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Observatorio (OBS*)
versão On-line ISSN 1646-5954
OBS* vol.11 no.1 Lisboa mar. 2017
A comparação da identidade dos jornalistas online em suas relações com os públicos no Brasil e na França
Florence Le Cam*, Fábio Henrique Pereira**
* PhD, professor, Chair of Journalism, Department of Information and Communication Sciences, Université Libre de Bruxelles (Brussels), Belgium (flecam@ulb.ac.be)
** PhD, professor, Department of Journalism, University of Brasilia, Brazil (fabiop@gmail.com)
RESUMO
O artigo analisa as interações entre jornalistas e públicos de redações on-line no Brasil e na França. Discute as novas modalidades de participação das audiências no jornalismo. Nesse sentido, busca-se entender as possíveis mudanças nessa relação, mas também o papel dos contextos nacionais na estruturação das práticas de jornalistas e públicos nos dois países. Esta pesquisa comparativa e qualitativa utilizou entrevistas em profundidade com dez jornalistas brasileiros e dez franceses a partir de um roteiro padrão. Os resultados revelaram similitudes na forma como os jornalistas enunciaram suas interações com os públicos dos dois países: as representações são geralmente estereotipadas e as audiências são apreendidas a partir de uma visão quantitativa. Essas constatações se juntam a outros estudos sobre o tema e que relativizam a capacidade de integração dos leitores nas redações on-line. Do ponto de vista dos estudos comparativos, elas permitem reforçar a nossa hipótese de uma identidade transnacional dos jornalista on-line, baseadas sobretudo na circulação de discursos estruturantes em relação a essas prática.
Palavras-chave: jornalistas on-line, públicos, identidade, entrevistas, estudos comparativos.
ABSTRACT
This paper analyses the interactions between journalists and the public in Brazilian and French online newsrooms. It discusses the new modalities of audience participation in journalism. Thus, it aims to understand the possible changes in this relation. The role of national contexts on structuring the practices of journalism and the public is also considered. This comparative and qualitative research is focused on in-depth interviews with ten journalists from each country and used a common guide. The results reveal resemblances on how journalists enunciate their interactions with public from both countries: their representations are stereotyped and audiences are perceived through a quantitative bias. These findings reinforce other studies that minimize the ability of online newsrooms to integrate the public. From the viewpoint of comparative studies, our hypothesis of a transnational identity of online journalists is strengthened. This hypothesis is mainly based on the circulation of structured discourses related to this practice.
Keywords : online journalists, public, identity, interviews, comparative studies.
Introdução
Este artigo analisa as interações entre jornalistas e públicos de redações on-line no Brasil e na França. O objetivo é investigar as representações que os jornalistas fazem dos públicos e como eles lidam com os mecanismos de gestão das interações com esses atores. Este trabalho centra seu foco nos discursos sobre as práticas e identidades do jornalismo on-line, particularmente na forma como eles engendram modalidades de regulação das relações com os públicos, ao mesmo tempo em que permitem aos jornalistas reposicionarem suas identidades em função dos contextos socio-históricos (Ruellan, 2011).
Trata-se ainda de um estudo com ambições de comparação transnacional entre dois países que constituíram sistemas midiáticos diferentes e, sobretudo, onde se observam processos distintos de profissionalização dos jornalistas (Le Cam e Ruellan, 2004). Por isso, o artigo trabalha simultaneamente duas dimensões: as representações sobre o público e as similitudes e diferenças observadas nos discursos dos jornalistas franceses e brasileiros. Para isso, serão analisadas 20 entrevistas feitas com webjornalistas, dez de cada país. A amostragem não tem perfil estatístico, mas obedece critérios de representatividade social (Fígaro, 2013). Ela parte da escolha de conjunto de perfis equivalentes nos dois países (como um espelho) de forma a dar conta da diversidade do grupo profissional em termos de gênero, idade, estatuto, tipo de mídia, abrangência. A escolha desses entrevistados, feita em comum acordo entre os autores deste artigo, buscou trabalhar com um conjunto de equivalências que permitissem promover uma comparação.
Nossa proposta toma como ponto de partida o contexto de discussão sobre as possíveis transformações das formas de participação do leitor a partir da introdução da mídias digitais. Vários discursos – oriundos de espaços acadêmicos, profissionais e empresariais – tendem a ressaltar práticas de colaboração dos públicos no jornalismo, por meio de comentários, do contato com a redação ou de coprodução de conteúdo1. Embora não se trate de um fenômeno necessariamente recente2, a ideia da participação do público no jornalismo (particularmente com internet) tem sido tomada como ponto de partida para discutir mudanças ou adaptações da identidade do jornalista e na forma como ele se posiciona face ao seu leitor. Esses estudos apontam tanto para cenários mais conservadores de reafirmação do estatuto profissional e de manutenção das rotinas jornalísticas como situações de readequação dessa prática, de mudanças na autopercepção dos papeis e da ideologia profissional dos jornalistas (Cf. Aubert, 2009; Calabrese, 2014; Pereira e Freitas, 2012, entre outros). Esta constatação sugere, portanto, uma espécie de dualidade na forma como a relação entre jornalistas e públicos é reconstruída discursivamente e que remete à metáfora de Robinson (2010) sobre os “Tradicionalistas”, “aqueles que querem manter um relacionamento hierárquico entre jornalistas e audiências” e os “Convergentes”, “aqueles que acreditam que os usuários deveriam ter mais liberdade em relação aos sites noticiosos3” (p. 126). Assim, um caminho a ser explorado neste artigo consiste justamente em descrever e explicar os contextos em que essas duas posições emergem no interior das redações investigadas.
Apesar da profusão de estudos sobre a participação da audiência no jornalismo on-line, poucos trabalhos situam esses debates a partir de uma perspectiva comparativa (excessão feita aos trabalhos de: Boczkowski, Mitchelstein, Walter, 2011; Domingo et. al., 2008). Por isso, entender a forma como os jornalistas on-line representam os públicos no Brasil e na França pode ser revelador do processo de gestão da identidade profissional dos jornalistas nesses países, na forma como eles buscariam estabelecer modalidades específicas (ou não) de se posicionarem frente aos públicos. Ao mesmo tempo, a revisão da bibliografia internacional sobre o jornalismo on-line parece apontar para uma relativa estandardização dos discursos identitários e que assumem uma dimensão quase normativa a estruturante em relação à representação do perfil do webjornalista no mundo. Tais discursos reforçariam aspectos transnacionais dessa prática, como a produção multimídia e multitarefas, a sedentarização da produção, a convergência nas redações, a introdução das redes sociais e de outras ferramentas de interação com os públicos no jornalismo.
Essas constatações servem como ponto de partida para este trabalho de comparação, centrado na forma como processo de gestão das relações com os públicos é simultaneamente condicionado por duas modalidades de discursos: aqueles relacionadas à constituição do profissionalismo jornalístico nos diferentes espaços nacionais e a forma como ele define as relações com outros atores (particularmente os leitores); e o modo como os discursos transnacionais sobre o jornalismo on-line buscam promover uma valorização da participação das audiências na prática jornalística.
Esta comparação trabalha com dois casos prototípicos (“protypical cases”) (Hirschl, 2005) em que a escolha dos objetos serve como ponto de partida para discutir uma explicação de ordem mais geral: o papel do discurso na construção das representações sobre as práticas e as identidades profissionais do jornalismo – hipótese já explorada por Le Cam em diferentes ocasiões (Le Cam, 2009; 2012; 2013). Três ordens de questão parecem emergir dessa proposta de análise: Como os públicos são representados pelos jornalistas on-line dos dois países? Como esses jornalistas se posicionam frente as modalidades de interação com os públicos no Brasil e na França? Que discursos identitários emergem dessas relações E como eles se relacionam com os contextos nacionais/internacionais sobre o jornalismo on-line?
Para discutir esse conjunto de questões, o texto está estruturado em quatro partes. Na revisão de conceitos, vamos priorizar discussões sobre comparação em jornalismo e uma breve descrição dos dois contextos nacionais analisados. Em seguida, serão apresentadas a metodologia e a análise das relações entre jornalistas on-line e públicos no Brasil e na França. A partir dos resultados da pesquisa, serão propostas algumas explicações sobre as semelhanças e diferenças observadas nas entrevistas com os jornalistas dos dois países.
Comparação e jornalismo
A proposta do artigo se ancora nas possibilidades abertas pela comparação das práticas de jornalismo on-line no Brasil e na França. Nossa escolha implica na necessidade de se considerar os contextos históricos e as especificidades locais no que se refere à reconstituição dos sistemas midiáticos e os contextos socioeconômicos e políticos que serão comparados. Contextualizar não significa apenas descrever um cenário nacional, mas levar em consideração as especificidades desses contextos na própria definição das categorias de análise utilizadas e que, como explica Reese (2008), não são necessariamente autoevidentes em diferentes países.
De modo geral, os estudos comparativos sobre o jornalismo têm como ponto de partida uma abordagem dedutiva em que um conjunto de variáveis a serem comparadas são derivadas de uma leitura estrutural dos sistemas midiáticos nacionais. É o que propõem, por exemplo, as pesquisas que se utilizam do trabalho seminal de Hallin e Mancini (2004; e depois 2011), Comparing media systems e que “buscam identificar as variações de larga escala que se desenvolveram nas democracias Ocidentais em termos e de estrutura e papel política para a mídia de informação, e explorar algumas ideias sobre como levar em consideração essas variações e pensar sobre suas consequências para a democracia política4” (2004, p.1). Para se distanciar de uma abordagem etnocêntrica sobre o tema, os autores vão se interessar pelas interações entre os diferentes fenômenos sociais que servem como base para os sistemas midiáticos de espaços geográficos distintos e “como eles estão estrutural e historicamente ligados ao desenvolvimento do sistema político5” (2004, p.5). O foco da análise, nesse sentido, são as relações específicas que a mídia estabelece com o sistema político e que permite distinguir, mas também aprofundar, as particularidades e similitudes das configurações midiáticas nacionais. Essa ambição sistêmica, bastante pertinente para pesquisas que tratam das especificidades nacionais, parece menos apropriada para este estudo, na medida em que buscamos entender as relações que emergem na pesquisa de campo entre as imagens e as práticas dos jornalistas on-line que integram a nossa amostra.
O contexto nacional, sua dimensão política, econômica e cultural continua sendo fundamental para qualquer tipo de abordagem comparativa, sobretudo no caso de países (como o Brasil e a França) que a princípio pertenceriam a sistemas midiáticos completamente distintos. Contudo, não buscamos aqui comparar sistemas midiáticos, mas as representações identitárias que emergem nos discursos dos jornalistas brasileiros e franceses ao referência às suas relações com os públicos. Nesse caso, o nível de análise não é o mesmo e nos pautamos aqui pela observação feita por T. Hanitzsch (2008): “O que é tratado como similaridade em um nível de análise pode revelar uma miríade de diferenças em níveis mais minuciosos de análise6” (2008, p. 96). Ou seja, o nível da nação não é a unidade de análise de nossa pesquisa, trabalhamos aqui com a unidade conceitual da identidade profissional.
Além disso, da mesma forma que este estudo não se utiliza da abordagem de Hallin e Mancini, ele também não compartilha dos pressupostos de outros estudos internacionais sobre jornalismo e que reforçam uma abordagem normativa da profissão, baseada sobretudo no contexto norte-americano. Essas investigações, de modo geral, questionam jornalistas de vários países em relação ao nível de profissionalismo (Cf. McLeod e Hawley, 1964), os conteúdos que eles produzem, o papel que eles pensem desempenhar, suas considerações éticas (Hanitzsch et al, 2011), a sua relação com a objetividade (Skovsgaard et al, 2012). Como explica Örnebring (2012), vários estudos comparativos dessa tradição centrados no nível individual de análise consistem geralmente na réplica em diferentes países de uma enquête originalmente desenvolvida em um contexto nacional específico, geralmente em países do Norte. Por conta disso, os estudos comparativos internacionais dos últimos anos permitiram a coleta de uma massa considerável de dados, mas que expressam uma tendência ao universalismo teórico e metodológico ao produzirem “quantificações descontextualizadas” (Livingstone, 2003, p.482).
Em contraposição a essas tradições, adotamos aqui a proposta de Josephi (2009) que sugere a necessidade de pesquisas qualitativas de pretensão comparativa7. Por outro lado, buscamos evitar uma postura excessivamente relativista – e que vai buscar nos contextos nacionais e nas especificidades do objeto empírico a explicação para os resultados encontrados. Na verdade, essas especificidades, ilustradas pelas dinâmicas microssociológicas implícitas nas trajetórias e nas interações cotidianas empreendidas pelos jornalistas, devem ser confrontadas com explicações de ordem “estrutural”, como a própria compreensão dos processos de circulação de discursos transnacionais sobre o jornalismo on-line e de (re)configuração de sistemas midiáticos nacionais nas últimas décadas. A aplicação dessa proposta de análise se operacionaliza por meio de uma perspectiva indutiva que busca, a partir da análise de entrevistas biográficas, compreender os sentidos atribuídos pelos atores às suas identidade e práticas (e como elas se situam em contextos nacionais e transnacionais de produção jornalística/midiática). A comparação e a confrontação desses sentidos e das representações identitárias que eles engendram nos permite, em seguida, produzir uma reinterpretação do quadro das relações entre jornalistas e públicos no Brasil e na França.
Tais procedimentos de análise serão precedidos por uma breve apresentação dos contextos midiáticos nacionais e do o perfil dos do jornalismo on-line nos dois países, tema da próxima seção.
Os contextos nacionais
A paisagem midiática
Esquematicamente, a organização da paisagem midiática do jornalismo on-line é relativamente similar no Brasil e na França. Ela se caracteriza pela presença de dois grupos de atores: os veículos de comunicação tradicional (impressos e audiovisuais) que criaram novas operações para atuar na internet e os sites exclusivamente on-line (também denominados pure players no caso francês). É preciso ressaltar que essa divisão, utilizada para fins de contextualização nacional, não dá conta da diversidade das estratégias adotadas por esses veículos e o modo como sua inserção no mercado do jornalismo on-line tem se consolidado no Brasil e na França.
Nos dois países, a criação de sites e portais é vista pela mídia como uma oportunidade de inserção do grupo em um mercado considerado “estratégico” (Possebon, 2002; Gestin et al, 2009) – mesmo que a gestão do jornal on-line seja deficitária no início. Essa percepção evolui, mais tarde, para um discurso de “sobrevivência” das empresas de comunicação por conta da queda do número de leitores e pela necessidade de se manter no mercado em meio às mudanças tecnológicas (Basile, 2009; Muller, 2011). Assim, apesar das consideráveis dificuldades financeiras enfrentadas pelo setor de mídia, as empresas de comunicação dos dois países continuam a desenvolver estratégias para o meio on-line. Alguns jornais tradicionais (France Soir, Jornal do Brasil) migraram totalmente para esse meio. Vários conglomerados desenvolveram modalidades de produção multissuporte ao mesmo tempo em que buscaram novas formas de financiamento das operações na web (publicidade, conteúdo aberto, conteúdo parcialmente aberto, conteúdo pago). Também criaram projetos de integração dos sites à estrutura da empresa: como serviços autônomos ou por meio das diferentes modalidades de redação convergente ou multimídia. De fato, apesar do contexto de crise, as organizações de mídia continuam ativas nos dois países, criando estratégias de publicação para dispositivos móveis, como tablets, smartphones, e-papers…
A internet deu origem, nos dois países, a novas redações pure players. Tais atores conhecem conheceram um sucesso rápido na França graças a duas iniciativas: Rue 89 e Médiapart. Os dois novos sites se estabelecem a partir da colaboração entre jornalistas e cidadãos, ao mesmo tempo em que se ancoraram em uma visão “profissional” do jornalismo – sobretudo no que diz respeito ao tratamento da informação e à investigação. Ao revelarem escândalos, furos, os dois sites vão rapidamente atribuir uma “carta de nobreza” a um tipo de jornalismo on-line dito independente (dos grandes conglomerados midiáticos). Eles estarariam na linha de frente em defesa da criação de um estatuto específico para os “editores da imprensa on-line”. Esse reconhecimento estatutário permitiu, nesse caso, que os sites se beneficiassem da ajuda que o Estado francês concede à imprensa (Charon e Le Floch, 2011). No caso brasileiro, fora algumas experiências de pequenos sites locais/regionais, os principais veículos pure players se enquadram na categoria de portais de conteúdo misto, operados principalmente por empresas de telefonia – cujo serviço tornou-se privado no Brasil a partir de 1998. Para essas empresas, o fornecimento de conteúdo jornalístico é visto como um atrativo para atrair consumidores para as demais operações do grupo e que são efetivamente rentáveis, como os serviços de telefonia, acesso à internet banda larga e de TV por assinatura.
Quem são esses jornalistas?
Desconhecemos a existência de um estudo qualitativo nacional sobre o perfil dos webjornalistas brasileiros. Partindo de estudos de caso de caráter etnográficos em redações on-line, produzidos em períodos distintos (Cf. Adghirni, 2002; Pereira, 2004; Jorge, 2007; Maia & Agnez, 2015) podemos inferir que o jornalismo na internet é produzido a partir de estruturas pequenas, composta por repórteres e subeditores jovens e chefiadas por jornalistas mais velhos, oriundos de redações tradicionais. Essas constatações são reforçadas pelos dados quantitativos da pesquisa Perfil do Jornalista Brasileiro (Mick e Lima, 2013) e extraficados para o setor do jornalismo on-line8. O estudo mostra que pouco mais de 63% dos respondentes têm menos de trinta anos, 28% possui mais de um emprego e pouco mais da metade trabalha mais de oito horas por dia (o que seriam indicativos da juvenização e da precarização desse estatuto). Do ponto de vista da formação, 91,5% estudaram jornalismo.
A situação é relativamente idêntica na França. Os primeiros jornalistas começaram a atuar ainda em 1995 em sites ligados à mídia tradicional e tornaram-se os atuais diretores de redação dos veículos on-line. Atualmente, o perfil dos jornalistas contratados nas redações parisienses são bastante similares. A maioria possui formação em jornalismo e terminou recentemente os estudos. Os jornalistas contratados tiveram, em sua grande maioria, experiências, pré-profissionais (em jornais universitários, estágios e programas de trainee, cargos de correspondentes locais na imprensa francesa e contratos de qualificação ou de alternância9), bem como um conhecimento teórico avançado sobre as princípios e técnicas básicas do jornalismo (como o trabalho de edição). Poucos deles tiveram formação específica em jornalismo on-line. A maior parte dos entrevistados franceses já atuou como repórter em sites da mídia regional, ligados a jornais impressos, rádio ou televisão.
No que se refere à produção, praticamente todos os sites ligados a mídias tradicionais desenvolveram iniciativas de clonagem de conteúdos, de distribuição multiplataformas ou de integração de redações. A alimentação dos sites nos dois países, nesse caso, é geralmente feita por jornalistas “sentados”, que reescrevem os despachos das agências de notícia, assegurando o fluxo de informações e o fornecimento de notícias em tempo real (Pereira, 2004; Dagiral & Parasie, 2010). O cenário é diferente no caso dos pure players, que buscaram constituir equipes próprias para a produção do noticiário on-line, tanto na França como no Brasil. No caso da França, os jornalistas que trabalham em alguns veículos pure players, como Mediapart ou Rue89, praticam ainda o jornalismo investigativo e sobretudo a prática de apuração. A ideia é afirmar uma identidade editorial distinta das redações on-line vinculadas à mídia tradicional (Canu & Datchary, 2010; Aubert, 2009).
Assim, o trabalho dos webjornalistas nos dois países costuma ser associado a discussões mais gerais sobre o processo de precariazação no jornalismo e que descrevem situações de aumento das jornadas de trabalho – as “rotinas infernais”, descritas por Adghirni (2002) –, aumento das competências exigidas dos profissionais, baixos salários, juvenização das redações etc. A intensificação desse debate por volta de 2009-2010 não revela uma situação nova no âmbito dos discursos profissionais, mas uma espécie de sequência (no sentido foucaultiano) (Cf. Le Cam, 2014) de discursos sobre a emergência, estruturação e garantia de visibilidade de um novo estatuto de jornalista: o jornalismo on-line, o webjornalismo ou ainda o jornalismo multimídia (Jorge & Pereira, 2009; Pereira, 2004; Ruellan, 1998)10.
Metodologia
O estudo adota um desenho metodológico qualitatiyo e comparativo. Segundo Hirschl (2005, p.126), esse tipo de abordagem “visa a geração de ‘thick concepts’ e de ferramentas de reflexão por meio de descrições multifacetadas11”. Dessa forma, “a construção de conceito por meio de descrições múltiplas é a abordagem metodológica na qual esse tipo de estudo comparativo adere com frequência12” (Hirschl, 2005, p. 129). Ela busca, num segundo momento, integrar os “estudos que se baseiam em princípios de seleção dos casos em comparação controlada e de inferência orientanda, com o objetivo de avaliar mudanças, explicar dinâmicas, e produzir inferências sobre causa e efeito por meio da seleção sistemática de casos e a análise dos dados13” (Hirschl, 2005, p.126).
Nossa análise se focalizou, em um primeiro momento, nas similitudes e diferenças na forma como os jornalistas enunciaram suas relações com o público. Nesse sentido, esta pesquisa buscou cruzar dois níveis de análise comparativa: o do indivíduo e o da organização (Örnebring, 2012), visando fazer emergir, no âmbito de uma abordagem indutiva, um conjunto de temáticas capazes de originar conceitos. Mas ela não faz uma análise estrita dos indicadores de trabalho, das práticas jornalísticas em seu contexto de trabalho ou do contexto organizacional do jornalismo on-line. Trata-se, na verdade do cruzamento de discursos gerados por meio de entrevistas qualitativas. Esse procedimento revela uma polifonia discursiva tanto em termos das diferenças na construção das relações com o público, como nas similitudes.
Além disso, esta abordagem busca propor elementos de reflexão sobre as explicações possíveis para os fenômenos observados, particularmente as congruências ou não entre discursos. Por isso, a ambição deste estudo comparativo sobre os jornalistas on-line de dois países não pode se limitar a uma descrição – por mais precisa e detalhada que ela seja – do que foi enunciado pelos sujeitos respondentes. Comparar os jornalistas no Brasil e na França consistiu em uma escolha que deveria permitir, inicialmente, realizamos uma análise de casos extremamente diferentes do ponto de vista político, econômico, cultural e social. Ora, os primeiros trabalhos sobre a evolução do mercado do jornalismo on-line e realização das entrevistas tiveram o efeito de atenuar a percepção em torno dessas diferenças iniciais. A solução metodológica adotada foi a de transpor as similitudes observada no que se refere aos mercados laborais nacionais ao nosso campo de pesquisa. Primeiro, na escolha de dois espaços geográficos mais ou menos equivalentes: as capitais nacionais. Segundo, na seleção de um conjunto de entrevistados nos dois países que tivessem características profissionais e sociodemográficas equivalentes. A partir desses elementos comparáveis do ponto de vista individual e organizacional avançamos na confrontação de um certo número de discursos tendo como base um problema de pesquisa comum: questionar a forma como os jornalistas buscaramm ressentir, construir ou se distanciar dos seus públicos. Essa temática, reconstruída por meio da leitura das entrevistas, permitiu vincular na análise dinâmicas organizacionais, as representações das práticas, das identidades e das relações dos jornalistas com os públicos nos dois países.
Constituição do campo e procedimentos de análise
Para a realização da pesquisa, realizamos entrevistas semiestruturadas com 20 jornalistas (dez de cada país) a partir de um roteiro padrão. Foram entrevistados webjornalistas em Brasília e Paris nos anos de 2011 e 2012. A escolha dos entrevistados buscou dar conta dos seguintes critérios de representatividade: tipo veículo (nacional ou regional; generalista ou especializado, pure player ou ligado a um grupo tradicional), cargo ou função desempenhada pelo respondente (estagiário, repórter, editor de área/subedidor, editor), gênero e idade do jornalista (Ver Anexo 01).
As entrevistas foram feitas com base em uma abordagem compreensiva da pesquisa em que buscamos a geração de uma narrativa biográfica pelos respondentes. O objetivo não era ilustrar hipóteses pré-estabelecidas, mas buscar significações originárias dos próprios entrevistados. Os respondentes, é claro, pertencem a contextos nacionais distintos, a histórias coletivas particulares, são fruto de trajetórias individuais que se distinguem entre si. E as formas narrativas analisadas aqui são também “ilusões retrospectivas” por meio das quais os respondentes reconstroem o que viveram, ou a forma como gostariam de recontar suas próprias histórias. Tais narrativas são ainda traços de histórias coletivas e, ao mesmo tempo, a construção de uma singularidade individual (Dubar, 2001). É a partir dessa dualidade – e, é claro, imersos no âmago dessa dificuldade metodológica – que realizamos uma comparação binacional sobre as relações entre as representações do público e os discursos sobre a identidade no jornalismo on-line.
A gestão das relações com os públicos e os discursos identitários
As operações de construção da amostragem buscaram, de certa forma, “controlar” as condições de enunciação dos discursos sobre o jornalismo on-line e os públicos, produzindo duas amostras “espelhadas” nos níveis dos perfis individuais e dos pertencimentos organizacionais. Essa construção nos permitiu explorar as semelhanças e diferenças encontradas tanto nas representações dos públicos como nas modalidades de gestão dessas relações observadas nos discursos dos jornalistas. Essas duas categorias foram geradas indutivamente a partir da confrontação dos narrativas dos entrevistados. Uma terceira camada de análise emerge quando tentamos situar esses resultados na relação entre os processo nacionais de construção da profissão e de circulação transnacional dos discursos sobre o jornalismo on-line.
As representações do público
Desconhecimento e estereótipos
Como explica Ruellan (2006), “o público, de algum modo, não existe: é plural, assim como são múltiplos os objetos a partir dos quais se pretende alcançá-lo (neste caso, os produtos midiáticos), além de multiformes (os leitores de um jornal não constituem uma unidade, mas um agregado do qual é difícil extrair regularidades)” (p. 35). Por isso, em seu dia a dia, os jornalistas negociam suas identidades e práticas a partir de tipificações que fazem do leitor. Essas representações da audiência permitem que os webjornalistas fundamentem suas decisões a partir do que imaginam ser as expectativas da audiência e os desdobramentos que a relação com o público pode adquirir (Gadini, 2007)
A análise comparativa mostra que os jornalistas franceses e brasileiros possuem uma representação bastante aproximativa do público. “Talvez por falta de estudo do que o leitor gosta e do que o leitor não gosta. Só que quem é o leitor? Hoje em dia fica difícil homogeneizar as pessoas” (B10). Eles não o conhecem de fato e repercutem falas generalistas como: “Os nossos internautas fazem parte dos grupos socioprofissionais mais favorecidos14” (F1, F4), e foram vários a mencionar os seus internautas se referindo a eles como o “grande público” (F6, F7, F9; B1, B5). Esse public cher inconnu ! (Méadel, 2004) ou ilustre desconhecido (Baesse, 2004) ainda é realidade nas redações on-line parisienses e brasilienses. A escolha da informação se faz frequentemente em função do que o jornalista pensa, individualmente, sobre quais assuntos seriam de interesse dos internautas (B1, B5, B7; F6). Também parece haver uma forma de tipificação recorrente nos depoimentos dos entrevistados: a ideia de um “o leitor típico de internet”, que diferente das outras mídias, seria “desterritorializado” (B1, B9) e se interessaria por uma informação mais curta e factual (B5, B8).
No caso do Brasil, muitas vezes esse estereótipo é construído pelo jornalista em consonância com a linha editorial do jornal ou do segmento do público a qual o veículo ou a editoria se dirige prioritariamente. Em vários momentos, os jornalistas justificaram certas formas de cobrir ou narrar determinados temas fazendo referência a um público composto por “pessoas da classe C” (B1), “servidores públicos” (B2), “operadores do mercado financeiro” (B6, B9), “professores, estudantes e diretores de escola” (B7), “o público jovem” (B7, B8), os “jovens universitários” (B10). Em alguns casos, a noção do leitor de um site é construída em oposição à do concorrente (B1). Essa visão parece se apoiar na reprodução pelo jornalista do discurso das empresas, apoiado, em alguns casos, nas pesquisas de audiência ou na própria imagem que as organizações constroem sobre si mesmas (como um veículo “jovem”, “conservador”, etc.). Um trecho do depoimento da entrevistada B9 ilustra bem esse tipo de percepção :
”O repórter do [jornal] O Globo escreve para a classe média do Rio de Janeiro. A pessoa que escreve para o Extra escreve para a classe baixa do Rio de Janeiro. Folha de São Paulo e Estado de São Paulo, cada um tem o seu público. [Em] Brasília, o Correio Brasiliense escreve para o serviço público federal e para o serviço público do Distrito Federal. Entendeu? É um publico X”.
Parece que o jornalista escreve mais para os seus colegas ou para seguir os conselhos e orientações dos superiores hierárquicos. Por isso, seguir ou antecipar as expectativas do público não é prioridade. Em outro registro, um respondente francês chega a aprovar a participação das audiências na produção midiática, bem como o aprofundamento da relação entre o jornalista e o seu público. Mas, ao final, ele prefere fazer referência a outras prática de outros jornalistas e não às suas, invocando exemplos conhecidos no meio, sem aplicá-los a si próprio:
”É também o fato de que o jornalista se apoia em seu público leitor, nos internautas, para buscar a informação. Por exemplo, existem sites que fazem mapas participativos sobre esse tipo de coisa, sobre uma rua bloqueada por conta da neve. Nesses casos, é a vida cotidiana das pessoas e são as pessoas que informam sobre o que passa nesse tipo de lugar [...]. Eu acho isso muito interessante [...]. Penso que, de qualquer forma, a gente é obrigado, se quer que o jornalismo sobreviva, a se associar ao leitor. Até porque o jornalismo conserva o seu papel que é o de verificar a informação, de transmiti-la, mas, para encontrar as informações, ele não pode fazer isso sozinho, isso é claro!” (F8).
A visão quantitativa
A maioria dos sites franceses e brasileiros desenvolveram formas de conhecer o título dos artigos mais lidos, o que encorajaria uma visão quantitativa da produção jornalística na internet (B2, B3, B7; F5, F7). Também disponibilizam ferramentas que relatam, em tempo real, os hábitos dos internautas, seus locais de origem, o tempo de consulta, sua navegação, ou mesmo o sexo, idade, profissão dos usuários, se são assinantes ou registrados no site, etc. Alguns jornalistas levam a sério esses números (B7; F1, F5) e reconhecem que organizam o trabalho da redação em função dos horários em que as matérias são consultadas e os assuntos mais lidos como forma de satisfazer o público potencial.
Contudo, várias representações contraditórias sobre o público estão presentes nos discursos dos entrevistados. Um jornalista francês que trabalhava em 2011 para uma rádio nacional se lembra de suas experiências em sites pure-players e fez as seguintes considerações sobre o uso de pesquisas de audiência: “Em uma mídia pure-player, nós brigamos pelos números porque sabemos que isso é importante, em uma mídia já estabelecida isso não é importante” (F5). As entrevistas de outros respondentes em Paris mostram que esse argumento não é necessariamente correto, mas o jornalista emprega-o como parte de uma estratégia de distinção entre diferentes modelos de sites.
Por outro lado, alguns jornalistas empregados em sites de mídias tradicionais questionam o fato de os números de acesso não serem divulgados na redação. “Nós, jornalistas, pedimos constantemente para ter acesso às estatísticas e eles [os gestores] não querem divulgá-los por uma razão obscura” (F9). De certa forma, isso permitiria que os responsáveis pelas redações pudessem orientar as práticas dos jornalistas em função de critérios de satisfação do público, a partir da avaliação que é feita dos produtos jornalísticos, mas sem ter a necessidade de dar provas disso (uma prática semelhante foi mencionada, por B1, no Brasil, ao fazer referência às exigências das chefias para que os repórteres agreguassem galerias de fotos a algumas reportagens, sob a alegação de que o público gosta desse tipo de produto).
Essa relação de controle por meio dos dados de audiência reaparece nas entrevistas com os brasileiros. Os três entrevistados que fizeram referência a esse tipo de prática (B2, B3, B7) afirmaram ter algums conhecimento sobre os dados de acesso ao site. Nos sites investigados, incluindo os pure players (B7, B8), os dados de acessos às matérias publicadas ainda não foram integrados aos mecanismos formais de progressão na carreira ou de avaliação de um jornalista pela chefia mas, aos poucos, têm sido incorporados a decisões tomadas dentro das redações. É o caso de um trecho da entrevista com B3. Ela relata que certas pautas, como política local, nem sempre são cobertas pelo veículo porque, na visão da chefia, são consideradas “matérias zero leitura”.
Essa visão quantitativa é, finalmente, justificada em certos discursos na França, pela necessidade de se adaptar às normas de referenciamento do Google (F5). Nesse caso, o motor de buscas tem se tornado o mediador entre o jornalista e o seu público, favorecendo, assim, o acesso de um pelo outro.
A gestão das interações com os públicos
As redes sociais
A oportunidade oferecida pelas redes sociais nem sempre é apresentada pelos entrevistados como uma modalidade de interação com os internautas (com excessão dos discursos de F8 e B7). Nos dois países, ela é, na verdade, concebida como um espaço de socialização e de sociabilidade profissional entre os jornalistas. Ou ainda de ampliação do público potencial de determinadas notícias. A utilização do Twitter, para alguns jornalistas franceses entrevistados em 2011, é, antes de tudo, uma forma de personal branding:
”É um pouco o princípio da marca. Se a gente compra aquela marca, é porque vimos a publicidade e ela nos diz alguma coisa. De alguma forma, nós nos garantimos, simples assim. Por isso, o fato estar no Twiter, de falar com as pessoas, de criar laços, e de as pessoas verem vocês desfilar na timeline, de certa forma te dá alguma familiaridade com elas... Você não é aquela pessoa que sai do nada, então é realmente o princípio da marca de publicidade, e o que eu digo não é muito glorioso” (F7).
Do lado brasileiro, B1 conta que utiliza o Twitter com frequência para difundir junto aos leitores e aos colegas jornalistas matérias de sua autoria, publicadas no site. Nesse caso, a estratégia de construção de sua reputação no meio profissional via redes sociais é mensurada não pelo networking da jornalista, mas pelo número de vezes que uma matéria é retuitada ou pelo fato de estar bem indexada nos motores de busca.
Para além dessas considerações - que remetem à própria estruturação das carreiras jornalísticas nos dois países (Le Cam & Pereira, 2015) - certos jovens jornalistas franceses desenvolvem um discurso bastante ideológico sobre o públicos e as redes sociais. Eles retomam, por conta própria, o discurso eufórico sobre a democratização da circulação da informação graças à web. Assim, as redes sociais dariam novamente “humanidade à troca de informação”, elas constroem e dão vida às comunidades ao redor dos jornalistas, percepção de F8. Esse tipo de discurso aparece de forma mais difusa nos depoimentos dos jornalistas brasileiros (sobretudo em B7), que se atêm muito pouco à descrição dos impactos das redes sociais no jornalismo.
Community management e editorias de mídia social
Nas redações dos dois países, as interações do público deram origem a adaptações na estrutura organizacional. Assim, no figaro.fr ou no Europe1.fr, foi introduzido um serviço de community management. No caso brasileiro, o cargo de editor de mídias sociais foi criado em vários veículos a partir em 2010, embora não tenha sido mencionado nas entrevistas que fizemos com os jornalistas. Ao justificar a criação do serviço, o quotidiano nacional Folha de S. Paulo, por exemplo, se apoiou em “pesquisas” que “indicam que os usuários vêm utilizando cada vez mais os sites de relacionamento também como fonte de notícias para desenvolver uma estratégia nova na área”. Além disso, o jornal teria se baseado nas “iniciativas pioneiras em implantação na imprensa internacional, em especial nos EUA e no Reino Unido15”.
No Brasil e na França, os serviços de community management foram criados para gerir os comentários dos internautas e encorajar a participação do público em todos os espaços destinados a esse tipo de interação, por meio de sondagens ou pela participação em um blog. A responsável por esse serviço no figaro.fr sempre participa da reunião da pauta dos jornalistas on-line. Ela extrai dali elementos da atualidade que servem em seguida para dar mais atratividade ao site e também como estratégia de incentivo à participação do público.
Comentários dos leitores
No Brasil, alguns jornalistas mencionaram os comentários e e-mails dos leitores como mecanismos importantes de interação com os públicos (B2, B3, B4, B7) : “O bom do on-line é isso. Você tem o comentário ali na hora” (B2); “Eu adoro ler os comentários” (B3); “É uma espécie de termômetro pra gente” (B4); “A gente recebe muito retorno de estudante [...]. É o cara que tem mais afinidade com tecnologia, é aquele cara que vai se manifestar” (B7). Esse tipo de intervenção da audiência reaparece no discurso dos jornalistas como instrumentos que permitem conhecer melhor o leitor, retificar informações equivocadas e legitimar certas decisões sob o argumento de que elas teriam correspondido às expectativas do público.
Já no caso dos respondentes franceses, somente uma jornalista afirmou tentar responder aos internautas.
”Existem comentários que a gente não presta atenção. São os comentários que comentam a matéria. Em seguida, tem aqueles que a gente presta atenção. São os cumprimentos ou as mensagens mais enraivecidas. Bom... os cumprimentos a gente os toma como tal. Fica contente. As mensagens mais enraivecidas, bom, no início isso me balançava um pouco porque até certo ponto isso é uma forma de ser questionada. Dizemos para nós mesmos que não deveríamos ter escrito isso ou aquilo... [...]. Agora que eu já refleti um pouco sobre essa questão e que já conversei com outros jornalistas, eu busco realmente responder aos leitores, explicar tudo a eles, porque, na minha opinião, é preciso fazer isso e, sobretudo, não deixar que as críticas caiam em uma espécie de limbo” (F9).
Entretanto, a maioria dos respondentes franceses demonstraram interesse pelos comentários. A participação do leitor não teria muito impacto no trabalho cotidiano, seja por causa da sua falta de pertinência e o caráter muito emocional, quase irracional, da participação do público, seja por conta das consequências pessoais que essas palavras terão sobre os próprios jornalistas. Os jornalistas franceses exprimem, em alguns casos, sentimentos opostos sobre o assunto, entre o prazer de serem comentados (o que significa serem lidos), e a apreensão de serem criticados publicamente. De fato, como explica Calabrese (2014, on-line), o discurso do que ela chama de não-jornalistas busca, ao mesmo tempo, aceitar e questionar a assimetria em relação ao discurso jornalístico. Ele exibiria, nesse caso, uma tripla competência “se pronunciar sobre atualidade (misturando enunciados modalizados e informativos), vigiar o discurso noticioso e reatualizar o contrato de leitura com o jornal16”
Discussões
A análise dos resultados pode ser sistematizada por meio do quadro 1 em que se comparam as representações dos públicos (R) e as modalidades de interação com esses atores (I) na forma como elas emergem nos discursos dos entrevistados brasileiros e franceses. Desse quadro, duas questões merecem ser exploradas. Primeiro, a forma como a participação dos públicos é incorporada à prática do jornalismo on-line. Segundo, a grande semelhança obervada no discursos dos jornalistas dos dois países.
Uma integração conservadora do público às redações on-line
Os resultados mostram que os públicos continuam sendo amplamente desconhecidos pelos jornalistas on-line. Mesmo assim são utilizados como suporte, como argumento, como elemento de justificação da maioria das decisões tomadas pelos profissionais da mídia. Os públicos continuam misteriosos, suas reações, comentários e produções, ainda aparecem distantes nos discursos dos jornalistas.
Estudos sobre a participação das audiências no jornalismo on-line reforçam essa duplicidade de posições. Apesar do discurso de valorização ou mesmo de promoção das relações com os públicos, os jornalistas atribuem um papel limitado a esses atores (Pereira & Freitas, 2012). Suas intervenções precisam se adequar às práticas convencionais das redações sem promover necessariamente mudanças na cobertura (Castro, 2011). Observamos inicialmente um discurso de reafirmação da identidade jornalística por meio de uma demarcação clara dos papeis de jornalistas e públicos na produção da informação. Isso explica o sentimento de frustração inicial sobre as possibilidades abertas pelo jornalismo on-line, particurlamente no que diz respeito à participação dos leitores (Calabrese, Domingo & Pereira, 2015).
Contudo, mesmo minimizando o impacto das novas modalidades dessa participação, não podemos negar que os públicos agora fazem parte da paisagem cognitiva dos produtores de notícias (Christin, 2015). Traços da presença do público na prática jornalística aparecem no discurso dos entrevistados, ao mencionarem que certas matérias “dão cliques”, que o “leitor gosta” (de vídeos, galerias de fotos, matérias longas ou curtas) ou que é necessário cobrir certos temas em função das audiências... Os jornalistas estão cientes dos comentários e das intervenções dos públicos nas redes sociais (mesmo que eles não sintam a necessidade de responder, de interagir). Eles trabalham em empresas de mídia que, em busca de leitores, introduzem plataformas de participação dos públicos: editorias de mídia social, serviços de community management, espaços de comentário e de coprodução de conteúdo.
A análise mostra que existem recorrências bastante interessantes nas falas dos jornalistas on-line por conta da forte utilização de argumentos gerenciais – declarações que parecem também emergir de um discurso mais internacional sobre a participação das audiências no jornalismo. Nossa hipótese seria que essas constatações revelariam o cruzamento de dois metadiscursos. Por um lado, os discursos recorrentes desde os anos 1980, sobre a importância de seduzir e convencer os públicos, de escutá-los, por exemplo, por meio do jornalismo público (Beauchamp & Watine, 2003), de deixá-los falar e produzir a partir de uma prática de jornalismo cidadão. Esse discurso é, portanto, anterior à internet, e remete a elementos relativamente estáveis da identidade profissional dos jornalistas. Por outro lado, observamos a circulação de um outro conjunto de discursos emitidos pelas organizações internacionais. É o caso da World Association of Newspapers and News Publishers (WAN-IFRA), que propõe há décadas um discurso construído e pronto e que é destilado em suas diversas formações internacionais destinadas a dirigentes de empresas de mídia17 (Touboul, 2010). Essas duas filiações discursivas parecem ter uma forte influência sobre os argumentos de justificação que os jornalistas utilizam para explicar suas relações com os públicos ou as relações que eles deveriam construir.
Traços identitários comuns
Do ponto de vista da comparação, os dados revelam um conjunto considerável de traços identitários comuns, pelo menos no que se refere às modalidades de justificação dos práticas pelos jornalistas brasileiros e franceses, bem como as maneiras de gerir a relação com seus públicos. Os resultados surpreendem pela semelhança, pois observamos apenas uma variação no que diz respeito às reações aos comentários dos leitores. Essa constatação, que emerge a partir de confrontação de dois casos distintos, parece reforçar uma hipótese mais abrangente que explora a eventual construção de uma identidade transnacional desses jornalistas.
Quatro elementos merecem ser levados em conta ao confrontarmos esses resultados aos contextos locais de geração dos dados:
O primeiro remete a uma similaridade nos perfis dos jornalistas on-line estudados e que integram as redações nos dois países. A maioria dos profissionais pesquisados são jovens, com boa escolaridade, formados majoritariamente em jornalismo e que apresentam interesses distintos no que se refere às novas tecnologias. Mesmo a análise das carreiras profissionais desses jornalistas revela traços comuns (Le Cam e Pereira, 2015). Esse elemento poderia ser revelador das dificuldades no ingresso dos jovens jornalistas no mercado de trabalho, mas também de certas concepções gerenciais que prevalecem nos departamentos de recursos humanos das empresas jornalísticas dos dois países por ocasião da contratação nas redações on-line.
Por outro lado, mesmo que tenhamos escolhido perfis correspondentes, não havia nenhuma garantia de que os discursos dos entrevistados seriam similares, sobretudo se consideramos as especificidades do processo de profissionalização e a composição do grupo profissional nos dois países (Le Cam & Ruellan, 2004). De fato, na França o ingresso no mercado de trabalho é aberto, embora a exigência de uma formação específica em um das escolas reconhecidas facilite a contratação. Já no Brasil, durante 30 anos (até 2009), o diploma superior em jornalismo era um requisito obrigatório para o exercício da profissão, o que levou à construção de uma noção de identidade profissional fortemente associada à formação e à posse do registro de jornalista (Albuquerque, 2006). Por conta disso, era esperado, por exemplo, que jornalistas brasileiros se posicionassem de forma mais enfática contra a participação “amadora” na produção on-line, o que não aconteceu.
O segundo ponto remete aos elementos convergentes em contextos econômicos e emergência de técnicas de produção relativamente idênticos. As empresas midiáticas, confrontadas às mesmas injunções de inovação, devem buscar se posicionar em um forte ambiente concorrencial, o que as impulsiona a inventar novas formas de se apresentar ao público, de incentivar o consumo de seus conteúdos. Ao mesmo tempo, os jornalistas vivem em contextos de relativa semelhança no que diz respeito à precariedade, à demanda generalizada por flexibilidade na produção da informação, bem como nas modalidades de aprendizado e apliação de certas ferramentas técnicas (por exemplo, os sistemas de gerenciamento de conteúdo, as redes sociais, os blogs). Eles se encontram confrontados a um aumento da demanda por um “jornalismo sentado”, voltado ao tratamento da informação que chega por meio de despachos de agências de notícias (Pereira, 2004). Esses elementos se encontram claramente presentes nos dois campos de pesquisa.
O terceiro elemento está ligado ao lugar ocupado pelos sites nos sistemas midiáticos nacionais. Diferente da mídia imprensa e audiovisual – que tanto no Brasil como na França estão submetidas a uma série de restrições do ponto de vista da participação do capital estrangeiro18 – as redações on-line são mais suscetíveis ao processo de globalização do mercado da comunicação. Assim, no caso brasileiro portais pure players como o Terra (propriedade da Telefónica da Espanha) e o iG (a portuguesa Ongoing) já fazem parte de conglomerados multinacionais. Outros, como o UOL, de propriedade do grupo Folha, investiram na aquisição de empresas estrangeiras de tecnologia. O mesmo acontece na França. Neste caso, diferente das mídias tradicionais em que o relativo isolamento permitiu a construção de modelos nacionais de jornalismo (Cf. Albuquerque, 2011), os sites de internet parecem definir suas práticas (ou pelos menos as representações em torno delas) a partir de uma lógica transnacional.
Uma quarta explicação para os nossos resultados faz referência à possibilidade de uma circulação internacional dos discursos sobre o jornalismo on-line. Essa hipótese se ampara em nossas observações preliminares em torno da existência de instituições e atores responsáveis pela difusão de textos sobre as inovações no jornalismo e as possibilidades abertas pelas tecnologias digitais. É o caso de organizações como a Columbia Journalism Review, as publicações da Wan-IFRA, blogs de figuras como Jay Rosen, Jeff Jarvis, etc. Tais discursos podem ainda ser apreendidos pela introdução de modos comuns de gestão das redações on-line por meio da contratação de consultorias internacionais19. E pelos próprios jornalistas, que geralmente acompanham as mídias de referência de outros países (Washington Post, The Guardian, New York Times, El País, Owni, Le Monde, Folha de São Paulo) e tendem a introduzir ou adaptar formatos externos às suas práticas. Isso aparece, na fala de alguns entrevistados, que contam terem se inspirado em outros veículos na hora experimentar novas formas de produzir para a web.
De modo geral, esses quatro elementos nos permitem testar uma explicação mais geral – de que haveria um processo de constituição de um identidade transnacional dos jornalistas on-line – pela comparação de dois casos prototípicos, escolhidos de forma assistemática (Hirschl, 2005). Essa constatação ultrapassa a dimensão da gestão das relações entre jornalistas e públicos e se constitui numa espécie de hipótese norteadora para outros estudos transnacionais e com foco nas dimensões individuais e organizacionais do jornalismo on-line.
Conclusões
Neste artigo, analisamos a forma como os webjornalistas brasileiros e franceses representam suas identidades a partir das relações com os públicos. O estudo, baseado em vinte entrevistas semiestruturadas trabalhou duas dimensões: 1. A análise geral dos resultados, ou seja, na forma como os entrevistados enunciaram modalidades de regulação das relações com os leitores; 2. A dimensão comparativa, na proposição de um conjunto de elementos capazes de explicar os resultados encontrados.
A despeito da proliferação discursos de promoção da participação das audiências, os jornalistas on-line demonstraram um desconhecimento do público e certa reticência em incorporar essas intervenções em suas práticas. Isso não significa que os públicos não participem ou que não tenham impacto na produção da informação. Mas as inovações parecem ser mais conservadores do que previam os discursos normativos que apregoavam uma “era das audiências”. Essas constatações se juntam a outros estudos sobre o tema e que relativizar a capacidade de integração dos leitores nas redações on-line.
Os resultados mais interessantes aparecem na abordagem comparativa. Neles percebemos uma número considerável de similitudes na forma como os jornalistas dos dois países representam suas relações com os públicos. Essa constatação reforça a nossa hipótese de uma identidade transnacional dos jornalista on-line, baseada principalmente na circulação de discursos estruturantes em relação a essas práticas. A emergência de várias semelhanças no que diz respeito às condições de trabalho, as práticas profissionais, as ferramentas utilizadas, os discursos gerenciais, e as concepções de público formuladas pelos jornalistas parecem sustentar essa hipótese.
Contudo, outros elementos merecem ser aprofundados em pesquisas posteriores sobre o tema:
- Antes de tudo, é possível que os elementos de semelhança e divergência observados decorram da grelha de análise comum utilizada na pesquisa, aplicada pelo pesquisador local em seu contexto nacional de origem. Esse tipo de procedimento pode ter dado origem a uma naturalização dos dados a serem posteriormente comparados. Por conta disso, a próxima etapa prevê entrevistas feitas em conjunto pelos dois pesquisadores, buscando, confrontar e quetionar essass natualizações durante o processo de análise e comparação.
- A investigação deve também ser complementada com uma análise dos metadiscursos sobre o jornalismo on-line difundidos na França e no Brasil. A nossa proposta é confrontar os discursos individuais dos entrevistados com os discursos coletivos, que circulam nos territórios nacionais analisados. Isso permitirá, em um segundo momento, avançar na compreensão dos processos de circulação internacional, ou pelo menos binacional, dos discursos sobre o jornalismo on-line. Essa análise dos metadiscursos nos permitiria fazer emergir as diferenças e similitudes, as apropriações ou os pontos de fratura entre as evoluções discursivas e a estruturação dos discursos sobre o jornalismo on-line nos dois países.
- A análise da comparação de nossos campos de pesquisa permitiria ainda aprofundar a ideia de uma identidade transnacional dos jornalistas on-line. A pesquisa deve, portanto, continuar a buscar semelhanças e divergências. No entanto, não se pode fazer presunções de caráter internacional. Isso significa que as semelhanças ou divergências encontradas talvez não estejam ligadas entre si, podem, ao contrário, ser resultado de processos nacionais, dos contextos locais. Nesse caso, ao mesmo tempo em que estabelecemos a hipótese sobre a emergência de identidades transnacionais dos jornalistas on-line (ligadas aos contextos econômicos, técnicos, gerenciais e profissionais comuns), devemos também trabalhar com o seguinte: as identidades ou os modos de fazer jornalismo poderiam emergir ou se estruturar localmente em momentos históricos idênticos, sem uma relação direta com a circulação de atores e de discursos? Em suma, as semelhanças encontradas são realmente a expressão de uma transnacionalidade ou a encarnação de complexos movimentos nacionais que não possuem laços explícitos entre si?
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Agradecimentos
Esta pesquisa foi cofinanciada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/Brasil) e pelo Centre de Recherche em Information et Communication (ReSIC) da Univesité Libre de Bruxelles (ULB/Bélgica). Gostaríamos tambpem de agradecer aos pareceristas da revista OBS* pelas sugestões, que nos permitiram avançar no desenho metodológico deste projeto de comparação transnacional em jornalismo.
NOTAS
1 Existe uma produção expressiva de trabalhos sobre o tema mais abrangente da participação das audiências no jornalismo (Cf. Sousa; Castro 2013). Uma revisão das principais perspectivas sobre o assunto foi proposta por
Calabrese, Domingo e Pereira (2015) no texto de abertura do número especial ‘O jornalismo Online e seus Públicos’ (Vol., n. 2) da revista Sur le Journalisme – About Journalism – Sobre Jornalismo: http://surlejournalisme.com/rev/index.php/slj/issue/view/9
2 Ver a conferência de Florence Le Cam “Penser l’étiquette ‘journalisme citoyen’. Premières analyses de l’histoire de la nomination d’une pratique sociale sur le web”, apresentado no Colóquio do Resaux d’études sur le Journalisme em janeiro de 2009.
3 No original: “Traditonalists”, “those who want to maintain a hierarchal relationship between journalists and audiences”, e os “Convergers”, “those who felt users should be given more freedoms within the news site”. As traduções são de responsabilidade dos autores.
4 No original: “attempt to identify the major variations that have developed in Western democracies in the structure and political role of the news media, and to explore some ideas about how to account for these variations and think about their consequences for democratic politics”.
5 No original: “how they are linked structurally and historically to the development of the political system”.
6 “What we treat as a similarity at one level of analysis may reveal myriad differences at more detailed levels of analysis”.
7 A possibilidade de combinar essas duas metodologias foi explorada no painel ” Comparative Qualitative Studies of Journalism: Both Possible & Useful?” coordenado por Arnaud Anciaux e Fábio Pereira, durante o congresso de 2015 da IAMCR, em Montreal (Canadá).
8 Os autores gostaria de agradecer a Jacques Mick e Samuel Lima por terem cedido esses dados inéditos.
9 Na França, uma formação em alternância é baseada em uma sucessão de períodos de aprendizado na empresa e de formação teórica em uma instituição de ensino.
10 Um questionário aplicado junto a empregados de sites de internet na França, em 2010, mostrava que estes tinham, em sua maioria, menos de 30 anos (23% deles, menos de 25, 37% entre 25 e 30), e que 60% trabalhavam, ao contrário da ideia amplamente difundida em torna da precarização, com contratos estáveis. 48% dos respondentes esperavam continuar trabalhando nesse domínio. Esse estudo, não científico, teve como mérito, colocar em evidência uma forte contradição entre os discursos emitidos sobre o estatuto do jornalista on-line e as suas reais condições de emprego. Assim, em 2012, vários diretores de redações on-line desejavam, acima de tudo, estabilizar suas equipes, se protegerem de uma forte mobilidade entre mídias dos jovens jornalistas por meio da concessão de contratos de trabalhos mais estáveis. De fato, uma das características do mercado de trabalho dos jornalistas on-line continua sendo a forte circulação de jornalistas entre empresas de mídia. Os resultados do questionário estão disponíveis no endereço: http://www.slideshare.net/alicanth/rsultats-questionnaire-sur-les-travailleurs-du-web.
11 No original: “aimed at generating ‘thick’ concepts and thinking tools through multi-faced descriptions”. Em filosofia, o termo “thick concept” expressa um conceito avaliativo e que também é substancialmente descritivo. Preferimos, neste caso, manter a expressão em inglês, conforme a citação original. Sobre a noção de thick concept, ver: http://www.www.iep.utm.edu/thick-co/
12 No original: “concept formation through multiple description is the methodological approach this guise of comparative study often adheres to”.
13No original: “studies that draw upon controlled comparison and inference-oriented case selection principles in order to assess change, explain dynamics, and make inferences about case and effect though systematic case selection and analysis of data”.
14 No original CSP+, sigla que designa na França, sobretudo no campo do marketing, as categorias socioprofissionais mais valorizadas, o que inclui empresários, artistas, empreendedores, funcionários públicos e as profissões intelectuais superiores (médicos, engenheiros, professores universitários, etc.).
15 FOLHA DE S. PAULO. (2010). Folha passa a ter editor de mídias sociais, 26 de Maio.
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/tec/tc2605201027.htm
16 No original: “se prononcer sur l’actualité (en mêlant énoncés modalisés et informationnels), surveiller le discours d’information et réactualiser le contrat de lecture avec le journal”.
17 Por exemplo, em dezembro de 2010, o periódico bimensal Jornal ANJ, editado pela Associação Nacional de Jornais, entidade brasileira filiada à WAN-IFRA, publicou uma reportagem de capa com o título ‘É preciso conhecer melhor o leitor’. A matéria descrevia experiências realizadas por jornais brasileiros e estrangeiros com o objetivo de atrair leitores mais jovens para o consumo de jornais.
18 A lei brasileira limita a 30% a “participação de estrangeiros ou de brasileiros naturalizados há menos de dez anos no capital social de empresas jornalísticas e de radiodifusão” (Lei nº 10.610/2002): https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10610.htm. Na França, a lei de 30 de setembro de 1986, modificada em 14 de novembro de 2016, limita a participação de estrangeiros a “20% do capital social ou dos direitos a voto”: https://www.legifrance.gouv.fr/affichTexteArticle.do;jsessionid=7CD874495EDB543B08384E3A9262C0DE.tpdila23v_2?idArticle=JORFARTI000033385385&cidTexte=JORFTEXT000033385368&dateTexte=20161115&categorieLien=id. Nos dois países, as restrições se aplicam apenas à radiodifusão hertziana. Não há limitações no caso dos operações de TV a Cabo ou por Satélite.
19 Ver os trabalhos de Jorge (2007) sobre o papel da Universidade de Navarra na construção de um modelo de “redação integrada” na imprensa brasileira.