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RISTI - Revista Ibérica de Sistemas e Tecnologias de Informação

versão impressa ISSN 1646-9895

RISTI  no.56 Porto dez. 2024  Epub 31-Dez-2024

https://doi.org/10.17013/risti.56.35-49 

Artigo

Atividades Literárias com Café: jogo-não-digital para apoiar a aprendizagem de Diagrama de Atividades segundo a UML

Literary Activities with Coffee: A Non-Digital Game to Support Learning Activity Modeling According to UML

Giliane Bernardi1 

Andre Zanki Cordenonsi2 

1 Departamento de Computação Aplicada, Universidade Federal de Santa Maria, Av. Roraima n. 1000, 97105-900, Santa Maria, Brasil. giliane.bernardi@ufsm.br

2 Departamento de Arquivologia, Universidade Federal de Santa Maria, Av. Roraima n. 1000, 97105-900, Santa Maria, Brasil. andre.cordenonsi@ufsm.br


Resumo

Esse artigo apresenta o desenvolvimento e avaliação de um jogo não-digital voltado para o apoio à aprendizagem de Diagrama de Atividades segundo a UML, uma linguagem amplamente utilizada para modelagem de software. O jogo foi desenvolvido a partir do processo ENgAGED e foi avaliado com estudantes de uma disciplina de Engenharia de Software utilizando o modelo MEEGA+. Ao ser avaliado, os estudantes afirmaram que o jogo atingiu os objetivos de maneira bastante positiva no que se refere aos critérios de qualidade Usabilidade e Experiência do Jogador e que julgaram estar aprendendo a partir do jogo. Como trabalhos futuros, destaca-se a adaptação do jogo, já que ele foi pensado para ser replicável para outros cenários e contextos educacionais.

Palavras-chave: Diagrama de Atividades; Jogo Não-Digital; UML; Engenharia de Software.

Abstract

This paper presents the development and evaluation of a non-digital game aimed at supporting the learning of Activity Diagram according to UML, a language widely used for software modeling. The game was developed following the ENgAGED process and was evaluated with students from a Software Engineering course using the MEEGA+ model. In the evaluation, the students reported that the game achieved its objectives in a very positive manner regarding the quality criteria of Usability and Player Experience, and they believed they were learning from the game. Future work includes adapting the game, as it was designed to be replicable for other scenarios and educational contexts.

Keywords: Activity diagram; Non-digital game; UML; Software engineering.

1. Introdução

Entre os conteúdos abordados em disciplinas de Engenharia de Software (ES), encontra-se a Engenharia de Requisitos, que busca compreender as necessidades para um determinado sistema, trazendo estratégias para documentar e descrever tais requisitos. Nessa perspectiva de formalização dos requisitos, parte do conteúdo envolve explorar modelagem de software, uma vez que representar um sistema por meio de modelos permite compreender suas funcionalidades e comportamento antes da implementação.

Atualmente, a UML (Unified Language Modelling) tem sido uma das linguagens de modelagem mais comumente trabalhada em sala de aula e pela indústria, destacando-se por ser uma linguagem amplamente conhecida e utilizada na área de Engenharia de Software e desenvolvimento de sistemas, permitindo a modelagem de aspectos de um sistema em diferentes graus de abstração por meio de um conjunto amplo de diagramas. No entanto, para Silva et al. (2020), a aprendizagem de modelagem de software com a UML é considerada difícil, devido à complexidade de seus conceitos, o que torna necessário pensar em estratégias que mitiguem as dificuldades dos estudantes neste processo.

No que concerne ao espaço de sala de aula, a abordagem mais utilizada para trabalhar os diagramas da UML é a formada por um momento inicial teórico, no qual os conceitos acerca dos diagramas são apresentados aos estudantes, explorando objetivos, semântica e sintaxe de construção dos mesmos, seguido por um momento de realização de exercícios, no qual são criadas situações-problema, que envolvem um conjunto de requisitos estabelecidos para um determinado cenário, e o estudante deve resolver os mesmos desenvolvendo o diagrama correspondente. Apesar de ser considerada uma estratégia interessante por envolver um elemento adicional ao conteúdo teórico, a realização de exercícios, requisitando do estudante sua participação no que é considerada uma tarefa cognitiva de nível mais alto, ainda assim encontra-se no campo de abordagens frequentemente utilizadas em sala de aula, que acabam por desmotivar os estudantes, que não visualizam na resolução de exercícios uma abordagem prática do conhecimento.

Von Wangenheim e Von Wangenheim (2012) afirmam que, para que o estudante possa aprender de forma mais “profunda”, são necessárias estratégias que o “levem a exercitar a aplicação do conhecimento”, “simulando a aplicação do conhecimento”. No que concerne ao foco deste artigo, Feichas e Seabra (2022) discutem que é necessário encontrar estratégias pedagógicas diversas para minimizar a complexidade envolvida no ensino de UML, bem como aumentar o interesse dos estudantes no processo de aprendizagem. Nesse sentido, a utilização de jogos, já consolidada no contexto educacional, tem passado a se destacar também no ensino e aprendizagem na área de Engenharia de Software, sendo que pesquisas indicam que os estudantes têm uma visão positiva do uso de jogos para a aprendizagem (Udeozor et al., 2023). Para Muñoz e Gasca-Hurtado (2023) trazer elementos de jogos pode se constituir como uma estratégia eficaz para aumentar as habilidades dos futuros profissionais.

Finalmente, destaca-se também o estudo apresentado por Souza e França (2016), onde os autores argumentam que jogos para o ensino de Engenharia de Software tem se apresentado como uma estratégia instrucional de bastante sucesso, mas que é necessário que os mesmos promovam satisfação e motivação, para além de simplesmente atenderem aos objetivos educacionais.

Considerando o exposto, este artigo apresenta o desenvolvimento de um jogo não-digital, criado para apoiar o ensino e aprendizagem de UML, especificamente para trabalhar um dos seus diagramas, o Diagrama de Atividades (DA), que, segundo Wazlawick (2016), pode ajudar na compreensão de quais são as atividades e os atores envolvidos nos principais processos de negócio de uma organização. O jogo foi planejado de forma a aliar os objetivos educacionais de ensinar aos estudantes como elicitar requisitos para a construção de um diagrama de atividades, bem como para trabalhar a sintaxe e regras para construção do mesmo, com questões de ludicidade e diversão, consideradas essenciais para engajar o estudante no processo de ensino e aprendizagem.

2.Jogos e o Ensino de UML

Os trabalhos correlatos apresentados nessa seção foram escolhidos por apresentarem características que foram buscadas para o desenvolvimento do jogo apresentado neste artigo. Gomes et al. (2023) apresentam um jogo para trabalhar os conceitos teóricos associados a UML e Engenharia de Software, por meio de um quiz imerso em um mundo virtual 3D, no qual o estudante é um engenheiro de software que precisa salvar uma cidade que está prestes a ser destruída por uma bomba instalada por um ex-membro da sua equipe que resolveu se vingar. A bomba é desarmada por meio de um código que, para ser desvendado, exige os conhecimentos de ES do jogador. Como contribuições, os alunos que avaliaram o jogo destacaram sentir um maior engajamento por poderem explorar um ambiente enquanto jogavam, potencializando o senso de presença e imersão, que também foi destacado por conta do enredo envolvente.

Em Almeida et al. (2023), os autores apresentam um jogo voltado para apoiar o ensino e aprendizagem de Diagrama de Classes, um dos modelos mais importantes da UML, por meio de um jogo de tabuleiro competitivo, que também trabalha com a mecânica de perguntas e respostas, onde os jogadores precisam se deslocar em um tabuleiro para coletar recursos educacionais que lhes permitam resolver um desafio. Como contribuições, após a realização de sessões de testes, os autores destacam, em especial, a possibilidade de adaptar o jogo para trabalhar outros temas, pois as regras são independentes de conteúdo, bem como a diversão gerada pela adição de recursos lúdicos, como coleta de tesouros, batalhas e sabotagens aos adversários.

Com o foco em modelagem de atividades, em Costa et al. (2019) é apresentado o jogo Activities in Space, desenvolvido para plataforma web e que apresenta três partes principais: a história, que apresenta o personagem principal e seu objetivo no jogo; a seleção da missão, onde o jogador escolhe a missão que irá jogar, dentro de um total de 6 missões existentes; e a missão propriamente dita, onde o jogador monta um diagrama de atividades para especificar passos que o personagem deve seguir para recuperar partes da sua nave e/ou estrela. Na tela das missões são apresentados os elementos de um DA, os quais são utilizados pelo estudante para montar o diagrama, arrastando os mesmos para uma parte central destinada a essa formação. Ao terminar de montar o diagrama, o estudante clica em um botão para executar o diagrama, que faz com que o personagem realize as atividades em uma animação que é exibida na tela, de forma a verificar se a missão foi concluída com sucesso.

Silva et al. (2017) apresentam o jogo analógico baseado em cartas ActGame (Activity Diagram Game), que tem como objetivo auxiliar estudantes na identificação dos elementos de um DA, bem como na construção de um diagrama a partir de uma descrição textual. A ideia é que o jogador ou grupo discutam o problema e, após, realizem a modelagem do diagrama seguindo etapas, para as quais existem cartas que apresentam passos para a modelagem, perguntas-guia, dicas e exemplo. Após avaliação com estudantes, os autores concluíram que o jogo teve um efeito positivo no que diz respeito ao seu design, a interação social proporcionada e a utilidade para aprendizagem de diagrama de atividades. No entanto, foram observados pontos de melhoria, em especial no que se refere ao fator diversão e imersão.

Os artigos apresentados demonstram que a utilização de jogos no ensino de UML e Engenharia de Software é uma estratégia eficaz para facilitar a compreensão de diversos modelos de UML, além de contribuir significativamente para o engajamento e aprendizado dos alunos. Esses estudos sugerem que a abordagem lúdica não apenas melhora a assimilação dos conceitos, mas também torna o processo de ensino mais dinâmico e interativo. Dessa forma, o uso de jogos foi adotado nesse presente trabalho como uma forma de diversificar as estratégias de ensino em relação à Engenharia de Requisitos e o Diagrama de Atividades.

3. Aspectos Metodológicos

O jogo apresentado foi desenvolvido tomando como referência o processo de desenvolvimento de jogos para o ensino de computação ENgAGED (Battistella, 2016), que contempla cinco fases, sendo duas relacionadas à análise e projeto do ponto de vista do design educacional, tomando como princípios o design instrucional (Filatro e Cairo, 2015); uma voltada para o desenvolvimento do jogo; e as duas finais para execução e avaliação dos resultados.

Para a avaliação do jogo foi utilizado o modelo MEEGA+ (Model for the Evaluation of Educational Games), que sistematiza a percepção dos estudantes com relação à qualidade do jogo no que concerne aos fatores experiência do jogador e usabilidade (Petri et al., 2019). Cada fator apresenta um conjunto de dimensões, sendo que para esta avaliação foram utilizadas as dimensões Estética, Aprendizibilidade e Operabilidade para o fator Usabilidade; e as dimensões Confiança, Desafio, Satisfação, Interação Social, Diversão, Atenção Focada, Relevância e Aprendizagem Percebida, para o fator Experiência do jogador, totalizando 30 questões, respondidas por meio de uma escala Likert de 5 pontos, indo de discordo totalmente a concordo totalmente, além de duas questões para traçar o perfil dos estudantes.

O jogo foi aplicado em sala de aula com uma turma da disciplina de Engenharia de Software, do curso de Engenharia da Computação da Universidade Federal de Santa Maria, uma universidade pública do Brasil. Na ocasião da aplicação, os estudantes estavam trabalhando os conteúdos associados a UML, e tinham tido acesso prévio aos conteúdos sobre o tema.

Participaram da atividade 19 alunos, que, inicialmente, se organizaram em equipes. Foram disponibilizados 4 kits impressos do jogo, permitindo que 8 equipes fossem formadas, duas por tabuleiro. Após, a professora explicou a dinâmica e trouxe as informações essenciais sobre o funcionamento do jogo. Além disso, todos receberam um livro de regras, para que pudessem consultar sempre que necessário. O jogo foi aplicado no decorrer de dois períodos de aula, totalizando 100 minutos. O tempo foi considerado suficiente, tendo sido usado para contextualizar a atividade, apresentar o jogo, organizar as equipes, preparar o ambiente do jogo, executar todo o jogo e finalizar a atividade, ao término da aula, com algumas considerações finais feitas pela professora.

Ao término, os estudantes responderam ao questionário que buscou avaliar a qualidade do jogo quanto à sua usabilidade e a experiência dos estudantes com o jogo, sendo que, dos 19 participantes, 13 responderam ao questionário, disponibilizado via Google Forms, após a execução. O fato de o questionário ter sido aplicado após a atividade e não em sala de aula pode ter ocasionado a não totalidade de respostas.

4.Apresentação do Jogo Atividades Literárias com Café

O desenvolvimento do jogo, denominado Atividades Literárias com Café, iniciou com a definição dos objetivos educacionais, seguindo as etapas propostas pelo ENgAGED. Conforme descrito na seção anterior, o jogo foi idealizado por uma professora da área de Engenharia de Software, que participou de todas as etapas de planejamento, desenvolvimento e avaliação do mesmo. É um jogo não-digital, pensado para ser jogado de forma competitiva-colaborativa, no qual equipes competem para atingir o objetivo e ganhar o jogo. Desta forma, buscou-se trazer o aspecto da colaboração entre os participantes de uma equipe pela resolução do desafio, ao mesmo tempo em que é incluído o elemento da competição. A busca por um jogo colaborativo tinha como principal razão integrar questões relacionadas ao trabalho em equipe, onde os alunos são encorajados a interagirem para a resolução do desafio, forma de trabalho com a qual estarão frequentemente expostos no futuro profissional. Dessa forma, desenvolver as competências de trabalho em equipe e habilidades sociais são fundamentais (Poy-Castro et al., 2015), e o jogo busca aliar esta prática em seu cenário.

Considerando os objetivos educacionais, pretende-se proporcionar aos estudantes uma estratégia diversificada para consolidar o processo de modelagem de atividades de acordo com a UML, por meio do desenvolvimento de um diagrama de atividades, que constitui o objetivo final do jogo. Como público-alvo, tem-se estudantes da área de computação de ensino superior, que estejam inseridos em disciplinas voltadas para o ensino de UML, mais especificamente para o conteúdo de Modelagem de Atividades com UML.

A narrativa do jogo envolve a editora Páginas e Inspiração, que trabalha com uma equipe de escritores que publicam suas obras, seguindo um fluxo de atividades determinado pela editora. Esse fluxo envolve diferentes atores, como os próprios escritores, o editor-chefe, a equipe de revisão técnica e a equipe de design, que desempenham um conjunto de atividades, até a publicação de uma obra literária. O objetivo principal do jogo é ser a primeira equipe a elaborar um Diagrama de Atividades que represente o fluxo do processo de publicação de uma obra, de acordo com um briefing fornecido pela editora, que se trata de um texto que já era utilizado pela professora como exercício, trazendo informações que possibilitam o desenvolvimento de um diagrama de atividades. Este exercício foi adaptado e imerso em uma narrativa para o jogo, trazendo a ludicidade e buscando aumentar o engajamento dos estudantes ao invés da simples realização de um exercício sobre o tema.

A Figura 1 apresenta uma visão geral do jogo, com o tabuleiro ao centro, formado por 04 salas correspondendo a escritórios da editora, uma recepção e uma cafeteria. Ao lado, são apresentadas as cartas/recursos associadas a cada ambiente.

Figura 1 Tabuleiro do Jogo (Fonte: dos autores) 

A mecânica central do jogo envolve a coleta dos recursos necessários para criar o diagrama: estados iniciais e finais, atividades, pontos de ramificação e união, e pontos de bifurcação e junção. Os estudantes devem ler o texto, identificar o que é necessário para montar o diagrama e navegar por um tabuleiro em busca dos recursos. A exploração pelo tabuleiro ocorre por meio da rolagem de 02 dados e o deslocamento de uma miniatura pelo número de espaços correspondentes ao número obtido. Os recursos correspondem a cartas que são coletadas, sendo que, para finalizar, os estudantes devem desenhar o diagrama em uma folha-resposta, tendo em mãos todos os recursos. Não é possível apresentar a solução sem ter realizado a coleta de todos os recursos. Além disso, para vencer, não basta apenas ser a primeira equipe a entregar um diagrama, é necessário que o mesmo esteja completo e correto. Um gabarito é entregue junto com os componentes do jogo, mas se o jogo estiver sendo jogado em sala de aula, como foi pensado e executado neste primeiro momento, o professor pode acompanhar e avaliar o resultado apresentado.

Nos escritórios, é possível obter os recursos necessários para a construção do diagrama, da seguinte forma (Figura 2):

  • Sala 01 - Escritor: recursos que correspondem às atividades executadas pelos escritores da editora no processo (04 cartas de atividades);

  • Sala 02 - Editor-chefe: recursos que correspondem às atividades executadas pelo editor-chefe da editora (07 cartas de atividades);

  • Sala 03 - Equipe Técnica: recursos correspondentes às atividades realizadas pela equipe técnica da editora (02 cartas de atividades);

  • Sala 04 - Equipe de Design: recursos correspondentes às atividades realizadas pela equipe de design da editora (02 cartas de atividades).

Figura 2 Exemplos de Cartas de Atividades (Fonte: dos autores) 

Destaca-se que todas as Cartas de Atividades são relevantes para o desenvolvimento do diagrama solicitado, não existindo cartas que devem ser analisadas e descartadas pelos estudantes.

Já a sala da recepção tem como objetivo ser o ponto de coleta dos demais recursos que compõem um diagrama de atividades: estados iniciais e finais, pontos de ramificação e união e pontos de bifurcação e junção, que podem ser visualizados na Figura 3.

Figura 3 Exemplos de Cartas de Conexão de um Diagrama de Atividades (Fonte: dos autores) 

Os estudantes devem se organizar para percorrer os diferentes espaços, coletando os recursos que necessitam para a composição do diagrama. Existe um baralho completo de cartas para cada equipe que estiver jogando. No entanto, as mesmas são disponibilizadas de forma embaralhada e com a frente oculta, fazendo com que uma equipe, ao acessar uma das salas, receba aleatoriamente uma carta daquele tipo. Isso pode ocasionar o recebimento de cartas duplicadas, por exemplo, ou o recebimento de cartas em ordem diferente da sequência do processo, fazendo com que os jogadores precisem refletir sobre a construção do diagrama, bem como pensar em estratégias para obter os recursos faltantes.

É nesse momento que o jogo apresenta seus elementos lúdicos e que pretendem gerar a diversão durante a experiência de jogo. A Cafeteria da Editora Páginas e Café é responsável por conter cartas que permitem aos jogadores realizar uma série de ações, dentro das possibilidades que serão apresentadas a seguir.

As cartas de Combate (Figura 4A) são cartas que apresentam desafios para a equipe ou batalhas contra equipes adversárias pela aquisição de recursos (08 cartas). Essas cartas apresentam um texto composto de um desafio/combate lúdico, que promove a sensação de interação e competitividade entre as equipes. Já as cartas de Sabotagem (Figura 4B) são lançadas contra uma equipe adversária com o objetivo de que ela perca ou tenha um recurso roubado (07 cartas).

Figura 4 A) Exemplos de Cartas de Combate e B) Exemplos de Cartas de Sabotagem (Fonte: dos autores) 

As Cartas de Negociação (Figura 5A) são lançadas para estabelecer uma negociação que envolve a troca de recursos entre duas equipes (04 cartas). Através de uma interação lúdica envolvendo o tema da cafeteria, as equipes podem chegar a um acordo em relação às cartas de recursos que podem ser trocadas. As Cartas de Proteção (Figura 5B) podem ser utilizadas durante o turno do adversário para anular o efeito de uma carta de Sabotagem (04 cartas), promovendo a interação e a ludicidade.

Figura 5 A) Exemplos de Cartas de Negociação e B) Exemplos de Cartas de Proteção (Fonte: dos autores) 

Por fim, as cartas de Efeito Instantâneo (Figura 6) são cartas que podem ser jogadas durante o turno da equipe, antes ou depois da realização de sua ação (05 cartas). Essas cartas introduzem efeitos aleatórios e imprevisíveis no jogo, e foram criadas para aumentar a ludicidade e a sensação de competição entre as equipes.

Figura 6 Exemplos de Cartas de Eeito Instantâneo (Fonte: dos autores) 

Dessa forma, ao jogar em seu turno, uma equipe pode (a) decidir explorar o tabuleiro, indo em busca de recursos; ou (b) jogar uma dessas cartas, de acordo com a estratégia da equipe, podendo influenciar o andamento do jogo. No total foram desenvolvidas 27 cartas desse tipo, todas criadas tendo como inspiração o ambiente de cafeteria, onde as mesmas podem ser coletadas.

5.Avaliação e Discussão dos Resultados

Conforme apresentado na seção 3, o jogo foi aplicado com estudantes que estavam cursando a disciplina de Engenharia de Software e estavam trabalhando com o conteúdo de Modelagem de Atividades no momento de sua utilização. Em um momento prévio, o conteúdo sobre o tema foi disponibilizado pela professora da disciplina no formato de um conjunto de slides, usualmente trabalhados em uma aula presencial sobre o tema, bem como de uma videoaula com apresentação do conteúdo e com dois exemplos comentados. Todos estes conteúdos foram disponibilizados no ambiente Moodle e foi solicitado aos estudantes que interagissem com o conteúdo previamente à aula. Durante a aula, os alunos seguiram diretamente para a execução do jogo, sendo que na aula seguinte os conteúdos foram consolidados, tirando as principais dúvidas e realizando novos exercícios para ampliar a prática.

Os resultados são apresentados na sequência, acompanhados de reflexão da professora pesquisadora a partir das observações feitas no decorrer da execução. Quanto ao perfil dos estudantes que responderam ao questionário, 10 possuem entre 18 e 25 anos e 3 possuem mais de 25 anos; 10 estudantes eram do sexo masculino e 03 do sexo feminino. Ainda, poucos têm o hábito de jogar regularmente jogos não-digitais, 61% joga raramente e 23% joga mensalmente jogos não-digitais, sendo que apenas 8% joga semanalmente e 8% joga diariamente. Esse fato pode ter contribuído para alguns resultados que serão apresentados mais adiante, nos quais os estudantes afirmam que, apesar de terem achado fácil aprender a jogar, não concordam totalmente que tiveram que aprender poucas coisas para jogar, mesmo se tratando de um jogo com pouquíssimas regras e ações a serem executadas (apenas explorar coletando recursos, ou jogar cartas).

Quanto às questões específicas de avaliação da qualidade do jogo, a Figura 7 apresenta os resultados para as dimensões de usabilidade. Por se tratar de um jogo de tabuleiro e cartas, os estudantes foram questionados quanto ao design desses elementos, os textos, cores e fontes utilizados (Estética), sendo que os resultados demonstram que 92,31% dos estudantes concordaram total ou parcialmente que os elementos são atraentes e consistentes.

Figura 7 Resultados da Avaliação da Usabilidade (Fonte: dos autores) 

Com relação à aprendizibilidade e a operabilidade do jogo, os resultados demonstram que os estudantes, em sua maioria, concordam total ou parcialmente que é fácil aprender a jogar (77%) e jogar o jogo (84,62%), respectivamente. No entanto, é importante destacar o número considerável de estudantes que se manteve neutro diante das afirmativas, o que pode ser resultado da falta de experiência prévia e hábito de jogar jogos de tabuleiro, já destacada anteriormente. No decorrer da execução do jogo, em algumas ocasiões os estudantes recorreram ao manual de regras ou a professora foi chamada para esclarecer alguma dúvida sobre as ações que eles poderiam seguir. Também cabe analisar a diferença entre os resultados da facilidade de aprender a jogar e a facilidade de jogar. Os resultados demonstram que os estudantes tiveram maior dificuldade para aprender a jogar, mas que depois de habituados com as mecânicas do jogo passaram a jogar com facilidade, o que mais uma vez pode ser explicado pela falta de hábito e conhecimento de jogos de tabuleiro e suas mecânicas.

A Figura 8 apresenta as questões que envolvem as dimensões de experiência do jogador.

Figura 8 Resultados da Avaliação da Experiência do Jogador (Fonte: dos autores) 

Os resultados demonstram que os estudantes se sentiram confiantes (Confiança) de que poderiam aprender o conteúdo por meio do jogo, o que é um dado importante, considerando que por mais que se busque aliar diversão com aprendizagem em jogos educacionais, é fundamental que o estudante perceba que o jogo é um recurso educacional e que precisa explorar o mesmo de forma a contribuir no processo de ensino e aprendizagem.

No quesito Desafio, os resultados corroboram o que os desenvolvedores pretendiam durante o planejamento, que o jogo trouxesse um desafio instigante que fizesse com que os estudantes não se sentissem entediados. Considerando que, usualmente, este problema estaria inserido em uma lista de exercícios para que o aluno simplesmente desenvolvesse o diagrama correspondente, trazer o problema em meio a elementos de um jogo, com uma narrativa, competição e interação com colegas pode ter sido responsável por 84,62% dos alunos concordarem que o jogo é desafiador e não é monótono.

O mesmo pode ser considerado para o quesito Satisfação, que obteve uma média de 80,77% de concordância, em que os alunos afirmaram sentirem-se realizados por completar as tarefas do jogo e com o que aprenderam. Dentro das quatro questões dessa dimensão a que obteve o maior número de respostas neutras e de discordância foi a que se referia a “ser devido ao meu esforço pessoal que eu consigo avançar no jogo”, o que pode ser natural considerando que o jogo era colaborativo, foi jogado em equipes compostas por 3 a 4 estudantes, o que ocasionou um esforço coletivo para “avançar no jogo”.

No que diz respeito a Interação, foi a dimensão melhor avaliada pelos estudantes, com 97,44% de concordância de que puderam interagir com os colegas e sentiram-se bem nesse processo de interação, com aspectos de competição e cooperação envolvidos. Este aspecto pode ser observado fortemente pelas discussões e trocas realizadas entre as equipes em busca de pensar a melhor estratégia para seguir no jogo e em como resolver o problema apresentado. Esta mesma percepção ocorreu com a questão da diversão, que obteve 92% de concordância. Na maioria do tempo era possível perceber que os alunos estavam se divertindo pois riam ao interagir com as cartas lúdicas, ficavam satisfeitos quando percebiam que coletavam um recurso que estavam necessitando, e comemoravam por perceber que estavam próximos de ganhar o jogo.

O quesito Atenção Focada obteve 71,79% de concordância, sendo que em conversa com os estudantes, alguns destacaram o fato de que estarem jogando na sala de aula, com mais 03 equipes ao seu redor, fazia com que tivessem sua atenção desviada para as discussões e risadas do grupo ao lado em alguns momentos. Ainda, um aspecto que foi observado e destacado por alguns estudantes em seus comentários, é que ao se aproximar do final do jogo, todos os recursos haviam sido coletados, porém alguns estavam em posse da equipe adversária, o que fez com que durante um certo período eles só pudessem acessar a Cafeteria e obter recursos para aplicar ações aos outros, e tentar obter os recursos faltantes para finalizar o diagrama e ganhar o jogo. Com isso, perderam um pouco o foco no objetivo de interagir com o tabuleiro e traçar estratégias com os colegas, pois havia apenas uma ação possível. Por fim, os quesitos Relevância e Aprendizagem Percebida receberam, respectivamente, 88,46% e 84,62% de concordância por parte dos estudantes, resultados que demonstram que os estudantes consideram que o jogo é relevante para o ensino do conteúdo e que acreditam que o mesmo contribuiu para sua aprendizagem.

Quanto aos comentários, duas considerações foram feitas por estudantes. A primeira, refere-se ao que já foi destacado sobre a falta de interação com o ambiente próximo ao final do jogo. O segundo comentário foi de que algumas cartas de ação envolviam, por exemplo, pegar um recurso de um deck, só que perto do término do jogo, os decks de recurso já estavam vazios, nas mãos das equipes, invalidando o uso da carta. O que ocorreu, na maioria dos casos, é que os estudantes adotaram a estratégia de “guardar” as cartas de ação para usar mais próximo ao final, acumulando uma grande quantidade de cartas nas mãos, sendo que algumas não puderam mais ser utilizadas. Como sugestão, será criada a regra de que uma equipe pode ficar com um determinado limite de cartas de ação na mão ao término do seu turno. Isso fará com que as equipes tenham que “gastar” suas cartas, tornando o jogo mais dinâmico e também fazendo com que cartas de recurso eventualmente retornem para o deck (pois algumas cartas de ação fazem com que recursos sejam perdidos aleatoriamente, sendo retornados aos decks correspondentes), o que pode contribuir para que a interação com os diferentes ambientes aumente, em decorrência da permanência de cartas nos decks por mais tempo. Além disso, para uma nova aplicação, o cenário foi revisado e simplificado, diminuindo o número de atividades a serem coletadas, tornando o tempo de execução mais rápido e não afetando a compreensão da construção do diagrama.

4.Conclusões

O principal objetivo, que norteou o desenvolvimento do jogo apresentado nesse artigo, foi a busca por uma estratégia diversificada e lúdica para auxiliar no ensino e aprendizagem de modelagem de diagramas de atividades, de acordo com a UML, em disciplinas de Engenharia de Software. A partir dos resultados da avaliação realizada por estudantes, é possível destacar, com relação à usabilidade, os dados positivos da dimensão estética, relacionada ao design dos elementos do jogo, que foi uma preocupação no decorrer do projeto no que concerne a buscar aliar a narrativa com o design visual das cartas e do tabuleiro. No que concerne à experiência do jogador, destacam-se as dimensões interação social e diversão, com os resultados mais positivos, e a percepção dos estudantes de que acreditam que o jogo pode ser considerado relevante para trabalhar o conteúdo e contribuir para a aprendizagem.

Destaca-se como uma contribuição da proposta sua possibilidade de adaptação, considerando que as cartas lúdicas são genéricas e não trazem nenhuma informação específica sobre o ambiente da editora ou do processo que está sendo modelado, possibilitando sua reutilização em outros contextos. Cada categoria foi desenvolvida utilizando uma cor específica, para otimizar seu reconhecimento, apesar de que todas possuem uma indicação textual na parte inferior, assim como um ícone que busca associar sua funcionalidade. O mesmo foi pensado em relação ao desenvolvimento do tabuleiro. Para essa primeira versão, as salas foram projetadas e pensadas como escritórios de uma editora, no entanto, elas foram nomeadas apenas com números (salas 01, 02, 03 e 04). Assim, apesar de suas imagens remeterem a um ambiente específico, diversos outros casos podem ser inseridos e utilizados. As cartas da Recepção, que correspondem a elementos genéricos de um diagrama de atividades também podem ser utilizadas em outros problemas de modelagem de atividades. Apenas as cartas de atividades são específicas para resolver o caso apresentado e precisariam ser substituídas, caso um professor desejasse criar um novo problema a ser resolvido por meio do desenvolvimento de um diagrama de atividades. Além disso, o tabuleiro e cartas da cafeteria poderiam ser utilizados em outros jogos, para trabalhar diferentes modelos, ou até mesmo para outras disciplinas ou conteúdos, desde que devidamente adaptado o problema a ser resolvido por meio da coleta de recursos.

Como ameaças à validade dessa pesquisa, destaca-se o número limitado de participantes, o fato de ter sido realizada uma única aplicação até o momento da publicação desse artigo, sendo necessário, ainda, a integração de uma avaliação sob a perspectiva dos impactos da aprendizagem de Diagrama de Atividades após o uso do jogo.

Como perspectivas futuras, pretende-se realizar novas experiências de uso do jogo em sala de aula, adaptando as regras e dinâmica, de acordo com o descrito na avaliação, buscando tornar o jogo mais desafiador e interativo. Por fim, destaca-se que o jogo está disponível no site do grupo de pesquisa1, para uso por professores e interessados.

Referências

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Recebido: 15 de Setembro de 2024; Aceito: 06 de Novembro de 2024

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