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Revista Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia
versão impressa ISSN 1646-2122
Rev. Port. Ortop. Traum. vol.22 no.3 Lisboa set. 2014
ARTIGO ORIGINAL
Artroplastia unicompartimental do joelho Oxford Knee phase 3. Resultados a médio prazo
Pedro FalcãoI; André GrenhoI; Jorge Homero CostaI; João Torrinha JorgeI; Joana ArcângeloI; Paulo CatarinoI
I. Serviço de Ortopedia. Centro Hospitalar Lisboa Central. Lisboa. Portugal.
RESUMO
Objectivo O interesse nas artroplastias unicompartimentais do joelho tem vindo a crescer, com melhoria dos resultados pós-operatórios e aumento da longevidade das próteses. Assim propusemo-nos a avaliar os doentes submetidos a artroplastia unicompartimental do joelho com Oxford Knee phase 3 realizados no nosso serviço.
Material e métodos Foi realizado um estudo retrospectivo de 29 artroplastias unicompartimentais do joelho Oxford Knee phase 3 (total de 27 doentes) consecutivas, com um tempo médio de follow-up de 47 meses (10 - 83 meses). Avaliaram-se os resultados clínicos, funcionais e radiológicos.
Resultados A idade média dos doentes é de 64 anos (49-78 anos). Não houve registo de complicações peri-operatórias. Registaram-se 2 descelamentos do componente tibial. 23 doentes encontram-se satisfeitos ou muito satisfeitos com a cirurgia e a média do Oxford knee score duplicou do pré-operatório de 17,4 (5 - 30) para o pós-operatório com 36,6 (11 - 48).
Conclusões A rápida recuperação, baixa morbilidade e melhoria dos resultados proporcionados pela via mini-invasiva parece justificar plenamente o uso das próteses Oxford Knee phase 3, apesar da curva de aprendizagem inerente à realização das artroplastias unicompartimentais.
Palavras chave: Artroplastia unicompartimental do joelho, artroplastia de Oxford, artroplastia do joelho, osteoartrose do joelho.
ABSTRACT
Purpose Improvement in medium- and long-term results increased interest in unicompartmental knee arthroplasty. We decided to evaluate patients undergoing Oxford Phase 3 unicompartmental knee arthroplasty with performed in our department.
Methods A retrospective study of 29 consecutive Oxford Phase 3 unicompartmental knee arthroplasty, with a median follow-up of 47 months (10-83 months) was performed. We assessed clinical, functional and radiological data.
Results Mean age was 64 years (49-78 years). There were no reports of perioperative complications. There were two loosenings of the tibial component. 23 patients were satisfied or very satisfied with the surgery and the mean Oxford knee score doubled from preoperative 17.4 (5-30) to postoperative 36.6 (11-48).
Conclusions Rapid recovery, lower morbidity and improved outcomes provided by mini-invasive surgery seems to fully justify Oxford Phase 3 unicompartmental knee arthroplasty, despite the surgical learning curve.
Key words: Unicompartmental arthroplasty, Oxford arthropasty, knee arthroplasty, knee osteoarthritis.
INTRODUÇÃO
A osteoartrose do compartimento interno do joelho é considerada uma doença unicompartimental que, se não for tratada, pode progredir afectando os outros compartimentos do joelho1.
As opções cirúrgicas para tratamento da osteoartrose do compartimento interno do joelho incluem osteotomia proximal da tíbia, artroplastia total ou artroplastia unicompartimental do joelho, dependendo de vários factores como a idade, nível de actividade física e deformidade existente 2-4.
Os primeiros desenhos das próteses unicompartimentais internas do joelho apareceram em 1969 (St. Georg) e 1972 (Marmor). Em 1974, John Goodfellow e John O’Connor introduziram a primeira Oxford Knee (phase 1) com componente femoral de metal com superfície esférica, componente tibial de metal plano, com polietileno móvel côncavo em cima e plano em baixo interposto entre eles. O dispositivo é completamente congruente e não constritivo. Estas características permaneceram inalteradas até hoje. A Oxford Knee phase 2 foi implementada em 1987, sendo colocada, à semelhança da phase 1, através de abordagem aberta com deslocação da rótula, como na artroplastia total. Em 1998 foi introduzida a phase 3, especificamente para a osteoartrose do compartimento interno usando uma abordagem mini-invasiva. Difere ainda na existência de cinco tamanhos diferentes de componente femoral, alteração na forma do componente tibial, instrumentação da prótese e forma do polietileno5.
Comparada com a artroplastia total, tem como vantagens a preservação óssea, menos complicações pós-operatórias (perdas sanguíneas, dor pós-operatória, taxa de infecção, trombose venosa profunda (TVP) e tromboembolismo pulmonar (TEP)), manutenção da normal cinemática do joelho, alta precoce e reabilitação mais rápida6-8.
Desenvolvimentos na instrumentação, desenho do implante, abordagem cirúrgica e selecção dos doentes levaram a uma grande melhoria dos resultados pós-operatórios e aumento da longevidade das próteses unicompartimentais do joelho9-13.
O objectivo deste estudo foi avaliar a sobrevida e os resultados clínicos, funcionais e radiológicos dos doentes submetidos a artroplastia unicompartimental do joelho com Oxford phase 3 realizados no nosso serviço.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizado um estudo retrospectivo das artroplastias unicompartimentais do joelho Oxford Knee phase 3 realizadas no nosso serviço.
Desde 2006, período em que se iniciou a colocação destas próteses, realizaram-se 37 artroplastias unicompartimentais (num total de 34 doentes). Todas as próteses foram implantadas por abordagem mini-invasiva.
Foram revistos os processos de consulta e do internamento, obtendo-se os seguintes parâmetros: idade, sexo, classificação ASA (American Society of Anesthesiologists), intercorrências no pós-operatório e Oxford knee score pré-operatório.
Os doentes foram convocados para uma avaliação pós-operatória onde se registou grau de satisfação, flexão-extensão actual e Oxford knee score pós-operatório.
Realizou-se uma radiografia AP em carga e perfil do joelho e extra-longo dos membros inferiores em carga, tendo-se avaliado desvios axiais varo-valgo e parâmetros radiográficas a salientar.
Foram excluídos sete doentes (um deles com artroplastia unicompartimental bilateral) por não comparência à avaliação pós-operatória.
RESULTADOS
Foram incluídas 29 artroplastias unicompartimentais do joelho (total de 27 doentes), com um tempo médio de follow-up de 47 meses (10 - 83 meses).
A idade média dos doentes é de 64 anos (49-78 anos). Há um predomínio do sexo feminino (23 contra 4 do sexo masculino).
O ASA médio dos doentes operados foi de 2,4.
Não houve registo de complicações peri-operatórias.
Um dos doentes foi submetido a conversão para artroplastia total do joelho por descelamento do componente tibial (excluído da avaliação clínica e radiográfica) e outro encontra-se a aguardar cirurgia de revisão pelo mesmo motivo. Considerando o total de intervenções e estas 2 falências, pode-se calcular uma sobrevida média de 94,6%.
Há dois doentes não satisfeitos com a cirurgia. Há um doente pouco satisfeito e 23 satisfeitos (10) ou muito satisfeitos (13).
Todos os doentes conseguem fazer extensão completa e a média de flexão é 111º (com um mínimo de 90º).
O Oxford knee score foi avaliado antes da cirurgia e no momento da consulta de avaliação pós-operatória. Este score apresenta um valor entre 0 e 48, sendo que 48 corresponde a uma pessoa sem queixas. A média do Oxford knee score pré-operatório é de 17,4 (5 - 30) e pós-operatório é 36,6 (11 - 48).
Radiologicamente utilizaram-se os critérios estabelecidos pelo centro de ortopedia de Oxford5. Registou-se uma média de desvio em varo de 1,68º (varo 8º - valgo 5º). Ocorreu artrose femoro-tibial externa em três casos (dois dos quais também com artrose femoro-patelar), um caso com slope tibial exagerado (19º), um caso com componente femoral em varo (15º), um caso com componente tibial demasiado grande com protusão interna, um caso de extrusão do menisco de polietileno, um caso com o componente tibial em valgo e um caso de descelamento do componente tibial a aguardar cirurgia de revisão (já referido).
DISCUSSÃO
O achado mais importante é o resultado da longevidade a médio prazo das artroplastias unicompartimentais do joelho, com uma sobrevida de 94,6% aos 47 meses, num hospital com baixo volume de artroplastias unicompartimentais realizadas.
Algumas das grandes séries mostram resultados muito encorajadores. Pandit et al.3 descreve resultados de 97,3% aos 7 anos14 e 96% aos 10 anos15 analisando 668 artroplastias no centro que desenvolveu os implantes e a técnica. Carr et al.6 reportou 99% de sobrevida aos 8 anos em 121 joelhos, Murray et al.13, em 143 joelhos, obteve uma sobrevida de 98% aos 10 anos, Svard e Price17, num estudo sueco, demonstraram uma sobrevida de 95% aos 10 anos em 124 joelhos operados, Kumar e Fiddian18 em 100 joelhos verificaram que aos 11 anos tinham uma sobrevida de 85%. Noutras 2 grandes séries de doentes, Lisowski et al.19 obteve 94,4% de sobrevida aos 7 anos em 244 artroplastias e Matharu et al.20 93% aos 8 anos em 459 joelhos operados. Estes estudos demonstram a importância da experiência e do alto volume de doentes necessários, com a respectiva curva de aprendizagem, para se obterem bons resultados. Apesar do baixo volume de doentes a nossa série apresenta bons resultados a médio prazo.
Os dois doentes com falência da artroplastia unicompartimental (um já operado e outro a aguardar cirurgia) apresentam descelamento do componente tibial. Esta é uma das causas descritas de revisão da prótese. Há a salientar que os dois doentes tiveram falência da prótese nos primeiros três anos.
Outra causa comum de revisão é a progressão da artrose do compartimento externo15, 21-25. Embora não tenha sido causa de revisão na nossa série houve progressão para artrose do compartimento externo em três doentes, sem no entanto haver repercussão clínica (dois desses doentes também tiveram progressão para artrose femoro-patelar). Contudo alguns estudos referem que a maior parte das falências das próteses unicompartimentais por progressão da doença do compartimento externo ocorrem nos primeiros 5 anos, com uma proporção pequena ocorrendo depois13, 15, 21, 23, 25. Crê-se que a causa estará relacionada com aspectos técnicos, nomeadamente uma correcção exagerada de deformidade em varo com “overstuffing” do compartimento interno. No nosso caso obtivemos um desvio médio em varo de 1,68º em relação ao desvio fisiológico.
O desgaste de polietileno não está descrito como causa de falência da Oxford Knee phase 3, traduzindo a vantagem do menisco de polietileno móvel13, 16, 18, 26. Por outro lado tem como desvantagem a possibilidade de luxação do menisco de polietileno, ocorrendo geralmente prematuramente após colocação da prótese, sendo atribuída a um erro técnico de implantação19. Na nossa série não houve nenhum caso de luxação a referir.
A maioria dos autores está em sintonia quando sugerem que as revisões ocorrem geralmente entre os 1,5 e 5 anos15, 19, 21, 23, 24. Este pormenor é característico da Oxford Knee phase 3, em que os erros técnicos se manifestam precocemente. Já os problemas a longo prazo são raros devido à alta resistência ao desgaste13, 27. Assim é muito provável que a Oxford Knee phase 3 tenha bons resultados a longo-prazo14.
Em relação às outras alterações radiográficas existentes no nosso estudo (um caso com slope tibial exagerado (19º), um caso com componente femoral em varo (15º), um caso com componente tibial demasiado grande com protusão interna, um caso de extrusão do menisco de polietileno, um caso com o componente tibial em valgo) demonstrou-se não terem repercussão na avaliação objectiva ou subjectiva dos doentes. Será necessário mais tempo de follow-up para sabermos se terá alguma consequência na sobrevida das artroplastias.
Na análise subjectiva realizada a grande maioria dos doentes encontram-se satisfeitos ou muito satisfeitos, traduzindo-se numa melhoria do Oxford knee score pós-operatório para mais do dobro em relação ao pré-operatório.
Não se registaram outro tipo de complicações, nomeadamente, infecções, trombose venosa profunda clínica ou tromboembolismo pulmonar.
Estudos recentes sugerem que os resultados da artroplastia unicompartimental são muito similares aos das artroplastias totais do joelho, com correcção para a idade29, 30. Selecção apropriada de doentes, escolha dos implantes e técnica cirúrgica e experiência do cirurgião permitem obter bons resultados22, 30.
Este estudo apresenta como limitações o baixo tempo de seguimento, a inexistência de uma equipa dedicada à realização deste procedimento e a baixa dimensão da amostra. No entanto, esta é a maior série publicada, até ao momento, no nosso país.
A artroplastia Oxford Knee phase 3 permite ao cirurgião criar um bom balanço entre a flexão e extensão, com baixa taxa de luxação do polietileno e correcção excessiva19. A percentagem de complicações major é baixa19.
Quando as indicações são criteriosamente aplicadas (com as principais indicações a serem a artrose antero-interna e a necrose avascular14, resultados bons e reprodutíveis podem ser esperados deste procedimento, com um follow-up a médio prazo19.
A rápida recuperação, baixa morbilidade e melhoria dos resultados proporcionados pela via mini-invasiva parece justificar plenamente o uso das próteses Oxford Knee phase 3, apesar da curva de aprendizagem inerente à realização das artroplastias unicompartimentais11.
Um maior tempo de follow-up será necessário para se avaliar a longevidade das artroplastias unicompartimentais.
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Data de Submissão: 2014-03-04
Data de Revisão: 2014-09-30
Data de Aceitação: 2014-10-20