SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número50Influência dos indicadores relacionados com governo eletrônico no Índice de Transparência Municipal (ITM) de PortugalSistemas Automáticos de Calificación de Tareas de Programación: Revisión y Crítica índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


RISTI - Revista Ibérica de Sistemas e Tecnologias de Informação

versão impressa ISSN 1646-9895

RISTI  no.50 Porto jun. 2023  Epub 30-Jun-2023

https://doi.org/10.17013/risti.50.44-57 

Artigos

Efeitos da realidade aumentada na aprendizagem das ciências naturais: uma revisão sistemática da literatura

Effects of using augmented reality on students learning: a systematic review

António Faria1 

Guilhermina Lobato Miranda1 

1 Instituto de Educação, Universidade de Lisboa, Alameda da Universidade, 1649-013 Lisboa, Portugal. antonio.faria@campus.ul.pt, gmiranda@ie.ulisboa.pt


Resumo

Este artigo apresenta os resultados de uma revisão sistemática da literatura sobre os efeitos da utilização da realidade aumentada (RA) na aprendizagem dos estudantes de ciências (Ciências Naturais e Biologia) do 3.ºciclo do ensino básico e do ensino secundário. Foi utilizada a metodologia PRISMA, tendo sido selecionados 10 artigos de revistas indexadas, num período de tempo entre 2010 e 2022. As bases de dados consultadas foram Scopus, ScienceDirect, Springer Link, EBSCO e Web of Science. A maioria dos artigos selecionados (n=8), após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, utilizou uma metodologia experimental. Os resultados indicam que a RA teve efeitos positivos na aprendizagem e motivação dos estudantes, bem como noutras variáveis como as competências visuoespaciais e o envolvimento dos estudantes nas tarefas de aprendizagem.

Palavras-chave: realidade aumentada; ensino das ciências; desempenho académico

Abstract

This article presents the results of a systematic review of the literature regarding the effects of using augmented reality (AR) on the learning of science students (Natural Sciences and Biology) in lower and high secondary education. The PRISMA methodology was used. Ten articles were selected from indexed journals, in a period of time between 2010 and 2022. The databases consulted were Scopus, ScienceDirect, Springer Link, EBSCO, and Web of Science databases. Most articles selected (n=8), after applying the inclusion and exclusion criteria, used an experimental methodology. The results indicate that AR had positive effects on students' learning and motivation, as well as on other variables such as visuospatial skills and student involvement in tasks.

Keywords: augmented reality; science education; academic achievement

1. Introdução

A integração da realidade aumentada (RA) em contextos de trabalho e aprendizagem surge em meados dos anos 90 através engenheiro Tom Caudell (Karagozlu, 2018 e Singh, 2019). A RA pode ser integrada num contexto mais amplo, que inicialmente se definiu como virtuality continnum (Milgram & Kishino, 1994), mas atualmente foi revisto para o quadro teórico de realidade mista (Skarabez et al., 2021). Nesta revisão Skarabez et al. (2021) referem “mixed reality (MR) environment is one in which real world and virtual world objects are stimulated and presented together within a single perception. That is, when a user simultaneously perceives both real and virtual content…” (p.4).

O uso da RA é muito diversificado e podemos destacar, entre outros, os contextos militar, industrial, médico, museológico, entretenimento e navegação (Singh, 2019). A evolução dos sistemas móveis, o facto de serem gadgets acessíveis, aliado ao desenvolvimento constante de aplicações (app) de RA, tem favorecido a sua integração em contextos de aprendizagem formal e informal (Nincarean et al., 2013; Zheng, 2015). A RA torna visíveis aspetos microscópicos, bem como a manipulação simulada de situações potencialmente perigosas (Page et al., 2021; Say & Pan, 2017).

Os sistemas que geram a RA podem funcionar com ou sem o uso de marcadores (Karagozlu, 2018; Weng et al., 2020). Em contexto de aprendizagem com integração da RA menos imersiva, é importante acautelar o conjugado uso de app, com os dispositivos mais apropriados, nomeadamente smartphone ou tablet (Parong, 2022, p. 503). Numa análise de diversas revisões de literatura e estudos meta-analíticos, destaca-se que sistemas pouco imersivos, como os criados a partir de smartphone se mostram facilitadores da aprendizagem, quando são implicados os princípios da Teoria Cognitiva da Aprendizagem Multimédia (Parong, 2022, pp. 504-505). Os sistemas baseados em marcadores incluem o uso de imagens e/ou códigos QR (quick response). Existem três componentes fundamentais: informação do marcador, uma câmara para capturar essa imagem e o produto 3D que é formado e apresentado. Por outro lado, aplicações sem o uso de marcadores requerem um Sistema de Posicionamento Global (GPS) e uma bússola ou um sistema de monitorização composto por um dispositivo de reconhecimento de imagem através da câmara (Karagozlu, 2018; Sahin et al., 2019; Hung et al., 2016; Weg et al. 2020), aspetos que os smartphones atuais integram. Naranjo et al. (2021) destacam a importância da RA na educação, nomeadamente pelas imagens produzidas e que, ao fornecerem feedback, orientam os alunos na resolução de problemas e na tomada de decisões.

A análise dos estudos realizados foi orientada pelas seguintes questões:

1. Quais são os efeitos do uso da RA na aprendizagem de Ciências (Biologia e Ciências Naturais) de alunos do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário?

2. Existem outras variáveis que expliquem o desempenho positivo dos alunos que utilizaram a RA como parte das atividades de ensino e aprendizagem?

2. Materiais e Métodos

2.1. Recolha de dados

Foi realizada uma revisão sistemática da literatura seguindo a metodologia PRISMA (Page et al., 2021). O período considerado foi entre 2010 e 2022. As bases de dados consultadas foram Scopus, ScienceDirect, Springer Link, EBSCO e Web of Science. Usámos os termos realidade aumentada (augmented reality/ realidad aumentada/ réalité augmentée), e ensino das ciências (science teaching/ enseñanza de las ciencias/ enseignement des sciences) e excluímos os termos realidade virtual (virtual reality/ realidad virtual/ réalité virtuelle) e universidade (university/ universidad/ université) conforme Tabela 1.

Tabela 1 Bases de dados e operadores num primeiro processo de revisão sistemática da literatura 

Base de dados Forma da pesquisa Registos
Scopus ALL (("augmented reality" AND "science teaching") AND NOT ("virtual reality") AND NOT ("university")) AND PUBYEAR > 2010 78
ALL (("realidad aumentada" AND "enseñanza de las ciencias") AND NOT ("realidad virtual") AND NOT ("universidad")) AND PUBYEAR > 2010 12
ALL (("réalité augmentée" AND "enseignement des sciences") AND NOT ("réalité virtuelle") AND NOT ("université")) AND PUBYEAR > 2010 0
ScienceDirect 'augmented reality' AND 'science%teaching' NOT 'virtual reality' NOT 'university' 142
'realidad aumentada' + 'enseñanza%ciencias' - 'realidad virtual' - 'universidad' 14
'réalité augmentée' + 'enseignement%sciences' - 'réalité virtuelle' - 'université' 8
Springer Link ('augmented reality' AND 'science teaching') AND NOT ('virtual reality' OR 'university') 394
('realidad aumentada' AND 'enseñanza de las ciencias') AND NOT ('realidad virtual' OR 'universidad') 0
('réalité augmentée' AND 'enseignement des sciences') AND NOT ('réalité virtuelle' OR 'université') 0
EBSCO "augmented reality" AND "science teaching" NOT "virtual reality" NOT "university" 54
"realidad aumentada" AND "enseñanza de las ciencias" NOT "realidad virtual" NOT "universidad" 8
"réalité augmentée" AND "enseignement des sciences" NOT "réalité virtuelle" NOT "université" 0
Web of Science ((((ALL=("Augmented reality")) AND ALL=("Science teaching")) NOT ALL=("Virtual reality")) NOT ALL=("university")) AND PY=(2010-2022) 9
((((ALL=("realidad aumentada")) AND ALL=("enseñanza de las ciencias")) NOT ALL=("realidad virtual")) NOT ALL=("universidad")) AND PY=(2010-2022) 0
((((ALL=("réalité augmentée")) AND ALL=("enseignement des sciences")) NOT ALL=("réalité virtuelle")) NOT ALL=("université")) AND PY=(2010-2022) 0

2.2. Resultados da pesquisa

Das cinco bases de dados consultadas: Scopus, ScienceDirect, Springer Link, EBSCO e Web of Science, foram devolvidas um total de 719 artigos, aos quais adicionamos cinco do Scholar Google, por se considerarem igualmente relevantes, resultando num total de 724 artigos, conforme Figura 1.

Figura 1 Aplicação da metodologia PRISMA na revisão sistemática da literatura 

2.3. Critérios de inclusão e exclusão

Na seleção dos artigos procedemos primeiramente à retirada de 2.90% (n = 21) por serem publicações duplicadas, tendo-se seguido a exclusão de 93.74% (n = 674) das publicações após leitura do título, das palavras-chave e do resumo, pois não integravam referências conjugadas a RA e CN (ou Biologia e/ou Geologia) e Ensino Básico ou Ensino Secundário (equivalente ISCED 2 e 3) (motivo 1); 0.14% (n = 1) por não apresentar a estratégia de ensino no trabalho com os alunos (motivo 2); 0.28% (n = 2) por incluírem a realidade virtual no estudo (motivo 3) e, por último, 0.28% (n = 2), uma meta-análise que não incluía estratégias educativas e integrava o ensino universitário e a outra uma revisão da literatura sobre a indústria alimentar (tema específico que não faz parte dos programas). Para este artigo, foram selecionadas 10 publicações, por serem as que apresentaram resultados na aprendizagem dos alunos do ensino básico e secundário, nas disciplinas de Ciências Naturais e/ou Biologia (Tabela 2).

Tabela 2 Metodologia do estudo, país, amostra, duração e sistema de RA utilizado 

Autor(es) e ano Metodologia do Estudo País N (GC + GE) Contexto geral Duração app e sistema (com/sem marcador) Idade
Gopalan et al. (2016) Experimental Malásia 140 (70 + 70) Sala de aula Pré-teste 20 minutos; Uma semana de trabalho; pós-teste 20 minutos Aplicação eStar*, computador (com marcador) 13 e 14 anos
Hung et al. (2016) Experimental Taiwan 72 (24 + 24) + 24) Sala de aula Nd Aplicação construída, óculos de RA (com marcador) 12 e 13 anos
Say et al. (2017) Métodos mistos explanatório Turquia 53 (27 + 26) Sala de aula Um mês; pré e pós-teste Aplicação construída, tablet (com marcador) 12 e 13 anos
Karagozlu (2018) Experimental Não definido 147 (70 + 77) Sala de aula 14 semanas de conhecimento pré e pós-teste Aurasma app*, smartphone (com marcador) 12 e 13 anos
López (2018) Quase-Experimental Colômbia 13 (0 + 13) Sequência didática de aprendizagem Nd Arloon Anatomy AR app, smartphone (com marcador) 10 e 11 anos
Sahin et al. (2019) Quase-Experimental Turquia 100 (50 + 50) Sala de aula Quatro semanas (16 horas); um teste de avaliação app não definida, computador (com marcador) 12 e 13 anos
Gnidovec et al. (2020) Quase-Experimental Eslovénia 51 (0 + 51) Sala de aula junho (pré-teste, ensino e pós-teste), setembro (pós-teste e questionário) Mirage AR9 app*, smartphone (com marcador) 13 e 14 anos
Petrov et al. (2020) Estudo de caso Bulgária 80 (0 + 80) Sala de aula Um ano letivo; pré e pós-teste Aplicação zSpace, computador e óculos 3D (sem marcador) Nd (High school)
Weng et al. (2020) Quase-Experimental Indonésia 68 (34 + 34) Sala de aula 90 minutos (organizados em 20 + 5 + 45 + 20); pré e pós-teste aplicativo construído e smartphone (com marcador) 14 e 15 anos
López-Cortés et al. (2021) Pré-Experimental Chile 162 (0 + 162) Sala de aula Nd Aplicação Mitotic Division, smartphone ou tablet (com marcador) 15 e 16 anos

Nota: GC - grupo controlo; GE - grupo experimental; * app descontinuada; Nd - não definido.

Estes 10 artigos utilizaram diferentes designs de investigação: quase-experimental (4 estudos), experimental (3 estudos), pré-experimental (1 estudo), métodos mistos (1 estudo) e estudo de caso (1 estudo), como ilustrado na Figura 2.

Figura 2 Metodologia dos estudos analisados. 

Com exceção de um artigo (Petrov et al, 2020) em que os autores não explicitam a idade dos alunos, verificámos um maior número de estudos na faixa etária 12-13 anos (4 estudos), sendo seguida pelas idades 13-14 anos (2 estudos) e, por fim as idades 10-11 anos, 14-15 anos e 15-16 anos (1 estudo cada), como ilustrado na Figura 3. Podemos encontrar em Rosser (1994, citado por Hung et al., 2017) a referência ao desenvolvimento das capacidades de visualização mental que ocorrem até ao final da infância.

Figura 3 Número de alunos envolvidos nos estudos analisados, por faixa etária. 

Procedeu-se à descrição das questões de pesquisa relacionadas à aprendizagem ou ao desempenho dos alunos e às conclusões dos autores, conforme Tabela 3.

Tabela 3 Questões de investigação (ou objetivos) presentes nos artigos e resultados relacionados do uso da RA na aprendizagem/desempenho dos alunos 

Autor(es)(ano) Questões de investigação ou Objetivo do estudo Instrumentos de recolha Conclusões
Gopalan et al. (2016) Os alunos que utilizam o eSTAR têm, eventualmente, uma melhor pontuação no pós-teste e que resulta numa melhor aprendizagem, em comparação com aqueles que usaram a aprendizagem convencional de ciências. Pré e Pós-teste de conhecimentos. ... através da utilização da aplicação eSTAR, os alunos do grupo experimental têm uma melhor pontuação no pós-teste e eventualmente um melhor desempenho da aprendizagem, quando comparados com os que seguiram uma aprendizagem convencional de ciências.
Hung et al. (2016) Pode a RA melhorar o desempenho da aprendizagem dos alunos em comparação com os materiais didáticos convencionais - livros ilustrados e interações físicas? Pode a RA criar mais interesse/motivação nos alunos do que os materiais didáticos convencionais - livros ilustrados e interações físicas? Teste de erro - error test (avaliação imediata) e teste de retenção - retention test (avaliação posterior). Os resultados das análises podem responder à primeira pergunta de pesquisa: o livro gráfico com RA oferece uma maneira prática e de “mãos na massa” para as crianças explorarem e aprenderem sobre as bactérias, e a RA melhora o desempenho da aprendizagem dos alunos numa medida semelhante aos materiais didáticos convencionais, como livros ilustrados e interações físicas. Os resultados mostraram que, afinal, a RA produziu benefícios educacionais semelhantes aos materiais didáticos tradicionais.
Say et al. (2017) ... o estudo procurou investigar o impacto da RA nas atitudes e no sucesso dos alunos. Pré e Pós-teste de conhecimentos. Verificou-se que os níveis de aproveitamento académico dos alunos aumentam mais com a educação proporcionada pelos cartões de RA. (...) De todos …, pensa-se que a RA seja um suporte eficaz no ensino e deve ser utilizado.
Karagozlu (2018) O objetivo deste estudo é determinar o impacto de uma aplicação de realidade aumentada concebida para o ensino de ciências do 7º ano, sobre o desempenho e as competências de resolução de problemas dos alunos Pré e Pós-teste de conhecimentos. ... as pontuações de desempenho pós-teste dos alunos no final do semestre mostraram que houve aumento nas pontuações de desempenho dos alunos em ambos os grupos, mas que o aumento no grupo experimental, que foi apoiado pela tecnologia RA, foi maior.
López (2018) Avaliar o processo de apropriação alcançado pelos alunos durante a implementação da sequência didática. Pré e Pós-teste de conhecimentos. Os resultados da sequência didática... mostraram que este tipo de estratégia tem, de facto, um impacto positivo nos processos de ensino-aprendizagem. Por exemplo, um dos desafios no ensino do corpo humano e da sua anatomia é a impossibilidade de realmente observar as características e funcionamento, de modo que há uma desconexão entre a teoria e a compreensão prática. (...) Nesse sentido, confirmou-se a hipótese que sugeria que as TIC e o uso de ferramentas como a Realidade Aumentada ajudaram a enfrentar essa rutura na aprendizagem.
Sahin et al. (2019) Existe uma diferença significativa entre o desempenho académico dos alunos do ensino secundário que utilizam aplicações de RA e as que utilizam métodos convencionais? Teste de desempenho do curso de Ciências Observou-se uma diferença significativa entre o grupo experimental e o grupo controlo no desempenho académico, sendo que os alunos que tiveram as aulas de ciências com RA obtiveram pontuações mais altas num teste de desempenho, no curso de ciências, do que aqueles que aprenderam por meio de métodos convencionais. ... Em conclusão, é evidente que a RA afeta positivamente o desempenho académico dos alunos.
Gnidovec et al. (2020) Como os materiais educativos baseados em RA ajudam os alunos a entender o sistema circulatório humano? Pré e Pós-teste de conhecimentos e follow-up de conhecimentos após férias escolares. A atividade instrucional neste estudo melhorou significativamente o conhecimento dos alunos sobre a anatomia básica e fisiologia do coração humano. Além disso, o pós-teste tardio mostrou que a mudança concetual alcançada na compreensão dos alunos foi estável durante um período de dois meses. Os resultados... confirmam a primeira questão de investigação, que os materiais educativos baseados em RA ajudaram os alunos a compreender a complexidade do sistema circulatório humano ...
Petrov et al. (2020) Este artigo tem como objetivo explorar o impacto de uma ferramenta de RA no desempenho de aprendizagem dos alunos. Pré e Pós-teste de conhecimentos. O estudo mostrou uma melhoria substancial na compreensão dos alunos sobre o assunto estudado. (...) Com base na análise dos dados sobre a eficácia da aprendizagem através de ambientes aumentados e dos testes escritos, pode-se afirmar que a integração da RA na referida unidade teve efeitos significativos na aprendizagem dos conteúdos.
Weng et al. (2020) Qual é o efeito do uso de RA num livro de biologia nos resultados da aprendizagem dos alunos? Pré e Pós-teste em aula e entrevista a três alunos de cada grupo O estudo descobriu que a tecnologia de RA melhora os resultados de aprendizagem no nível de análise na taxonomia de Bloom, mas não melhora significativamente os resultados de aprendizagem nos níveis de memorização e compreensão. Assim, a tecnologia de RA pode ter o potencial de ser útil no desenvolvimento das habilidades cognitivas de ordem superior dos alunos.
López-Cortés et. al. (2021) Avaliar as representações dos estudantes acerca do fenómeno mitótico através da análise de explicações sobre uma situação quotidiana (cicatrização de uma ferida). Detetar alterações nos níveis de representação dos estudantes que participam no estudo ao trabalhar com uma sequência que promove a visualização através do uso de realidade aumentada. Pré e Pós teste com a avaliação por rubrica do desempenho … possibilita inferir que a realidade aumentada permite que os alunos observem um fenómeno abstrato e descontextualizado de diferentes pontos de vista, favorecendo a seleção e utilização de esquemas mentais anteriores para processar novas informações, otimizando a memória de trabalho na busca de novas conceções. (...) É por isso que consideramos que o recurso como um todo (sequência e app) oferece oportunidades de aprendizagem eficazes, ativas e ubíquas (Cabero et al., 2019), geradoras de representações mais complexas e robustas na explicação de um fenómeno complexo da biologia, como a divisão mitótica.

3. Resultados

A análise do Tabela 3 mostra que 9 dos 10 estudos analisados indicaram melhoria nos resultados/desempenho académico nos alunos que utilizaram a RA em contexto de aprendizagem, quando comparados com o desempenho dos alunos que utilizaram o método convencional. O estudo desenvolvido por Weng et al. (2020) refere que não houve diferença nos resultados/desempenho académico dos alunos, nos níveis de memorização e compreensão, mas apenas no nível de análise, tendo como referencial a taxonomia de Bloom (1956) e destacando o potencial da RA no desenvolvimento dos processos cognitivos de ordem superior. Um outro estudo de Hung et al. (2016) refere que não se verificou diferença no desempenho académico dos alunos, mas que os resultados obtidos são consonantes com a literatura ao considerarem vantajosa a RA na melhor perceção de conceitos ou processos 3D (visuoespaciais). Ressaltamos o estudo de Gnidovec et al. (2020) que apresenta como limitação o facto de não existir um grupo de controlo. No estudo de Karagozlu (2018) a autora aponta que a RA favoreceu a resolução de problemas e o autocontrole dos estudantes.

4. Discussão

O número de estudos desenvolvidos em meio educativo não superior com integração da RA tem vindo a aumentar mas, conforme referem Carrilho e Vera (2022), a RA é ainda uma tecnologia inovadora e emergente. Estes autores mencionam Toledo e Garcia (2017) que destacam que a RA possibilita trazer para a aula a tridimensionalidade e a interatividade que são aspetos únicos e importantes para a aprendizagem de certas matérias. Crespo e Marín (2020, citam Martin et al., 2011, e Martin-Gutierrez, 2017) para destacarem os desafios educativos que a RA introduz nos processos de ensino e aprendizagem. Referem que melhora a motivação dos estudantes, que se constitui como uma oportunidade de desenvolver novas estratégias de ensino e de aprendizagem e de estar a tornar-se comum em dispositivos acessíveis.

Com exceção de um estudo (Petrov et al., 2020) que utilizou um sistema de computador, que os autores apontam como uma limitação devido ao alto custo do sistema, em todos os outros foram utilizados smartphones ou tablets, aspeto que torna o uso da RA mais acessível.

Na nossa análise encontrámos estudos que utilizaram aplicativos criados para conteúdos ensinados e analisados na investigação, mas que já não existem no mercado como disponíveis, o que não permite a replicação da atividade com novos grupos de alunos. Outras aplicações continuam a existir, mas apenas uma parte da sua utilização pode ser explorada gratuitamente (López, 2018) e outras continuam a existir e permitem a exploração plena e livre (López-Cortés et al., 2021).

Os autores são unânimes em indicar que os alunos estão mais ligados à atividade da aula quando a RA está presente. Este resultado aparece em todas as investigações realizadas previamente a este artigo e em outras revisões sistemáticas da literatura onde foi usada a RA.

Salientamos que o impacto positivo da RA na aprendizagem dos alunos é referido através de uma maior proximidade entre o conhecimento teórico e dimensões não visíveis da realidade (Nincarean et al., 2013; Say et al., 2017; López, 2018; Gnidovec et al., 2020; López-Cortés et al., 2021). Este aspeto ajuda os alunos a aprender estruturas anatómicas internas (López, 2018), aspetos complexos (Gnidovec et al., 2020), a melhorar o desenvolvimento de habilidades cognitivas de ordem superior (Weng et al., 2020), a otimizar a memória de trabalho, gerando representações mentais mais complexas e robustas (López-Cortés et al., 2021) e a apoiar a aprendizagem significativa (Petrov et al., 2020).

Em síntese podemos referir:

Em resposta à nossa Q1, ser unânime nos estudos analisados que a aprendizagem foi favorecida ou que ocorreu um melhor desempenho dos alunos, ainda que Hung et al. (2016) refiram que não se verificou diferença no desempenho académico dos estudantes que integraram o seu estudo. Contudo, entendemos destacar o estudo de Weng et al. (2020) que detalham o potencial da RA no desenvolvimento dos processos cognitivos de ordem superior, de acordo com a taxonomia de Bloom (1956);

Em resposta à nossa Q2, podemos listar os diversos aspetos que os autores destacam como vantagens na integração da RA em contextos de ensino e aprendizagem, sem que a ordem em que apresentamos os estudos traduza a sua maior ou menor importância. A RA:

  1. Permite uma maior proximidade ao conhecimento teórico e a dimensões não visíveis dos fenómenos em estudo (Nincarean et al., 2013; Say et al., 2017; López, 2018; Gnidovec et al., 2020; López-Cortés et al., 2021);

  2. Melhora a perceção de aspetos complexos dos conteúdos em análise (Gnidovec et al., 2020; López-Cortés et al., 2021);

  3. Motiva os alunos, promove o seu bem-estar e uma aprendizagem mais aprazível (Hung et al., 2016; Say et al., 2017);

  4. Fornece feedback imediato (López-Cortés et al., 2021)

  5. Permite desenvolver competências viso-espaciais (Say et al., 2017);

  6. Possibilita a compreensão prática do não visível (Lópes, 2018);

  7. Apoia a aprendizagem significativa (Petrov et al., 2020);

  8. Pode ser usada de forma gratuita (López, 2018).

5. Conclusão

É comum a todos os estudos analisados que a RA se revela, no processo de ensino e aprendizagem das Ciências Naturais e/ou Biologia, como um aspeto inovador e motivador, promovendo maior atenção e envolvimento dos alunos. Destaca-se também como um meio complementar à utilização de outras ferramentas, nomeadamente no ensino das ciências (STEM), dada a possibilidade de tornar visível o não visível. Os aspetos mencionados convergem, na opinião dos autores dos estudos, a levar a uma maior motivação, envolvimento e entusiasmo na aprendizagem, conduzindo os alunos a sentirem uma maior confiança no que estão a realizar.

Referências

Bloom, B. S. (Ed.) (1956). Taxonomy of educational objectives, Handbook 1: Cognitive domain. New York: Longmans. [ Links ]

Carrilho, J., & Vera, W. (2022). Realidad aumentada en aplicaciones móviles educativas. RISTI - Revista Ibérica de Sistemas e Tecnologias de Informação, (E47), 77-94. http://www.risti.xyz/issues/ristie47.pdfLinks ]

Crespo, V., & Marín, L. (2020). La realidade aumentada y el aprendizaje basado en problemas como estrategia que soportan los Living Lab. RISTI - Revista Ibérica de Sistemas e Tecnologias de Informação , (E32), 572-582. http://www.risti.xyz/issues/ristie32.pdfLinks ]

Gnidovec, T., Žemlja, M., Dolenec, A., & Torkar, G. (2020). Using augmented reality and the structure-behavior-function model to teach lower secondary school students about the human circulatory system. Journal of Science Education and Technology, 29, 774-784. https://doi.org/10.1007/s10956-020-09850-8 [ Links ]

Gopalan, V., Zulkifli, A., & Bakar, J. (2016). A learning performance study between the conventional approach and augmented reality textbook among secondary school students. AIP Conference Proceedings, 1761(1), 020029-1-020039-5. https://doi.org/10.1063/1.4960879 [ Links ]

Hung, Y.-H., Chen, C.-H., & Huang, S.-W. (2016). Applying augmented reality to enhance learning: a study of different teaching materials. Journal of Computer Assisted Learning, 33, 252-266. https://doi.org/10.1111/jcal.12173 [ Links ]

Karagozlu, D. (2018). Determination of the impact of augmented reality application on the success and problem-solving skills of students. Quality & Quantity, 52, 2393-2402. https://doi.org/10.1007/s11135-017-0674-5 [ Links ]

López, J. (2018). Apropiación de la realidad aumentada como apoyo a la enseñanza de las ciencias naturales en educación básica primaria. Revista Boletín Redipe, 7(12), 144-157. https://revista.redipe.org/index.php/1/article/view/655Links ]

López-Cortés, F., Moreno, E., Palmas-Rojas, C., & Rubilar, C. (2021). Niveles de representación externa de estudiantes de Educación Secundaria acerca de la división celular mitótica: una experiencia con realidad aumentada. Pixel-Bit Revista de Medios y Educación, 62, 7-37. https://doi.org/10.12795/pixelbit.84491 [ Links ]

Milgram, P., & Kishino, F. (1994). A taxonomy of mixed reality visual displays. IEICE Transactions on Information and Systems, 77(12), 1321-1329. https://web.cs.wpi.edu/~gogo/courses/cs525H_2010f/papers/Milgram_IEICE_1994.pdfLinks ]

Naranjo, J., Robalino-López, A., Alarcon-Ortiz, A., Peralvo, A., Romero, R., & Garcia, M. (2021). Sistema de realidade aumentada para la enseñaza de matemática en tiempos de COVID-19. RISTI - Revista Ibérica de Sistemas e Tecnologias de Informação , (E42), 530-541. http://www.risti.xyz/issues/ristie42.pdf [ Links ]

Nincarean, D., Ali, M. B., Halim, N. D. A., & Rahman, M. H. A. (2013). Mobile augmented reality: The potential for education. Procedia-Social and Behavioral Sciences, 103, 657-664. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.10.385 [ Links ]

Page, M. J., McKenzie, J. E., Bossuyt, P. M., Boutron, I., Hoffmann, T. C., Mulrow, C. D., Shamseer, L., Tetzlaff, J. M., Aki, E. A., Brennan, S. E., Chou, R., Glanville, J., Grimshaw, J. M., Hróbjartsson, A., Lalu, M. M., Li, T., Loder, E. W., Mayo-Wilson, E., McDonald, S., Moher, D. (2021). The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ, 372(71), 1-9. http://dx.doi.org/10.1136/bmj.n71 [ Links ]

Parong, J. (2021). Multimedia Learning in Virtual and Mixed Reality. In R. Mayer & L. Fiorella (Eds.), The Cambridge Handbook of Multimedia Learning (pp. 498-509). Cambridge University Press. https://doi.org/10.1017/9781108894333.051 [ Links ]

Petrov, P., & Atanasova, T. V. (2020). The effect of augmented reality on students’ learning performance in stem education. Information, 11(4), 209-219. https://doi.org/10.3390/info11040209 [ Links ]

Sahin, D., & Yilmaz, R. M. (2020). The effect of Augmented Reality Technology on middle school students' achievements and attitudes towards science education. Computers & Education, 144(103710), 1-11. https://doi.org/10.1016/j.compedu.2019.103710 [ Links ]

Say, S., & Pan, V. (2017). The effect of instruction with augmented reality astronomy cards on 7th grade students’ attitudes towards astronomy and academic achievement. The Turkish Online Journal of Educational Technology, (Special Issue for INTE 2017), 295-301. https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED600996.pdf [ Links ]

Singh, A. (2019). Virtual reality, augmented reality and mixed reality: Human-computer interaction. Publicação independente [ Links ]

Skarbez, R., Smith, M., & Whitton, M. C. (2021). Revisiting Milgram and Kishino's Reality-Virtuality Continuum. Frontiers in Virtual Reality, 2(647997), 1-8. https://doi.org/10.3389/frvir.2021.647997 [ Links ]

Zheng, S. (2015) Research on Mobile Learning Based on Augmented Reality. Open Journal of Social Sciences, 3, 179-182. http://dx.doi.org/10.4236/jss.2015.312019 [ Links ]

Weng, C., Otanga, S., Christianto, S., & Chu, R. (2020). Enhancing students’ biology learning by using augmented reality as a learning supplement. Journal of Educational Computing Research, 58(4), 747-770. https://doi.org/10.1177/0735633119884213 [ Links ]

Recebido: 11 de Janeiro de 2023; Aceito: 20 de Abril de 2023

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons