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Angiologia e Cirurgia Vascular

versão impressa ISSN 1646-706X

Angiol Cir Vasc vol.14 no.2 Lisboa jun. 2018

 

CASO CLÍNICO

Aneurisma da artéria axilar em contexto de trauma penetrante

Endovascular repair of an axillary pseudoaneurysm due to penetrating trauma

Pedro Pinto Sousa1, Pedro Brandão1, Alexandra Canedo1

 

1Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular, Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho

 

Autor para correspondência

 

RESUMO

As lesões da artéria axilar e subclávia por trauma penetrante, excluindo aquelas ocorridas em teatro de guerra, são relati­vamente raras e com poucos casos descritos na literatura. Contudo, se não diagnosticadas atempadamente, estas pode­rão estar associadas a uma elevada morbilidade e mortalidade.

A dificuldade e complicações frequentemente associadas à abordagem por cirurgia direta tornaram o tratamento endo­vascular uma alternativa mais atrativa, particularmente em caso de formação de pseudoaneurisma ou fístula arterio-ve­nosa. Os autores descrevem um caso clínico de um jovem de 24 anos, admitido por lesão da artéria axilar em contexto de trauma penetrante e submetido a correção endovascular.

Palavras-chave: Tratamento endovascular, Artéria axilar, Traumatismo vascular penetrante, Pseudoaneurisma, Endoprótese revestida

 

ABSTRACT

Axillary and subclavian artery injuries due to penetrating trauma, excluding those occurring in war theatre, are relatively rare and few cases are described in the literature. However, if not diagnosed in a timely manner, these lesions may be associated with high morbidity and mortality.

The difficulty and complications often associated with the open surgery approach have made endovascular treatment a more attractive alternative, particularly in cases of pseudoaneurysm or arteriovenous fistula formation. The authors describe a clinical case of a 24-year-old man admitted for an axillary artery injury in the context of penetrating trauma and that undergone successful endovascular correction.

Keywords: Endovascular repair, Axillary artery, Penetrating trauma, Pseudoaneurysm, Covered stent

 

INTRODUÇÃO

No contexto de ser uma entidade raramente encontrada na sociedade em geral, excluindo países com cenário de guerra, a sua real incidência e mortalidade encontra-se por determinar. No entanto, alguns estudos europeus descre­vem que o trauma vascular representará um valor na ordem dos 4% de todas as admissões em urgência por trauma(1,2).

As lesões arteriais por trauma penetrante podem ter uma apresentação clínica muito variável desde ausência de sinais/sintomas com sua resolução espontânea até se apresentarem de forma exuberante requerendo um trata­mento cirúrgico ou endovascular.

Apesar de pouco frequentemente encontradas na nossa população, é importante o conhecimento e experiência na avaliação e tratamento destas lesões. Uma abordagem clássica de avaliação inicial começa pela identificação dos conhecidos hard signs como hemorragia ativa, hematoma expansível, ausência ou diminuição do pulso, sopro ou frémi­to palpável e isquemia de membro. Estes implicam uma inter­venção urgente, estando muitas vezes associados a uma necessária abordagem exploratória por cirurgia direta. Por outro lado, a presença de soft signs como hematoma estável e lesão na proximidade de grandes vasos, de uma forma geral, permite ao examinador mais tempo para a avaliação do doen­te e identificação das lesões que poderão, numerosas vezes, ser corrigidas com técnicas endovasculares.

Muito frequentemente, as lesões da artéria axilar e subclá­via por trauma penetrante estão associadas a lesões do plexo braquial, veia axilar e hemo ou pneumotórax, sendo as lesões do plexo braquial a principal causa de morbilidade a longo prazo.

Numa revisão sistemática recente (Branco et al(3)) sobre lesões por trauma penetrante da artéria axilar e subclávia resolvidos, com recurso a tratamento endovascular, foram descritos 92 casos com uma predominância do sexo masculi­no 72.8% (n = 67) e uma classe etária afetada bastante jovem (33.7 anos, variando entre os 10 e os 83 anos). As armas de fogo foram o mecanismo mais frequentemente identificado (65.2%; n = 62), sendo o falso aneurisma e a fístula arterio­-venosa a forma clínica de apresentação mais comum.

 

CASO CLÍNICO

Doente do sexo masculino, de 24 anos de idade, sem ante­cedentes pessoais de relevo.

Admitido no Serviço de Urgência no contexto de um trau­matismo torácico penetrante por arma de fogo ao nível do hemitórax direito. O orifício de entrada infra-clavicular e de saída medial à omoplata.

Apresentava-se hemodinamicamente estável, objetivava-se o orifício de entrada e de saída do projétil, mas sem evidên­cia de hematoma ao nível do ombro ou do tórax e sem sinais de isquemia do membro, mantendo-se com pulsos palpá­veis, sem sopro ou frémito. Realizou estudo imagiológico por tomografia axial computorizada que revelava laceração da artéria axilar proximal. Foi proposto para tratamento endo­vascular com realização de angiografia de subtração digital diagnóstica e identificação de zona de extravasamento de contraste ao nível da artéria axilar que foi excluído com colo­cação de um stent recoberto auto-expansível. O doente teve alta no dia seguinte após o procedimento e evolução clínica no internamento bem como o seu follow-up foi favorável, sem intercorrências. Realizou ecoDoppler ao primeiro, terceiro, sexto e décimo segundo mês pós intervenção e depois anual­mente. Encontra-se, neste momento com três anos e cinco meses de seguimento e com permeabilidade do stent bem como presença de pulsos distais palpáveis no membro afeto. Teve alta duplamente anti-agregado com aspirina e clopido­grel que manteve durante seis meses, ficando depois, apenas com indicação para mono anti-agregação com aspirina.

 

DISCUSSÃO

Aproximadamente 3% das lesões traumáticas da cabeça e pescoço têm envolvimento da artéria axilar ou subclávia(4). A mortalidade pré-hospitalar pode atingir os 23%(5) sendo que a morbilidade a longo prazo está maioritariamente relacionada com eventuais lesões do plexo braquial.

Aqueles doentes que se apresentam à admissão com hard signs deverão ser submetidos a imediata exploração. Por outro lado, se hemodinamicamente estável e na presença de soft signs, o doente poderá ser melhor estudado com recurso a tomografia axial computorizada ou angiografia de subtração digital.

A reparação das lesões com recurso a procedimentos endovascu­lares, segundo as técnicas descritas na literatura, tem se revelado seguros e com bons resultados. Os doentes ideais são aqueles com falsos aneurismas ou fístulas arterio-venosas. Por outro lado, aqueles que terão menor probabilidade de sucesso via endovas­cular são os que se apresentem com oclusão arterial, em que não seja possível ultrapassar a lesão. Os doentes hemodinamicamente instáveis deverão na sua maioria ser tratados por cirurgia aberta.

Segundo os dados reportados por Branco et al(3), a taxa de mortalidade intra-hospitalar ronda os 5%, sendo que a permeabilidade primária dos stent's utilizados, num segui­mento médio de 13.2 meses (3-48 meses) foi de 88.1%.

 

 

 

 

O seguimento descrito na literatura para estes doentes varia muito desde apenas vigilância clínica até estudo complemen­tar com recurso a ecoDoppler ou tomografia axial computori­zada. No caso descrito optou-se por manter seguimento com recurso a exame objetivo complementado com ecoDoppler.

 

BIBLIOGRAFIA

1. Perkins ZB, De'Ath HD, Aylwin C, et al. Epidemiology and outcome of vascular trauma at a British Major Trauma Centre. Eur J Vasc Endovasc Surg. 2012;44:203–9        [ Links ]

2. Non-iatrogenic civilian vascular trauma in a well-defined geogra­phical region in Finland; R. Pöyhönen · V. Suominen · I. Uurto · J. Salenius; Eur J Trauma Emerg Surg        [ Links ]

3. Branco B C, DuBose JJ Endovascular solutions for the management of penetrating trauma: an update on REBOA and axillo-subclavian injuries; Eur J Trauma Emerg Surg. 2016 Dec;42(6):687-694. Epub 2016 Nov 16        [ Links ]

4. Demetriades D, Kimbrell B, Salim A, et al. Trauma deaths in a matu­re urban trauma system: is “trimodal” distribution a valid concept? J Am Coll Surg. 2005;201:343–8;         [ Links ]

5. Gill H, Jenkins W, Edu S, Bekker W, Nicol AJ, Navsaria PH; Civi­lian penetrating axillary artery injuries; World J Surg. 2011 May;35(5):962-6. doi: 10.1007/s00268-011-1008-8.         [ Links ]

6. Branco BC, DuBose JJ, Zhan LX, et al. Trends and outcomes of endovascular therapy in the management of civilian vascular inju­ries. J Vasc Surg. 2014;60:1297–307 (1307.e1).         [ Links ]

7. DuBose JJ, Scalea TM, Brenner M, et al. The AAST prospec- tive Aortic Occlusion for Resuscitation in Trauma and Acute Care Surgery (AORTA) registry: data on contemporary utiliza- tion and outcomes of aortic occlusion and resuscitative balloon occlusion of the aorta (REBOA). J Trauma Acute Care Surg. 2016;81:409–19.         [ Links ]

 

*Autor para correspondência

Correio eletrónico: pedro_psousa@hotmail.com (P. Sousa).

 

Recebido a 10 de outubro de 2017

Aceite a 07 de junho de 2018

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