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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versão impressa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.18 no.4 Algés dez. 2024  Epub 31-Dez-2024

https://doi.org/10.69729/aogp.v18i4a10 

Letter to the Editor/Carta ao Editor

Carta ao editor - sobre a necessidade de rastreio organizado em casos de PAS

Letter to the editor - on the need for organized screening in PAS cases

Pedro Viana Pinto1 
http://orcid.org/0000-0001-8464-6594

Ana Paula Machado2 

Manuela Silva2 

Antónia Costa3 

Marina Moucho2 

1 Serviço de Ginecologia, ULS São João, Porto, Portugal; Departamento de Anatomia, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Portugal.

2 Serviço de Obstetrícia, ULS São João, Porto, Portugal

3 Serviço de Ginecologia, ULS São João, Porto, Portugal; Departamento de Ginecologia Obstetrícia e Pediatria, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto, Portugal.


Foi com muito interesse que lemos na mais recente publicação da Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa o artigo “O Perfil Clí́nico da Mulher com Risco Acrescido de Acretismo Placentar: Proposta de uma Guideline de Rastreio”1. Neste artigo é dada relevância ao acretismo placentário (de agora em diante designado PAS - Placenta Accreta Spectrum - de acordo com a nomenclatura estabelecida pela FIGO) e ao seu diagnóstico anteparto, patologia à qual nos temos dedicado, de uma forma multidisciplinar, nesta instituição em particularnos últimos anos2.

À luz da evidência atual, e de acordo com o mecanismo fisiopatológico da doença, o principal fator de risco de PAS é a cirurgia uterina, principalmente a cesariana, criadora de um defeito miometrial extenso numa zona de mais difícil cicatrização. Estes dados foram confirmados na revisão efetuada que demonstra um OR de 5.84, 95%CI [2.69; 12.67] para grávidas com 2 ou mais cesarianas1. Sabendo neste momento que a taxa de cesarianas tem vindo a aumentar paulatinamente nos hospitais públicos (de acordo com dados do PORDATA, em 2021 cerca de 37% dos partos foram por cesariana), é expectável, num futuro não muito distante, uma incidência crescente de PAS diagnosticados no nosso sistema nacional de saúde.

Atualmente, é recomendada a avaliação e tratamento destes casos em centros dedicados com uma equipa experiente e com interesse nesta patologia. Desta forma, é possível diminuir a morbimortalidade materna, obtendo estimativas de morbilidade cirúrgica composta, incluindo hemorrágica, semelhantes, em média, às de uma cesariana convencional3),(4 e, simultaneamente, reduzir a prematuridade, principal fator prognóstico adverso da morbilidade fetal5. A deteção e vigilância anteparto em centros de referência permitem atingir excelentes desfechos, mesmo em caso de atuação emergente. Assim, foi com agrado que acolhemos a sugestão de criação de um score de risco de PAS para avaliação das mulheres durante a gravidez. Embora o score seja extremamente atrativo e construído de acordo com os principais fatores de risco identificados, fica a dúvida se não incorre em alguma sobre-referenciação de casos que dificilmente terminariam em PAS, com subsequente sobre-disponibilização de recursos técnicos e humanos diferenciados, e com os custos inerentes a este tipo de cuidados num centro de referência. Somos da opinião que todas as doentes com cesariana anterior e placenta prévia devem ser avaliadas num centro dedicado, com um ecografista experiente, algo que já é realizado em múltiplos países, principalmente na Europa e Estados Unidos da América, mas também em países em desenvolvimento. São estas as doentes de maior risco que, provavelmente, apresentarão o espectro mais grave da doença, com maior possibilidade de diagnóstico anteparto e que mais beneficiarão da abordagem por uma equipa multidisciplinar6.

Em 2014, no nosso Serviço, concordando com a necessidade de prestar mais atenção a esta entidade e entendendo a importância da multidisciplinaridade para a sua orientação, desenvolvemos um protocolo de atuação no acretismo placentar, discriminando as diversas opções terapêuticas de acordo com as situações com que nos deparamos no dia a dia, as opções maternas e o caráter planeado/emergente da situação. Com a experiência crescente, a abordagem multidisciplinar, incluindo a técnica cirúrgica, tem vindo a sofrer alterações, no sentido de minimizar a invasividade e radicalidade, sem compromisso da morbilidade. A equipa multidisciplinar envolve a participação de elementos da Obstetrícia, Ginecologia Oncológica, Ginecologia, Urologia, Radiologia de Intervenção, Anestesiologia, Neonatologia com cuidados diferenciados, Imuno-hemoterapia e Unidade de Cuidados Intensivos materna. Destacamos ainda o papel da Anatomia Patológica, na avaliação de placentas/peças de histerectomia, fundamentais para garantir/validar um diagnóstico preciso e real, e discriminando as situações de deiscência miometrial das situações de acretismo.

Já em 2018 publicamos uma carta ao editor nesta mesma revista relativa à necessidade de criação de centros de referência para orientação dos casos de PAS7. Na altura escrevemos algo que assumimos se mantém ainda atual: “na eventual criação de centros de referência de acretismo placentar é fundamental a elaboração de critérios realistas e adequados de referenciação; é fundamental a existência de uma equipa multidisciplinar bem preparada e capaz de trabalhar em conjunto, disponível e pronta a atuar quando necessário; é indispensável centrar o foco no diagnóstico antenatal, promovendo um parto eletivo e em condições ideais; é, ainda, essencial definir adequadamente como reagir em situações agudas, emergentes e não suspeitadas, garantindo o melhor desfecho materno e fetal”. Infelizmente não foram ainda dados passos nesse sentido. Atualmente, e com o grau crescente de exigência na primazia da qualidade assistencial, continuamos a acreditar nesta necessidade, estando disponíveis para colaborar nesse sentido. Acreditamos que esta realidade seja inevitável, sendo que mais cedo será melhor e que mais doentes beneficiarão desta prática.

Referências bibliográficas

1. Simoes AS, Caramelo, F.; Santos Silva,I. The Clinical Profile of the Woman at Increased Risk of Placenta Accreta Spectrum Disorders: Proposal of a Practical Screening Guideline. Acta Obstet Ginecol Port 2024;18(3):214-22. [ Links ]

2. Teixeira B, Pinto PV, Realista R, Silva M, Costa A, Machado AP, et al. Placenta Accreta Spectrum Disorders - The Impact of the Creation of a Multidisciplinary Team on Maternal Outcomes in Portugal. Rev Bras Ginecol Obstet 2023 Dec;45(12):e747-e53. [ Links ]

3. Soleymani Majd H, Collins SL, Addley S, Weeks E, Chakravarti S, Halder S, et al. The modified radical peripartum cesarean hysterectomy (Soleymani-Alazzam-Collins technique): a systematic, safe procedure for the management of severe placenta accreta spectrum. Am J Obstet Gynecol 2021 Aug;225(2):175 e1- e10. [ Links ]

4. Palacios-Jaraquemada JM, Fiorillo A, Hamer J, Martinez M, Bruno C. Placenta accreta spectrum: a hysterectomy can be prevented in almost 80% of cases using a resective-reconstructive technique. J Matern Fetal Neonatal Med 2022 Jan;35(2):275-82. [ Links ]

5. Viana Pinto P, Kawka-Paciorkowska K, Morlando M, Huras H, Kolak M, Bertholdt C, et al. Prevalence of fetal anomalies, stillbirth, neonatal morbidity, or mortality in pregnancies complicated by placenta accreta spectrum disorders. Acta Obstet Gynecol Scand 2024 Jul 14. [ Links ]

6. Shamshirsaz AA, Fox KA, Salmanian B, Diaz-Arrastia CR, Lee W, Baker BW, et al. Maternal morbidity in patients with morbidly adherent placenta treated with and without a standardized multi-disciplinary approach. Am J Obstet Gynecol 2015 Feb;212(2):218 e1-9. [ Links ]

7. Viana Pinto P, Machado AP; Montenegro, N. Placenta accreta - about the need for a reference center. Acta Obstet Ginecol Port 2018;12(3):238-9. [ Links ]

Recebido: 01 de Novembro de 2024; Aceito: 08 de Novembro de 2024

Endereço para correspondência Pedro Viana Pinto E-mail: pedrovianapinto@gmail.com

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