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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

versão impressa ISSN 1647-2160

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental  no.19 Porto jun. 2018

https://doi.org/10.19131/rpesm.0198 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

 

Fatores associados à ansiedade entre profissionais da atenção básica

 

Factors associated with anxiety between basic attention professionals

 

Los factores asociados con la ansiedad entre los profesionales de atención primaria

 

Adaene Moura*, Rosaline Lunardi**, Rosa Volpato***, Vagner Nascimento****, Tayla Bassos*****, & Alisséia Lemes******.

*Enfermeira; Mestranda em Enfermagem na Universidade Federal de São Carlos, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Rodovia Washington Luís, s/n, 13565-905 Aragarças, GO, Brasil. E-mail: adaene_moura@hotmail.com

**Enfermeira; Doutora em Ciências; Professora Adjunta II na Universidade Federal de Mato Grosso, 78060-900 Barra do Garças, MT, Brasil. E-mail: rosaline@terra.com.br

***Enfermeira; Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Carlos, Programa de Enfermagem, 13565-905 Aragarças, GO, Brasil. E-mail: rosamjacinto@hotmail.com

****Enfermeiro; Aluno de Doutorado no Centro Universitário São Camilo, Programa de Pós-graduação em Bioética; Professor Adjunto na Universidade do Estado de Mato Grosso, 78060-900 Barra do Garças, MT, Brasil. E-mail: vagnerschon@hotmail.com

***** Acadêmica em Enfermagem pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Campus Universitário do Araguaia (CUA), Aragarças-GO, Brasil. E-mail: tayla-queren@live.com

******Enfermeira; Doutoranda em Enfermagem Psiquiátrica pela Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto; Docente Assistente na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Campus Universitário do Araguaia (CUA), Barra do Garças-MT, Brasil. E-mail: alisseia@hotmail.com

 

RESUMO

CONTEXTO: O transtorno de ansiedade, acomete cerca de 3,6% da população em algum momento da vida, sendo mais comum em mulheres, incluindo transtornos que compartilham características de medo e ansiedade excessivos e perturbações comportamentais.

OBJETIVO: A pesquisa teve como objetivo avaliar a presença de ansiedade entre profissionais da Estratégia de Saúde da Família e os fatores associados com a presença da ansiedade.

MÉTODOS: Pesquisa de campo, descritiva, exploratória, quantitativa, realizada com 50 trabalhadores de seis unidades de atenção básica em saúde. Para coleta de dados foi utilizado um questionário semiestruturado e o uso do Inventário de Ansiedade de Beck. Os dados foram analisados e apresentados por meio do uso da estatística descritiva e por meio da análise de correlação por coeficiente de contingência C. A pesquisa teve aprovação ética com número 515/705.

RESULTADOS: O perfil dos profissionais caracterizou-se pelo sexo feminino (94%), casados (54%), com idade média de 39 anos. A ansiedade esteve presente entre 30% dos trabalhadores. Os fatores associados com a ansiedade foram a dificuldade para dormir (C=0,410; p=0,004), pressão no trabalho (C=0.422; p=0,004) e já ter realizado tratamento para ansiedade nos últimos 12 meses (C=0.638; p=0,000).

CONCLUSÕES: Verificou-se que os trabalhadores das unidades de saúde participantes, estão expostos a fatores que contribuíram para o surgimento da ansiedade. Esses resultados contribuem para a necessidade de se desenvolver estratégias de prevenção, diagnóstico e tratamento deste transtorno em busca de melhorar a saúde mental destes trabalhadores, contribuindo para um melhor desempenho profissional e êxito em sua vida pessoal e social.

Palavras-Chave: Transtorno de ansiedade; Atenção primária à saúde; Profissional de saúde; Saúde mental

 

ABSTRACT

BACKGROUND: Anxiety disorder affects about 3.6% of the population at some point in life, being more common in women, including disorders that share characteristics of excessive fear and anxiety and behavioral disorders.

AIM: The aim of this research was to evaluate the presence of anxiety among professionals in the Family Health Strategy and the factors associated with the presence of anxiety.

METHODS: Field research, descriptive, exploratory, quantitative, performed with 50 workers from six basic health care units. A semi-structured questionnaire and the use of the Beck Anxiety Inventory were used for data collection. The data were analyzed and presented through the use of descriptive statistics and through correlation analysis by contingency coefficient C. The research was ethically approved with number 515/705.

RESULTS: The profile of the professionals was characterized by the female gender (94%), married (54%), with a mean age of 39 years. Anxiety was present among 30% of the workers. The factors associated with anxiety were difficulty in sleeping (C = 0.410, p = 0.004), work pressure (C = 0.422, p = 0.004) and anxiety in the last 12 months (C = 0.638; = 0.000).

CONCLUSIONS: It was verified that the workers of the participating health units are exposed to factors that contributed to the emergence of anxiety. These results contribute to the need to develop strategies for the prevention, diagnosis and treatment of this disorder in order to improve the mental health of these workers, contributing to a better professional performance and success in their personal and social life.

Keywords:Anxiety disorders; Primary health care; Health personnel; Mental health

 

RESUMEN

CONTEXTO: O transtorno de respuesta, cerca del 3,6% de la población en el momento actual de la vida, sendo más vendido en varias partes, incluye transtornos que compartan características de medo y ansiedade excessivos e perturbações comportamentais.

OBJETIVO: Una pregunta clave como objetivo sobre la presencia de ansiedad entre los empleados de la Estrategia de salud de la familia y los asociados de Faculty Associate con una presença de ansiedade.

METODOLOGÍA: Investigación de campo, descriptiva, exploratoria, cuantitativa, realizada con 50 trabajadores de seis unidades de atención básica en salud. Para la recolección de datos se utilizó un cuestionario semiestructurado y el uso del Inventario de Ansiedad de Beck. Los datos fueron analizados y presentados por medio del uso de la estadística descriptiva y por medio del análisis de correlación por coeficiente de contingencia C. La investigación tuvo aprobación ética con número 515/705.

RESULTADOS: O perfil de las características es el sexo femenino (94%), casados (54%), promedio de 39 años. A ansiedade esteve presente entre 30% dos trabalhadores. Os fatores associados com a ansiedade foram a dificuldade para dormir (C = 0,410; p = 0,004), pressão no trabalho (C = 0,422; p = 0,004) e já ter realizado tratamento para ansiedade los últimos 12 meses (C = 0,638; p = 0,000).

CONCLUSIONES: Se verificó que los trabajadores de las unidades de salud participantes, están expuestos a factores que contribuyeron al surgimiento de la ansiedad. Estos resultados contribuyen a la necesidad de desarrollar estrategias de prevención, diagnóstico y tratamiento de este trastorno en busca de mejorar la salud mental de estos trabajadores, contribuyendo a un mejor desempeño profesional y éxito en su vida personal y social.

Palabras Clave: Trastorno de ansiedad; Atención primaria de salud; Personal de salud; Salud mental

 

Introdução

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estimou que, em 2015, 264 milhões (3,6%) de pessoas em todo o mundo apresentavam algum transtorno de ansiedade, sendo mais comum entre as mulheres. No Brasil, cerca de 9,3% da população é afetada por este transtorno (World Health Organization [WHO], 2017).

A ansiedade tem sido considerada como um sentimento comum a qualquer ser humano, mas, dependendo da intensidade dos sintomas e prejuízos causados na vida do indivíduo, ela poderá ser considerada como ansiedade patológica, podendo manifestar preocupação excessiva com circunstâncias diárias da rotina da vida, tais como: trabalho, saúde, finanças, ou até mesmo em questões menores (American Psychiatric Association, 2013).

Situações de vulnerabilidade favorecem o desenvolvimento do transtorno em determinados grupos, como os trabalhadores que atuam em serviço de saúde, pois constantemente passam por eventos estressores e se deparam com sofrimento, medo, conflitos, tensões, disputa pelo poder, ansiedade, estresse, convivência com a morte, longas jornadas de trabalho, entre tantos outros fatores inerentes ao cotidiano desses trabalhadores (Braga, Carvalho, e Binder, 2010).

Além das situações de vulnerabilidade, o trabalho exige dos profissionais que atuam em serviços de saúde, alguns domínios para lidar com a prática diária voltada a assistência de sua população de abrangência, tais como: pensamento acelerado, ser ágil, ter capacidade de liderar, resolver situações problemáticas, pressão do tempo, dentre outros domínios, porém, quando o trabalhador não consegue desempenhar esses domínios, poderá causar-lhe tensão e sofrimento no trabalho (Martins, Robazzi, e Bobroff, 2010; Carvalho, Araújo, e Bernades, 2016).

Sobre o serviço de saúde brasileiro, destaca-se que no ano de 1988 houve a regulamentação do Sistema Único de Saúde (SUS) e anos após, houve a aprovação da Política Nacional de Atenção Básica por meio da portaria nº648 de 2006, o que regulamentou a atenção a saúde a nível primário. Os serviços de Atenção Básica surgiram como um conjunto de ações de saúde voltados a abranger a toda comunidade com ações de promoção e proteção da saúde, de prevenção de agravos, de diagnóstico, de tratamento, de reabilitação e de manutenção da saúde, visando ainda o respeito do sujeito em sua singularidade, complexidade, integralidade e inserção sociocultural e faz parte deste nível de atenção a ESF e o Núcleo de Atenção à Saúde da Família (NASF) (Ministério da Saúde, 2012).

Destacaremos neste estudo a Estratégia de Saúde da Família (ESF), por ter sido local de coleta de dados e por ser uma instituição criada para reorganizar da atenção básica em todo o país, de acordo com os preceitos do SUS. A ESF existe no Brasil desde o ano de 2004 e no ano de 2012, registrou-se que 95% dos municípios constavam com 33.404 unidades implantadas, abrangendo 55% da população. Cada ESF é responsável por uma população de até 4.000 pessoas, sendo a média recomendada de 3.000, respeitando critérios de equidade. Os profissionais que atuam nesta unidade são compostos por uma equipe multiprofissional (médico, enfermeiro, auxiliar ou técnico de enfermagem e agentes comunitários de saúde), profissionais de saúde bucal (cirurgião-dentista, auxiliar e/ou técnico em saúde bucal) e de apoio (auxiliar administrativo e/ou recepcionista e serviço geral), responsáveis por ações que inclui a identificação da população exposta a riscos; realização de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde e prevenção de injúrias; atendimento humanizado, busca ativa e notificação de patologias (Ministério da Saúde, 2012).

Diante da importância do serviço de atenção básica a qual a ESF está inserida, justifica-se a necessidade de identificar os principais fatores que podem contribuir para o surgimento de ansiedade entre profissionais que atuam em ESF, já que esta patologia interfere de modo negativo no desempenho profissional, no convívio familiar e social, na saúde física e psíquica dos mesmos. Os resultados poderão contribuir com o desenvolvimento de ações preventivas voltadas à saúde mental dos trabalhadores. Nesse sentido, este estudo teve como objetivo avaliar a presença de ansiedade entre profissionais que atuam em ESF e os fatores associados com a presença da ansiedade.

 

Métodos

Trata-se de uma pesquisa de campo, exploratório, descritiva com abordagem quantitativa, realizada com os profissionais Enfermeiros(as), Técnicos em Enfermagem (TE), Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e Auxiliares Administrativos (AA), que atuam em seis ESF localizadas em um município na região Centro-Oeste no interior de Goiás, Brasil.

A escolha das unidades de saúde deu-se pela proximidade dos pesquisadores com os coordenadores dos serviços do Sistema Único de Saúde e pelo reconhecimento da importância que essas unidades têm por atender a população de sua comunidade através de ações preventivas, de promoção e de recuperação da saúde.

Os critérios de inclusão foram: ser Enfermeiro(a), Médico(a), dentista, Técnico(a) em Enfermagem, Agente Comunitário de Saúde ou Auxiliar Administrativo; atuarem em uma das ESF participantes no estudo e serem maiores de dezoito anos, concordando em participar da pesquisa, por meio de assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Os critérios de exclusão foram: profissionais de atestado médico, licença prêmio ou férias no período da coleta de dados; e aqueles que não foram encontrados em até três tentativas para coleta de dados.

Para definição da amostra, utilizou-se uma amostragem não probabilística, por conveniência, dos 60 profissionais pertencentes as seis unidades de ESF existentes neste município.  Destes, 50 profissionais estavam aptos de acordo com os critérios definidos, sendo: 06 Enfermeiros, 06 Técnicos de Enfermagem, 33 Agentes Comunitários de Saúde e 05 Auxiliares Administrativos. É importante ressaltar que foram convidados todos os profissionais que atuavam nas ESF, porém, não houve a participação de profissionais médicos e dentistas, pelo fato de não serem encontrados nos momentos de visita dos pesquisadores e/ou por recusarem a participar do estudo, conforme critérios de exclusão.

A pesquisa foi realizada, nos períodos matutinos e vespertinos, entre os meses de agosto a novembro de 2016, por meio da aplicação de dois instrumentos. O primeiro, um questionário semiestruturado, contendo questões objetivas, sobre dados sóciodemográfico (faixa etária, sexo, estado civil, escolaridade, religião, renda individual), perfil da profissão e hábitos de vida. O segundo instrumento, o Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), é um questionário validado no Brasil, autoaplicável que avalia sintomas característicos de ansiedade em busca de determinar a tendência à ansiedade, possuindo 21 itens, apresentados em uma escala de Likert de quatro pontos, variando de 0 a 3. Os itens somados resultam em escore total que pode variar de 0 a 63, onde de acordo com o manual de aplicação do instrumento, os pontos de corte para ansiedade são: 0 a 10 (ausência de sintomas ansiosos); 11 a 19 (ansiedade leve); 20 a 30 (ansiedade moderada); e 31 a 63 (ansiedade grave), sendo considerado o escore ≥ 21 pontos como indicativo da existência de ansiedade clinicamente significativa (Cunha, 2016).

Os participantes responderam os instrumentos da pesquisa na própria instituição de trabalho, em local calmo e seguro. O preenchimento teve a duração média de 30 minutos.

Os dados foram processados e analisados no programa Epi info versão 3.5.2 e Bioestat versão 5.0. A estatística descritiva com utilização do programa Epi Info versão 3.5.2, foi aplicada nas variáveis sóciodemográficas, perfil da profissão, presença de ansiedade. Para avaliar as possíveis associações da ansiedade com as demais variáveis (dificuldade para dormir, consumo de álcool, tabaco e sedentarismo; afastamento médico, tratamento para ansiedade e falta no trabalho decorrente de problemas mentais; agressão decorrente ao trabalho, considera o trabalho como estressor, estrutura física do trabalho e pressão no trabalho), foi utilizado o programa BioEstat versão 5.0, por meio da análise de correlação “Coeficiente de Contingência C” (resultado de C=0, determina que não há associação entre as variáveis, quando C≠0, há correlação entre duas variáveis (˂0.1 fraca, 0.1 a 0.3 moderada e ˃0.3 forte)), sendo nível de significância adotado de 5% (p˂0,05).

Todas as providências em relação à dimensão ética do estudo foram tomadas de acordo com a Resolução de ética 466/2012. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Mato Grosso/Campus Universitário do Araguaia, sob o protocolo número 515/705.

 

Resultados e Discussão

Caracterização Sociodemográfica dos Profissionais

Os participantes do estudo apresentaram idades entre 22 e 64 anos, com média de 39 anos, predominantemente indivíduos com idade entre 32 a 46 anos (62%), do sexo feminino (94%), casados (54%), com ensino médio completo(34%) e superior completo (30%), com renda individual mensal de 1 a 3 salários mínimo (74%) e com algum tipo de religião (98%) (Tabela 1).

 

 

Estes resultados são semelhantes a outros estudos realizados com trabalhadores da Atenção Básica, como apresentados por Pascoal (2008) no município de João Pessoa-PB (Brasil) em que 88,8% dos participantes eram do sexo feminino e 78,8% tinham idade acima de 30 anos. Já em 2016 no estado da Bahia (Brasil), encontrou-se que 84,5% dos participantes eram do sexo feminino e 58% tinham idade ≤40 anos (Carvalho et al., 2016).

A predominância de mulheres no mercado de trabalho vem crescendo a cada dia, principalmente ao serviço de saúde, estando relacionado a questões históricas e culturais, onde a mulher aparece em maior proporção ocupando funções voltadas ao cuidado da comunidade (Gavin, 2013).

Neste estudo predominou pessoas casadas e com escolaridade de ensino médio completo e superior. Dados semelhantes foram encontrados em dois estudos. O primeiro descritivo exploratório realizado no interior de Goiás (Brasil) com 36 profissionais de ESF, destacou 48% dos profissionais eram casados e 53% concluíram o ensino médio completo (Entreportes et al., 2017). O segundo um estudo transversal realizado no sul da região nordeste brasileira com 762 trabalhadores da Atenção Básica, identificou que 16,5% tinham ensino superior e 64,4% possuíam companheiros (Carvalho et al., 2016).

A continuidade dos estudos dos profissionais que atuam em serviços de saúde pode ser devido ao crescimento dos incentivos e fomentos oferecidos pelos órgãos governamentais para educação como: fornecendo programas de seleção unificados, bolsas de estudos e financiamentos estudantis. Outro fator a ser considerado é também possibilidade de progressão profissional (Borges, Lemes, Volpato, Nascimento, e Rocha, 2015).

Os trabalhadores de saúde deste estudo recebem entre 1 a 3 salários mínimo mensais, dados semelhantes ao estudo seccional realizado no ano de 2010, em Campo Grande-MS (Brasil), com 134 profissionais da equipe de saúde de nove unidades públicas, que apontou 87,5% dos participantes possuíam renda familiar menor que 3,4 salários mínimos (Filha, Costa, e Guilam, 2013).

A maioria dos profissionais declararam possuir algum tipo de religião, é importante destacar que a religião tem sido considerada um fator protetor ao surgimento de doenças mentais em vários estudos, que apontam que a religião auxilia as pessoas a enfrentarem sua realidade e buscarem compreender a si próprio, sendo capaz de contribuir na redução dos índices de ansiedade, pelo fato de proporcionar alivio, consolo, conforto, bem-estar e esperança (Werner, Siqueira, e Lemes, 2015).

 

Caracterização do Perfil Profissional dos Trabalhadores

Os 50 participantes no estudo pertencem as seis ESF em funcionamento no município, sendo, seis enfermeiros (12%), seis técnicos em enfermagem (12%), trinta e três agentes comunitários de saúde (66%) e cinco auxiliares administrativos (10%).

Quanto ao tempo de trabalho na área de saúde, 66% dos profissionais atuam a mais de 10 anos na área de formação, 64% atuam mais de 10 anos em ESF e 42% atuam mais de 10 anos na mesma ESF (Gráfico 1). Um estudo apontou resultados semelhantes ao desta pesquisa, onde 37,4% dos servidores trabalham a mais de 10 anos na mesma instituição (Filha et al., 2013).

Anos de trabalho podem ser considerados como fator de risco para o desenvolvimento de doenças psíquicas laborais. Assim como apontado em um estudo, que o tempo de trabalho proporciona um cotidiano intenso e prolongado com os usuários, o que pode provocar no trabalhador um forte impacto psicológico, que se expressa na impotência vivenciada frente a situações de extrema penúria material (Lancman, Ghirardi, Castro, e Tuacek, 2009).

Todos os participantes declaram trabalhar na ESF 8h/dia, cumprindo uma jornada de 40 horas semanais, dentre esses 18% referiram trabalhar em um segundo emprego remunerado (duplo vínculo). Quanto as horas trabalhadas, é necessário que a carga horária permita que os trabalhadores tenham momentos de lazer e descanso associados a uma vida social saudável, caso contrário, a falta de lazer poderá contribuir para o surgimento de sintomas negativos, tais como de estresse e o adoecimento mental (Dalri, 2013).

Neste estudo, parte dos profissionais relataram não se sentirem realizados profissionalmente (36%) e a maioria (64%) sentiu-se realizados. No estudo de Vieira (2017), 42% dos profissionais entrevistados demonstraram insatisfação com o trabalho, mas especificamente com a estrutura física, conforto, segurança e salário. Ao contrário, no estudo de Pascoal (2008), apenas 39,88% dos entrevistados estavam realizados profissionalmente. Souza e Maria (2016) apontam que a baixa realização profissional pode prejudicar a prática dos profissionais, interferindo no modo de atender a população e a organização do serviço, enquanto que uma boa realização profissional torna-se fundamental para a execução do trabalho com melhor qualidade.

 

Ansiedade entre os Profissionais das ESF

Este estudo apontou que 30% dos profissionais apresentaram algum grau de ansiedade, destes, 20% apresentaram ansiedade leve, 2% moderado e 8% grave (Gráfico 2). É importante ressaltar que cinco participantes (10%) apresentaram sintomas clínicos significativos, com escores iguais ou maiores que 21 pontos, na Escala BAI.

A literatura aponta para o adoecimento mental entre os trabalhadores de ESF, porém não destaca o tipo de adoecimento, nem se apresentam sintomas ansiosos. Como o estudo realizado em João Pessoa-PB (Brasil), que apontou que 19,40% dos profissionais de ESF apresentaram risco de adoecimento mental (Pascoal, 2008).

É importante destacar, que os profissionais que atuam em unidades de saúde da família são responsáveis por realizar vários tipos de atendimentos voltados à saúde dos moradores de sua área de abrangência e, ainda, precisam conviver diariamente com condições de trabalhos diversas e conflitos pessoais entre trabalhadores e gestão. Não se pode anular os fatores genéticos, sociais, ambientais que também influenciam o surgimento dos sintomas de ansiedade. Todos estes fatores podem contribuir para o surgimento de sentimentos do tipo angustia, medo, tristeza, irritação, fadiga, impotência e frustações, que afeta diretamente a saúde emocional dos trabalhadores (Pereira, 2011).

 

Fatores Associados com a Presença de Ansiedade entre os Trabalhadores de ESF

Trabalhadores que atuam em serviços na área de saúde estão expostos a fatores laborais que provocam fadiga crônica, baixos índices de saúde e a altos níveis de estresse (Martins, Campos, Duarte, Chaves, e Silva, 2016). Destacando-se aqueles relacionados aos hábitos de vida, como exemplo o sono e repouso. Neste estudo, 24% dos entrevistados apresentaram dificuldade para dormir e 2% declararam fazer o uso de medicações para induzir ou melhorar a qualidade o sono. Quanto ao número de horas dormidas por dia, 66% dos profissionais dormem ≥8h/dia e 34% dormem <8h/dia.

Corroborando com nosso estudo, e apontando uma maior ocorrência do uso de medicamentos para dormir entre os profissionais de enfermagem (17,7%) foi relatada por Da Rocha e De Martino (2009) mostrando a ocorrência da associação entre sintomas ansiosos, qualidade do sono dos trabalhadores, e uso de medicamentos. Outro estudo também apontou o sono como um fator de risco para o adoecimento mental, onde cerca de 30% dos trabalhadores da ESF reconheceram que dormiam mal (Pascoal, 2008).

Os níveis de ansiedade e estresse pode ser um fator diretamente proporcional, ao sono, visto que quanto maior o nível de estresse entre os profissionais que atuam em serviços de saúde, maior será a pontuação global do índice de sono, indicativo de qualidade de sono ruim, ou seja, efeito do estresse sobre o sono causa repercussões negativas para a saúde do trabalhador (Da Rocha e De Martino, 2009).

Quanto a associação da ansiedade aos hábitos de vida dos participantes, destaca-se uma forte associação entre a dificuldade para dormir e a presença de ansiedade entre os profissionais (C=0,410; p=0,004), associação essa não identificada entre as variáveis de consumo de bebidas alcoólicas, tabagismo e sedentarismo (Tabela 2).

Este estudo ainda apontou para uma forte associação entre ansiedade e a pressão no trabalho (C=0.422; p=0,004) e, ao contrário, não houve associação da ansiedade com a violência no trabalho, consideração do trabalho como estressor e a estrutura física da unidade (Tabela 3). Um estudo transversal realizado no estado de Minas Gerais (Brasil), apontou que 25% dos trabalhadores revelaram sobrecarga decorrente do trabalho, ressaltado por medo de agressão e cansaço físico ao final do trabalho (Vieira, 2017). Outro estudo apresentou que 18,7% dos trabalhadores sofriam alto desgaste decorrente do trabalho, fato que pode gerar doenças ocupacionais, prejudicando a saúde do trabalhador, podendo contribuir para o surgimento de alterações psíquicas, tais como, estresse, ansiedade, entre outras (Gavin, 2013).

Este estudo também revelou uma forte associação entre ansiedade, no momento da pesquisa, e realização de tratamento para ansiedade nos últimos 12 meses (C=0.638; p=0,000) e, ao contrário, não houve associação da ansiedade com o fato de afastamento médico por doenças crônicas ou agudas e/ou profissionais que já faltaram ao trabalho em decorrência de problemas mentais (Tabela 4).

Entre os profissionais que já buscaram algum tipo de tratamento para ansiedade, destaca-se os ACS (58%), enfermagem (28%) e auxiliares administrativos (14%). O tratamento adotado pelos entrevistados foi medicamentoso (42%), seguido do psicológico (29%) e como uma alternativa o apoio espiritual (29%).

O estudo de Paschoa, Zanei e Whitaker (2007) apontou que é necessário investimento voltado a melhorar a qualidade de vida dos profissionais que atuam na área da saúde, em específico da enfermagem, pois, assim a própria instituição teria benefícios e contaria com profissionais mais satisfeitos, melhorando assim a produtividade e qualidade da assistência prestada. Além disso, Carvalho, Araújo e Bernades (2016) apontaram que o trabalho em excesso contém grande carga emocional, pois, lida com enfermidade e morte de indivíduos. Desse modo, os profissionais podem ter uma reação de incapacidade, o que favorece sofrimento.

Foram apontadas algumas medidas que os profissionais realizam como forma de aliviar a ansiedade como: ouvir música (34%) e a prática de caminhada (26%) (Gráfico 3).

A música pode ser utilizada no contexto psicoterapêutico, importante no auxílio para redução da ansiedade e do estresse, além de proporcionar conforto e prazer, propiciando maior equilíbrio para a saúde do indivíduo. Constata-se, portanto, que ao favorecer a indução de relaxamento e redução de ansiedade e estresse, a música pode ser utilizada como um importante recurso para potencializar os processos de saúde, promovendo o bem-estar dos trabalhadores, pacientes, tornando o ambiente mais tranquilo (Nunes-Silva, Moreira, Moraes, Rosa, e Marra, 2012).

 

Conclusão

Os resultados permitiram identificar que os enfermeiros, técnicos de enfermagem, ACS e auxiliares administrativos que atuam em ESF, que participaram deste estudo apresentaram um percentual expressivo de ansiedade, com destaque para o tipo leve deste transtorno mental.

A presença da ansiedade entre os trabalhadores mostrou-se diretamente associada a alguns fatores, tais como, dificuldades para dormir, pressão exercida no trabalho e já ter realizado tratamento para ansiedade nos últimos 12 meses.

O estudo sugere que a partir da identificação de fatores causadores de doenças mentais, como a perda da qualidade do sono associado a ansiedade, pode permitir o planejamento de atividades que contribuam na prevenção destas doenças entre os trabalhadores, bem como de promoção e recuperação de sua saúde, em busca de resgatar a qualidade de vida dos profissionais, o que implicará em melhores desempenhos na vida pessoal, social e no cuidado prestado a saúde da população.

Este estudo chama a atenção para a necessidade de repensar as condições de trabalho vivenciadas por estes profissionais e desta forma, recomenda-se que novos estudos que abranjam diferentes regiões geográficas, novas categorias de trabalhadores e de outros setores, de forma que se possam compreender melhor os fatores que podem desencadear os transtornos mentais entre os profissionais que atuam em serviços de saúde devido à exposição ao trabalho.

 

Implicação para a Prática Clínica

O presente estudo poderá contribuir com a sensibilização de gestores e demais profissionais responsáveis por elaborar estratégias que visem a prevenção (palestras sobre os transtornos mentais comuns decorrente do trabalho, rodas de conversa para discutir os problemas do ambiente de trabalho, atividades complementares integrativas que visem acolher os trabalhadores – ex.: Reiki, Mindfulness, Terapia Comunitária, massoterapia), o diagnóstico (rastreio dos transtornos mentais, a partir do uso de instrumentos validados, tais como, a escala usada neste estudo e a facilidade no acesso ao atendimento clinico e/ou especializado em saúde mental) e o tratamento (garantia de um acompanhamento pelo tempo necessário que atenda às necessidades do trabalhador (médicos, enfermeiros, psicológicos, assistentes sociais), oferta de tratamento farmacológico (medicamentos) quando necessário e a oferta de tratamentos não farmacológico (atendimento psicológico e oferecimento de práticas alternativas e complementares) que visem acolher o sofrimento deste trabalhador.

Desta forma, percebe-se que sendo possível atender o trabalhador quer seja na fase de prevenção ou tratamento, no que diz respeito ao transtorno mental aqui verificado e de outros transtornos mentais que podem acometer a sua saúde, será possível diminuir o preconceito frente o adoecimento mental entre esta população, proporcionando assim, a melhora da qualidade de vida, a manutenção da qualidade da saúde física e mental, bem como a melhora do desempenho profissional e êxito em sua vida pessoal e social.

 

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Também integra a equipe de elaboração deste artigo os seguintes autores: Elias Rocha (Enfermeiro; Mestre em Ciências da Saúde; Docente Assistente na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Barra do Garças-MT, Brasil. E-mail: eliasufmt@yahoo.com.br) e Eduardo Vieira (Psicólogo; Especialista em Dependência Química. Coordenador Municipal de Saúde Mental na Prefeitura Municipal de Barra do Garças/MT, Brasil. E-mail: eduardo.psicologo@outlook.com).

 

Recebido a 30 de março de 2017

Aceite para publicação a 15 de dezembro de 2017

 

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