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Revista :Estúdio

versão impressa ISSN 1647-6158

Estúdio vol.10 no.27 Lisboa set. 2019  Epub 30-Set-2019

 

Artigos originais

A artemídia na obra-processo água da artista Val Sampaio em seu fluir afetivo pela região Amazônica

The artemidia in the process work water of artist Val Sampaio in her affective flow through the Amazon region

Sissa Aneleh Batista de Assis1  *

1Universidade Católica de Brasília (UCB/Brasil). Endereço: QS 7 - Taguatinga, Brasília - DF, CEP: 71966-700, Brasil.


Resumo:

A produção artística feminina da Amazônia Brasileira ao provocar a constante interação entre arte, tecnologia e natureza, expandiu a sensibilidade artística regional atualizando-a em temas, poéticas e suportes artísticos. Tais poéticas promoveram formas de relações mais diretas das artistas visuais contemporâneas com a região Norte. Neste texto pretende-se apresentar o projeto de mídia locativa da artista visual amazônica Val Sampaio intitulado Água, sendo melhor traduzido como um trabalho artístico sobre o afeto pela região Norte mediado pelas novas mídias.

Palavras chave: mídia locativa; mulheres artistas; Amazônia

Abstract:

The feminine artistic production of the Brazilian Amazon, by provoking the constant interaction between art, technology and nature, has expanded the regional artistic sensitivity by updating it in themes, poetics and artistic supports. Such poetics promoted forms of more direct relations of the contemporary visual artists with the North region. This paper intends to present the locative media project of the Amazonian visual artist Val Sampaio entitled Water, being better translated as an artistic work about the affection for the North region mediated by the new media.

Keywords: locative media; women artists; Amazon

Introdução

(…) região que já foi chamada de inferno", de "paraíso" e de "eldorado" - se constitui, para alguns, a última fronteira a ser explorada e, para outros, um sacrário a ser preservado a qualquer custo. Para algumas visualidades, a Amazônia é a própria encarnação do último paraíso perdido; para outras, ao contrário, é o "inferno verde", quente e avesso à civilização eurocêntrica. Visões paradoxais, sem dúvida, mas nem por isso opostas e excludentes. Desde já digamos que a Amazônia não é o território do "ou" que exclui, mas do "e" que conecta e superpõe (Medeiros & Pimentel, 2013:1).

As novas poéticas artísticas do século XXI interferiram no cotidiano regional e local da região Norte do Brasil. Para tanto, atualizaram a visualidade amazônica advinda da produção artística da arte das mulheres do Norte do Brasil, consideradas por esta investigação artistas amazônicas. Parto desta produção feminina que possui relação afetuosa com a natureza regional, neste artigo visito o processo artístico da artista plástico-visual Val Sampaio, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Pará, realizadora da Arte Paraense. Tomando como ponto de partida a ideia do afeto da mulher artista regional pela natureza amazônica, irei analisar a obra de artemídia da artista em análise nomeada por Água (2010-2011).

A obra-processo Água pode ser considerada a primeira experiência de arte-mídia regional que foi criada e executada por Val Sampaio. A artista percorreu o rio Amazonas com artistas, professores e convidados de diversas regiões do Brasil em duas expedições de mídia locativa. Típica vivência artística, realizado como um mergulho profundo na região preferido por muitas artistas amazônicas. Neste trabalho Sampaio lança mão das funções e ferramentas de mídias locativas usando mapeamento e monitoramento do movimento, geotags (geo-localização), realidade móvel aumentada (tipo de hyperlinkagem) e anotações urbanas em escrita eletrônica.

O projeto foi composto por duas expedições realizadas em um barco de porte médio e modelo regional, passando pelos municípios Oriximiná, Santarém e Óbidos - localizados no Estado do Pará, região Norte do Brasil. Em setembro de 2019, foi realizada a primeira expedição do projeto na qual participaram Jarbas Jácome, Cláudio Bueno, Gilbertto Prado, Nacho Duran e Dênio Maués. Por conseguinte, em abril de 2011, na segunda expedição estiveram presentes Rosangela Leote, Panetone, Marcos Bastos, Cláudio Bueno, Léo Pinto, Panetone, Gilbertto Prado e Val Sampaio.

1. Sobre ter o rio Amazonas como sacrário, suporte e tema artísticos

A obra-processo Água que navegou no fluir da maré do baixo Amazonas, em suas primeiras ações mapeou e monitorou o ciclo das águas e seu entorno geográfico (Figura 1 e Figura 2) demarcado por GPS em geolocalização. Um dos elementos principais da obra é o mapa virtual que demarca a passagem do barco da expedição, sendo nutrido coletivamente pelos colaboradores do processo da obra. Para uma produção mais abrangente da vivência, levou-se todas as tecnologias digitais à bordo, incluindo comunicação móvel com internet para publicar dados e anotações lançados em redes sociais em tempo real ao longo o processo de construção da obra de artemída em andamento. Enquanto que a produção dos participantes das expedições estava sendo visualizada no site do projeto www.aguas.art.br, os mapas virtuais estavam disponíveis no Google Maps com o nome Água Mídia Locativa - Google My Maps. Relata Val Sampaio na rede social Água Mídia Locativa que o seu trabalho é:

uma intervenção e construção de um desenho no espaço, a construção de um desenho neste espaço, que é o rio Amazonas, entre Santarém-Obidos-Oriximiná. Primeiro dia fizemos 120 quilômetros. Segundo dia 75 quilômetros. Terceiro dia 80 quilômetros. Quarto dia 55 quilômetros. Quinto dia 35 quilômetros. Sexto 40 quilômetros. Ou seja, uma intervenção física no espaço do rio Amazonas e nas mídias localizando este lugar, por isso é uma mídia locativa. Veja nosso percurso anotado pelo nosso GPS. (Água Mídia Locativa, 2010).

Fonte do mapa: facebook Agua Mídia Locativa.

Figura 1 Val Sampaio, Água, 2010-2011. Registro de mídia locativa em mapas virtuais. Projeto Água. Rio Amazonas e municípios do Estado do Pará, Brasil. 

Fonte do mapa: Água Mídia Locativa - Google My Maps

Figura 2 Val Sampaio, Água, 2010-2011. Registro de mídia locativa em mapas virtuais. Projeto Água. Rio Amazonas e municípios do Estado do Pará, Brasil. 

Em outros dias, a artista prossegue seu relato dando inúmeras coordenadas pela rede social e registrando a localização da expedição:

1 grau 33 segundos, 55 graus 49 minutos e 13 segundos é a nossa localização. estamos na Ilha de Mirizal região de Oriximiná que desaparece sob as águas grandes de março que trazem o nosso inverno no norte do país (Água Mídia Locativa, 2010).

O projeto Água é constituído também pela produção de intervenções e performances in locus, vídeos e fotografias da natureza e da vida cotidiana de moradores dos lugares visitados por Val Sampaio e convidados. Desdobrando-se ainda em registros pessoais do grupo escolhido pela artista e convidados divididos em duas expedições, nas quais registrou-se a experiência de viver por sobre as águas do rio Amazonas tanto com artistas regionais quantos de fora do Estado do Pará. Ao passo que o olhar fotográfico da artista e dos convidados completa a obra-processo com fotografias tiradas durante as viagens (Figura 3 e Figura 4).

Fonte https://www.facebook.com/agua.midialocativa?sk=wall

Figura 3 Cláudio Bueno, Dpticos (expedição 1 e 2), 2011. Fotografia digital colorida. Projeto Água. 

Fonte: https://www.facebook.com/agua.midialocativa?sk=Wall

Figura 4 Val Sampaio, Lago Laje, a caminho do Rio Amazonas - Segunda Expedição do Projetogua, 2011. Fotografia digital colorida. Rio Amazonas e municípios do Estado do Pará, Brasil. 

2. Entre o virtual e o real: desdobramentos de uma obra múltipla.

Por extensão, os materiais artístico e de registro produzidos durante as semanas das expedições, geraram exposições tendo outras linguagens artísticas contemporâneas incluídas na obra Água, mas em propostas planejadas para a estrutura de museus. O público pôde visitar as exposições para uma experiência não mais virtual, mas real de contato direto com a produção artística. A primeira expedição resultou na instalação interativa CAVERNAME (2011), a qual tem o título que significa o conjunto de costelas ou arcos que formam a estrutura do casco de embarcações. Possivelmente, uma referência direta aos barcos alugados para as expedições que serviram de casa, escritório e ateliê dos colaboradores do projeto durante o período das longas viagens pelo rio Amazonas. Observa-se que tanto a natureza quanto os elementos externos diversos do processo de produção do projeto de artemídia foram aproveitados por Val Sampaio.

O trabalho supracitado foi apresentado no evento Art Mov Belém em um ambiente imersivo, nele foram colocados uma tela com vídeos dos participantes do projeto projetados no chão de madeira da sala escura da exposição, o som ininterrupto do barco da expedição preenchia o espaço da exposição da obra e o chão de madeira lembrava o material principal dos barcos fabricados na Amazônia brasileira. O registro do processo da obra permanece disponível na internet em redes sociais e blogs em partes. Entretanto, os desdobramentos das produções deste projeto em outras linguagens artísticas foram limitadas ao tempo da exposição em que foram apresentadas após o final do projeto.

Considerou-se a relação histórica entre a mulher artista nortista e a natureza amazônica na produção analisada neste artigo. Principalmente, no que tange à simbiose entre arte, mulher e naturezas - natural, humana e urbana - onipresente em muitos trabalhos de artistas mulheres da Arte Amazônica. Integra-se nesta análise a possibilidade do uso da Amazônia como suporte, elemento, cenário, matriz, talvez: retorno à origem. Um eterno encontro de elementos locais e regionais diversos que transbordam em obra de arte, conclui-se que mulher e natureza iluminam-se. Sob tal luz a arte feminina amazônica produz os ecossistemas estéticos e/ou a ecoestética formulados pelos pesquisadores brasileiros Afonso Medeiros e Lúcia Pimentel. Segundos os autores:

Ecossistemas estéticos podem ser pensados como processos; dinâmicas; mobilidades; equilíbrios precários; organicidades tênues; inteligências em constante estado de adaptabilidade; conluios do aleatório com o intencional; demo/grafias artístico-estéticas; ecoestéticas (Medeiros & Pimentel, 2013: 11).

Conclusão

Afirmou-se neste trabalho que a relação histórica entre a mulher artista nortista e a natureza amazônica vigora em parte da produção artística da arte do Norte do Brasil que usa como suporte, elemento e cenário o ambiente natural amazônico. Portanto, concluo que Val Sampaio é um exemplo desta premissa ao realizar a primeira expedição de artemídia registrada no Pará aventurando-se pela natureza amazônica, distanciando-se de centros urbanos e reafirmando o seu afeto pela região. Por fim, termino frisando a ligação das/dos artistas amazônicas/os com o elemento água que advém da convivência natural com sua região de origem e de produção artística. Nela o rio é rua, fluxo e arte.

Referências

Medeiros, Afonso & Pimentel, Lúcia (2014) "Ecossistemas Estéticos." In 22 Encontro Nacional da Associação Nacionalde Pesquisadores em Artes Plásticas ANPAP'2013. Belém: Programa de pós-graduação em Artes do Instituto de Ciências da Arte da da Universidade Federal do Pará. v.1, p. 7-13. ISBN: 9788560639038 [Consult, 2018-12-20] Disponível em URL: Disponível em URL: http://www.anpap.org.br/anais/2013/ANAIS/ANAIS.html . [ Links ]

*Brasil, documentarista, apresentadora, atriz e professora.

Recebido: 03 de Janeiro de 2019; Aceito: 21 de Janeiro de 2019

Endereço para correspondência Correio eletrónico: sissadeassis@yahoo.com.br (Sissa de Assis)

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