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Revista Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia
versão impressa ISSN 1646-2122
Rev. Port. Ortop. Traum. vol.21 no.4 Lisboa dez. 2013
CASO CLÍNICO
Artroplastia total da anca com osteotomia de encurtamento subtrocantérica para a doença de desenvolvimento da anca Tipo IV de Crowe
Diogo FerrazI; Rafael Llopis MiróI; Maria Imaculada NeiraI
I. Hospital Universitário Santa Cristina. Madrid. Espanha.
RESUMO
Objetivos: descrever uma técnica de encurtamento femoral associada a artroplastia total da anca numa doente com doença de desenvolvimento da anca bilateral tipo IV de Crowe.
Métodos: doente de 62 anos, sexo feminino, com história conhecida de doença de desenvolvimento da anca bilateral não tratada. Clínica de coxalgia bilateral resistente ao tratamento conservador. Radiologia convencional confirmou sub luxação bilateral das ancas superior a 100%. Antecedentes de substituição articular com osteotomia subtrocantérica transversa. Posteriormente ralizada a artroplastia contralateral com encurtamento femoral pela técnica da Clínica Mayo.
Resultados: o recuo conseguido de 25 meses para o procedimento de osteotomia sub trocantérica transversa e de 17 meses para a técnica da Clínica Mayo. Em ambos os atos cirúrgicos verificou-se uma correta execução técnica e não foram registadas complicações. Não foram observáveis no período de seguimento crítérios de ossificação heterotópica ou descolamento asséptico. O Harris Hip Score inicial situava-se em valores de 40 tendo evoluído após os dois procedimentos cirúrgicos para valores superiores a 80. A dor inicial descrita como severa e persistente melhorou para ligeira a ocasional.
Conclusões: a substituição articular para as luxações altas (tipo IV de Crowe) implica com regularidade um encurtamento femoral para evitar uma lesão neurológica por estiramento. O procedimento de encurtamento subtrocantérico permite evitar a pseudartrose pós osteotomia de avanço do grande trocanter bem como a fragilização da musculatura abdutora. A técnica da Clínica Mayo acrescenta um superior contacto osso – osso no local da osteotomia e o ajuste intra operatório do comprimento do membro.
Palavras chave: Artroplastia total anca, osteotomia encurtamento subtrocantérica, doença desenvolvimento anca tipo IV Crowe.
ABSTRACT
Objective: describe a surgical technique and to evaluate the results of cementless arthroplasty with a simultaneous subtrochanteric shortening osteotomy in a patient with bilateral Crowe type – IV developmental dysplasia of the hip.
Methods: a 62 year old woman with a known history of untreated bilateral Developmental Displacement of the Hip. Pain and dysfunction resistants’ to nonoperative measures. Conventional radiology confirmed bilateral dislocation of the hips more than 100%. History of joint replacement with transverse subtrochanteric osteotomy at left hip. Subsequently right hip arthroplasty with femoral shortening osteotomy by Mayo Clinic technique.
Results: the follow up period was 25 months for transverse sub trochanteric osteotomy procedure and 17 months for the Mayo Clinic technique. Both surgical acts occurred with proper technical execution, and there were no complications. Were not observed during follow-up criteria of heterotopic ossification or components loosening. The Harris Hip Score initial stood in values of 40 having evolved after the two surgical procedures for values greater than 80. The initial pain described as severe and persistent improved to mild or occasional.
Conclusions: joint replacement for high dislocations (Crowe type IV) implies with regularly a shortening femoral osteotomy to prevent neurological damage by stretching the sciatic nerve. The procedure of sub trochanteric osteotomy allows prevent nonunion after advancement osteotomy of the greater trochanter as well as the weakening of the abductor muscles. The technique of Mayo Clinic adds a superior contact bone - bone at the osteotomy site and setting intraoperative limb length.
Key words: Total Hip Arthroplasty, shortening subtrochanteric osteotomy, Crowe type - IV developmental dysplasia.
INTRODUÇÃO
A doença de desenvolvimento da anca é usualmente referida na literatura como doença de displasia da anca. Descrita inicialmente, por Dupuytren em 1832, como luxação congénita da anca o seu conceito foi evoluindo. Com a constatação de apresentar uma história natural variável nem sempre atingindo a luxação e mesmo quando esta ocorre poder ser por um processo pós natal não sendo portanto uma patologia verdadeiramente congénita[1].
Wynne – Davies em 1970 verificou diferenças entre crianças com luxações pós natais precoces daquelas com luxações de aparecimento mais tardio. O primeiro grupo expressava história familiar de hiper – laxidez ligamentar; já o segundo grupo com luxação de aprecimento posterior manisfestava incidência familiar de displasia acetabular.
Em 1984 Davies Stuart vem corroborar esta hipótese de predisposição genética[2] onde admite serem as luxações congénitas verdadeiras associadas a laxidez ligamentar estando as luxações posteriores ao período neonatal relacionadas com displasia acetabular familiar.
Com o intuito de abranger esta noção de uma patologia dinâmica, com potencialidade de evolução favorável ou desfavorável, Klisic em 1989 recomendou o uso do termo Deslocação ou Doença de Desenvolvimento da Anca[1] englobando assim os conceitos de Displasia; Subluxação e Luxação da Anca indepentemente de ocorrerem na vida intra uterina ou no pós natal no decurso do desenvolvimento filogenético da marcha bípede.
Incidência
A incidência aceite para a deslocação do desenvolvimento da anca no período neonatal em populações não tratadas aproxima-se de um a dois por mil. Já a instabilidade da anca neonatal atinge valores de quinze a vinte por mil[3].
Com a progressiva utilização da ultrasonografia consegiu-se um diagnóstico e tratamento mais precoce com consequente melhoria do prognóstico. A prevalência da doença na idade adulta é rara correspondendo à indicação para substituição total da anca em instituições de referência na ordem dos 0,3%[4].
Classificação
Em 1979, Crowe et al[5] classificou a deslocação de desenvolvimento da anca na idade adulta segundo dois parametros. Primeiro considerando a migração proximal da cabeça do fémur admitindo quatro níveis: Tipo I (< 50% subluxação ), Tipo II ( 50 a 75 % subluxação), Tipo III ( 75 a 100 % subluxação), Tipo IV (> 100 % subluxação); segundo, dividindo a distância vertical que corresponde ao comprimento entre a linha horizontal inter–lacrimal e a linha horizontal ao nível da junção cabeça – colo femoral pelo comprimento definido entre a linha horizontal ao nível da tuberosidade isquiática e a linha horizontal tangente à crista ilíaca: Tipo I (< 0.10), Tipo II (0.10 a 0.15), Tipo III (0.16 a 0.20), Tipo IV (> 0.20). Esta classificação é de caráter quantitativo[3].
Artroplastia
No caso clínico em estudo submeteu-se à apreciação os resultados funcionais e radiográficos da artroplastia total da anca para uma doente com doença desenvolvimento da anca bilateral tipo IV de Crowe recorrendo-se à técnica de osteotomia de encurtamento subtrocantérica. Objetivamente procedeu-se ao subtipo de osteotomia transversa na anca esquerda e à técnica da Clínica Mayo na anca direita[6,7].
Em 1996 surgiu a clasificação anatómica de Hartofilakidis[9]: Tipo I – anca displásica, não deslocada; Tipo II - deslocação baixa; Tipo III – deslocação alta. Apresentando-se assim como predomínio qualitativo[3]. Neste artigo será utilizada o subtipo migração proximal da classificação de Crowe.
MATERIAL E MÉTODOS
O instrumental utilizado na artroplastia esquerda (osteotomia transversa) consistiu: haste não cimentada porosa de revestimento total 130 mm, componente acetabolar 40 mm, cabeça de cromo – cobalto 22 mm, polietileno altamente reticulado 22 mm, dois parafusos acetabolares 6,5 mm, três cabos de cerclage (Zimmer incorporated).
Na anca contra – lateral foi utilizada uma haste femoral modular AcuMatch série M (Figura 1) que permite ultrapassar as discrepâncias de diâmetro entre a diversas frações do canal medular. Constituída por três segmentos independentes respetivamente: colo, componente metafisário, haste distal propriamente dita, o que possibilita uma seleção independente entre o offset e o comprimento da haste. Restantes implantes: componente acetabular 40 mm, cabeça de cromo – cobalto 22 mm, polietileno altamente reticulado 22 mm, três parafusos acetabulares 6,5 mm, quatro cabos de cerclage (Zimmer incorporated).
Técnica cirúrgica - procedimento Clínica Mayo
Planificação pré – operatória: realiza-se um estudo imagiológico antero – posterior e lateral para determinação inicial da dimensão dos componentes, nível da osteotomia femoral e da osteotomia subtrocantérica. O ensaio do componente acetabular projeta-se com a máxima medialização possível para obter o apoio sumo no teto acetabular e na lágrima[6]. A prova do componente femoral permite prever o nível da osteotomia subtrocantérica usualmente um centímetro distal ao pequeno trocanter[6]. O comprimento antecipado de osso a ser removido deve ser calculado com o objetivo de igualizar a dimensão dos membros inferiores e não alongar o membro mais de quatro centímetros[7].
Via de abordagem: via póstero lateral de Moore (via posterior de Langenbeck – Figura 2A) a qual permite uma excelente identificação do acetábulo primitivo assim como realizar a osteotomia femoral[6]. Possibilita ainda uma boa mobilização do fémur após a libertação da inserção distal do músculo grande glúteo o que diminui a tração sobre o nervo ciático[6] (Figura 2B). Artrotomia e luxação da cabeça femoral. Colheita de enxerto de osso esponjoso mediante uma fresa de pequena dimensão (Figura 2C).
Osteotomia do colo femoral: O corte pode ser medido distalmente desde a cabeça do colo do fémur ou proximalmente desde o pequeno trocanter. Procede-se à preparação intra medular, a qual deverá ultrapassar o nível da osteotomia de encurtamento, com o intuito de se conseguir uma boa ancoragem da prótese ao fragmento distal permitindo obter uma boa estabilidade rotacional[7].
Osteotomia subtrocantérica ou osteotomia femoral proximal: geralmente 10 cm distal ao grande trocanter (Figura 2D). O fragmento femoral é transladado anteriormente preservando os tecidos moles envolventes dando acesso ao acetábulo anatómico.
Tempo Acetabular: O acetábulo primitivo por norma apresenta dimenções reduzidas o que indica o uso de fresas acetabulares de pequeno diâmetro. Na maioria dos casos consegue-se uma boa cobertura lateral com a medialização da fresagem. Quando isso não se verifica utiliza-se enxerto ósseo autólogo para aumento da parede supero-lateral[7]. Neste processo deve-se ter especial cuidado com a moldagem da parede anterior e medial[6]. Já a coluna posterior é frequentemente espessa podendo ser utilizada para otimizar o teto acetabular[7]. A última fresa pode ser utilizada em modo reverso com o intuito de expandir o acetábulo e compactar o enxerto ósseo[6,7]. O componente acetabular é impactado na sua posição não negligenciando a anteversão e cobertura[6] e fixo com parafusos suplementares[7].
Tempo Femoral: Osteotomia femoral distal: Nesta fase coloca-se uma haste teste e procede-se à redução da anca. Seguidamente tracciona-se distalmente o membro com fim de igualizar o seu comprimento com o membro contra lateral. Determina-se assim o nível da osteotomia femoral distal ficando o fémur encurtado. O segmento ósseo removido é aberto em bivalve (Figura 2E).
Preparação femoral definitiva: Antes da preparação definitiva da porção distal do femur é aconselhável a sua estabilização através da colocação de cabos de cerclage. É aconselhável recorrer ao uso de hastes femorais modulares e estriadas pois permitem maior estabilidade rotacional devido à discrepância de diâmetro entre a metáfise e a diáfise[6]. Permitem igualmente a eleição independente do offset, dimensão componente metafisário e comprimento da haste distal[6] (Figura 1).
Implantação Haste Femoral: Antecipadamente à impactação da haste definitiva é necessário o ajuste do alinhamento rotacional de ambos fragmentos femorais de forma a permitir uma anteversão aproximada de 15° componente metafisário[7] ou conseguir esse alinhamento através da anteversão independente das diversas frações da haste femoral utilizada. O processo de implantação em si é realizado de forma independente. Primeiro, a parcela metafisária sucedida pelo fragmento mais distante. Se necessário poderse - á ajustar a osteotomia para uma boa redução da anca ou em casos de estiramento excessivo do nervo ciático[6,7]. A estabilidade rotacional e axial são conseguidas pela boa ancoragem do implante quer a nível metafisário quer distalmente. O segmento ósseo removido após aberto em bivalve é colocado, em associação opcional a exerto ósseo autólogo, ao nível da osteotomia e estabilizado por dois cabos de cerclage a fim de potencializar a remodelação óssea (Figura 2F).
Encerramento: Realizam-se as provas usuais de estabilidade da anca. Encerramento por planos com reinserção mediante pontos transósseos do tendão distal músculo grande glúteo, cápsula articular e os músculos curtos rotadores externos da coxa[6]. Dreno aspirativo 24 horas.
CASO CLÍNICO
Doente sexo feminino, 62 anos, altura 156 cm com história conhecida de doença de desenvolvimento da anca bilateral não tratada. Referenciada à consulta por coxalgia bilateral de evolução arrastada refractária ao tratamento conservador. A avaliação clínica inicial demonstrava sinal de Trendelemburg e hiperlordose lombar secundária ao flexo bilateral da anca. Arco de movimento da anca diminuído bilateralmente. O estudo imagiológico confirmava o quadro de doença de desenvolvimento da anca do adulto com subluxação superior a 100% bilateralmente (Figura 3 A e B). Primariamente procedeu-se à substituição articular esquerda (Figura 3C) e posteriormente foi realizada artroplastia da anca direita (Figura 3 D).
RESULTADOS
Na avaliação clínica foram registados os seguintes parâmetros: altura, discrepância do comprimentro entre os dois membros inferiores no pré e pósoperatórios e o Harris Hip Score. O Recuo conseguido foi de 25 meses anca esquerda e 17 meses anca direita. A avaliação da consolidação da osteotomia foi efetuada em radiogramas subsequentes. Os critérios de remodelação óssea considerados foram a presença de calo ósseo no local de osteotomia e a continuidade entre as corticais das frações proximais e distais do fémur[8]. Realizaram-se ainda o despiste da migração dos componentes, calcificação heterotrópica, osteólise e desgaste do polietileno acetabular. Em ambas as ancas o Harris Hip Score inicial situava-se em valores de 40 e atingiu níveis superiores 80 após os procedimentos cirúrgicos. Nesta escala o critério dor, inicialmente descrita como severa condicionando limitação marcada das atividades, progrediu para um quadro dor ligeira a ocasional. A discrepância clínica entre o comprimento dos membros inferiores entre os dois gestos cirúrgicos aproximava-se dos 40 mm. Após ambas as reconstruções articulares essa disparidade verificou-se ser inferior a 10 mm (Figura 3 E).
DISCUSSÃO
A doença de desenvolvimento da anca se não diagnosticada na infância pode evoluir para manifestarse na idade adulta como um quadro de sub-luxação ou luxação da anca. Nestes pacientes os músculos que se inserem no femúr proximal encontram-se encurtados e apresentam uma disposição anatómica mais horizontalizada[9]. Essa alteração estrutural pode predispor a uma ausência de contacto entre a cabeça femoral e o osso ilíaco. Desta forma não se irá desenvolver patologia degenerativa nestas estruturas e os pacientes manter-se-ão indolores pelo que não se encontram indicados tratamentos invasivos. Nos casos onde esse contacto se verifica e por ser um contacto instável, existe uma tendência para o aparecimento de desgaste local manifestado pelo desenvolvimento de um neo – acetábulo e alterações secundárias da cabeça femoral. A presesnça deste falso acetábulo bem definido é o fator de principal prognóstico de desenvolvimento de dor[9].
Nas sub luxações sintomáticas menos severas com degeneração articular mínima poder-se-á optar por osteotomias peri acetabulares[3]. As evidências sugerem que esta técnica apresenta bons resultados para pacientes com menos de trinta anos e possuem uma boa /excelente congruência articular no momento do ato cirúrgico[3]. Este procedimento não impossibilita uma futura artroplastia da anca.
A susbtituição total da anca tem sido documentada para a maioria dos doentes com artropatia avançada no contexto de doença de desolvolvimento da anca tipo I, II, III com bons resultados funcionais e supressão da dor[4]. Contudo a anatomopatologia característica das luxações altas (tipo IV de Crowe) coloca dificuldades técnicas para a reconstrução articular.
Como primeiro objetivo encontra-se a colocação do componente acetabular ao nível do acetábulo verdadeiro. A sua disposição a esse nível tem concedido os resultados mais duráveis[4] potencializando a musculatura abdutora[10]. Na sua impossibilidade o seu posicionamento mais elevado mas não mais lateralizado poderá ser aceitável[3].
No que concerne à sua colocação aceita-se como que adequada uma cobertura de 75 a 80% desde que exista uma boa reserva óssea na parede anterior e posterior[3]. Se estes valores não forem atingidos poder-se-á considerar o recurso a enxerto ósseo. Como critérios favoráveis ao desgaste do polietileno e como tal a evitar incluem-se: inclinação acetabular superior a 45° ou lateralização relativamente à lágrima excedendo os 25 mm.
Porém este posicionamento anatómico do componente acetabular resulta numa anca de mais difícil redução, alongamento do membro e consequente possibilidade de lesão neurológica por estiramento.
Para solucionar este problema foram descritas várias técnicas de encurtamento femoral permitindo uma mais fácil redução, equalização do comprimento dos membros inferiores e a proteção do nervo ciático.
A osteotomia de encurtamento femoral pode ser realizada a vários níveis anatómicos. O método tradicional tem consistido na osteotomia de avanço distal do grande trocanter associada a encurtamento femoral proximal. Implica o recurso a hastes retas e apresenta como possíveis complicações uma união fibrosa do grande trocanter e o aparecimento de fraturas do segmento metafisário proximal[10].
Encontram-se igualmente descritas as técnicas de osteotomia segmentária de encurtamento metafisário para pacientes com patologia unilateral e osteotomia de Schanz prévia[10] e a osteotomia de encurtamento supra condiliana que permite manter inalterada a musculatura abdutora pela sua osteotomia distal[11].
Mais proximamente surgiu um novo conceito: osteotomia de encurtamento subtrocantérica. Este procedimento divide-se em vários sub tipos: osteotomia transversa, osteotomia oblíqua, osteotomia em “step – cut” e a osteotomia pela técnica da Clínica Mayo[6,7]. A osteotomia oblíqua apresenta valores de pseudartrose de 10% aos 8 anos[6]. O procedimento em “ step – cut” tem vantagens que favorecem a remodelação óssea tais como uma maior superfície de contacto entre os segmentos da osteotomia e uma maior resistência ao momento de torção[8].
No caso em estudo foi realizada uma osteotomia de encurtamento subtrocantérica transversa na anca esquerda e pela técnica da Clínica Mayo anca direita. Ambas as situações permitem preservar a estrutura óssea proximal e com isso garantir uma melhor estabilidade rotacional a esse nível bem como reduzir o risco de comprometimento da musculatura abdutora por pseudartrose pós osteotomia de avanço trocantérica[8].
A osteotomia de encurtamento subtrocantérica requer uma fixação estável nos fragmentos metafisários e diafisários[4,7,8]. A estabilidade rotacional metafisária é melhor conseguida com a utilização de hastes modulares. O recurso a hastes não modulares pode condicionar um insuficiente preenchimento e ancoragem ao canal medular o que pode ocasionar o descolamento asséptico, fraturas da haste femoral por estas apresentarem predominantemente fixação distal ou ainda pseudartrose da osteotomia por escassa estabilidade rotacional[8].
Neste âmbito Whiteside estudou o efeito da retenção parcial do colo do fémur com a utilização de hastes modulares no que refere à estabilidade rotacional e concluiu ser este o fator mais importante[16]. Já a estabilidade a nível distal poderá ser comprometida em pacientes com densidade óssea diminuída. Na presença destas duas variáveis é legítimo recorrer-se a uma haste cimentada[8]. O uso de hastes não cimentadas modulares cuja geometria se adapte a um canal medular estreito e reto de um fémur com uma morfologia alterada será a melhor solução[8].
A osteotomia transversa realizada à esquerda apresentou evolução favorável com desenvolvimento de continuidade cortical evidente aos 16 meses de pósoperatório (Figura 3E).
Não foram observáveis critérios de ossificação heterotrópica segundo o sistema de classificação Brooker ou de descolamento asséptico demonstrado pela migração distal do componente femoral relativamente à extremidade do grande trocanter ou pelo aparecimento de uma angulação em varo da haste femoral nos radiogramas de controlo.
Na anca direita foi efetuado o encurtamento subtrocantérico tela técnica da Clínica Mayo. Este procedimento representa um avanço técnico relativamente aos precedentes na medida em que permite um excelente contacto osso – osso ao nível da osteotomia conseguido pela aposição em bivalve do segmento ósseo removido a fim de favorecer a remodelação óssea. Possibilita ainda o ajuste intra operatório do comprimento do membro[7].
O recurso a uma haste modular possibilita a seleção independente quer do componente metafisário permitindo um ajuste e uma fixação firme ao fragmento femoral proximal independentemente do nível de ressecção do colo do fémur[8] quer de uma haste cilíndrica estriada distal com capacidade de pontencializar uma fixação estável ao fragmento distal bem como ao nível da osteotomia[4]. Esta garantia proximal e distal de estabilidade rotacional é indispensável para evitar a pseudartrose da osteotomia[4].
Deve-se ainda salientar que a anteversão femoral proximal é corrigida pela rotação dos fragmentos femorais conseguindo-se a lateralização anatómica normal do grande trocanter e dos abdutores restaurando-se assim a força abdutora e minimizando a instabilidade e a claudicação[4].
Este passo é essencial para obter uma estabilidade ótima da anca, um bom arco de movimento e minimizar o risco de luxação pós-operatória[7].
Radiograficamente não foram observáveis critérios de ossificação heterotrópica ou de descolamento asséptico de ambos os compomentes evidenciados por migração ou varização da haste femoral ou por alteração da distância entre o bordo infero – medial do componente acetabolar e a linha inter-lacrimal[8].
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Conflito de interesse:
Nada a declarar.
Diogo Ferraz
Rua Sousa Aroso nº 31 Ed 3 - 2A
4400 - 289 Matosinhos
Portugal
diogo_fcml@hotmail.com
Data de Submissão: 2013-07-18
Data de Revisão: 2013-11-26
Data de Aceitação: 2013-11-26