Introdução
A literacia em saúde consiste nas competências cognitivas, sociais e capacidades que possibilitam às pessoas aceder, compreender e usar informação no domínio da saúde. Ao longo da última década, a literacia em saúde, tem sido perspetivada como uma dimensão fundamental para os programas de promoção da saúde e prevenção das doenças mentais (Loureiro, 2012). Diversos estudos têm mencionado que o conceito de literacia em saúde pode ter um papel determinante na manutenção e na melhoria das condições de saúde. Um inadequado nível de literacia em saúde pode ter implicações significativas na saúde individual/coletiva (Martins, 2018). Esta também designada de alfabetização em saúde, pressupõe uma interação entre os profissionais de saúde e as pessoas, uma vez que, as pessoas devem ter habilidades de inteligência e comunicação para tomarem decisões informadas sobre a melhor decisão a ser tomada em relação à sua saúde. Desta forma, a alfabetização em saúde implica o conhecimento, motivação e competências das pessoas para aceder e analisar as informações obtidas, de forma, a tomar decisões na vida quotidiana sobre cuidados mais adequados, prevenindo doenças e promovendo a saúde para manter ou melhorar a qualidade de vida (Sørensen, 2012; Martins, 2015).
Este conceito é um conceito multidimensional, sendo explorado por vários autores. Nutbeam definiu três tipos de literacia: literacia funcional, literacia interativa e literacia crítica (Pedro, Amaral, & Escoval, 2016). O modelo explorado foi o de Sorensen et al que confina as principais dimensões da alfabetização em saúde (Sousa, 2017). Este processo requer quatro tipos de competências: acesso, entender, avaliar e aplicar. Estas quatro competências são cruciais para a literacia em saúde, pois baseiam-se nas qualidades cognitivas específicas e depende da qualidade da informação obtida sobre a saúde. Estas competências também incorporam os três níveis de literacia (literacia funcional, interativa e crítica) (Sørensen, et al., 2012). O modelo baseia-se em três dimensões: promoção da saúde, prevenção da doença e cuidados de saúde. Sendo que estas estão relacionadas com os quatro tipos de competências em saúde (acesso, entender, avaliar e aplicar). Este modelo esteve na base da construção do projeto HLS-EU e consequente construção do questionário de Literacia para a saúde europeu (HLS-EU-PT) ( Mota, 2018).
O conceito de saúde mental, inicialmente, era entendido como ausência de perturbação. Os estudos revelam que esta não se restringe à ausência de doença mental, mas abrange a presença de algo positivo, designando-se de saúde mental positiva, ou seja, a saúde mental deve ser entendida como estado completo (Figueiral, 2016). Segundo o relatório Health at a Glance (2018) cerca de uma em cada seis pessoas dos países da união europeu sofrem de algum problema de saúde mental (17,3%, ou seja, 84 milhões de pessoas), relativamente aos dados de 2016. Dentro destes problemas de saúde mental, destacam-se a ansiedade (5,4%, ou seja, 25 milhões de pessoas), seguida das perturbações do humor (4,5%, ou seja, 21 milhões de pessoas). Portugal destaca-se como o 5º país da EU onde há uma maior prevalência destas doenças, como se pode verificar no gráfico 1. No topo da lista encontra-se Finlândia, Holanda, França e Irlanda. De seguida, encontra-se Portugal, sendo que as perturbações com maior prevalência são a depressão e ansiedade (cada afeta 6% da população), seguindo-se os problemas relacionados com o consumo de álcool e drogas e distúrbios bipolares e esquizofrenia (cada afeta 2 % da população). As perturbações psiquiátricas são classificadas segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID) que permite identificar e padronizar as tendências e estatísticas sobre saúde. O CID define as doenças, distúrbios, lesões e outros problemas relacionados com a saúde de uma forma hierárquica, possibilitando desta forma, um fácil armazenamento, recuperação e análise do conteúdo (World Health Organization - WHO, 2018).
Os profissionais de saúde inseridos em contexto de saúde mental e psiquiátrica centram-se na prestação de cuidados de saúde à pessoa com alterações da saúde mental, sejam eles reais ou potenciais, baseando-se em intervenções psicoterapêuticas, visando (Sá, 2010): a promoção e proteção da saúde mental; a prevenção da perturbação mental e o tratamento; a Reabilitação psicossocial e a reinserção social da pessoa.
Face ao contexto supracitado, tornou-se importante a realização de um estudo que responda à questão: qual o nível a literacia em saúde das pessoas com alterações de saúde mental assistidos na casa de saúde do Bom Jesus, em Braga, com o objetivo de saber o nível de literacia em saúde nestas pessoas.
Métodos
Ao abrigo do paradigma quantitativo, foi realizado um estudo descritivo exploratório transversal, pois pretendemos descrever e perceber o comportamento da váriavel “Literacia em Saúde” nos doentes com alterações da saúde mental e posteriormente verificar se existe relação com as outras variáveis (variáveis sociodemografiacas e variáveis clínicas). Para determinação da amostra recorremos a um método não probabilístico e por conveniência. No estudo feito os critérios de inclusão definidos foram: idade igual ou superior a 18 anos; ter capacidades cognitivas para responder ao questionário MMSE (pontos de corte segundo os critérios pré-definidos da escala). De acordo com os critérios definidos, a nossa amostra é constituída por n=101 pessoas, dos quais 23 eram acompanhados externamente à instituição e os restantes, 78 estavam institucionalizados em unidades de curto internamento.
A nossa população alvo foram as pessoas com alteração da saúde mental assistidos numa instituição psiquiátrica. Como não foi possível aceder a todos os pessoas institucionalizadas, recorremos a uma população acessível: as pessoas com alterações mentais assistidas numa unidade assistencial na área da Psiquiatria encontravam-se internadas em duas unidades de curto internamento e uma unidade de apoio socio-ocupacional em regime de ambulatório, totalizando uma população de N=257.
Como instrumento de colheita de dados foi aplicado um questionário constituído primeiramente por um grupo para avaliar a capacidade cognitiva, através da escala Mini-Mental State Examination (MMSE) e de seguida para avaliar o nível de literacia em saúde através da escala Health Literacy Survey in Portuguese (HLS-EU - PT).
A escala MMSE foi desenvolvida por Folstein, Folstein, & McHugh, 1975. É constituída por 30 itens que avaliam as funções cognitivas, nomeadamente, a orientação temporal e espacial, a memória imediata e de evocação de palavras, o cálculo, a nomeação, a repetição, a execução de um comando, a leitura, a escrita e habilidade visomotora. A pontuação obtida no final da escala pode variar entre 0 e 30 pontos, em que o 0 representa um “mau desempenho” e o 30 representa um “bom desempenho”. Para a população portuguesa prosperam-se valores operacionais de “corte” segundo a escolaridade/literacia, como se pode verificar na tabela 1 (Melo, Barbosa , & Neri , 2017) (Morgado, Rocha, Maruta, Guerreiro, & Martins, 2009).
A escala HLS-EU-PT foi construída por Luís Saboga Nunes & Kristine Sorensen, para avaliar a alfabetização em saúde. Esta escala é constituída por 47 itens, divididos em 12 subdomínios. Para cada item da escala, o indivíduo classifica a dificuldade de uma determinada tarefa, segundo uma escala de Likert de 4 categorias, ou seja, muito fácil, fácil, difícil e muito difícil. A informação proveniente da escala, está subdividida em três domínios, em que o primeiro se designa como domínio da saúde, o segundo como domínio da prevenção das doenças, e por fim o terceiro domínio, o domínio da promoção da saúde (Sørensen, et al., 2013). As respostas dos 47 itens que medem o nível de alfabetização em saúde estão cotadas, com um mínimo de 0 e um máximo de 50 pontos, onde 0 representa o “mínimo possível”, e o 50 representa o “melhor possível”. Os quatro níveis resultantes das pontuações obtidas são: “inadequados” (0-25);“problemáticos” (> 25-33);“suficientes” (> 33-42); “excelentes” (> 42-50). Sendo que, os níveis “inadequado” e “problemático” foram combinados num único nível “alfabetização em saúde limitada” (0-33), de forma a detetar grupos vulneráveis (Sørensen, et al., 2015).
De forma a cumprir os princípios éticos, após a elaboração do instrumento de colheita de dados foi solicitada autorização, para aplicação do estudo de investigação, à direção da instituição já supra-referida, sendo concedida a devida autorização da instituição e comissão de ética da mesma. Foi também garantida a confidencialidade dos dados, através da atribuição de códigos ao questionário.
A informação recolhida foi analisada através do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 25, recorrendo à análise estatística descritiva e inferencial.
Resultados
Após analisar a nossa amostra, verificamos que era constituída por 101 pessoas, dos quais 68 (67,3%) são do sexo feminino e 33 (32,7%) são do sexo masculino. Relativamente à idade e para efeitos de análise estatística esta variável foi categorizada, sendo que a nossa amostra era constituída maioritariamente por pessoas com idade entre os 45-55 anos. Analisando a variável do estado civil dos inquiridos, estes são maioritariamente solteiros (42 inquiridos, ou seja 41,6%). No que diz respeito às habilitações literárias, 51 pessoas (50,5 %) referem que têm ensino básico e apenas 1% refere completar o nível de escolaridade de mestrado. Observando a variável situação profissional, podemos concluir que a maioria dos inquiridos (40 pessoas - 39,6%) são reformados. Por fim, a caracterizar a variável local de residência, a amostra em estudo é constituída por 59 pessoas (58,4%) que residem em meio urbano. Na amostra em estudo, o principal motivo de internamento é a perturbação de humor (34,7%).
Apresentação dos Resultados
À questão “Tem alguma outra doença de longa duração?”, 29,7% referiram ter outros problemas de saúde, sendo que os restantes 70,3% referiram não ter qualquer problema de saúde. Dentro dos individuo que responderam ter outro problema de saúde, destaca-se a hipertensão arterial (9,9%), seguida da doença cardiovascular
Para responder ao nosso primeiro objetivo: “Conhecer o nível de literacia em saúde nas pessoas com alterações de saúde mental assistidos numa instituição psiquiátrica”, foi elaborado o gráfico 1 onde está evidenciado o nível de literacia em saúde destas pessoas, por categorias e dimensões da escala HLS-EU-PT.
Depois de analisado, podemos afirmar que 7,90% das pessoas da amostra apresentam um nível de literacia em saúde “inadequado”, 63,4% apresentam um nível de literacia em saúde “problemático”, 21,8% tem um nível de literacia em saúde “suficiente” e os restantes (6,9%) um nível de literacia em saúde excelente. Relativamente às dimensões da escala, Promoção da Saúde, Prevenção da Doença e Cuidados de Saúde, podemos verificar que em todas as dimensões o nível de literacia em saúde é problemático em mais de 50% das pessoas da amostra. Também se verifica que os piores resultados se encontram na dimensão Promoção da saúde, com cerca de 68% das pessoas com um nível de literacia em saúde limitada.
Relativamente ao segundo objetivo:” Perceber se existe relação entre o nível de literacia em saúde e as variáveis sociodemográficas nas pessoas com alterações de saúde mental assistidas numa instituição psiquiátrica”, as variáveis sociodemográficas foram cruzadas com a variável literacia em saúde. Assim, foi possível observar a existência de relação entre o sexo e a literacia em saúde, onde se conclui, pelo valor da mediana que o nível de literacia em saúde é superior no sexo masculino (31,91) comparativamente ao sexo feminino (30,53)
Na variável “idade” por categorias foi observado a existência de relação entre a idade e a literacia em saúde, onde se conclui, que o nível de literacia é superior nas pessoas com idade inferior a 35 anos (32,62). Com base na análise inferencial, foi permitindo afirmar que há evidencia estatística suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde é influenciado pela idade. No entanto, não se pode dizer que quanto mais velhos, menos literacia tem estas pessoas. Com a análise bivariada da variável “estado civil” em categorias e “literacia em saúde” constatou-se que a literacia em saúde é superior em pessoas que vivem acompanhados (31,21) e inferior nas pessoas que vivem sozinhos (30,85. Depois de efetuada a análise inferencial, podemos concluir que não há evidência estatística suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde é influenciado pelo estado civil. Seguindo para a variável “habilitações literárias”, podemos concluir que as pessoas com escolaridade secundária ou superior tem maior nível de literacia em saúde (31,56) comparativamente com as pessoas com escolaridade até ao ensino básico (29,78). O valor de prova desta variável é de 0,020, podendo concluir que há evidência estatisticamente suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde está correlacionado com as habilitações literárias das pessoas em estudo. Mais concretamente, nessa população, quanto maior a escolaridade maior o nível de literacia em saúde. No entanto a relação existente é desprezável. Com base na variável “situação profissional em categorias”, o nível de literacia em saúde é superior nas pessoas que se encontram no ativo (32,27) em relação às pessoas que se encontram no inativo (30,56). O valor de prova desta variável é de 0,259, permitindo concluir que não há evidencia estatística suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde é influenciado pela situação profissional. Quanto à variável “local de residência”, o nível de literacia em saúde é maior nas pessoas que vivem em meio urbano (31,56) em relação às pessoas que vivem em meio rural (29,96). Depois de realizada a análise inferencial, podemos concluir que não há evidência estatística suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde é influenciado pelo local de residência.
Relativamente ao terceiro objetivo: “Perceber se existe relação entre o nível de literacia em saúde e as variáveis clínicas nas pessoas com alterações de saúde mental assistidas numa instituição psiquiátrica, as variáveis clínicas foram cruzadas com a variável literacia em saúde. Portanto, foi possível observar a existência de relação entre o motivo de internamento e a literacia em saúde, podendo concluir que as pessoas que foram internados com o diagnóstico de perturbação da personalidade possuem maior nível de literacia em saúde (32,98), seguindo-se das restantes alterações mentais. Após a análise inferencial, podemos concluir que, no entanto, apenas o motivo de internamento perturbação neurótica tem evidência estatística suficiente. Por fim, foi analisada a variável “tem alguma outra doença de longa duração” e a variável “literacia em saúde”, tendo-se verificado que as pessoas que já vivenciaram outros problemas de saúde possuem um nível de literacia de saúde superior (31,38) comparativamente aqueles que não vivenciaram essa situação (30,85). Com base na análise inferencial, o valor de prova é de 0,821 e indica a inexistência de correlação, estatisticamente significativa, entre a variável em causa e o nível de literacia em saúde.
No que diz respeito ao quarto objetivo: “Verificar se há relação entre o nível de literacia em saúde nas pessoas assistidas em unidades de curto internamento e as pessoas em fase de tratamento no ambulatório”, foi observado a existência de relação, sendo que as pessoas assistidas externamente à instituição possuem maior nível de literacia em saúde (31,20) relativamente às pessoas assistidas em unidades de curto internamento (30,85). Após calcular o valor de prova, conclui-se, que não há evidência estatística suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde é influenciado pelo tipo de internamento.
Relativamente à primeira questão: “Qual o nível de literacia em saúde nas pessoas com alterações de saúde mental assistidos numa instituição psiquiátrica? “, foi possível averiguar através do questionário HLS-EU-PT, que a amostra em estudo é maioritariamente constituída por pessoas com um nível de literacia considerado problemático (63,7%). Comparativamente a outros países da Europa, nomeadamente, Holanda, Irlanda, Polónia, Grécia, Alemanha, Áustria, Espanha e Bulgária, Portugal encontra-se ligeiramente abaixo da média destes países, sendo que, o valor médio do score europeu situa-se nos 33,8 e Portugal nos 33,0. Em relação ao nível de literacia em saúde, em Portugal há um predomínio do nível de literacia “suficiente” (42,4%). Nas dimensões Cuidados de Saúde e Prevenção da Doença, Portugal situa-se abaixo dos valores médios, sendo que, na dimensão Cuidados de saúde,45,4% das pessoas apresentam um nível de literacia limitada (problemático 35,3% e inadequado10,1%) e na dimensão prevenção da doença, 45,5% das pessoas também apresentam um nível de literacia limitada (34,2% problemático e 11,3% inadequado). Quando à dimensão Promoção da Saúde, Portugal encontra-se ligeiramente acima dos valores médios (Espanha, Ávila , & Mendes, 2015). Examinando a nossa amostra, podemos verificar que o nível de literacia geral é problemático, seguindo-se de suficiente, nas três dimensões da literacia em saúde há um predomínio do nível de literacia problemático (PS-52,5%; PD-53,5% E CS- 51,5%). Contudo, estes valores são semelhantes aos descritos na literatura, onde se verifica que a literacia em saúde é um problema transversal, uma vez que o nível de literacia predominante se situa no problemático.
Dando resposta à segunda questão: “Será que existe relação entre o nível de literacia em saúde e as variáveis sociodemográficas?”, foi possível afirmar que, na nossa amostra verificou-se, a existência de relação entre a idade e o nível de literacia em saúde, quanto mais velhos são as pessoas menor o nível de literacia em saúde, pois as pessoas com idade inferior a 35 anos apresentavam um nível de literacia de 32,62 , e as pessoas com idade superior a 65 anos apresentavam um nível de literacia de 28,90. Contudo, esta relação é desprezável. Na nossa amostra também foi possível verificar a existência de relação entre as habilitações literárias e o nível de literacia em saúde, quanto mais estudos têm as pessoas, maior o nível de literacia em saúde. Em 2018, Portugal a média das idades situava-se nos 44,8 anos, já em 2010 esta média situava-se nos 41,2 anos, através destes dados podemos afirmar que a população portuguesa está a envelhecer. Sendo que, a média europeia situa-se nos 43,1 anos, mais baixa que em Portugal. Contudo, a percentagem da população com escolaridade inferior ao ensino básico tem vindo diminuir (Pordata, 2019). Na população da nossa amostra, não se conseguiu verificar tanto estas diferenças, pois 50,5% da amostra apresentavam escolaridade inferior ao ensino básico e os restantes 49,5% apresentavam escolaridade superior.
A relação entre o nível de literacia e a idade foi corroborada por vários estudos, que evidenciam que quanto mais velhos são as pessoas menor a literacia em saúde (Serrão, Veiga, & Vieira, 2015; Veiga & Serrão, 2016; Espanha, Ávila, & Mendes, 2016). Contudo, a relação existente na nossa amostra não é tão significativa, como se pode verificar também no estudo de Carneiro, Silva, & Jólluskin (2017). Em relação à variável habilitações literárias, quanto mais escolaridade têm as pessoas, maior é o nível de literacia em saúde (Serrão, Veiga, & Vieira, 2015; Pedro, Amaral, & Escoval, 2016; Carneiro, Silva, & Jólluskin, 2017). Contudo na nossa amostra esta relação não foi significativa para afirmarmos que quanto mais escolaridade tenham as pessoas mais letradas em saúde sejam. Segundo o estudo de Carneiro, Silva, & Jólluskin (2017), quando a variável habilitações literárias é controlada, a relação entre o nível de literacia e a idade torna-se desprezável ou as diferenças existentes desaparecem. Relativamente às restantes variáveis sociodemográficas (sexo, estado civil, situação profissional e local de residência), não foi possível verificar a existência de relação destas com o nível de literacia em saúde, na amostra em questão.
Quanto à terceira questão de investigação: “Será que há relação entre as variáveis clínicas e o nível de literacia em saúde nas pessoas com alteração da saúde mental?” e após a análise em programa estatístico, averiguou-se, para a nossa amostra, a existência de relação entre o diagnóstico de internamento “perturbação neurótica” e a literacia da saúde, sendo que as pessoas com este motivo de internamento possuem maior nível de literacia, em comparação aos outros motivos de internamentos. No entanto, não existe fundamentação para comparar os nossos dados com a literatura. Quanto à outra variável clínica em estudo, “tem alguma outra doença de longa duração”, não se observou, para a nossa amostra, relação entre esta e a literacia em saúde, que fosse considerada estatisticamente significativa.
Por fim, em relação á terceira questão: “Qual o nível de literacia nas pessoas assistidas em unidade de curto internamento e Unidade socio-ocupacional de apoio em ambulatório?”, foi possível identificar a existência de relação entre ambas as variáveis, sendo que se verificou uma maior literacia nas pessoas assistidas externamente à instituição em relação às pessoas assistidas em unidades de curto internamento. Contudo, após a análise inferencial de ambas as variáveis, concluiu-se que não existe relação entre o nível de literacia em saúde e o tipo de internamento das pessoas.
É de salientar que, apesar de não existir relação estatisticamente significativa entre ambas as variáveis, as pessoas assistidas externamente à instituição apresentam um nível de literacia superior (31,20) à das pessoas institucionalizadas em unidades de curto internamento (30,85).
Conclusão
Na pesquisa bibliográfica, sobre a população portuguesa, denota-se o baixo nível da literacia em saúde. Contudo o nível de literacia varia dependendo de alguns fatores. De acordo com a revisão da literatura, existe uma relação entre a idade e o nível de literacia, apesar de não serem estatisticamente significativas, que não permitem afirmar que à medida que a idade avança, o nível de literacia tende a diminuir (Medina, 2019).
O fator escolaridade relaciona-se com a literacia em saúde, uma vez que os idosos com um menor nível de escolaridade, tendem a ser os mesmos que apresentaram os piores resultados (Medina, 2019). Os resultados do nosso estudo corroboraram com a revisão da literatura analisada, porque o nível de escolaridade afeta o nível de literacia em saúde. Apesar de haver evidência estatística suficiente para afirmar que o nível de literacia em saúde é influenciado pela idade ou pela escolaridade, esta relação é desprezável, fazendo com que não se possa dizer que quanto mais velho menor a literacia dos mesmos ou quanto maior o nível de escolaridade maior o nível de literacia. Denotou-se, também, a existência de relação entre o motivo de internamento “perturbação neurótica” e a literacia em saúde, sendo que os indivíduos com este motivo de internamento possuem maior nível de literacia, comparativamente com os outros motivos de internamentos.
Este estudo veio evidenciar um nível de literacia em saúde baixo nas pessoas desta amostra, demonstrado através dos resultados que se situavam no “problemático” e “limitada” na relação da literacia em saúde.
Implicações para a Prática Clínica
O conceito de literacia em saúde tem vindo a ganhar importância ao longo das décadas, de forma a capacitar as pessoas para a tomada de decisão acerca da sua saúde. Este é transversal nas várias áreas da saúde onde se tem evidenciado um baixo nível de literacia, podendo ser um fator de risco para o desenvolvimento das doenças crónicas (diabetes e obesidade), sendo que, este acontecimento também se verifica nas perturbações psiquiátricas. Um inadequado nível de literacia em saúde pode ter implicações significativas na saúde individual e coletiva (Martins, 2018).
Alguns autores relacionam o facto de que as pessoas possuírem um baixo nível de literacia em saúde tem maior dificuldade em compreender a informação fornecida pelos profissionais de saúde. Sendo que, este quando relacionado ao estigma e preconceito contribuem para agravar as perturbações mentais, uma vez que, impedem o diagnóstico precoce das mesmas, levando uma elevada taxa de hospitalização, que por sua vez, se traduz em elevados custos em cuidados de saúde (Loureiro, Pedreiro, Correia, & Mendes, 2012; Pedro, Amaral, & Escoval, 2016).
Desta forma, tem-se procurado que as pessoas adquiram conhecimentos em saúde, para que a comunicação entre os profissionais de saúde e as pessoas seja eficaz. O autoconhecimento e a autoconsciência são assim aptidões que importam fortalecer, de modo a conseguir estabelecer relações de ajuda com as pessoas, que se pretendem coerentes, empáticos e de aceitação incondicional do outro (Tomás, 2013).