Introdução1
Os estudos indicam que existe relação entre o género e a intervenção das mulheres portuguesas no mercado de trabalho (Silva, 2016), e que as mulheres estão em posições desiguais comparativamente aos homens, em vários fenómenos (Silva, 2016), como a segregação horizontal (Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego [CITE], 2018), a segregação vertical (Casaca & Perista, 2017) e as desigualdades salariais (CITE, 2018).
Apesar disto, os estudos também revelam que esta tendência está a modificar-se nos jovens. De facto, as taxas de emprego entre os géneros tendem a assemelharem-se nestas faixas etárias (Wall et al., 2016), com o crescente do número de jovens diplomados com educação superior (Rocha, 2014). Como resultado, as desigualdades de género atenuam neste grupo etário no espaço doméstico (Wall et al., 2016) e nos salários (Casaca & Perista, 2017), evidenciando-se a relevância da escolaridade nestas alterações.
O presente artigo tem por objetivos i) caracterizar as desigualdades de género no mercado de trabalho nos Açores, uma região onde o mercado laboral e a participação das mulheres têm apresentado particularidades e debilidades face ao contexto nacional, e ii) perspetivar as tendências de mudança protagonizadas aí pelos jovens nesta matéria.
Associado às especificidades do mercado de trabalho açoriano, a entrada da mulher na vida ativa nesta região fez-se tardiamente no contexto nacional (Diogo & Rocha, 2018). No entanto, nas camadas mais jovens, verifica-se atualmente uma tendência generalizada para as mulheres integrarem o mercado de trabalho (Diogo, 2008; Tomás, 2008). Em que medida estas mudanças se estão a traduzir numa maior igualdade de oportunidades entre homens e mulheres na esfera laboral? Investigação já realizada aponta para a persistência de desigualdades salariais na região (Diogo & Rocha, 2018), porém não olha para as restantes dimensões, nem para os jovens. Assim, pretende-se analisar as desigualdades de género no mercado de trabalho açoriano, a partir de uma abordagem mais abrangente, considerando além das desigualdades salariais, a segregação horizontal e a segregação vertical, assim como aprofundar o caso dos jovens, a partir das suas perceções.
Desigualdades de género no mercado de trabalho: dimensões de análise e teorias explicativas
Os estudos relevam que o género continua a ser uma variável que condiciona as oportunidades dos indivíduos no mercado do trabalho, notando-se a existência de assimetrias entre os homens e as mulheres penalizadoras para as segundas (Fernandez-Mateo & Kaplan, 2018; Silva, 2016). Estas assimetrias dizem respeito a fenómenos que surgem designados na literatura como desigualdades de género.
As desigualdades de género abrangem “direitos, estatuto e dignidade hierarquizados entre as mulheres e os homens, quer a nível da lei quer a nível dos factos” (Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego [CITE], 2003, p. 303). São diferenças de oportunidades entre os homens e as mulheres na esfera pública e na esfera privada (CITE, 2003), sendo que o mercado de trabalho se insere na esfera pública e os trabalhos de foro doméstico na esfera privada (Bourdieu, 1999; Silva, 1983, citado em Amâncio, 1994). Este fenómeno manifesta-se através da segregação horizontal (Silva, 2016), da segregação vertical (Silva, 2016) e das desigualdades salariais (CITE, 2003).
A segregação horizontal abrange a “concentração de mulheres e/ou homens em diferentes tipos de atividade, ficando as mulheres confinadas a um leque mais apertado de sectores ou profissões” (CITE, 2003, citado em Ponces, 2022, p. 28). Esta componente é visível em várias profissões e traduz-se na tendência para as mulheres estarem inseridas em determinados ramos de atividade e de profissões que são consideradas femininas e com remunerações mais baixas (Casaca & Perista, 2017). Efetivamente, os setores de atividade e as categorias profissionais onde existem mais mulheres têm menores remunerações (CITE, 2018). A maioria das mulheres ingressaram no setor terciário por serem trabalhos com afinidade com o papel doméstico (Casaca, 2013), como professoras, administrativas ou profissionais de saúde. Nos últimos anos, este tipo de profissões manteve uma elevada participação feminina, continuando a serem áreas femininas. Por outro lado, houve modificações nas profissões que tinham menor participação feminina, como as profissões liberais, as engenharias e os executivos das empresas (Gadrey, 2001, citado em Gadrey, 2005).
No que diz respeito à segregação vertical consiste na “concentração de mulheres e/ou homens nos níveis mais baixos da hierarquia profissional” (CITE, 2003, citado em Ponces, 2022, p. 28). Assim, é verificada uma maior concentração das mulheres nas posições inferiores da hierarquia e com menores remunerações (Casaca & Perista, 2017). Na literatura é utilizado o conceito de “teto de vidro” para dar conta da existência de barreiras invisíveis nas organizações que dificultam a promoção das mulheres a cargos mais elevados na hierarquia. Este cenário ocorre quando os homens e as mulheres possuem qualificações e competências idênticas, no entanto, não existem as mesmas oportunidades de ascender a um cargo de chefia. Em contrapartida, as mulheres que ocupam estes cargos desistem devido à cultura machista das organizações (Courtney, 2007, citado em Schouten, 2011). Segundo os Quadros de Pessoal de 2009, as chefias das empresas tendem a ser masculinas (Cantante, 2014), esta tendência permanece constante (Casaca & Lortie, 2017). Em 2020 os cargos de chefia continuam a ser masculinizados nas empresas cotadas em bolsa (Casaca et al., 2020).
A desigualdade salarial ou a assimetria salarial define-se por “desigualdade salarial média entre mulheres e homens. Pode referir-se à remuneração média mensal de base ou ao ganho médio” (CITE, 2003, citado em Ponces, 2022, p. 31). São as mulheres que tendem a auferir rendimentos inferiores em comparação com os homens, havendo, no entanto, uma tendência para as desigualdades salariais se amenizarem nas gerações mais jovens (Casaca & Perista, 2017).
As desigualdades de género no mercado de trabalho têm vindo a ser explicadas a partir de diferentes correntes teóricas, destacando-se a teoria do capital humano (Casaca, 2009), as teorias da segmentação do mercado de trabalho (Casaca, 2009), os contributos que se centram na influência das representações sociais de género (Casaca & Perista, 2017) e, por fim, as perspetivas relativas à conciliação emprego-família (CITE, 2018).
De acordo com a teoria do capital humano de Becker, que assenta na ideia de que as decisões nas organizações são racionais, existe maior dificuldade na contratação das mulheres, uma vez que têm menor produtividade por terem custos associados à maternidade, e por este motivo, é incentivada a permanência das mulheres na esfera doméstica (Becker, 1993, citado em Casaca & Perista, 2017; Casaca, 2009). Segundo esta abordagem, as mulheres renunciam a determinados cargos, de forma voluntária, para conseguirem conciliar a vida profissional e familiar, ou seja, escolhem determinados empregos que simplifiquem a conciliação emprego-família (Degraff & Anker, 2004). Neste contexto, as mulheres competem entre si para aceder a profissões com menor exigência, menor valorização social e menores salários em comparação com o dos homens (Becker, 1993, citado em Casaca & Perista, 2017; Casaca, 2009).
Relativamente às teorias da segmentação, estas defendem que existem dois segmentos do mercado de trabalho: primário e o secundário (Casaca, 2009; Dias et al., 2020). O mercado de trabalho primário incorpora os trabalhadores com condições de trabalho favoráveis em funções qualificadas bem remuneradas. Neste grupo, os indivíduos beneficiam de estabilidade no emprego, com progressão na carreira e com poder de negociação (Casaca, 2009; Dias et al., 2020), estando sobrerrepresentados os homens e os indivíduos qualificados (Casaca, 2009). No que diz respeito ao mercado de trabalho secundário, este abrange os indivíduos com posições mais fracas no mercado de trabalho, em situações de precariedade, pouco qualificados com remunerações inconstantes e baixas. Neste mercado os indivíduos não detêm segurança no trabalho, nem poder de negociação (Casaca, 2009; Dias et al., 2020). Este segmento é composto predominantemente por mulheres, jovens e indivíduos com baixo nível de escolaridade (Casaca, 2009).
Uma outra perspetiva teórica centra-se na relação das representações sociais na construção social do género, defendendo que as representações de género estão presentes no processo de recrutamento/seleção e, posteriormente, quando estão inseridas na organização através das expetativas e da identidade de género. Esta corrente teórica explica porque existem profissões desempenhadas por homens e profissões desempenhadas por mulheres (Casaca & Perista, 2017). Estes estereótipos de género contribuem para a permanências das desigualdades existentes entre homens e mulheres (Silva, 2016), verificando-se na segregação horizontal (Casaca & Perista, 2017).
Uma última abordagem foca-se na variável género como componente essencial na conciliação emprego-família que condiciona a participação das mulheres no mercado de trabalho (CITE, 2018), considerando que os estudos indicam que são as mulheres que despendem maior número de horas semanais à esfera doméstica (Wall et al., 2016) e estão encarregues da prestação de cuidados familiares (CITE, 2018). Segundo Schouten (2011), as mulheres não estão apenas sujeitas ao “teto de vidro”, como também a “parede de vidro”, isto significa que são as desigualdades na divisão das tarefas domésticas que desencadeiam assimetrias no mercado de trabalho, pois a maioria das mulheres não têm apoio do cônjuge para dedicarem-se à sua atividade profissional. Assim, as mulheres estão encarregues do trabalho familiar, dificultando a sua progressão laboral (Schouten, 2011). Couppié et al. (1997) evidenciam que as mulheres para alcançarem carreiras profissionais equivalentes às dos homens têm de se manter solteiras ou sem filhos pequenos (Couppié et al., 1997), salientando, assim, que a maioria das mulheres não possuem apoio conjugal para investir na carreira, ao contrário do que ocorre com muitos homens (Schouten, 2011).
Apesar da persistência das desigualdades de género no mercado de trabalho, os estudos têm vindo a apontar para a sua amenização nos grupos juvenis devido às seguintes razões: a taxa de emprego nos jovens entre homens e mulher encontra-se com valores semelhantes (Wall et al., 2016), as desigualdades salariais apresentam números inferiores nestas faixas etárias (Casaca & Perista, 2017), os jovens homens dedicam-se com mais frequência à esfera doméstica (Wall et al., 2016) e são os homens jovens que têm valores mais modernistas em relação à vida familiar (Aboim, 2007). A escolaridade é um fator explicativo para estas transformações, pois os estudos indicam que foi a dedicação das mulheres na sua educação que desenvolveu uma diminuição nas diferenças salariais entre os géneros, com ênfase nos jovens comparativamente aos outros grupos etários (Casaca & Perista, 2017) e que são as mulheres com maiores níveis de escolaridade que mais participam no mercado de trabalho (Casaca, 2012) e, por conseguinte, as jovens mulheres com ensino superior possuem valores modernos sobre a vida familiar (Aboim, 2007). Logo, os jovens são uma categoria social particularmente relevante para perspetivar as dinâmicas de transformação deste fenómeno. Com esse intuito, a pesquisa, de que se dá conta no presente artigo, procurou analisar, num primeiro momento, as desigualdades de género na globalidade do mercado de trabalho na Região Autónoma dos Açores e, num segundo momento, as perceções dos jovens acerca dessas desigualdades, de forma a vislumbrar tendências de mudança em curso.
Metodologia da investigação
Tendo em conta os dois objetivos enunciados, a recolha de dados da investigação teve duas fases. Em primeiro lugar, numa abordagem macrossocial ao mercado de trabalho açoriano, foram extraídos os dados dos Quadros de Pessoal respeitantes ao mês de outubro de 2019, publicados no Relatório Único (Observatório do Emprego e da Qualificação Profissional [OEFP], 2021). Estes dados dizem respeito às empresas privadas e estatais, excluindo a Administração Pública.
Numa segunda fase, pretende-se compreender a perspetiva microssociológica do fenómeno através das perceções dos indivíduos. As entrevistas permitem obter dados com maior profundidade, analisando-se aspetos que não estão presentes nas estatísticas, nomeadamente as perceções face às desigualdades de género, as dinâmicas familiares e a articulação emprego-família. Estes fatores são essenciais para compreender a manutenção das desigualdades no mercado de trabalho. Consequentemente, foram realizadas 24 entrevistas semiestruturas a jovens tendo-se definido como jovens, segundo o critério do Observatório da Juventude dos Açores (s.d.), os indivíduos na faixa etária entre os 15 e os 34 anos. Os jovens entrevistados estavam empregados e tinham idades compreendidas dos 23 aos 34 anos. Utilizou-se, também, como critério as habilitações literárias, contemplando-se jovens mais escolarizados (13 com ensino superior) e jovens com menor escolaridade (11 sem ensino superior, todos com o ensino secundário à exceção de um). As entrevistas foram sujeitas a uma análise de conteúdo categorial (Quivy & Campenhoudt, 2013), com recurso ao programa informático QDA Miner lite.
De forma, a garantir a fiabilidade das categorias foi calculado o k de Cohen no SPSS (Lima, 2013) e o cálculo da fidelidade através da proporção de acordos. Assim, o resultado do k de Cohen foi de 0,914; no caso do cálculo da proporção de acordos, o resultado foi de 94%, aferindo que o sistema de categorias possui fiabilidade (Ponces, 2022).
As desigualdades de género no mercado de trabalho açoriano
O mercado de trabalho açoriano tem-se caracterizado por particularidades e debilidades face ao quadro nacional, com destaque para o tecido empresarial constituído, em maior grau do que na generalidade do país, por empresas maioritariamente de pequena dimensão (Diogo et al., 2021; Palos, 2014), o menor nível de qualificações da população empregada (Rocha et al., 2005; Serviço Regional de Estatística dos Açores [SREA], 2020) e o elevado peso do setor primário (Rocha et al., 2005), dificultando a feminização do emprego. Deste modo, os Açores eram até há pouco tempo uma das regiões portuguesas, ou mesmo a região, com menor participação das mulheres no mercado de trabalho, continuando a apresentar, em 2020, uma taxa de atividade feminina (52,1%) abaixo da média nacional (53,6%), segundo o inquérito ao emprego (PORDATA, 2022).
As mulheres açorianas entraram massivamente no mercado de trabalho numa fase mais recente que a nível nacional, sendo dinamizada primeiramente em 1976, com a criação de novos serviços relacionados com a implementação do Estado Providência, e mais intensamente a partir do ano 2000, com o crescimento do turismo e de outros tipos de serviço que não apenas os serviços públicos (Diogo, 2008). Assim, nas camadas mais jovens, verifica-se atualmente uma tendência generalizada para as mulheres integrarem o mercado de trabalho (Diogo, 2008; Tomás, 2008).
A maior presença de mulheres no mercado laboral regional não se tem traduzido necessariamente por uma igualdade de oportunidades entre homens e mulheres nesta esfera. Alguns trabalhos têm evidenciado, nomeadamente, a existência de desigualdades ao nível salarial (Diogo & Rocha, 2018), não havendo estudos, contudo, sobre as outras dimensões do fenómeno na Região, ou seja, sobre a segregação horizontal e a segregação vertical. Começa-se, assim, por fazer uma caracterização das desigualdades de género no mercado de trabalho dos Açores através das suas dimensões: a segregação horizontal, a segregação vertical e as desigualdades salariais.2
Segregação horizontal
Em 2019 a maioria da população ativa açoriana estava inserida no setor terciário, sendo a participação feminina minoritária no setor primário e secundário (Relatório Único, 2021, citado em por Ponces, 2022). O contexto nacional apresenta a mesma tendência, pois o setor terciário engloba a maioria da população empregada (Sá et al., 2021). No entanto, as mulheres estão, sobretudo, inseridas nos serviços associados ao cuidado a terceiros, nomeadamente nas áreas da educação, saúde, serviços pessoais, limpeza (Wall et al., 2016). Independentemente do nível escolar, as mulheres tendem a estar inseridas nas mesmas áreas, apesar exercerem outro tipo de funções (Wall et al., 2016).
A segregação horizontal averigua-se através da distribuição de homens e mulheres por categorias profissionais (segundo a Classificação Portuguesa das Profissões de 2010) e por habilitações literárias (Tabela 1).
É notória a distribuição por categorias profissionais entre homens e mulheres, sendo que os homens estão inseridos nos grupos 1, 3, 6, 7 e 8 e as mulheres estão integradas nos grupos profissionais 2, 4, 5 e 9, sendo também evidente a maior concentração das mulheres num menor número de grupos profissionais, sendo indicador de fenómenos segregação horizontal.
Em contrapartida, se analisarmos a distribuição masculina e feminina por categorias profissionais por nível de escolaridade, a tendência modifica-se. No grupo dos “Especialistas das atividades intelectuais e científicas”, os homens estão mais frequentemente inseridos nesta categoria em comparação com as mulheres quando não têm habilitações universitárias. O grupo 9 é mais feminizado quando as mulheres possuem o ensino básico, enquanto os homens pertencem com maior frequência a este grupo com as outras habilitações literárias. Assim, as mulheres diplomadas estão maioritariamente inseridas nos grupos dos 2 e 4 e em comparação com os homens. A integração nas mulheres na área administrativa é um fenómeno europeu (Gadrey, 2005), nacional (Ferreira, 1998) e açoriano (Rocha et al., 2005).
Segregação vertical
Existe legislação portuguesa com o objetivo de instituir uma representação equilibrada na quantidade de homens e mulheres a ocupar cargos de chefia em empresas cotadas em bolsa e no setor público empresarial (Paço & Casaca, 2021). Entre 2005 e 2015, não existiram muitas alterações no género dos indivíduos que ocupavam cargos de topo e as chefias femininas intermédias da administração pública aumentaram (Wall et al., 2016).
Averiguando como estão distribuídas as chefias açorianas por género e setores de atividade económica (Figura 1) verifica-se que existem mais homens a ocupar cargos de chefia em todos os setores. Contudo, existem mais chefias femininas no setor terciário, sendo a ocupação feminina maioritária neste setor.
A Tabela 2 estabelece a comparação das habilitações literárias das chefias açorianas. Assim, é possível verificar que as mulheres que ocupam cargos de chefia tendem a possuir, mais frequentemente, habilitações académicas de nível superior, nomeadamente licenciatura (28,8%), mestrado (4,0%) e doutoramento (0,9%), em comparação com as habilitações literárias dos homens para o mesmo nível hierárquico. Concluindo-se, assim, que os homens que desempenham posições de chefia possuem níveis académicos inferiores comparativamente com as mulheres que ocupam estas posições no mesmo nível ou equiparados. Nos Açores, as mulheres tendem a possuir níveis de habilitações literárias superiores em comparação com os homens, nomeadamente o ensino superior (Rocha et al., 2012), em Portugal a tendência mantém-se (Torres, et al., 2018).
Desigualdades salariais
Para analisar as desigualdades salariais consideram-se as remunerações médias pagas e os ganhos médios mensais em simultâneo porque outros estudos salientaram existem maiores assimetrias salariais quando o valor é calculado pelos ganhos mensais (Ferreira, 2010). Averiguam-se as diferenças salariais por níveis de qualificação (Casaca & Perista, 2017), por habilitações académicas (Diogo & Rocha, 2018) e por antiguidade (Casaca & Perista, 2017).
A Tabela 3 evidencia a posição desfavorável das mulheres, em termos de remunerações e ganhos mensais, em todos os níveis de qualificações, salvaguardando o caso dos praticantes e aprendizes. Nota-se que os níveis de qualificação com maiores disparidades salariais são os Quadros Superiores, os Profissionais Altamente Qualificados e os Encarregados. Esta assimetria salarial nos Quadro Superiores foi referenciada em estudos anteriores (Casaca & Perista, 2017; Diogo & Rocha, 2018).
A Tabela 4 analisa as assimetrias das remunerações e dos ganhos salariais por habilitações literárias, verifica-se que as mulheres são alvo de desigualdade salarial em quase todos os níveis académicos, exceto no que diz respeito às remunerações para os habilitados com o 3.º ciclo, nesta situação os homens são alvo de desigualdade salariam com uma diferença de 2,9%. É possível concluir que os ganhos médios mensais apresentam diferenças salariais superiores, com algumas exceções nomeadamente no 2.º ciclo, no curso técnico superior profissional e no bacharelato.
Em 2019, a nível nacional verificou-se a existência de desigualdades salariais em todos os níveis escolares entre homens e mulheres (Sá et al., 2021). Podemos concluir que as desigualdades salariais entre os géneros aumentam nos níveis académicos mais elevados e diminuem nas habilitações literárias mais baixas, conforme foi verificado noutros estudos (Diogo & Rocha, 2018).
Comparando as remunerações médias mensais e os ganhos médios por antiguidade (Tabela 5), nota-se que, existem desigualdades salariais por antiguidade, principalmente nas remunerações médias. No caso dos ganhos salariais, afigura-se outro cenário, pois estes parecem ser benéficos para as mulheres que se encontram nos escalões de antiguidade entre os 5 a 9 anos (-1,0%) e entre 15 aos 19 anos (-0,8%), apesar de serem valores pouco significativos. Porém, os homens auferem melhores salários, independentemente da antiguidade (Figueiredo & Fontainha, 2015).
Em suma, constatou-se uma tendência para as assimetrias salariais entre os homens e as mulheres serem maiores quando se analisa os ganhos mensais por níveis de qualificação e por habilitações literárias, contudo, o mesmo não se verifica na antiguidade, com exceção ao inferior a 1 ano.
Perceções dos jovens
Depois de dar conta de alguns indicadores de desigualdades de género no mercado de trabalho, em termos de segregação horizontal, segregação vertical e diferenças salariais, pretende-se perceber como é que o fenómeno é percecionado pelos jovens, considerando que estes são particularmente relevantes para perspetivar as dinâmicas de transformação em curso. Com base na análise das entrevistas a 24 jovens, apresentam-se as suas perceções sobre a segregação horizontal, a segregação vertical, as desigualdades salariais e a conciliação emprego-família.3
Perceção dos jovens sobre a segregação horizontal
No que diz respeito à perceção sobre a segregação horizontal, a maioria dos entrevistados manifesta que não existem diferenças entre as funções desempenhadas pelos homens e pelas mulheres na organização onde estão inseridos: “Ah, sim, sim, sim. Trabalho de campo e trabalho de secretária, é tanto homem como de mulher.” (Indivíduo do sexo feminino, 33 anos, licenciada); “Ah sim, sim, não há discriminação de modo nenhum.” (Indivíduo do sexo feminino, 34 anos, licenciada).
Contudo, existem algumas ocorrências em que os entrevistados referem encontrar-se numa situação de segregação horizontal devido a estereótipos de género ou de elementos culturais (Schouten, 2011), associando-se o trabalho feminino ao trabalho administrativo e de costureira. Estas associações podem ser explicadas com a relação que o papel da mulher tem com o espaço doméstico (Rocha et al., 1999), verificando-se a presença dos estereótipos de género e de elementos culturais (Schouten, 2011) relativamente ao tipo de profissões desempenhadas por homens e por mulheres (Casaca & Perista, 2017). Verifica-se, assim, a influência do papel social de cada género no desempenho das profissões:
(…) por acaso temos diferenciação de sexo e de trabalhos na empresa (…). Temos uma parte que é produção, só nessa parte só trabalham senhoras, temos a parte da estamparia onde trabalha um rapaz, mas parte de produção propriamente dita são só mulheres. A parte de armazém e de administrativo e comercial são, maioritariamente, homens. Só tem uma senhora a desempenhar, parte da função desta. Portanto, tirando estas duas pessoas que são exceção à regra, temos a empresa divida em dois setores e também por sexos. (Indivíduo do sexo masculino, 25 anos, licenciatura)
(…) por exemplo, naturalmente existe mais homens porque aquilo é uma empresa que tem mecânicos, mecânicos só há homens (…) eu diria que se calhar é 70% masculino e 30% feminino (…) na secretaria comercial é só mulheres (…) Acho que ainda há aquela coisa dos papéis trata a mulher, da mão de obra trata o homem (…). (Indivíduo do sexo masculino, 28 anos, licenciatura)
(…) as nossas direções com maior número de efetivos são as direções de produção e distribuição, portanto trabalha a nível de centrais e nas centrais nós verificamos, bem à vontade 95% do pessoal que lá trabalha são homens. Começam a existir algumas mulheres, algumas engenheiras e até mesmo algumas operadoras de central, mas é algo recente. (Indivíduo do sexo masculino, 25 anos, licenciatura)
Em todo o caso, a maioria dos entrevistados, independentemente do sexo, não perceciona sinais de segregação horizontal na empresa onde trabalha. A invisibilidade destas desigualdades poderá resultar de uma naturalização do fenómeno, dificultando o reconhecimento dos estereótipos de género como fator produtor de segregação horizontal.
Perceção dos jovens sobre a segregação vertical
Relativamente às perceções sobre a segregação vertical, os entrevistados notam que ambos os géneros ocupam posições de chefia nas empresas onde trabalham, encarando, desta forma, o desempenho de cargos de chefia pelas mulheres como uma realidade natural. Nestas situações existem as mesmas oportunidades entre homens e mulheres a ocupar cargos de chefia: “Por acaso ali eu não sinto que haja muita desigualdade, não. Há chefes mulheres e chefes homens e todos trabalham bastante bem uns com os outros e respeitam-se uns aos outros.” (Indivíduo do sexo feminino, 27 anos, mestrado); “Na minha empresa sim, mas isto não é a opinião que tenho do resto do mercado.” (Indivíduo do sexo feminino, 34 anos, licenciada); “Sim, na minha empresa sim. Porque existem, por exemplo, quadros superiores tanto femininos como masculinos, chefias tanto masculinas como femininas, diretores igual e até administradores. Também existem administradores masculinos e femininos.” (Indivíduo do sexo masculino, 25 anos, licenciatura).
Contudo, nem todos os entrevistados estão inseridos em empresas com mulheres a desempenhar posições de chefias, notando-se que existem empresas que dão preferência a homens a desempenhar estas funções, ou seja, são situações onde ocorre segregação:
(…) as chefias que eu conheço são tudo homens. Por exemplo, nos cargos superiores, nos donos existe mulheres e homens que aquilo é uma empresa de família e existe mulheres e homens. Mas de resto, para baixo, cargos de chefias só vejo homens, por isso se calhar neste sentido, se calhar até poderá haver alguma discriminação, digamos assim, não sei… (Indivíduo do sexo masculino, 28 anos, licenciatura)
Evidenciou-se, também, que algumas organizações não estão disponíveis para oferecer as mesmas oportunidades de progressão para funções de chefia entre homens e mulheres. Esta situação verificou-se com uma entrevistada, sendo referido que na empresa onde trabalha as mulheres enfrentam obstáculos no acesso aos cargos de chefia:
Não, por exemplo na produção parece que é impensável haver uma chefe mulher, apesar que a única mulher que tinha lá dentro, tinha todas as capacidades para ser subchefe, mas nem sequer é posto na mesa, porque não… Nem sequer está a ser considerado, o que é pena e é uma coisa que eu gostava que mudasse no futuro, ela tinha todas as capacidades de ser subchefe daquele setor. (Indivíduo do sexo feminino, 29 anos, licenciatura)
Em suma, subsistem várias realidades, alguns entrevistados revelam pertencer a organizações com mulheres a ocupar cargos de chefia, em contrapartida, outros reconhecem que não existe igualdade de oportunidades entre homens e mulheres na empresa onde estão inseridos. Os jovens que reparam na desigualdade de oportunidade entre homens e mulheres para ocupar cargos de chefia são minoritários, o que pode indicar uma certa invisibilidade do fenómeno. Como foi verificado anteriormente, a maioria das chefias açorianas são masculinas em todos os setores da atividade económica (Figura 1).
Perceção dos jovens sobre as desigualdades salariais
No que diz respeito à perceção sobre as desigualdades salariais, este fenómeno passa despercebido para a maioria dos entrevistados. Torna-se, pois, relevante averiguar os recortes das situações em que os entrevistados afirmam desconhecer este tipo de situação. Os recortes dizem respeito a entrevistados que estão inseridos em empresas públicas ou semiprivadas com a perceção que o salário é atribuído pelo mérito:
Para o mesmo tipo de funções não, quem aufere mais é que está mais anos no serviço, portanto quem teve oportunidade de ir subindo ao longo dos anos, quem recebe menos independentemente de ser homem ou ser mulher tem haver à partida com o número de anos de serviço ou com a avaliação de desempenho. Nem mesmo na avaliação de desempenho há tratamento desigual. (Indivíduo do sexo masculino, 31 anos, mestrado)
Que eu tenha conhecimento, não. Toda a gente é paga pelo seu grau académico, o escalão está como mestre ou como doutorado e é pago consoante isso, não acho que… não sei se há alguma desigualdade neste sentido. (Indivíduo do sexo feminino, 27 anos, mestrado)
No entanto, verificou-se a mesma tendência na maioria dos entrevistados, inclusive quando estão a trabalhar em empresas privadas, notando-se que os jovens não têm a perceção deste fenómeno, apesar da análise de dados dos Quadros de Pessoal demonstrar a presença de desigualdades salariais entre homens e mulheres.
Não obstante, existem dois entrevistados que conhecem este tipo de situação ou que foram alvo de desigualdades salariais:
Sim, por acaso tenho esse conhecimento, não são bem as mesmas funções, mas são funções enquadradas no mesmo setor digamos. Portanto sim, tenho conhecimento desta situação sim. (Indivíduo do sexo masculino, 25 anos, licenciatura)
A nível do trabalho, pela posição remuneratória foi uma vez há muito tempo na primeira empresa foi… fazíamos a mesmas funções, tínhamos o mesmo grau de escolaridade, mas o colega ganhava mais, não sei se era por ser homem ou não, coincidia que era rapaz (…). (Indivíduo do sexo feminino, 32 anos, ensino secundário)
Deste modo, podemos concluir que existe desconhecimento deste tipo de situações por parte dos entrevistados. No âmbito da Comissão Europeia, Helena Dalli salienta que o sigilo sobre o salário incentiva as mulheres a desconhecerem desigualdades salariais a que estão sujeitas (Lourenço, 2021), portanto, esta pode ser a causa para os entrevistados não reconhecerem o fenómeno das desigualdades salariais na empresa onde trabalham.
A conciliação emprego-família dos jovens
Tendo em consideração que a participação no mercado de trabalho se encontra dependente da divisão do trabalho na esfera doméstica e que a literatura dá conta de uma mitigação das desigualdades de género na esfera doméstica nas camadas mais jovens (Wall et al., 2016), procurou-se analisar a perceção das conciliação emprego-família dos entrevistados. Deste modo, verificou-se que quem consegue estabelecer um equilíbrio nesta conciliação são os jovens casais sem filhos e os jovens que residem com os pais:
É equilibrado, o meu trabalho às vezes exige uma hora extra ou outra, se calhar tenho mais tempo no trabalho do que em casa, mas tudo é equilibrado. Se estou mais uma hora, depois também estou em casa outra hora. É assim, é equilibrado. (Indivíduo do sexo feminino, 23 anos, ensino secundário
Esta situação não se verifica quando os entrevistados têm filhos, ou seja, quando os jovens têm filhos esta conciliação complexifica-se comparativamente com os jovens que não têm filhos. Importa destacar que nos excertos das mulheres existem referências mais pormenorizadas sobre as exigências da vida familiar, porque são as mulheres que conhecem e excutam as tarefas.
É assim… Hoje em dia torna-se muito complicado essa conciliação porque ora estamos no trabalho, ora quando chegamos a casa temos todas as lidas domésticas para fazer, não é? E não podemos fechar os olhos a isso, se não o filho não come, o marido não come, eu não como. Ninguém veste porque não há roupa lavada e arrumada, etc. Portanto, cada vez mais é complicado essa conciliação, talvez ao fim de semana é quando temos mais algum tempo para dispensar com a família. Durante a semana, lá está, obviamente, que levamos o nosso filho, por exemplo, à atividade porque ele joga futebol. Mas é a tal coisa, não conseguimos, estar muito tempo juntos, os três. Devido à azáfama da nossa rotina. (Indivíduo do sexo feminino, 31 anos, mestrado)
Sinto-me porque trabalhar e depois trabalhar fora das 9h às 18h, ter um menino e depois ter as coisas de casa, não é fácil. Ter a vida doméstica também não é fácil. Claro que há sempre quem esteja pior, mas o que nos dói é o que nos toca na pele. (Indivíduo do sexo feminino, 32 anos, ensino secundário)
Sim, um bocado, sinto-me um bocado. (Indivíduo do sexo masculino, 28 anos, licenciatura)
Realça-se que a dificuldade da conciliação emprego-família aumenta quando existem filhos (Andrade, 2013), mesmo com a intervenção dos jovens homens no espaço doméstico (Wall et al., 2016), não obstante, o trabalho de cuidados permanece uma função das mulheres, salientando o papel dos estereótipos de género e elementos culturais (Schouten, 2011):
Claro que para as mulheres é mais cansativo, os filhos são mais ligados às mães. A nível que ser mãe para tudo, o pai fica ali mais um bocadinho no relax. É mais cansativo, é. (Indivíduo do sexo feminino, 30 anos, ensino secundário)
Sinto-me penalizada às vezes porque há coisas que acabam sempre por cair para mim, enquanto mulher. Sinto-me um pouco mais sobrecarregada neste aspeto. Há coisas, por exemplo, não tem de ser, não é? Mas nós mulheres é que temos que pensar, o que é que o filho vai vestir amanhã, o que é que o filho… qual é a roupa que o filho está a necessitar neste momento, o que é que nós vamos jantar amanhã. Portanto, o facto de certas e determinadas coisas que acabam por cair para mim, enquanto mulher. Por vezes, sinto-me um bocado sobrecarregada e esgotada. Mas não por ele não me ajudar, é mesmo por uma questão de serem incumbidas estas responsabilidades quase de uma forma automática. (Indivíduo do sexo feminino, 31 anos, mestrado)
Quando as crianças ficam doentes e precisam de permanecer em casa, estas tarefas têm tendência a ser da responsabilidade das mulheres, enquanto os companheiros não dão o acompanhamento ao filho, continuam a sua atividade laboral: “Já, tenho que recorrer àquela licença de acompanhamento a filho ou então férias ou horas gozadas, trabalhadas digo.” (Indivíduo do sexo feminino, 32 anos, ensino secundário).
Contudo, existem casais com outro tipo de modelo familiar, ou seja, com dinâmicas familiares assentes numa partilha de cuidados aos filhos: “Já, já. Mas não foi muito tempo foi um dia, dois dias porque depois intercalava com o meu marido, então…” (Indivíduo do sexo feminino, 27 anos, ensino secundário).
Sob a perspetiva dos entrevistados esta desigualdade na divisão de tarefas domésticas não condiciona a participação no mercado de trabalho. No entanto, quando analisamos minuciosamente as mulheres manifestam que são tratadas de modo diferente quando são mães ou quando têm que prestar assistência ao filho. Por conseguinte, se o marido/companheiro não coloca baixa para acompanhar o filho, este pode ser um impedimento para a mulher investir na sua profissão. Evidenciou-se que existem casais jovens onde são as mulheres encarregues do trabalho de cuidados, notando-se que o cuidado dos filhos incide sobre as mulheres, conforme foi verificado em estudos anteriores (Torres, et al., 2018), inclusive jovens. Assim sendo, estas mulheres acabam por obter menos disponibilidade e maiores dificuldades para dedicarem-se à carreira profissional.
Apesar disto, verifica-se uma amenização na desigualdade da divisão do trabalho familiar (Wall et al., 2016) nos grupos etários mais jovens, não existe uma desocupação das mulheres do papel doméstico, mas uma partilha das tarefas entre o casal. No caso do cuidado dos filhos, notaram-se várias modalidades, por um lado, há homens que têm intervenção neste âmbito, evidenciando-se os modelos de parentalidade mais participativos no cuidado aos filhos, como foi verificado em estudos anteriores (Wall et al., 2016). Por outro lado, permanecem casais que o trabalho de cuidados é da responsabilidade das mulheres. De forma geral, a conciliação emprego-família nos jovens casais é mais complexa e exigente quando existem filhos, e mesmo havendo participação masculina na esfera doméstica, os cuidados com os filhos recaem mais sobre as mulheres, com reflexos na sua participação no mercado de trabalho.
Conclusões
As desigualdades de género no mercado de trabalho têm sido evidenciadas tanto a nível nacional como internacional, a partir de várias dimensões, sendo explicadas por diversas teorias que colocam a ênfase em fatores como o capital humano, a segmentação do mercado de trabalho, a influência das representações sociais de género e a conciliação emprego-família. No entanto, a investigação também dá conta de alguns indicadores que poderão estar a contribuir para a sua amenização nas camadas mais jovens.
No caso dos Açores, objeto de análise neste artigo, o mercado laboral e a participação das mulheres têm apresentado acentuadas particularidades e debilidades face ao contexto nacional. Simultaneamente, esta região é marcada pelas dinâmicas de transformação evidenciadas, especialmente desde o ano 2000, traduzidas na tendência generalizada para as mulheres das novas gerações integrarem o mercado de trabalho, invertendo de forma muito intensa o comportamento das suas mães e gerações anteriores.
Numa abordagem macrossocial, com base nos Quadros de Pessoal, procurou-se, em primeiro lugar, caracterizar as desigualdades de género no mercado de trabalho açoriano. Evidenciou-se, no presente estudo, que as mulheres açorianas são alvo de desigualdades de género no mercado trabalho em todas as suas dimensões, sendo estas: segregação horizontal, segregação vertical e desigualdades salariais.
Relativamente à segregação horizontal constatou-se que a população açoriana está, maioritariamente, inserida no setor terciário. Porém, os homens participam com maior frequência no setor primário e secundário em comparação com as mulheres. No caso das categorias profissionais, os homens participam estão inseridos na maioria dos grupos profissionais, em contrapartida, as mulheres sem ensino superior estão inseridas nas profissões administrativas e nos trabalhadores de serviços pessoais (grupo 4 e 5), enquanto as mulheres com ensino superior estão integradas com maior frequência nos grupos dos especialistas e nas profissões administrativas (grupo 2 e 4) e com menor participação no grupo trabalhadores de serviços pessoais (grupo 5).
Na segregação vertical, notou-se que nos cargos de chefia as mulheres têm maiores habilitações literárias comparativamente com os homens, principalmente o ensino superior. Concluindo, assim, que a probabilidade de uma mulher desempenhar funções de chefia aumenta com as habilitações de nível superior.
No que diz respeito às desigualdades salariais, verificamos que ocorrem em desfavor das mulheres, intensificando-se na categoria profissional de Quadro Superior, nas habilitações escolares de ensino superior, como o bacharelato, licenciatura e mestrado e, por fim, com a antiguidade na organização de 20 e mais anos.
Procurou-se, numa segunda fase, a partir da análise de entrevistas, perceber como é que as desigualdades de género no mercado de trabalho são percecionadas pelos jovens, considerando que as gerações mais jovens têm protagonizado mudanças significativas ao nível da participação no mercado de trabalho açoriano, sendo particularmente relevante aprofundar as suas perceções de forma a perspetivar as dinâmicas de transformação em curso.
De acordo com a análise dos dados qualitativos, as desigualdades de género no mercado de trabalho surgem, de forma geral, invisíveis aos jovens, apesar de os dados do contexto macrossocial demostrarem que são uma realidade persistente. Desta forma, são poucos os que reconhecem a presença destes fenómenos nas organizações onde estão inseridos. As perceções sobre a conciliação emprego-família mostram que, mesmo nos grupos etários mais jovens, as mulheres tendem a assegurar o cuidado aos filhos, sendo sobrecarregadas com a conciliação e prejudicando a sua carreira profissional. O fenómeno tende, assim, a estar naturalizado, a partir de estereótipos de género que associam as mulheres ao espaço doméstico e ao cuidado dos filhos, não sendo consciencializado pelos jovens o impacto que a divisão assimétrica do trabalho familiar tem na redução das oportunidades das mulheres no mercado de trabalho.