Las claves del lenguage simbólico e Signos, iconos y tropos são os mais recentes trabalhos publicados pelo antropólogo, historiador das mentalidades, docente universitário e investigador Mariño Ferro. No primeiro, volta a debruçar-se sobre um tema que tão bem conhece e que já tinha abordado em outros importantes trabalhos, nomeadamente no excelente estudo sobre simbologia animal antiga e medieval, O Simbolismo Animal. Neste novo trabalho, Marinõ Ferro, que já colaborou com a nossa revista, começa por apresentar definições para as palavras “sinais”, “símbolos” e “tropos”, enquanto instrumentos para o estudo que se segue, nomeadamente, em busca da definição que melhor se adeque a “símbolo”. Depois de considerar conceitos com ele aparentados a nível da linguagem, como “metáfora”, “sinais” e “sinédoque”, assinala que o primeiro autor que designou de forma moderna a palavra foi o neoplatónico Jâmblico, que viveu entre os séculos III e IV e que realizou o assinalável contributo de remeter o seu significado para o mundo do indizível, do divino. Este autor considerava que o símbolo era uma imagem consagrada aos seres superiores1. Mas Mariño Ferro vai um pouco mais longe e acaba por nos apresentar aquela que para ele continua a ser a melhor definição do vocábulo, a que se encontra no dicionário da Real Academia espanhola que o define como “imagem, figura, ou divisa com que materialmente, ou de palavra, se representa um conceito, por alguma semelhança ou correspondência que o entendimento percebe entre este conceito e aquela imagem”2. Depois de encontrar a definição que melhor se adequa a “símbolo”, o autor faz uma breve resenha do estudo deste no ocidente europeu, referindo como as sociedades que nele se desenvolveram, a partir do Renascimento e principalmente da época das Luzes, esqueceram a maior parte dos conteúdos simbólicos que o primeiro tinha herdado das sociedades medievais e antigas. Este movimento prolongou-se até ao século XIX, quando o estudo do subconsciente levado a cabo por Freud e Jung acabou por os resgatar. Mas Mariño Ferro critica o primeiro autor por ter considerado os símbolos universais e não próprios de uma cultura, no âmbito de uma visão evolucionista das sociedades. A mesma crítica faz a Jung. A este autor ainda censura tê-los considerado inatos e portanto não inventados pelas sociedades, considerando-os produtos da atividade do subconsciente3. Mariño Ferro menciona depois a importante pesquisa levada a cabo pelo antropólogo Dan Sperer, que procurou as propriedades universais do entendimento humano. Sperer colocou o enfoque no dispositivo simbólico, considerando-o como um conjunto de crenças, ou seja como um conhecimento não científico, definição insuficiente e pouco adequada para o nosso autor4. Mais decisivos avanços foram dados no enfoque semântico pelo historiador da arte Emile Mâle e pelo antropólogo e historiador das religiões Mircea Eliade, ao tentarem encontrar explicações para os símbolos entre os testemunhos que nos chegaram dos próprios membros das sociedades que os elaboraram5, no caso do primeiro ao pesquisar nas fontes medievais6. Em suma, como Mariño Ferro sublinha, a partir dos trabalhos de campo que realizou na Bolívia e na Galiza, mas também pelo estudo das simbologias medieval e da Antiguidade, se os símbolos, como muitas metáforas da vida quotidiana, podem estar cobertos de uma capa subconsciente mais ou menos densa, têm significados conscientes para os membros da comunidade que os cria7. Baseado nos estudos que realizou, o autor aborda de seguida as funções dos símbolos, particularizando como pretendem transmitir e criar valores, comunicar com eficácia e tornar visível o invisível. Segue-se uma intensiva análise das diversas unidades significantes dos símbolos, referindo como se apresentam e se relacionam com os significados em capítulos ilustrados com múltiplos exemplos que se revelam preciosos para o leitor, nomeadamente ao referir como chegam a adquirir uma particular complexidade, tornando-se mais elaborados, rumo a outras “magnitudes”. Por fim, assinala, analisando-os, os casos em que mais do que um significante se combinam para especificar os significados pretendidos. No final da obra, apresenta um importante e elucidativo resumo dos símbolos que foram estudados e mencionados, explicitando-se os seus significados.
No segundo livro, Signos, iconos e tropos, o autor começa por apresentar o âmbito do seu estudo afirmando que deseja mostrar o amplo emprego dos signos, ícones e símbolos na cultura ocidental. Deste modo, o seu estudo estende-se desde a Antiguidade até à cultura popular contemporânea ocidental, embora também cite exemplos de outras culturas e civilizações, como é o caso em que analisa as linguagens humanas do presente e do passado. Na introdução, Mariño Ferro começa por assinalar os contributos decisivos para a definição de cultura de Edward Tylor e Franz Boas8 e como estes autores ampliaram o seu âmbito, levando a que antropólogos e estudiosos da cultura aprofundassem as suas pesquisas, dando especial enfoque ao papel da linguagem no desenvolvimento humano. O autor conclui que os sistemas de comunicação humanos se compõem de “coisas que representam outras coisas”9, introduzindo, deste modo, a linguagem simbólica, que afirma ser própria das sociedades humanas, pois os vestígios da sua utilização recuam à pré-história, como é possível observar nos testemunhos que dela nos chegaram. A partir da definição dos “signa”, “tudo o que a partir de uma convenção aceitada previamente pode entender-se como uma coisa que está no lugar de outra”10, e de referir como se compõem de um significante, a entidade portadora da mensagem, e significado, ou seja a mensagem, define os seus componentes: o signo, o ícone e o tropos, referindo que prefere este termo a símbolo, pois “tropos” é portador de um significado mais amplo. Segundo o autor, “tropos” produz uma mudança de significado nas palavras e objetos com que mantem algum tipo de conexão ou correspondência11. Feita esta apresentação, são estudados de forma exaustiva mas sobretudo esclarecedora, os componentes dos “signa”, ilustrados com múltiplos exemplos. Particularmente importante para os estudiosos da medievalidade é o capítulo dedicado ao tropos, o mais extenso, pois, como o autor confessa, “o termo oferece uma vista panorâmica quase infinita”, onde Mariño Ferro estuda e enumera os bestiários medievais, incluindo o das esculturas, depois de destacar o papel primordial para o género do Fisiólogo, e a heráldica. O âmbito do estudo levado a cabo pelo antropólogo cultural é vastíssimo e compreende um elevado número de exemplos, convenientemente agrupados por denominações precisas. O livro acaba assim por se revelar como uma enciclopédia dedicada ao simbolismo, uma obra estimulante para os estudantes da cultura e das mentalidades, particularmente da Idade Média, embora o âmbito do seu estudo seja bem mais vasto. São, em suma, duas leituras interessantíssimas que aconselho a todos os que pretendem aprofundar o papel crucial da semiótica na história da cultura e da civilização ocidentais.