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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa
versão impressa ISSN 1646-5830
Acta Obstet Ginecol Port vol.12 no.1 Coimbra mar. 2018
EDITORIAL
Cancro na mulher em Portugal
Cancer in women in Portugal
Daniel Pereira da Silva*
*Ginecologista Oncológico; Diretor da Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa; Presidente da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia
Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence
O presente número da revista tem vários artigos sobre oncologia, o que não é comum.
Este facto levou-me a orientar este editorial, no sentido de refletirmos sobre o panorama nacional nesta área.
Se atentarmos na evolução do nosso país de 2001 a 2010, apenas uma década, quanto à incidência dos dez tipos de cancro mais frequentes na mulher, verificamos alterações muito importantes1,2. O cancro da mama é o de maior incidência, seguido do cólon, tiroide, gástrico, corpo uterino, recto, pulmão-brônquios, linfoma não-Hodgkin, colo uterino e melanoma cutâneo.
Em 2010 o cancro da mama continuou a ser de longe o mais frequente - 31,1 % de todos os cancros, 6.541 novos casos, a que corresponde um aumento muito elevado: mais 1.967 casos que em 2001, ou seja, um aumento substancial de 43% nesse período. Verificou-se uma taxa de incidência padronizada à população europeia de 93,2/100.0001,2. Devemos ter em consideração que houve melhoria no registo de novos casos, mas o aumento verificado reflete a melhor cobertura nacional do rastreio organizado e esporádico.
Outra alteração de relevo foi o aumento do número de casos de cancro do corpo uterino com um registo de 985 casos em 2010, a que corresponde um aumento de 224 novos casos ou seja mais 29,4%. Esta localização tumoral ultrapassou em frequência o cancro do colo do útero, passando a ser o 5º cancro mais frequente na mulher, ao passo que o colo do útero passou a ocupar o 9º lugar. Naturalmente que a melhoria da cobertura do rastreio do cancro do colo teve um papel fundamental no controlo desta neoplasia e o aumento da longevidade da nossa população justifica o aumento registado quanto aos tumores localizados ao endométrio. Para o efeito basta observar a taxa de incidência padronizada deste tumor e verificamos que passou de 11,4 para 12,4/100.000, verificando-se o aumento de apenas 1 ponto. Neste número temos um trabalho sobre como avaliar o carcinoma do endométrio, no que respeita à infiltração no miométrio e metastização linfática3. A procura de meios menos invasivos para o estadiamento deste tumor (ecografia, ressonância magnética, gânglio sentinela e outros) tem sido sistemática. Discute-se, mesmo, o valor para a doente do estadiamento. Estamos longe de encontrar a necessária estabilização deste aspecto4. Temos também 2 artigos sobre colo do útero5,6. O problema do adenocarcinoma do colo é de facto um grande desafio7. É o tumor que mais escapa à citologia e aos meios de diagnóstico precoce, e que tem tido uma crescente importância relativa. Este panorama tenderá a mudar radicalmente, na medida em que há uma faixa crescente da população feminina vacinada contra os HPVs mais prevalentes na sua génese e a mudança do teste de rastreio para a pesquisa do HPV de alto risco é altamente promissora para melhorarmos o seu controlo. Este aspecto vai também tornar muito menos relevante a questão colocada no artigo sobre a citologia do colo com padrão inflamatório8.
No que respeita ao cancro do ovário, nota-se um aumento de cerca de 12% no número de novos casos, ou seja, foram registados 433 em 2001 e 484 em 2010. Deixou de estar entre os 10 mais frequentes em 2010, porque outras localizações tumorais tiveram maior incidência. A taxa de incidência padronizada manteve-se relativamente estável: 7,0/100.000 em 2001 e 6,7 em 2010.
Se avaliarmos os outros tipos de cancro específicos da mulher, verificamos que em 2010, o número de casos foi muito baixo: vulva 177, vagina 45 e placenta 8 novos casos.
Se pensarmos na nossa organização assistencial e na casuística dos hospitais onde estas doentes foram e são tratadas, temos de convir que não estamos a fazer o melhor quando tratamos de forma desarticulada tumores relativamente raros. Devíamos fazê-lo em unidades com a necessária dimensão mínima, de modo a optimizar os resultados do tratamento multidisciplinar, onde assume particular importância a diferenciação da equipa cirúrgica9. Colocaria neste grupo os cancros do colo, ovário, vulva, vagina e placenta. Curiosamente temos nesta publicação a descrição de 2 casos muito raros de tumores da vulva10,11, sempre muito interessantes.
Atendendo à profusão de casos de cancro da mama e ao aumento do carcinoma do endométrio, a oferta e diferenciação assistencial tem de aumentar nesta área com a criação de unidades vocacionadas nesse sentido. Importa aqui procurar a articulação entre especialidades e, por vezes, entre instituições, para garantir igualdade na acessibilidade às melhores práticas.
Deixando o âmbito estrito da nossa especialidade, alargando os nossos horizontes assistenciais numa perspectiva preventiva, que também nos cabe, temos de considerar que no ranking de 2010, o cancro do cólon foi o 2º em frequência, a tiroide o 3º, o gástrico o 4º, o recto o 6º, o do pulmão 7º e o melanoma cutâneo o 10º.
Estes elementos devem ser suficientes para nos interpelar, de modo a que orientemos a nossa prática preventiva e assistencial, no sentido de lhes dar respostas. Para as localizações fora do âmbito estrito da nossa especialidade - digestivo, tiroide, pulmão e pele - devemos estar alertas para os sinais clínicos e recomendações preventivas das várias localizações, de modo a indicar atempadamente estilos de vida mais saudáveis, a referenciação à outra especialidade ou a prescrição do exame complementar adequado à sua prevenção e ou diagnóstico precoce.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence
Daniel Pereira da Silva
E-mail: dpdasilva@sapo.pt