estava em outro lugar, toda essa movimentação e inconstância acabaram se tornando cansativo, eu não tinha um ponto fixo, não podia estar em casa todos os dias e nem muito menos ver meus amigos, basicamente minha vida girava em torno do trabalho.” (Entrevistado A).
“Minha rotina era esporádica, nesse período eu estava à frente de um projeto grandioso, que demandava muita responsabilidade. Nesse tempo, a carga horária estava muito puxada, chegava às 4 da manhã e tinha dias que saia somente às 23 horas, eu vivia praticamente somente para o trabalho, não tinha tempo para mim”. (Entrevistado B).
As causas do Burnout, como já relatado, são multifatoriais, e segundo Silva Filho e Ramos (2004), os profissionais que desenvolvem Burnout são aqueles que se dedicam totalmente ao seu trabalho. É visível que aqueles profissionais que são mais dedicados estão mais propícios à doença, pois eles se doam bastante e vivem em prol do seu trabalho. O trabalho ocupa grande parte do tempo das pessoas, por esse motivo deve haver um cuidado para que as rotinas laborais não venham sufocar e causar prejuízos à saúde. Desse modo deve haver uma moderação entre o tempo de trabalho, tempo com a família e amigos, para que assim não haja nenhum desalinhamento entre esses fatores.
Sobre tratamento da doença:
“Logo após ser alertado e tive conhecimento do que estava acontecendo comigo, procurei um psicólogo, e comecei a colocar em prática tudo que o psicólogo me recomendava. Em seguida pedi para sair da empresa onde trabalhava, pois percebi que era aquela rotina que estava me adoecendo e não fazia sentido permanecer ali. Comecei a fazer coisas que tinha vontade e não tinha tempo, pois priorizava o trabalho, viajei, visitei amigos e relaxei.” (Entrevistado A)
“Logo após amigos me alertaram eu procurei um psicólogo e comecei a me cuidar, dei uma desacelerada, tirei mais tempo para mim e para minha família, comecei a reconhecer meus limites e a não os ultrapassar, além disso, pedi demissão. A partir do momento que percebi que aquela empresa estava me prejudicando e estava trazendo problemas para a minha vida e que não havia uma preocupação em me ajudar, não fazia sentido permanecer ali.” (Entrevistado B)
Trindade et al. (2010), afirma que a presença de mecanismos de suporte ao profissional é indispensável, valorizando aspectos pessoais e familiares e incentivando os profissionais a aproveitarem os momentos de convivência familiar, com o intuito de contribuir com o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e superação. A Síndrome de Burnout não surge da noite para o dia, pode demorar a atingir o pico do estresse, momento esse em que os sintomas da doença ficam bem aparentes e surge um diagnóstico.
Após o diagnóstico, é preciso rever a rotina e mudar alguns hábitos, pois se o trabalhador continuar com as mesmas práticas, a doença só irá se agravar. Por sua vez, a responsabilidade empresarial é grande, ela deve estar atenta e prestar total apoio ao funcionário para que assim ele possa se recuperar e até mesmo evitar o surgimento de novos casos. Maslach (2003) discorrem sobre os custos implicados na indiferença ao problema por parte da organização e defendem que a melhor forma de preveni-lo e tratá-lo é considerá-lo como problema coletivo e organizacional e não como individual.
Sobre a atenção da organização:
“A empresa, em nenhum momento, mostrou-se preocupada com a minha saúde e com meu tratamento, pelo contrário continuava me cobrando e a única preocupação era se eu iria conseguir finalizar projeto o qual estava realizando. Felizmente descobri em estágio inicial, portanto o tratamento se deu de forma rápida, com um mês de descanso, terapia e com boas práticas já estava me sentindo renovado. E logo que surgiu uma oportunidade, voltei a trabalhar. Embora tenha sido doloroso passar por aquela situação serviu de aprendizado, e com certeza sempre me lembrarei desse episódio como uma alerta para não me submeter às mesmas coisas e me priorizar”. (Entrevistado A).
“Infelizmente para conseguir auxílio tive que buscar, pois a gestão só visava resultados, não havia uma gestão humanizada. É inacreditável, mas mesmo na minha folga, meu dia de descanso eles me ligavam, cobrando resultados ou perguntando por coisas que dava para esperar”. (Entrevistado B).
Nos relatos dos entrevistados A e B, é importante ressaltar a concordância nas falas de que a empresa foi negligente em fornecer ajuda e até mesmo o diagnóstico, pois em ambos os casos a empresa não tinha conhecimento ou não queria perceber a doença e não forneceu suporte para que os funcionários se recuperassem. É responsabilidade das organizações dar as respostas às necessidades individuais de cada funcionário e fornecer um ambiente organizacional agradável que trate os funcionários como um ser em desenvolvimento, em vez de uma máquina que oferece benefícios.
Sobre as consequências da doença:
“Mas embora tenha sido por um curto período de tempo essa doença acabou trazendo consequências, não somente na área de trabalho, como também em minha vida pessoal, pois como eu me sentia improdutivo e cansado, não conseguia interagir com a minha família e amigos, nada me animava.” (Entrevistado A).
“Por mais que não tenha consequências drásticas, mas de certa forma afetou bastante meu psicológico, pois hoje fico com pé atrás não me dou(doar) tanto”. (Entrevistado B).
Loureiro et al. (2008), afirma que o impacto do Burnout não se restringe somente à vida profissional do trabalhador, afetando do mesmo modo a sua vida familiar e pessoal. O indivíduo com a síndrome perde o interesse por suas obrigações diárias, lazer e motivação para o convívio com os amigos e familiares resultando em afastamento. Essa afirmativa vai diretamente ao encontro dos relatos dos entrevistados, pois ambos relataram não ter forças nem ânimo para essa interação. A doença, tem impacto na esfera profissional e na vida pessoal, pois quando uma pessoa chega ao seu extremo, perde suas forças e vitalidade, ficando impossibilitada de se socializar com amigos e familiares.
Uma vez que o empregado não consegue se desligar de suas atividades laborais, ou ele levará trabalho ou ele passará mais tempo na empresa, seja fisicamente ou mentalmente, gerando problemas para sua saúde. Conforme relatado pelos dois entrevistados, pessoas afetadas pelo Burnout podem sofrer traumas após a experiência, ambos relataram que após a doença passaram a se doar menos, porque temem que isso aconteça novamente.
CONCLUSÕES
A Síndrome de Burnout mesmo tendo sido descrita pela primeira vez na década de 70, nunca se ouviu falar tanto nela quanto na atualidade, dadas às suas manifestações em casos reais e índices crescentes, e ainda visto a fatores como a incidência da pandemia da covid-19. Verificamos a importância do conhecimento da doença para um prévio diagnóstico e se poder iniciar as intervenções necessárias, pois as consequências podem impactar negativamente a vida do trabalhador, a produtividade, a qualidade de vida e o trabalho.
Como a síndrome de Burnout se desenvolve lentamente, as pessoas não percebem que estão doentes, é imprescindível que as organizações entendam a doença e tenham profissionais capacitados para subsidiar os acometidos e tomar medidas preventivas. Quando a doença é diagnosticada em estágio inicial, o tratamento é feito rapidamente. Na maioria das vezes, o afastamento do trabalho, a prática de atividades físicas e o convívio familiar são suficientes para restabelecer a saúde do profissional. Em casos mais graves, se faz necessário uso de medicamentos e acompanhamento médico.
Nos casos relatados, observamos que as pessoas que sofreram com a síndrome Burnout contribuíam para suas carreiras e não deixavam nada para depois, acabavam se sobrecarregando e esqueciam-se de suas vidas pessoais e da necessidade de moderação no trabalho e do tempo de descanso. Este estudo permitiu refletir sobre a “ainda” insensibilidade das empresas acerca das doenças ocupacionais e o quanto as empresas devem se tornar ambientes saudáveis, com boas relações interpessoais, comunicação não violenta, boa liderança, condições físicas e estruturais, remuneração compatível, horários propícios, dentre outros fatores que são variáveis de acordo com a organização, porte, localização, objetivo, missão e valores. Se faz necessário que as organizações tenham uma visão mais humana e que valorizem estratégias colaborativas para melhorar o seu ambiente e reduzir o surgimento de doenças do trabalho como a síndrome de Burnout, evitando perdas, principalmente, de vidas produtivas.
Este estudo se deu de forma não conclusiva, visto sua não finitude e limitação de entrevistados, mas possibilitou vários esclarecimentos acerca da ação do Burnout na vida de pessoas acometidas. Tivemos como diferencial a manifestação de duas pessoas que foram acometidas pela doença. A literatura de livros e artigos científicos não trazem casos práticos ou quase nenhum relato, na sua grande maioria, trazem aspetos descritivos, teóricos e que parecem de longa distância. Através do formato de análise de conteúdo, pudemos elencar pontos de conhecimentos na prática importantes para corporificar a literatura. Temática sensível de explorar tanto para as pessoas como para as organizações.
As pessoas usam de suas linguagens e sentimentos para representar o mundo como autoconhecimento (Bauer & Gaskell, 2002). As organizações, como extensão de vida do indivíduo, devem assumir esse papel e responsabilidade de perceber, orientar e de realinhar processos em prol das vidas que estão sob sua condução.














