1. Introdução
Qual é a fonte do crescimento urbano e do desenvolvimento urbano sustentável? De acordo com Caragliu et al. (2011), esta questão tem merecido a atenção constante de investigadores e decisores políticos durante muitas décadas.
Nas últimas duas décadas, o conceito de "smart city" ou “cidade inteligente” tornou-se cada vez mais popular na literatura científica e nas políticas internacionais. No entanto, o conceito de cidade inteligente sustentável é mais recente.
Existem muitas definições de cidades inteligentes. Obtém-se frequentemente uma série de variantes concetuais substituindo "smart" por adjetivos alternativos, por exemplo, "inteligente" ou "digital". O rótulo "cidade inteligente" é um conceito difuso e é usado de maneiras que nem sempre são consistentes (Albino et al., 2015). No trabalho realizado por Albino et al. (2015), os autores identificaram 23 definições diferentes de cidade inteligente.
A comunidade de investigação tem desenvolvido um grande número de soluções experimentais e em tempo real para cidades inteligentes, devido à conveniência e grande atenção dada à sustentabilidade no passado recente (Silva et al., 2018), (Martínez et al., 2023).
A composição de múltiplos atributos constrói uma cidade inteligente. De acordo com Mohanty et al. (2016), a maioria das propostas de cidades inteligentes é composta por quatro atributos principais: sustentabilidade, qualidade de vida, urbanização e inteligência.
Tecnologias como a Inteligência Artificial (IA), a Internet das Coisas (IoT), a aprendizagem automática, a aprendizagem profunda, a computação cognitiva e a análise de grandes quantidades de dados ajudaram os sistemas tradicionais com intervenções tecnológicas avançadas. A cidade inteligente é um desses projetos esperançosos que tem sido adotado em todo o mundo com o objetivo de tornar a vida dos seus habitantes mais confortável e inclusiva. Decorrente deste conceito surgiu também o conceito de universidade inteligente (Rico-Bautista et al., 2021). De acordo com Ahad et al. (2020) “todos os processos diários, como a governação, as políticas, os serviços e o feedback, são automatizados e os utilizadores podem aceder-lhes a partir de qualquer parte do mundo com a ajuda de dispositivos inteligentes. Esta automatização tem sido fundamental para reduzir os riscos ambientais através da utilização de técnicas respeitadoras do ambiente e rentáveis”.
As cidades são aceleradoras da mudança social, promovem a inovação, dispõem de infraestruturas interligadas e adotam e escalam facilmente a tecnologia. No entanto, estas cidades estão sobrecarregadas com questões como a gestão dos resíduos urbanos, a conservação dos combustíveis fósseis, a facilitação de sistemas de saúde acessíveis e atempados, a gestão eficiente do tráfego e a transparência na governação. Estas preocupações deram origem a espaços urbanos inovadores, tecnológicos e sustentáveis, conhecidos como cidades inteligentes sustentáveis. As experiências das cidades inteligentes sustentáveis utilizam a tecnologia para monitorizar a sua comunidade e fornecer soluções sustentáveis e acessíveis para os espaços urbanos. A implementação bem-sucedida das cidades inteligentes sustentáveis requer uma rede de telecomunicações estável, segura, interoperável e fiável para suportar aplicações e serviços em áreas urbanas. Os recentes desenvolvimentos na tecnologia IoT e blockchain fornecem o ímpeto e o suporte para este desenvolvimento de cidades inteligentes sustentáveis (Padmapriya & Sujatha, 2021).
Face ao exposto, importa analisar os contributos mais significativos para o estudo das cidades inteligentes sustentáveis em termos dos principais temas e autores nos últimos anos. O objetivo desta questão é identificar os temas relacionados com as cidades inteligentes sustentáveis na literatura científica. Este esforço contribui para a clarificação do campo de estudo da área temática, permitindo que académicos e investigadores continuem a estudar estas questões científicas.
2. Metodologia
A pesquisa foi realizada em 15 de dezembro de 2023 na base de dados Scopus. Foram utilizados os termos "Smart cit*" e "Sustainab*", limitados ao título, resumo e palavras-chave. Como resultado da pesquisa, foram obtidas 7666 publicações. Posteriormente, a pesquisa foi limitada a artigos, capítulos de livros e comunicações em conferências, obtendo-se um total de 6891 publicações.
Foi efetuada uma análise bibliométrica e utilizada a técnica da coocorrência de termos. A unidade de análise foi a publicação e as variáveis corresponderam aos termos incluídos no título, no resumo e nas palavras-chave. Os termos foram extraídos com recurso ao software VOSviewer (versão 1.6.20), de forma a construir um mapa com as relações entre os vários termos e a sua associação a clusters de áreas temáticas. Num estudo comparativo sobre a utilização e o desenvolvimento de três ferramentas - CiteSpace, HistCite e VOSViewer - esta última é mais frequentemente utilizada (Pan et al., 2018). De acordo com van Eck & Waltman (2014), esta metodologia analisa a distância entre os vários termos selecionados, sendo que quanto menor for a distância entre dois termos, mais forte é a relação entre eles. As cores do mapa representam os vários clusters de áreas temáticas, sendo que os termos com a mesma cor fazem parte do mesmo cluster e, por isso, estão mais fortemente relacionados entre si, em comparação com a contagem binária dos termos, que consiste em verificar se o termo está presente ou ausente em cada documento analisado
3. Resultados
Esta secção contém uma apresentação detalhada dos resultados da análise bibliométrica realizada. Em primeiro lugar, são apresentados os resultados da análise descritiva. Em particular, o número de artigos publicados por ano; o top 10 de publicações por revista, instituição, país e área temática. São também identificados os 10 artigos mais citados. De seguida, são apresentados os resultados da análise por área temática.
3.1. Análise Descritiva
Na Figura 1, apresenta-se o número de publicações sobre o tema em análise. Verifica-se uma tendência de crescimento das publicações desde 2011, sendo 2023 o ano de pico (1101), com mais um artigo publicado do que em 2021 (1100). Os dois primeiros artigos neste domínio foram publicados em 2000. De realçar que apesar da pesquisa ter sido efetuada a 15 de dezembro de 2023 já havia artigos indexados a 2024.
Sustainability Switzerland e Sustainable Cities and Society são as revistas com mais artigos publicados, com um total de 345 e 165 artigos, respetivamente. Todas as revistas no top 10 publicaram mais de 70 artigos cada (Figura 2).
A Figura 3 mostra que a Índia é o país com mais publicações (954), o que corresponde a 13,8% da amostra. Segue-se a Itália (648) e os Estados Unidos (635). Os países do top 10 publicaram todos mais de 230 artigos.
As áreas disciplinares mais representativas são as Ciências da Computação, com 3352 documentos, e as Engenharias, com 2889 documentos. As áreas disciplinares com menor representatividade são Economia, Econometria e Finanças.
Como mostra a figura 4, do total de 6891 publicações, 45% são publicadas em revistas científicas, 41% são artigos de conferências e 14% são capítulos de livros.
Para avaliar o potencial impacto que os artigos que compuseram a amostra do estudo têm sobre cidades inteligentes e sustentabilidade, foram analisados os 10 artigos com maior número de citações. A Tabela 1 apresenta o título, revista que o publicou, autores, ano e número de citações dos artigos mais citados em ordem decrescente. Os 10 artigos mais citados foram publicados entre 2011 e 2018. Embora o número de publicações sobre cidades inteligentes e sustentabilidade tenha aumentado significativamente entre 2016 e 2023. Os artigos mais citados vêm de uma variedade de revistas, com os dois mais citados vindo do Journal of Urban Technology e o quarto e quinto mais citados vindo do Sustainable Cities and Society.
Título | Revista | Autores/ano | Nº citações |
---|---|---|---|
Smart cities in Europe | Journal of Urban Technology | (Caragliu et al., 2011) | 2163 |
Smart cities: Definitions, dimensions, performance, and initiatives | Journal of Urban Technology | (Albino et al., 2015) | 2010 |
The real-time city? Big data and smart urbanism | GeoJournal | (Kitchin, 2014) | 1637 |
Towards sustainable smart cities: A review of trends, architectures, components, and open challenges in smart cities | Sustainable Cities and Society | (Silva et al., 2018b) | 959 |
Smart sustainable cities of the future: An extensive interdisciplinary literature review | Sustainable Cities and Society | (Bibri & Krogstie, 2017) | 822 |
Smart cities and the future internet: Towards cooperation frameworks for open innovation | Lecture Notes in Computer Science | (Schaffers et al., 2011) | 819 |
What are the differences between sustainable and smart cities? | Cities | (Ahvenniemi et al., 2016) | 802 |
Sensing as a service model for smart cities supported by Internet of Things | Transactions on Emerging Telecommunications Technologies | (Perera et al., 2014) | 742 |
Sustainable-smart-resilient-low carbon-eco-knowledge cities; Making sense of a multitude of concepts promoting sustainable urbanization | Journal of Cleaner Production | (De Jong et al., 2015) | 687 |
Internet of Things and Big Data Analytics for Smart and Connected Communities | IEEE Access | (Sun et al., 2016) | 667 |
3.2. Tópicos por grupos temáticos
Considerando a análise das áreas temáticas e utilizando o software VOSviewer e a técnica de coocorrência de termos, foram identificados vinte e oito mil seiscentos e quarenta e sete (28647) termos. Dos quais quinhentos e setenta e sete (577) tiveram um mínimo de vinte (20) ocorrências. A unidade de análise foi o conjunto das palavras-chave e o método de contagem foi a contagem total. Destas, 577 atingiram o limiar, resultando em um mapa, distribuído em seis (6) clusters. Isso pode ser observado na Figura 5.
O primeiro cluster, de cor vermelha na Figura 5, composto por cento e sessenta e oito (168) termos, associa as cidades inteligentes e a sustentabilidade com a qualidade de vida. As cidades inteligentes atraem uma atenção considerável de académicos e planeadores urbanos, principalmente no contexto das políticas de desenvolvimento urbano. Baseadas em inovações tecnológicas, as cidades inteligentes são ecossistemas complexos que têm o potencial de melhorar a habitabilidade, a funcionalidade e a sustentabilidade urbanas através de uma rede de pessoas, processos e dados. No entanto, de acordo com académicos e urbanistas, o conceito de cidade inteligente favorece os produtos e soluções tecnológicas em detrimento dos utilizadores finais e da sua qualidade de vida (Macke et al., 2018). A investigação conduzida por Ismagilova et al. (2019) centrou-se em vários aspetos das cidades inteligentes: mobilidade inteligente, vida inteligente, ambiente inteligente, cidadãos inteligentes, governo inteligente e arquitetura inteligente, bem como em tecnologias e conceitos relacionados. A discussão também se centra no alinhamento das cidades inteligentes com os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU. De acordo com Ismagilova et al. (2019), as cidades inteligentes usam tecnologias de informação e comunicação para melhorar: a qualidade de vida de seus cidadãos, a economia local, o transporte, a gestão do tráfego, o meio ambiente e a interação com o governo. Na investigação realizada por Cesar et al. (2019), o estudo tem como objetivo analisar a influência dos fatores de governança inteligente na qualidade de vida no contexto das cidades inteligentes da região Nordeste do Brasil. Os fatores de transparência, colaboração, participação e parceria, comunicação e accountability foram mensurados em termos de qualidade de vida. Os resultados da pesquisa indicam fortes e importantes relações entre os construtos. Entre os resultados da pesquisa, os autores destacam a identificação de linhas estratégicas que podem ajudar os líderes de cidades inteligentes a desenvolver políticas públicas e ações executivas municipais que envolvam a população no alcance de metas de desenvolvimento sustentável. Esses achados podem contribuir para o aprimoramento da governança das cidades inteligentes, a fim de melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. Na perspetiva de uma cidade inteligente, a pesquisa realizada por Macke et al. (2018) conclui que o sucesso nesta área pode ser alcançado através de quatro fatores (relações socio estruturais, bem-estar ambiental, bem-estar material e integração comunitária) revelados pela análise. De acordo com os resultados do estudo, o cumprimento destes critérios de sucesso melhoraria a qualidade de vida dos cidadãos e criaria uma comunidade mais forte dentro da cidade. Finalmente, o estudo fornece informações relevantes para investigadores sociais e urbanistas, identificando fatores que influenciam as perceções de qualidade de vida e fornece também elementos para o debate político e académico.
O segundo cluster, a verde na Figura 5, é composto por cento e catorze (114) termos e relaciona a Internet das Coisas (IoT) com Big Data e a computação em nuvem. A expansão dramática da urbanização nas cidades modernas exige soluções inteligentes para resolver questões críticas como a mobilidade, os cuidados de saúde, a energia e as infraestruturas civis. A IoT é uma das tecnologias facilitadoras mais promissoras para enfrentar estes desafios, criando uma rede mundial maciça de objetos físicos interligados, dotados de eletrónica, software, sensores e conetividade de rede (Alavi et al., 2018). Bibri & Krogstie (2017) propõe um quadro analítico para aplicações centradas em dados possibilitadas pela IoT para promover a sustentabilidade ambiental no contexto de cidades inteligentes e sustentáveis. Shahat Osman (2019) apresenta um quadro de análise de grandes volumes de dados para cidades inteligentes denominado Painel de Análise de Dados de Cidades Inteligentes. A conceção deste painel baseia-se na resposta às seguintes questões de investigação: Quais são as características dos quadros de análise de big data aplicados em cidades inteligentes na literatura, e quais são os princípios essenciais de conceção que devem orientar a conceção de quadros de análise de big data para servir os objetivos das cidades inteligentes? Para responder a estas questões, foi efetuada uma revisão sistemática da literatura sobre estruturas de análise de grandes volumes de dados em cidades inteligentes. O quadro proposto introduz novas funcionalidades na estrutura de análise de grandes volumes de dados, representadas pela gestão e agregação de modelos de dados. Na era da IoT e dos ecossistemas das cidades inteligentes, o estacionamento inteligente e as soluções inovadoras conexas são necessários para tornar as cidades do futuro mais sustentáveis. O estacionamento inteligente, com a ajuda de sensores incorporados nos automóveis e nas infraestruturas das cidades, pode aliviar os estrangulamentos no estacionamento e proporcionar a melhor qualidade de serviço e benefícios aos cidadãos. No entanto, há vários aspetos de conceção que têm de ser bem estudados e analisados antes de implementar tais soluções. Na investigação conduzida por Al-Turjman & Malekloo (2019), os autores classificaram os sistemas de estacionamento inteligentes de acordo com fatores de conceção suaves e duros. Eles enfatizam a importância da confiabilidade dos dados, segurança, privacidade e outros fatores críticos de design em tais sistemas. Foram exploradas as tendências emergentes no ecossistema de estacionamento, com foco na interoperabilidade e partilha de dados. Apresentam questões de investigação em aberto sobre o estado atual dos sistemas de estacionamento inteligentes e recomendam um modelo concetual para o estacionamento híbrido. A IoT para cidades inteligentes tem muitos domínios diferentes e depende de diferentes sistemas subjacentes para o seu funcionamento. Na investigação conduzida por Syed et al. (2021), os autores fornecem uma cobertura holística da IoT nas cidades inteligentes. Discutem os componentes fundamentais que compõem o panorama das cidades inteligentes baseadas na IoT, seguidos das tecnologias que permitem estes domínios em termos das arquiteturas utilizadas, das tecnologias de rede empregues e dos algoritmos artificiais utilizados nos sistemas de cidades inteligentes baseados na IoT. Analisam as práticas e aplicações mais comuns em vários domínios de cidades inteligentes e identificam os desafios enfrentados na implantação de sistemas IoT para cidades inteligentes, juntamente com medidas de mitigação.
O terceiro cluster, de cor azul escura na Figura 5, é composto por noventa e nove (99) termos e associa as cidades inteligentes e a sustentabilidade à eficiência energética. Os países em desenvolvimento enfrentam o desafio constante de alcançar tanto o crescimento económico como a proteção ambiental. Haverá uma escassez de eletricidade no mundo devido ao aumento exponencial da procura de eletricidade provocado pelo rápido crescimento da população mundial. Com o desenvolvimento da IoT, mais dispositivos inteligentes serão integrados em edifícios residenciais em cidades inteligentes que participam ativamente no mercado da eletricidade através de programas de resposta à procura para gerir eficientemente a energia a fim de satisfazer esta procura crescente de energia (Hafeez et al., 2020). O estudo realizado por Guo et al. (2022) toma como ponto de partida uma política-piloto de cidade inteligente na China e avalia sistematicamente os efeitos da construção de uma cidade inteligente na poupança de energia e na redução das emissões de CO2, utilizando um método progressivo de diferença-em-diferenças. Os resultados da investigação mostram que a construção de cidades inteligentes reduziu significativamente as emissões de CO2 per capita, com um efeito de redução de aproximadamente 18,42 pontos percentuais logarítmicos. Esta conclusão permanece válida no teste placebo, no método da variável instrumental e numa série de verificações de robustez. Concluíram também que existe uma relação em forma de U invertido entre a eficiência energética e as emissões de CO2 per capita, e que a maioria das cidades chinesas ultrapassou o ponto de inflexão; que a construção de cidades inteligentes permite obter poupanças de energia e reduzir as emissões de CO2 per capita através da melhoria da eficiência energética; e que o efeito da construção de cidades inteligentes na redução das emissões de CO2 é mais evidente nas cidades com níveis administrativos mais elevados, níveis mais elevados de progresso tecnológico e de inovação ecológica, e níveis mais elevados de estrutura industrial avançada. Esta investigação fornece uma base empírica sobre a forma como os países ou regiões em desenvolvimento podem avançar para o desenvolvimento sustentável através da transformação digital e inteligente e demonstra a importância de prever a construção de novas infraestruturas, como as cidades inteligentes, na perspetiva de uma economia de baixo carbono. Em Addanki & Venkataraman (2017), os autores apresentam uma análise detalhada de como o desenvolvimento urbano, particularmente na Índia, pode ser planeado no contexto da transformação urbana sustentável, das alterações climáticas e das visões urbanas futuras. No estudo realizado por Strielkowski et al. (2020), os autores tiveram como objetivo fornecer uma análise dos determinantes da eficiência económica e avaliar os pré-requisitos para a segurança energética das cidades inteligentes. Os principais métodos do estudo incluem uma análise económica das melhorias de infraestruturas que conduzem a uma redução da procura de energia das cidades inteligentes, representada pelo sistema inteligente de iluminação pública com díodos emissores de luz (LED).
O quarto cluster, de cor amarela na Figura 5, é composto por setenta e oito (78) termos e associa a informação e a comunicação ao crescimento urbano. As infraestruturas verdes urbanas desempenham um papel cada vez mais importante no planeamento do desenvolvimento urbano sustentável, uma vez que fornecem importantes serviços ecos sistémicos reguladores e culturais. O termo "cidade inteligente" define o novo ambiente urbano, concebido para o desempenho através das TIC. Para enfrentar os grandes desafios trazidos pela urbanização, a cidade inteligente tornou-se um conceito omnipresente para sustentar o crescimento urbano e económico, ao mesmo tempo que aborda as questões ambientais e sociais criadas por esse crescimento (Law & Lynch, 2019). As cidades de todo o mundo estão interessadas em utilizar as TIC para resolver os seus problemas urbanos. O conceito de cidade inteligente tem sido amplamente adotado como solução, mas a gama de serviços oferecidos nas cidades inteligentes varia consoante a cidade e a região. As diferenças devem-se a uma série de fatores, incluindo características urbanas, necessidades sociais e estruturas governamentais. Na Coreia, o Programa Estratégico Nacional de Cidades Inteligentes foi lançado para estabelecer um novo ecossistema tecnológico e normas para cidades inteligentes (Yang et al., 2021). O estudo realizado por Yang et al. (2021) apresenta os serviços de cidades inteligentes que estão a ser desenvolvidos pelo Programa Estratégico Nacional de Cidades Inteligentes coreano e compara-os com os serviços oferecidos em 15 cidades inteligentes na Europa, Ásia e América do Norte.
O quinto cluster, de cor púrpura na Figura 5, é composto por sessenta e sete (67) termos e associa as alterações climáticas e a poluição à sustentabilidade e às cidades inteligentes. Cidade limpa, cidade verde e cidade sustentável são slogans que descrevem a nossa esperança de viver em áreas livres de poluição. O impacto da globalização e da industrialização tem sido objeto de investigação em todo o mundo devido à enorme mudança de paradigma que estão a provocar. Estes fenómenos são também preocupantes porque as cidades consomem cerca de três quartos dos recursos naturais do mundo e geram três quartos da sua poluição e resíduos. As cidades precisam de se tornar mais inteligentes, aplicando soluções inovadoras aos desafios da urbanização em grande escala e encontrando novas formas de criar cidades habitáveis, competitivas e autossuficientes. Neste sentido, o surgimento de cidades inteligentes pode ser uma onda de transformação muito mais ampla que está prestes a atingir o mundo inteiro. A mitigação das alterações climáticas globais, e a sustentabilidade ambiental em geral, dependem, portanto, de forma crítica, das práticas de sustentabilidade dos residentes urbanos. No trabalho desenvolvido por Wang & Moriarty (2019), os autores analisam o potencial de políticas de cidades inteligentes para ajudar a alcançar economias significativas de energia (e gases de efeito estufa) no transporte urbano e na construção e operação de edifícios. O trabalho desenvolvido por Balova et al. (2021) tem como objetivo identificar as principais áreas de formação de uma cidade inteligente e sustentável, que podem contribuir para a proteção do meio ambiente. O documento apresenta os resultados e as definições de uma cidade inteligente e da sua variante, uma cidade inteligente sustentável. Com base num inquérito a especialistas, foram identificadas as principais áreas de formação de uma cidade inteligente e sustentável, foram formuladas algumas medidas recomendadas para a implementação nessas áreas e foram apresentados exemplos da sua implementação na prática internacional. Em Andrés (2017), o autor apresenta um novo modelo de desenvolvimento de redes comunitárias sem fios, enquadrado nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, para conseguir a transformação das cidades em zonas ambientalmente sustentáveis e tomar medidas para combater as alterações climáticas; este modelo baseia-se na utilização de energias renováveis, protocolos de encaminhamento em malha, monitorização da qualidade do ar e de variáveis ambientais, IoT e aplicação de métodos educativos para premiar as zonas menos poluídas. Em Ismail et al. (2021), discute-se a utilização da inteligência artificial, em particular de métodos de aprendizagem automática, para prever e alertar para a poluição em zonas urbanas. São utilizadas tanto a aprendizagem supervisionada como a não supervisionada. Os autores centram o estudo em quatro domínios: poluição atmosférica, qualidade da água, ruído urbano e gestão do tráfego e dos resíduos.
Por último, a cor azul-clara na Figura 5 é composta por cinquenta e um (51) termos e associa os transportes urbanos à sustentabilidade. O conceito de cidade inteligente é visto como parte do futuro urbano, integrando avanços tecnológicos, colaboração intersectorial e mercados abertos inovadores com objetivos estratégicos e ambições para alcançar um desenvolvimento urbano sustentável. A mobilidade inteligente é considerada um elemento essencial da cidade inteligente, uma vez que os sistemas de transportes urbanos devem tornar-se mais eficientes e sustentáveis. No trabalho desenvolvido por Müller-Eie & Kosmidis (2023), os autores identificaram estratégias e medidas para catorze cidades de média dimensão na Rede Nórdica de Cidades Inteligentes, identificando objetivos de mobilidade inteligente juntamente com medidas de mobilidade propostas ou implementadas. Avaliaram também a forma como estão alinhados com a mobilidade sustentável e a sua eficácia, utilizando dois quadros analíticos: a) os objetivos do Planeamento da Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS) da UE e b) os objetivos S.M.A.R.T.. Ao fazê-lo, avaliaram em que medida as políticas e medidas de mobilidade inteligente nas cidades inteligentes nórdicas contribuem para a mobilidade e o desenvolvimento urbano sustentável, e de que forma contribuem para alcançar os objetivos das cidades inteligentes e sustentáveis em termos de viabilidade e responsabilidade. Devido às restrições ambientais globais, as cidades, e especialmente os transportes urbanos, têm de optar por soluções ecológicas. Os sistemas sustentáveis de partilha de bicicletas tornaram-se uma parte importante das infraestruturas de transporte mundiais, como alternativa aos automóveis movidos a combustíveis fósseis nas áreas metropolitanas (Subramanian et al., 2023). Uma das atividades mais amplamente apoiadas é a conceção e implementação de soluções de poupança de energia para a mobilidade urbana. As pessoas desempenham um papel importante neste domínio, especialmente os jovens. No estudo realizado por Grzesiuk et al. (2023), aplicado à Geração Z, os autores concluíram que os comportamentos de energia sustentável relacionados com a compra, utilização e eliminação de aparelhos elétricos, bem como os comportamentos de conservação de energia relacionados com a mobilidade, resultantes da escolha do modo de transporte para se deslocar na cidade, influenciam a avaliação da importância das soluções de mobilidade energeticamente eficientes disponíveis. No trabalho desenvolvido por Cartenì et al. (2023), o objetivo foi propor uma arquitetura de modelo de Big Data e computação em nuvem para estimativa de procura de viagens origem-destino multiclasse, baseada na aplicação de um algoritmo de tráfego de dois estágios usando contagens de tráfego em redes congestionadas, também para propor uma política sustentável em escala urbana. A metodologia proposta foi aplicada a um estudo de caso real em termos de estimativa da procura de viagens na cidade de Nápoles (Itália), também com o objetivo de verificar a eficácia de uma política sustentável em termos de redução do congestionamento do tráfego em cerca de 20% nas rotas. Os resultados obtidos, embora preliminares, sugerem a utilidade da metodologia proposta em termos da sua capacidade de estimar a procura de viagens em tempo real/períodos de tempo pré-fixados.
4. Discussão e Conclusões
O princípio das cidades inteligentes tem recebido cada vez mais atenção em estudos recentes, especialmente durante a pandemia da COVID-19, conforme destacado por Sharifi, Khavarian-Garmsir e Kummitha (Sharifi et al., 2021), embora também tenha sido criticado pela sua ênfase tecnocrática (Kitchin, 2014). No entanto, o subcampo das cidades inteligentes e sustentáveis, onde a sustentabilidade ambiental e o progresso tecnológico estão interligados, continua relativamente pouco explorado. Até 2050, prevê-se que as populações urbanas representem 66% da população total mundial, um aumento significativo em relação aos atuais 54% (Toli & Murtagh, 2020). Este crescimento realça a necessidade de as cidades gerirem estrategicamente os seus recursos para o aumento da população.
O objetivo desta pesquisa foi realizar uma análise bibliométrica de publicações sobre cidades inteligentes e sustentabilidade. No que diz respeito ao comportamento das publicações ao longo do período analisado, verifica-se uma tendência ascendente, sobretudo a partir de 2010, sendo 2023 o ano com maior número de publicações. Sustainability Switzerland e Sustainability Cities and Society foram as revistas com maior número de artigos publicados. Porém, os 2 artigos mais citados são do Journal of Urban Technology. A Índia é o país com maior número de artigos publicados, seguida pela Itália. Os estudos podem ser agrupados em seis grandes blocos de conhecimento (clusters): Qualidade de Vida, IoT, Eficiência Energética, Crescimento Urbano, Mudanças Climáticas e Poluição e Transporte Urbano.
Na análise bibliométrica nesta área foi encontrado apenas um estudo (Dias, 2018). Este estudo apresentado numa conferência, faz uma análise bibliométrica sobre a investigação em cidades inteligentes em Portugal e Espanha. Estudos sobre esse tema foram identificados na revisão sistemática da literatura, mas não na análise bibliométrica. Houve inúmeras revisões sistemáticas da literatura sobre este assunto, tais como (Abedi et al., 2023); (Antonios et al., 2023), entre muitos outros.
Na minha opinião, a análise bibliométrica da literatura existente sobre cidades inteligentes sustentáveis é uma contribuição valiosa para o estado da arte atual. No entanto, uma análise mais aprofundada da abordagem utilizada permite-nos identificar algumas limitações. As limitações podem ser justificadas pelo facto de termos utilizado apenas a base de dados Scopus como fonte de informação, não incluindo outras fontes relevantes como a Web of Science, e pelo facto de apenas termos analisado artigos de revistas, capítulos de livros e artigos de conferências, ignorando assim a outra literatura existente sobre o assunto, que poderia fornecer alguns insights interessantes sobre o tema das cidades inteligentes sustentáveis.
Com base no exposto, as possibilidades de estudos futuros são inúmeras e poderiam ser enriquecidas ampliando a busca, sem limitar o tipo de documento, para incluir todos os tipos de publicações em diversas bases de dados, incluindo a Web of Science e a Scopus.