No passado dia 3 de Fevereiro de 2022, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Rui Manuel Figueiredo Nobre defendeu uma dissertação de doutoramento sobre a Ordem do Templo em Portugal1. Dirigida por Saul António Gomes, foi discutida e apreciada por um júri alargado, formado pelos três autores deste texto e por outros quatro medievalistas da Universidade de Coimbra, entre os quais se incluía o orientador do candidato.
Não foi esta mais uma tese sobre o Templo em Portugal, a juntar-se às três que foram defendidas sobre o mesmo tema noutras universidades do país e do estrangeiro, ao longo dos últimos anos2. Com um orientador que era um investigador experiente, e, talvez, o melhor conhecedor do Templo em Portugal3, o candidato soube regressar aos arquivos e aos diplomas, acumular dados e referências, para renovar, com eles, boa parte do que se conhecia sobre a presença e a acção dos templários. Trouxe, assim, contributos decisivos para o conhecimento dos mestres, dos comendadores e dos cavaleiros da milícia, para a reconstituição da geografia patrimonial desta, ou até para a análise das relações que ela mantinha com outras estruturas de poder, dentro e fora do espaço do reino.
Os méritos e os limites da dissertação de Rui Nobre são, no fundo, o objecto destes três olhares sobre a Ordem do Templo. Estão formados pelos textos das arguições de inícios de Fevereiro, aos quais se acrescentou uma ou outra observação adicional, e, sobretudo, as referências bibliográficas que não tinham. Se os três olhares se cruzam com frequência, como era de esperar, raramente se sobrepõem, oferecendo um panorama compósito, mas coerente, das grandes linhas de força da investigação sobre o Templo em Portugal.
Primeiro
A tese de doutoramento de Rui Manuel Figueiredo Nobre foi realizada num tempo longo, compatível, por um lado, com a atividade profissional do doutorando, que exerce funções de professor do ensino secundário, e, por outro, com o tema da tese e com a base documental usada. É o resultado de uma investigação muito extensa, marcada pela dispersão da documentação por vários arquivos e coletâneas documentais já publicadas, complementada por observações in situ na tentativa de lograr o esclarecimento de topónimos associados ao património da Ordem do Templo em Portugal. Em reforço desta amplitude, incide sobre todo o período de tempo em que a Ordem se fez representar em Portugal, o que significa praticamente dois séculos. No seu conjunto, estas opções tornaram o campo de estudo muito vasto e repleto de desafios, por vezes, difíceis de equacionar.
Do ponto de vista da estrutura, a tese conta com três partes, dedicadas respetivamente aos homens, ao património e aos poderes, devidamente enquadradas e completadas pela introdução, considerações finais, lista de referências bibliográficas e um anexo em que constam os locais onde foi possível arrolar bens da Ordem do Templo em Portugal. Integrada na introdução, é feita uma resenha sobre as principais obras sobre a Ordem do Templo, que, sendo um exercício muito meritório, carece de uma leitura e revisão atentas4.
Na primeira parte, dedicada aos homens, isto é, aos Templários propriamente ditos, procura-se estabelecer o universo humano da Ordem e, em particular, o dos seus protagonistas. Assumem destaque a origem socioeconómica dos indivíduos e a sua integração na estrutura hierárquica da instituição, entre as categorias de cavaleiros, sergentes, clérigos, confrades, familiares ou terceiros templários. São indicadas as balizas cronológicas da sua atuação, embora não seja referenciada a base documental e/ou bibliográfica de suporte aos dados sistematizados a este propósito. O mesmo tipo de subdivisão é aplicado aos designados protagonistas, onde são mencionados os que exerciam os cargos de mestres e procuradores, comendadores-mores e comendadores ao lado de outros integrados em categorias hierárquicas de natureza distinta, como a dos cavaleiros professos, e que incluía os titulares dos cargos acabados de referir, a dos sergentes de armas e de ofícios, a dos clérigos e, por fim, a dos confrades, familiares ou terceiros templários. Entre as páginas 69-203 é abordado o universo dos protagonistas, sendo aduzida uma massa extensa de informação e que pouca reflexão mereceu ao autor, provavelmente devido ao tempo que despendeu na sua organização.
É admitida a possibilidade de o processo de recrutamento ocorrer no seio das várias comendas, embora se saliente que nem todos os freires permanentes nesses núcleos fossem portugueses. É avançada uma estimativa sobre o número de Templários em Portugal, embora não se entenda a oscilação desse número ao longo da tese, havendo imprecisões que merecem revisão. Conjetura-se que o universo dos Templários em Portugal “ultrapassaria largamente os cerca de trezentos e oitenta indivíduos arrolados no presente estudo” (p. 34), embora não se clarifiquem os argumentos que sustentam esta afirmação. O mesmo se pode afirmar em relação ao número “efetivamente alto” (p. 68) de mulheres que solicitavam a entrada na Ordem como confreiras. Na tentativa de apurar a origem socioeconómica dos Templários são usados os topónimos integrados nos seus próprios nomes, “pronunciando ligações às oligarquias dos homens bons dos municípios” (p. 41), embora este elemento constitua um indicador discutível.
Sendo estas questões capitais para o aprofundamento do conhecimento da Ordem do Templo, há questões que merecem discussão. Na tese é demonstrada a preocupação de referenciar exemplos estrangeiros a par dos provenientes de Portugal, como um meio de contextualização dos dados e como uma oportunidade de evidenciar o domínio sobre a bibliografia disponível. Pese embora esta estratégia beneficiar o trabalho, não fica claro se a Ordem em Portugal assumia comportamentos semelhantes aos que tinha em outras províncias dispersas pela Europa, ou se, pelo contrário, tinha especificidades no que toca a esta matéria. Assumiria um perfil mais português, isto é, apresentar-se-ia mais autónoma em relação às diretrizes do convento central e mais vulnerável às pressões régias e às pressões sociais portuguesas, ou persistia na vontade de ser uma Ordem mais internacional, vendo-se mais como uma extensão em Portugal? Dado o perfil social de boa parte dos freires, estas questões socioeconómicas são bastante complexas e a sua interpretação tem de ter em conta os estudos sobre a história da nobreza, já que a relação com a coroa5 e com as dinâmicas sucessórias em vigor em Portugal podem ter condicionado os ingressos na Ordem6.
A segunda parte da tese é centrada no património rústico e urbano da Ordem do Templo em Portugal. O grande desafio é o estabelecimento da localização geográfica de alguns desses bens. A opção metodológica consiste na sua apresentação tendo por base a rede das dioceses medievais em território português e, dentro de cada uma delas, o elenco dos concelhos atuais. Os dados são balizados em onze dioceses medievais (Tui, Braga, Porto, Coimbra, Viseu, Lamego, Guarda, Lisboa, Évora, Badajoz e Algarve / Silves), assumindo-se que é hoje possível ter a perceção do que seriam os limites aproximados dessas dioceses antes de 1415, graças ao trabalho de Bernardo Sá Nogueira7.
Reconhecendo a fragilidade da organização dos bens templários em dioceses medievais e, dentro de estas, em concelhos atuais, a questão reside em questionar o benefício desta opção para este trabalho de investigação. Os filtros aplicados, com recurso às dioceses e aos concelhos, não distorceram a realidade histórica em estudo? A referência deveria ter sido a área das comendas, pois é a que melhor reflete a estrutura patrimonial da Ordem no tempo em estudo. Se tivesse sido feita a ligação dos vários bens às comendas de que fariam parte integrante, teria sido possível avançar com uma ordem de grandeza entre as áreas das comendas, evidenciando a especificidade que marcava cada uma delas. O habitual exercício cartográfico das sedes das comendas, e não das áreas abrangidas por cada uma delas, é pouco audaz e necessita de ser complementado por contributos historiográficos que ponham em evidência a diversidade entre estes núcleos8. Tenho consciência da complexidade deste desafio e, por isso mesmo, sei que não poderia ter sido levado por diante num trabalho de âmbito tão alargado quanto este.
Sobre o património, encontra-se um manancial enorme de informação, de difícil tratamento e enriquecido pelo cruzamento de dados extraídos de várias fontes documentais, entre as quais se incluem as inquirições régias. Na p. 209, é afirmado: “Por uma questão de representação gráfica organizaram-se os bens segundo um conjunto de grandes tipologias”: unidades de exploração rural, terras, edifícios, vilas/aldeias/póvoas/lugares, meios de produção, matas e, por fim, marinhas, o que facilita um conhecimento mais rigoroso dos bens.
Um dos grandes méritos desta tese reside precisamente no esforço de sistematização de todos estes dados, plasmado num conjunto utilíssimo de 18 mapas, 87 quadros e 25 gráficos. Para cada diocese e concelho, são tidas em consideração as mesmas tipologias de propriedade. No total são referidos 401 locais distribuídos por dez dioceses e constata-se que dos 842 prédios elencados, as dioceses de Braga e do Porto tinham o maior número deles (p. 344). Porém, não é dito se estes bens são, ou não, os maiores e os mais rentáveis. Do mesmo modo, não se apura se a distribuição da propriedade, nomeadamente daquela que resultou de doações, reflete o traçado das vias de peregrinação que convergiam para Santiago de Compostela ou se tinha uma relação com a implantação senhorial. A mesma incógnita recai sobre a sua eventual relação com as lógicas de proteção militar de algumas passagens cruciais, como a ligação de Coimbra a Lisboa, onde estão documentadas várias propriedades da Ordem do Templo. A propriedade de natureza militar era significativa e também merece aprofundamentos, na medida em que a conquista de um castelo era sinónimo da conquista de um território9 e que, em simultâneo, o castelo era um ponto de organização desse mesmo território. Rapidamente deixava de constituir a vanguarda da guerra e passava a fazer parte da construção e governação do território da retaguarda.
Tendo em conta o volume de dados tratados, o autor avança com uma reflexão sugestiva: “Do conjunto das doações feitas aos templários é possível perceber que existiram, ao longo dos cerca de duzentos anos da sua permanência entre nós, três momentos distintos. Um primeiro momento, anterior à conquista das cidades de Santarém e de Lisboa (1147), em que as doações, ocorridas predominantemente a norte da bacia do Mondego, são sobretudo de cariz particular, pro anima dos próprios ou dos seus parentes, não sendo, no entanto, de excluir uma ou outra doação régia (ou de familiares próximos do rei), sobretudo, de caráter geoestratégico. Um segundo momento, de consolidação efetivo do espaço entre as regiões de Coimbra e Lisboa, correspondente à parte central do reino, em que as doações assumem um caráter claramente dominial. E, por último, uma terceira fase, correspondente à promessa de doação de D. Afonso Henriques de todas as terras a sul da linha do Tejo. Terras essas que, aparentemente, parecem suscitar pouco interesse à Ordem, provavelmente pelo concurso que neste espaço existia com as demais ordens religiosas militares presentes no território do espaço nacional, também, por estarem conscientes do novo tipo de orografia, da ocupação efetiva do espaço pelas populações (escassez de pessoas) e, sobretudo, do reduzido valor das rendas da dízima e dos padroados que irão obter” (p. 216).
Por fim, na terceira parte da tese, são focados os poderes exercidos pela Ordem do Templo em Portugal. Mais um desafio bastante exigente e que requer a conjugação de todos os elementos anteriormente carreados. Em foco, estão o poder político-administrativo, o militar, o espiritual e os recursos económicos, sem se destacar a inovação da tese nestes domínios. Desde logo, são retomados os forais, vistos como elementos de concessão de autonomia aos concelhos (p. 361), sem ser salientado o seu alcance ao nível do reconhecimento e da legitimidade das comunidades recetoras10. No que toca ao poder militar, é aceite que a localização dos castelos do Templo reflete a sua função de defesa da fronteira Leste (p. 376). No entanto, a presença de alguns castelos junto à fronteira pode representar uma ameaça pela proximidade com senhorios congéneres em Castela. Por sua vez, a complexa problemática da “guerra justa” na Hispânia, por manifesta falta de tempo, não pôde ser explorada com mais profundidade, ficando por avaliar o peso do carisma da Terra Santa e da Cruzada nas doações em benefício da Ordem. Por sua vez, o poder espiritual é aferido pela rede eclesiástica da Ordem, retomando-se o esquema de organização dos dados em função das dioceses existentes à época, e pelos direitos e privilégios que exercia neste domínio. Por último, a abordagem do poder e dos recursos económicos segue a mesma opção metodológica. Desta feita, as 39 comendas identificadas são integradas na rede diocesana, sem se clarificar a relação entre si, opção que impediu o desenvolvimento da reflexão em torno da rede de comendas. De acordo com a tese, as fontes de rendimento da Ordem do Templo assentavam na economia agropecuária e piscatória, na circulação de pessoas e bens, nos arrendamentos e emprazamentos, nas doações pias, nas tendas urbanas e na atividade bancária, embora esta última pareça configurar uma mera hipótese especulativa, uma vez que não se encontram dados documentados no contexto deste trabalho.
Na sua globalidade, a leitura da tese resulta bastante interessante e suscita reflexões pertinentes no quadro da historiografia atual. Feita a partir de uma documentação de difícil análise e interpretação, muitas vezes escrita em latim e conhecida apenas através de cópias posteriores, e dispersa por vários arquivos, a tese de Rui Nobre tem também uma sólida base de apoio em bibliografia. O elenco destes instrumentos de trabalho apresentado no final necessita de uma revisão, tendente a eliminar o desajuste entre os trabalhos que constam na bibliografia e os que foram referenciados ao longo do texto. Por último, as considerações finais são marcadas pela síntese dos principais dados apresentados ao longo da tese e não por uma reflexão que ensaie uma interpretação mais sistémica dos mesmos. Rica em dados, é uma tese útil no contexto da historiografia sobre a Ordem do Templo em Portugal.
Paula Pinto Costa
Segundo
A dissertação apresentada pelo mestre Rui Manuel Nobre constitui, a meu ver, um excelente trabalho de investigação histórica. Tanto pela eleição de um tema difícil e mal conhecido, apesar do grande interesse que a Ordem do Templo continua a suscitar, como pelo regresso aos arquivos e pelo inventário sistemático da documentação neles conservada. Sem o exprimir de forma inequívoca (p. 25), o candidato tem consciência da importância decisiva deste giro arquivístico, como ora por moda se diz. Mesmo se a pesquisa não foi exaustiva - não considerou os diplomas do arquivo distrital de Braga, nem os da diocese de Badajoz, como há pouco reconheceu -, foi esta opção que lhe permitiu construir um catálogo prosopográfico com cerca de 400 entradas (pp. 69-205), e trazer novidades sobre a origem e a distribuição dos bens da milícia (pp. 206-352), ou sobre os poderes e a influência que esta detinha e exercia dentro e fora do reino (pp. 353-439). Tudo bons motivos para que a sua dissertação tenha a devida atenção.
Não poderei fazer o inventário destes méritos, por serem muitos, mas não posso deixar de recordar os mais importantes. Desde logo, a revisão crítica da lista dos mestres, ora desambiguados e reduzidos a um total de 23 (pp. 51, 69-112), mesmo se há nela aspectos a corrigir e a melhorar. Depois, as novidades sobre a identidade de alguns dos mestres, ou sobre o estatuto e a origem social de 84 comendadores e de 161 cavaleiros, já sem mencionar os muitos freires clérigos e os vários familiares da ordem. Com tudo isso, deu um contributo importante para o conhecimento da sociologia das ordens, atestando, também para o Templo, a importância do recrutamento de freires entres as elites urbanas e concelhias, por vezes com capacidade para disputar o lugar de mestre. Como demonstram os casos de Lourenço Martins e de Vasco Fernandes de Tavra, ambos originários de Santarém. Também documentou a proximidade entre a milícia e as comunidades urbanas e rurais, manifesta através das doações feitas pelos concelhos da Guarda e de Bragança (pp. 214, 236), ou dos legados entregues por uma multiplicidade de camponeses livres, os herdadores, que arrolou a partir dos registos das inquirições (pp. 207, 215, 218-219). Não queria terminar estas observações iniciais sem sublinhar a justa insistência na dimensão internacional da ordem. É certo que, a meu ver, não se libertou por completo dos discursos que sublinham o carácter nacional do Templo, ou a relação especial deste com os reis portugueses (pp. 43, 383), mas não só recordou a presença habitual de freires estrangeiros nas comendas do reino, como criticou com inteira razão a tese da precoce nacionalização do Templo (p. 379), defendida, entre outros, por José Valente em 200211. Foi com satisfação, portanto, que o vi dar a devida atenção ao socorro da Terra Santa (pp. 385-387), matéria tão descurada pelos investigadores do Templo em Portugal.
Como já se deduz destas observações, a dissertação do candidato organiza-se com um plano muito ambicioso, como se tudo fosse importante e nada quisesse esquecer. Propósito louvável, por certo, do qual se dá testemunho logo de entrada, com o sub-título do trabalho - Homens, Património e Poderes -, mas pergunto-me se terá sido a melhor escolha. Como é natural, o facto obrigou-o a dispersar-se por um infindável conjunto de temas e de problemas, a discutir hipóteses, a verificar e a rever localizações, cronologias e referências, tarefas exigentes e que nem sempre lhe deram o tempo suficiente para aprofundar análises e reflexões. Para pôr em prática aquela dialéctica essencial nos processos de investigação, que vai dos dados à bibliografia e desta de volta àqueles, para assim averiguar o que neles há de particular e de universal e para os inserir em conjuntos mais vastos e significativos. Como pode agora olhar para trás e reflectir no percurso que realizou, pergunto se aquela multiplicidade de temas e de assuntos não prejudicou a unidade e a coerência do seu trabalho, ou mesmo as novidades que este podia trazer. Em particular, daquilo que nele é mais interessante e mais inovador e que respeita, como bem sabe, à composição social da milícia, ao recrutamento dos freires e à estrutura hierárquica do Templo, problemas aos quais voltarei.
Seja como for, quero sublinhar a enorme coragem intelectual que o candidato revela com esta dissertação. O Templo não era, na verdade, um terreno virgem e tinha sido objecto de três teses de doutoramento recentes12, às quais se juntaria uma síntese sobre a milícia em Portugal, da responsabilidade de Paula Pinto Costa13, mas esta já depois de o candidato ter iniciado a sua investigação. Julgo que foi precisa muita coragem para regressar aos arquivos e enfrentar o trabalho feito e as análises e as perspectivas consagradas, que era preciso discutir e avaliar, até para melhor valorizar o trabalho que se empreendia. Não foi esta, porém, a opção de Rui Nobre. Da valia dessas teses e doutras publicações pouco disse, embora não tenha deixado de assinalar a existência de espaço para novos trabalhos, com base em fontes de arquivo e num estudo prosopográfico e patrimonial (p. 25). Mas a elegância com que se distanciou das investigações anteriores teve consequências inevitáveis. Manifestas, desde logo, na recorrente necessidade de apontar em nota as divergências detectadas, mas sem as discutir e sem se pronunciar sobre elas de forma segura e esclarecedora. Sirva de exemplo a fixação do Templo em Braga em data anterior a 112814, cronologia que aceita como boa (pp. 30, 230, 405), mas da qual duvida em nota com melhores razões. Tudo isto recomendava, a meu ver, uma maior atenção aos procedimentos da crítica histórica, indispensável para avaliar a conformidade dos diplomas com o tempo e com o espaço e para distinguir os verdadeiros dos falsos. A este propósito, não posso deixar de assinalar o uso de um falso sobre os limites de Soure (pp. 230, 354), já identificado como tal por Rui de Azevedo15, ou o recurso a bibliografia de divulgação e pouco segura, seja para inventariar bens do Templo no Algarve (p. 341)16, seja para identificar algumas das fortificações secundárias da Ordem (pp. 375-376)17, sem que num caso e noutro as observações estejam devidamente apoiadas em diplomas de arquivo.
Se estes lapsos são inevitáveis numa dissertação com esta amplitude e com esta diversidade temática, há outras falhas e omissões mais relevantes, mas que me parecem ter origem na mesma dispersão e na falta de tempo que ela certamente provocou. Não creio que hoje se possa datar de 1128 o concílio de Troyes, nem vacilar quanto à data de fundação do Templo (pp. 28-29, 404), depois dos trabalhos fundamentais de Rudolf Hiestand e de Simonetta Cerrini18, ambos comodamente resumidos por Alain Demurger em livro de 2005 que cita na bibliografia19. Também não me parece que se possam analisar os ofícios do convento central e a estrutura hierárquica da milícia sem consultar os trabalhos de Jochen Burgtorf e de Jonathan Riley-Smith20. Ou examinar os laços de familiaridade e de confraternidade sem ter em conta os estudos de Francesco Tommasi, de Jochen Schenk e de Carlos de Ayala Martínez21, ou, já agora, as observações que apresentei numa publicação sobre as inquirições medievais e que menciona na sua bibliografia22. Por outro lado, a regra do Templo, que cita a partir de duas edições distintas, a de Pinharanda Gomes e a de Judith Upton-Ward23, sem nunca recorrer à edição mais antiga de Henri De Curzon24 - e dir-me-á porquê -, merecia uma maior atenção. Tanto para evitar uma que outra afirmação mais apressada, sobre o facto de a regra não proibir a posse de bens e de os sergentes não tomarem votos, ou sobre o facto de os seus artigos não aludirem ao “ato de matar outro ser humano” (pp. 56, 63, 364), embora a pobreza duns e a profissão dos outros estejam consignadas, assim como a aptidão de os freires matarem sem pecado os inimigos da fé25, sem a qual não se entenderia, aliás, a imagem do templário como um malicida consagrada por S. Bernardo26. Como, ainda, para esclarecer melhor o estatuto dos sergentes e dos frater conjugati, ou até das freiras do Templo, já que os primeiros eram distintos dos homens e dos criados dos freires que arrolou (pp.183-184) e entre os segundos não se incluíam aqueles que resolviam os casamentos para professar. Era esse o caso de Estêvão Peres Espinhel e de Fernando Gonçalves, os quais, ao contrário do que indicou (pp. 32, 42, 62), não devem ser categorizados como frater conjugati, mas incluídos entre os freires professos, uma vez que ambos tomaram votos com o consentimento das mulheres respectivas.
Nada disto seria muito preocupante, nem muito significativo - e isto, claro, é fruto do tamanho do seu objecto e da falta de tempo -, se não tivesse produzido resultados que julgo menos conseguidos, em particular no que respeita à análise e à caracterização do universo humano da milícia. Se nada tenho a dizer do modo seguro como estimou a dimensão demográfica da milícia - uma média de 71 freires por geração, calculada com base nos dados para o século XIII -, as suas análises dos processos de recrutamento dos freires e das origens sociais destes pareceram-me demasiado rápidas. Não teve em conta um artigo fundamental de Alan Forey sobre o recrutamento dos freires27 e pouco se demorou sobre as diferentes formas de entrada na milícia - tradição familiar, vocação pessoal, colocação de filhos-segundos, profissões tardias, proximidade social, vizinhança, etc -, ou sobre o peso relativo de cada uma delas. Mas, sobretudo, não aproveitou da melhor forma os muitos dados que coligiu no seu catálogo prosopográfico. Se aceitou o recrutamento de freires tanto entre os fidalgos do reino como entre as famílias dos concelhos e das cidades, não procurou avaliar a importância de cada um deles no seio da milícia, quer entre os mestres, quer entre os comendadores, quer, ainda, entre os restantes freires. Se os mestres e os comendadores eram sempre de origem social mais elevada, como parece disposto a acreditar (p. 42), mal se compreende que não tenha mobilizado os dados que suportam semelhante afirmação. Quase outro tanto se podia dizer dos estrangeiros, cuja presença considera habitual, embora pudesse ter apresentado dados mais concretos, ou feito pelo menos algumas contagens a partir dos elementos apresentados no seu catálogo prosopográfico.
Termino com duas notas mais breves. Uma sobre alguma imprecisão conceptual que se observa quando parece confundir os mandatos dos comendadores com os préstamos que a ordem fazia aos seus benfeitores (pp. 55, 57), ou quando usa o termo convento quase como sinónimo de comenda (p. 55), embora o termo se deva reservar para o convento central, ou provincial, ou, no limite, para uma comenda com uma comunidade mais numerosa e mais estruturada. A segunda nota apenas para lamentar que pouco se tenha interessado pela estrutura provincial do Templo, que reunia os reinos de Portugal, de Castela e de Leão desde o último terço do século XII28, realidade que não ignora, mas que não valorizou. Os efeitos práticos dessa organização supranacional da Ordem não podem ser esquecidos e merecem a devida atenção num trabalho futuro, até porque mais de metade dos mestres documentados entre 1213 e 1287, segundo os seus próprios dados (p. 53), exercia jurisdição simultânea sobre os três reinos peninsulares, quer dizer, em Portugal, em Castela e em Leão.
Nada do que trago lhe é, portanto, estranho, nem inteiramente desconhecido. As observações e os comentários que aqui deixo mais não são, na verdade, do que o fruto de um diálogo silencioso, mas atento e muito interessado, que fui fazendo consigo, com as suas análises, dúvidas e perspectivas. Espero poder continuá-lo de outras formas, certo de que só os trabalhos de qualidade merecem a justiça de serem lidos, discutidos e criticados. Essa é, creia, a melhor homenagem que lhes fazemos.
Luís Filipe Oliveira
Terceiro
A Ordem do Templo em Portugal é tema de um velho debate. Foi com esta expressão que intitulei um recente artigo na Medievalista, no qual reflectia sobre a ligação do Templo português ao Oriente Latino, a propósito da publicação de um novo documento conservado no Archivo de la Corona de Aragón, em Barcelona29. As publicações sobre a Ordem do Templo são consideráveis. Por isso, afigura-se talvez surpreendente que Rui Manuel Figueiredo Nobre, agora doutor pela Universidade de Coimbra, tivesse escolhido esse objecto como tema da sua tese30, a qual tenho a honra de aqui discutir em conjunto com Paula Pinto Costa e com Luís Filipe Oliveira. Decisão surpreendente, dizia, se não se soubesse - o que muitos ainda recusam ver - que diversos aspectos da história do Templo em Portugal têm que ser renovados por completo, como o sentiu perfeitamente o orientador deste trabalho, Saul António Gomes, sem dúvida o investigador mais consistente sobre estas matérias no seu país31.
A minha experiência de júris de doutoramento em Portugal é muito reduzida. Só com dificuldade poderia ser menor, à excepção de algum jovem doutorado. Até agora, apenas participei numa defesa de tese, a de Luís Filipe Oliveira, com quem hoje partilho a redacção destas observações. Foi em Faro, na Primavera de 2007, na Universidade do Algarve32. Em quinze anos, as práticas universitárias mudaram certamente muito em Portugal e ter-se-ão tornado mais complicadas e administrativamente mais pesadas, a julgar, ao menos, pelo caso francês. Por isso, peço desculpa àquelas e àqueles que aqui me leem por não dominar bem as regras e os costumes dos júris de doutoramento. Espero que a minha perspectiva exterior - ou mesmo um tanto estrangeira - possa valorizar a dissertação que tive o prazer de descobrir, de ler e de avaliar, sabendo que, graças à amável assistência linguística de Luís Filipe Oliveira, estou pelo menos seguro que todos me compreenderão.
Quando comecei a carreira de professor na Universidade de Nantes, em 2000, depois de três anos passados em Madrid para concluir a minha tese33, recordo bem que o Templo era o parente mais pobre da historiografia das ordens religiosos-militares na Península Ibérica, apesar da profunda renovação que este campo de estudos conheceu no final do século XX34. Com excepção da coroa catalã-aragonesa35, nenhuma tese tinha tomado a ordem como objeto de estudo. Se esta observação, que não era mais que um lamento, continua válida para Castela e Leão36, a situação em Portugal alterou-se por completo. Nos primeiros anos deste novo milénio, três doutorandos estudaram os Templários do Reino, em paralelo e em curta sucessão: um primeiro, em 2002, nos Estados Unidos, um segundo, em 2008, no Brasil, e um último, em 2009, em Portugal, na Universidade do Porto37. A partir destas bases, apareceu mesmo uma síntese recente38. No entanto, a quantidade não é tudo, e muitas questões ficaram por responder.
O mérito de Rui Manuel Figueiredo Nobre foi o de ter retomado este assunto nos anos de 2010, regressando às fontes e oferecendo-nos hoje, em quase 500 páginas, uma visão da Ordem do Templo, a qual, não sendo sempre equilibrada - voltarei a isto - é a mais completa, a mais segura e a mais abrangente que temos. O título da tese é de uma clareza lapidar, “A Ordem do Templo em Portugal: Homens, Património e Poderes”. Se ele evoca muito bem o projeto holístico do candidato, cuja experiência de pesquisa e de ensino é rica e longa, também apresenta ao leitor, sem surpresa, as três partes que compõem o estudo, uma primeira dedicada aos homens (pp. 28-205), uma segunda ao património (pp. 206-358) e uma terceira aos poderes (pp. 353-439).
A ambição do projeto é considerável e, graças a uma passagem breve no início da introdução, creio ter percebido que esta foi a causa da dificuldade encontrada pelo novo doutor para terminar a dissertação. Devemos felicitar Rui Manuel Figueiredo Nobre por ter mantido o rumo e por ter concluído a obra, cuja leitura permite que os especialistas do Templo e das ordens militares compreendam o que ele traz de novo, por vezes através de breves notas, discretas, mas seguras e eficazes. Os três doutoramentos defendidos sobre o Templo em Portugal neste milénio apresentam - como se sabe - falhas significativas39. Rui Manuel Figueiredo Nobre, que teve a elegância de não o dizer, embora o facto lhe causasse alguns embaraços, sabe-o melhor do que ninguém. Ele teve que rever muitos factos e teve que o fazer muitas vezes, quase sempre para melhor destacar a força e a originalidade das suas observações. Mas pergunto-me se não deveria ter-se apoiado mais - mesmo que isso significasse retificar e corrigir - nas duas teses que cita como fundamentais, quer dizer, na de Maria Cristina Fernandes, útil para questões patrimoniais, e na de José M. Valente, adequada - em parte, pelo menos - para perspectivar os poderes e a relação entre a coroa e a ordem. A opção teria permitido que se concentrasse sobretudo - e talvez até de forma exclusiva - na parte relativa aos homens, aos freires do Templo e àqueles que com eles se relacionavam. Pela sua amplitude e pela sua novidade, esta notável, rica e corajosa prosopografia (pp. 70-203) poderia constituir, para mim, uma tese totalmente autónoma. A esse propósito, recordo a extrema qualidade, verdadeiramente modelar, da dissertação que Luís Filipe Oliveira apresentou em provas de doutoramento, dedicada aos freires de Avis e de Santiago nos séculos XIV e XV40.
Se, em seguida, me concentrarei principalmente na primeira parte, não é que as outras duas me sejam indiferentes. A segunda, em particular, com as suas tabelas, mapas e histogramas, impressiona em particular o pobre técnico que eu sou. Mesmo a terceira, mais esperada, contém bons elementos, como na página 381, onde se destaca que a ação militar templária em Portugal, até meados da década de 1140, foi feita sobretudo de insucessos. Sabe-se que os inícios na Terra Santa não foram diferentes41 e, se não é possível tratar o Templo em Portugal sem evocar a fronteira da Reconquista, Rui Manuel Figueiredo Nobre preocupou-se em mostrar com precisão que o património da ordem estava mais a norte, mas que as missões desta - com bem maior frequência do que se crê - obrigavam os freires a voltarem-se para o Oriente, para garantir esse succursum da Terra Santa subestimado pela historiografia peninsular42, ao qual, aqui, se presta real atenção, inclusive fora dos desenvolvimentos específicos da terceira parte (pp. 385-387).
Para mim, o recenseamento de todos os Templários atestados em Portugal é o que mais impressiona e o que suscita verdadeira admiração. A maioria deles viveu no século XIII. Em termos quantitativos, a proporção com o século anterior é de um para quatro. Há, é certo, um condicionamento documental que não escapou ao autor, mas este tem razão em extrair daí elementos decisivos sobre o peso e o papel da ordem, para lá dos quais, a título pessoal, eu teria reflectido sobre a imagem social que os freires projectavam. Fica-se surpreendido pela quantidade de cavaleiros identificados. Fica igualmente estabelecido o princípio da rotatividade dos cargos de comendador (p. 60), que indiquei há mais de vinte anos43, mas também a inexistência de nomeações vitalícias, salvo o exemplo muito particular do antigo mestre provincial Paio Gomes Barreto (p. 57), ou mesmo aquele outro caso, também discretamente assinalado, em que se faz uma doação ao Templo com a intenção explícita de nele entrar (p. 56). Para além dos cavaleiros, estuda-se todo o "povo templário", para usar a expressão feliz de Alain Demurger44, os sargentos, claro, um pouco rapidamente identificados na minha opinião com os "homens do Templo", mas também os clérigos, estes com uma missão espiritual, amplamente descrita na terceira parte (pp. 388-412), permitindo que a ordem atraísse confrades e donados, os quais, uma outra vez, sem dúvida, conviria ter caracterizado com maior cuidado, não falando dos milites ad terminum, ausentes em Portugal, e analisando mais de perto os fratres conjugati e as suas esposas, algumas delas por certo confreiras.
Afastada da base, porém, é a própria hierarquia do Templo em Portugal que a tese de Rui Manuel Figueiredo Nobre esclarece com maior proveito. As tabelas cronológicas dos mestres provinciais e dos comendadores-mores, nem sempre fáceis de distinguir, são muito valiosas e serão úteis por muito tempo (pp. 51, 53-54). Construídas com critérios documentais muito seguros, iluminam uma infinidade de caminhos - inclusive quando pensávamos conhecê-los - e, ainda que possamos acrescentar ou retificar pormenores - se, claro, continuarmos a trabalhar nisso - constituem uma proeza significativa, nunca tentada por quem se interessa pelo Templo em Portugal45. Por isso mesmo, talvez seja indelicado recordar, por exemplo, que Lourenço Martins, dado pela primeira vez como mestre entre 1279 e 1283, surge apenas documentado como lugar-tenente (tenens locum magistri) em 128246. Do meu ponto de vista, há pouca necessidade de insistir nestas correções e prefiro sublinhar, quer no que respeita a este dignitário que conheço bem, quer quanto a Hugo Martonio, originário, ao que parece, do meu querido Angoumois, quer quanto a tantos outros dos seus companheiros, quão preciosa é esta dissertação. Além do contributo prosopográfico, a história social não foi de todo esquecida e, em termos de recrutamento, a origem dos Templários interessa tanto à nobreza, com os Ramirões, como às elites urbanas (pp. 40-44), nomeadamente as de Santarém, donde é oriundo o último mestre provincial, Vasco Fernandes de Tavra, a quem se dá o nome completo (pp. 109-112), tal como o cavaleiro João Esteves Barreto (pp. 160-161).
Todos os trabalhos, claro, mesmo de qualidade, podem suscitar críticas e reservas. Na bibliografia, notei algumas lacunas e, para dar apenas um exemplo, não creio que ainda se possa hesitar sobre a data do Concílio de Troyes, 1128 ou 1129 (p. 29), depois de Rudolf Hiestand47, seguido por Simonetta Cerrini48, ambos esquecidos pelo autor, terem certificado o último daqueles anos. Na expressão escrita, ainda que cuidada, algumas palavras são problemáticas, em particular “convento”, utilizado na página 62 e noutras passagens, como sinónimo de comenda. As fontes atestam esse uso? Penso que não, e o recurso a este termo, embora aceite por Alan Forey49, parece-me abusivo. No Templo de finais do século XIII, o “convento” era sobretudo a sede central no Oriente50. Este último - como disse - tinha laços bem mais intensos com a província de Portugal do que habitualmente se admite. Rui Manuel Figueiredo Nobre sabe isso, mas não foi claro e ficou como que ao meio da praia, ao escrever, na página 43, que “a Ordem em Portugal assumiu formas nacionalizantes, não deixando de ser internacional”.
Ainda que mal documentada, a dimensão internacional é matricial e sobrepõe-se a qualquer outra. Em 2005, na sua tese que não é citada, Pierre-Vincent Claverie tinha assinalado “a posição vantajosa que Portugal ocupava entre as nações secundárias da ordem”51. Como prova mencionou três cavaleiros templários, Estêvão, João e Lourenço, interrogados em Chipre em 1311 e recebidos em Tomar ou em Ançã na década de 1290. Revisitei ora estes processos-verbais, publicados pelo historiador alemão de finais do século XIX, Konrad Schottmüller52, o que já devia ter sido feito, e verifiquei que são neles mencionados cerca de dez freires, incluindo um certo Galcerán, "preceptor dicti ordinis in regno Portugalie", provavelmente catalão e, sem dúvida, outro comendador-mor, um porta-estandarte e aquele Estêvão Lourenço (p. 123) cuja ficha poderá ser completada com estes novos dados. E há outras pistas que podem ser exploradas para identificar freires portugueses fora da sua província. Haveria que aludir a André Matias, a quem o papa Nicolau IV escreveu em 1291 na qualidade de substituto do defunto grão-mestre Guillaume de Beaujeu53? Neste contexto, teria sido útil recordar que, em 1307, os freires portugueses se dirigiram a Jacques de Molay e a Pere de Santjust54 e, da mesma forma que o futuro mestre provincial Afonso Gomes permaneceu na Terra Santa, onde conheceu o grão-mestre Thomas Bérard55, poder-se-ia pensar que o clérigo João Jordão, de quem se fala na página 188, deve o seu cognome a uma passagem pelo Oriente.
O succursum da Terra Santa merecia sem dúvida melhor, mas pelo menos o assunto foi discutido e, tendo em vista uma publicação que julgo desejável - pelo menos em parte -, talvez seja esta a secção do texto que mereça ser mais trabalhada. A partir de uma estadia arquivística em Barcelona e, em todo o caso, de uma melhor consideração da documentação geral da ordem, dos atos da chancelaria pontifícia e de tudo o que se pode encontrar em Castela, a começar pelos interrogatórios de Medina del Campo de 1310, sem esquecer os de Ourense56, reconhecidamente problemáticos, mas que podem trazer dados respeitantes a Portugal. Nada disto é mais do que um lamento doce e brando, próprio de um estrangeiro sempre ansioso por alargar as perspectivas, e, em todo caso, não pode nem deve ocultar as diversas qualidades desta bela e original obra, a qual, a partir de agora, melhora a nossa compreensão da Ordem do Templo em Portugal.
Philippe Josserand