1. Introdução
De forma geral, os serviços ecossistêmicos são classificados como benefícios derivados das funções dos ecossistemas, para os quais existem demandas. Sendo assim, englobam tanto funções quanto bens derivados dos ecossistemas. Entretanto, torna-se importante compreender que o conceito de Serviços Ecossistêmicos integra tanto aspectos ecológicos, quanto econômicos e sociais; desta forma, o valor dos benefícios implicados pelos serviços ecossistêmicos não se restringe apenas à valoração econômica, explicitamente monetária,
mas engloba também valores como saúde, valor sociocultural ou valor de conservação (GRÊT- REGAMEY et al., 2017b; MAES et al., 2016).
Assim, essa abordagem enfatiza os valores da natureza para os seres humanos e fornece uma estrutura adequada para lidar com problemas complexos relacionados ao uso sustentável de recursos que as sociedades hoje enfrentam (GRÊT-REGAMEY et al., 2017b). Neste contexto, a Avaliação Ecossistêmica do Milênio teve um papel muito importante; quando publicada em 2005, visava avaliar a influência dos ecossistemas no bem-estar humano e estabelecer bases científicas para o manejo sustentável dos ecossistemas.
De acordo com esta avaliação, os serviços ecossistêmicos podem ser classificados em quatro tipologias básicas: (1) Serviços de provisão, relacionados ao fornecimento de materiais e energia; (2) Serviços de regulação, fornecidos a partir do momento em que os ecossistemas começam a atuar como reguladores de condições ambientais; (3) Serviços de apoio ou habitat, fornecendo espaço físico e condições para desenvolvimento de espécies; e (4) Serviços culturais, para benefício estético, espiritual e psicológico dos cidadãos locais (MEA, 2005).
Dentre os serviços ecossistêmicos providos pelos remanescentes florestais, especialmente em ambiente urbano, o serviço de regulação climática é um dos mais destacados pela literatura (MARTINI et al., 2017; LEAL; BIONDI; BATISTA, 2014). Além de outras funções como aumento da infiltração de águas pluviais; prevenção de erosão e assoreamento em corpos d’água; redução da compactação do solo; fornecimento de habitat; mitigação de ilhas de calor; redução de ruído, absorção de poluentes hídricos e atmosféricos (ANDERSSON et al., 2014; BARÓ et al., 2014; HERZOG; ROSA, 2010).
Essa compreensão do ambiente urbano integrado ao ambiente natural está consolidando-se cada vez mais. Tal relação entre meio antropogênico e meio natural no ambiente urbano é evidenciada pelos recursos mais comuns disponíveis neste ambiente (RUFFATO-FERREIRA, 2018). Carvalho (2016) destaca as áreas verdes no ambiente urbano inclusive como sendo um dos fatores que garantem preferência para ocupação urbana, visto que, além de promover conforto ambiental às zonas no entorno, as áreas verdes contribuem para valorização da vista, manutenção da privacidade e satisfação do ideário social.
Quando estes conceitos são alinhados a ferramentas e métodos práticos para apoiar a tomada de decisão em escalas locais e regionais, os serviços ecossistêmicos acabam por ser mais bem abordados (GRÊT-REGAMEY et al., 2017b). Isto acontece a partir dos indicadores de serviços ecossistêmicos, que podem ser denominados como a informação que comunica as características e tendências dos serviços ecossistêmicos, possibilitando aos formuladores de políticas compreender a condição, tendências e taxa de mudança nos serviços ecossistêmicos (LAYKE et al. 2012 apud MAES et al., 2016).
Considerando especialmente a promoção da preservação e proteção das áreas verdes remanescentes é essencial que ao planejamento sejam incorporados indicadores, ou métricas, confiáveis quanto ao tamanho, distribuição e composição dos espaços verdes necessários para garantir a provisão adequada de serviços ecossistêmicos (Grêt-Regamey et al. 2015 apud GRAFIUS, CORSTANJE, HARRIS, 2018).
Diante exposto, o presente estudo teve como objetivo verificar na literatura se existem indicadores de correlação entre métricas de paisagem, amplamente utilizadas para caracterização de vegetação remanescente em paisagens alteradas, com a provisão de serviços ecossistêmicos. O intuito é compreender se as métricas de paisagem apresentam potencial para atuarem como indicadores de serviços ecossistêmicos.
2. Material e Métodos
O desenvolvimento deste artigo foi baseado em três etapas básicas:
A Etapa 1 consistiu em uma análise bibliométrica de produções divulgadas em bases de pesquisa internacionais. O objetivo foi avaliar o panorama de pesquisas que têm possivelmente estudado de forma integrada métricas de paisagem aplicadas à avalição de provisão de serviços ecossistêmicos. Para tanto, promoveu-se uma análise bibliométrica na Plataforma Scopus utilizando-se as seguintes palavras-chave: ‘ecosystem services valuation’ e ‘landscape metrics’. A busca foi realizada em fevereiro de 2021, sem restrição de data.
A Etapa 2 consistiu no aprofundamento da discussão, a partir de outros estudos relevantes divulgados em outras bases de pesquisa. Por fim, na Etapa 3, realizou-se uma revisão e discussão de artigos científicos que abordaram os serviços ecossistêmicos providos especialmente por remanescentes florestais e possíveis relacionais com indicadores ou métricas de análise espacial.
3. Resultados e Discussão
Na Tabela 1 estão apresentadas as informações gerais a respeito dos estudos levantados por meio da pesquisa bibliométrica. Observa-se que a busca retornou um resultado que pode ser considerado baixo, em um intervalo de tempo de quase 20 anos foram identificados apenas 256 documentos, onde somente 210 consistem em artigos originais. Porém segundo Garcia e Longo (2019) apesar de ser um tema relativamente novo, há um crescente no número de publicações, resultado da conscientização a respeito da importância dos serviços prestados pelo ecossistema.
Nos últimos tempos tem havido evolução em pesquisas para o mapeamento e avaliação dos serviços ecossistêmicos; entretanto, em sua maioria, estes trabalhos têm um enfoque voltado aos aspectos das mudanças ecológicas e valoração econômica, não incluindo nesta discussão a perspectiva dos beneficiários, ou seja, as partes interessadas e suas percepções. E estes grupos têm interesses e preferências diferentes quanto aos serviços ecossistêmicos (ZHANG et al., 2020).
Conforme apresentado na Figura 1, pode-se estimar que a produção científica começou sua consolidação lentamente a partir de 2014 e mais significativamente apenas nos últimos dois anos (2019 e 2020); desta forma, apesar de haver indicativos, ainda é cedo para afirmar uma tendência crescente neste tipo de abordagem.
Desses 210 trabalhos publicados sobre a temática, há uma significativa predominância dos periódicos que mais publicaram, sendo eles: Ecosystem Services (37), Ecological Economics (16), Ecological Indicators (14) e Journal of Environmental Management (12), conforme apresentado na Figura 2.
Os países que mais se destacaram na publicação de artigos nesta temática foram: Estados Unidos, em primeiro lugar, com 218 trabalhos publicados, seguida do Reino Unido (100), China (81), Alemanha (73), Austrália (40), Espanha (38) e Holanda (37). Neste ranking o Brasil se encontra em 13º lugar, com 16 publicações. Importante destacar ainda que as mais fortes redes de colaboração internacional ocorrem principalmente entre estes países com maiores índices de publicação (Figura 3 e Figura 4). Este é um forte indicador de que a colaboração internacional potencializa as pesquisas.
Artigo | Autores | Periódico | Ano | N. citações |
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The value of estuarine and coastal ecosystem services | Barbier, E.B.; Hacker, S.D.; Kennedy, C.; Koch, E.W.; Stier, A.C; Silliman, B.R. | Ecological Monographs, 81(2), pp. 169-193 | 2011 | 2066 |
Biodiversity and ecosystem services: A multilayered relationship | Mace, G.M.; Norris, K.; Fitter, A.H. | Trends in Ecology and Evolution, 27(1), pp. 19-26 | 2012 | 851 |
Landscape services as a bridge between landscape ecology and sustainable development | Termorshuizen, J.W.; Opdam, P. | Landscape Ecology, 24(8), pp. 1037-1052 | 2009 | 349 |
A GIS application for assessing, mapping, and quantifying the social values of ecosystem services | Sherrouse, B.C.; Clement, J.M.; Semmens, D.J. | Applied Geography, 31(2), pp. 748-760 | 2011 | 290 |
Ecosystem services and valuation of urban forests in China | Jim, C.Y.; Chen, W.Y. | Cities, 26(4), pp. 187-194 | 2009 | 215 |
A framework for developing urban forest ecosystem services and goods indicators | Dobbs, C.; Escobedo, F.J.; Zipperer, W.C. | Landscape and Urban Planning, 99(3-4), pp. 196-206 | 2011 | 213 |
The value of urban open space: Meta-analyses of contingent valuation and hedonic pricing results | Brander, L.M.; Koetse, M.J. | Journal of Environmental Management, 92(10), pp. 2763-2773 | 2011 | 189 |
Navigating coastal values: Participatory mapping of ecosystem services for spatial planning | Klain, S.C.; Chan, K.M.A. | Ecological Economics, 82, pp. 104-113 | 2012 | 179 |
European agricultural landscapes, common agricultural policy and ecosystem services: A review | Van Zanten, B.T.; Verburg, P.H.; Espinosa, M.; Gomez-Y-Paloma, S.; Galimberti, G.; Kantelhardt, J.; Kapfer, M.; Lefebvre, M.; Manrique, R.; Piorr, A.; Raggi, M.; Schaller, L.; Targetti, S.; Zasada, I.; Viaggi, D. | Agronomy for Sustainable Development, 34(2), pp. 309-325 | 2014 | 164 |
Modeling benefits from nature: Using ecosystem services to inform coastal and marine spatial planning | Guerry, A.D.; Ruckelshaus, M.H.; Arkema, K.K.; Bernhardt, J.R.; Guannel, G.; Kim, C.-K.; Marsik, M.; Papenfus, M.; Toft, J.E.; Verutes, G.; Wood, S.A.; Beck, M.; Chan, F.; Chan, K.M.A.; Gelfenbaum, G.; Gold, B.D.; Halpern, B.S.; Labiosa, W.B.; Lester, S.E.; Levin, P.S.; McField, M. | International Journal of Biodiversity Science, Ecosystem Services and Management, 8(1-2), pp. 107-121 | 2012 | 163 |
A review of methods, data, and models to assess changes in the value of ecosystem services from land degradation and restoration | Turner, K.G.; Anderson, S.; Gonzales-Chang, M.; Costanza, R.; Courville, S.; Dalgaard, T.; Dominati, E.; Kubiszewski, I.; Ogilvy, S.; Porfirio, L.; Ratna, N.; Sandhu, H.; Sutton, P.C.; Svenning, J.-C.; Turner, G.M.; Varennes, Y.-D.; Voinov, A.; Wratten, S. | Ecological Modelling, 319, pp. 190-207 | 2015 | 146 |
Socio-cultural valuation of ecosystem services: Uncovering the links between values, drivers of change, and human well-being | Iniesta-Arandia, I.; García-Llorente, M.; Aguilera, P.A.; Montes, C.; Martín-López, B. | Ecological Economics, 108, pp. 36-48 | 2014 | 142 |
From theoretical to actual ecosystem services: Mapping beneficiaries and spatial flows in ecosystem service assessments | Bagstad, K.J.; Villa, F.; Batker, D.; Harrison-Cox, J.; Voigt, B.; Johnson, G.W. | Ecology and Society, 19(2),64 | 2014 | 138 |
Form follows function? Proposing a blueprint for ecosystem service assessments based on reviews and case studies | Seppelt, R.; Fath, B.; Burkhard, B.; Fisher, J.L.; Grêt-Regamey, A.; Lautenbach, S.; Pert, P.; Hotes, S.; Spangenberg, J.; Verburg, P.H.; Van Oudenhoven, A.P.E. | Ecological Indicators, 21, pp. 145-154 | 2012 | 134 |
Remote sensing of ecosystem services: A systematic review | De Araujo Barbosa, C.C.; Atkinson, P.M.; Dearing, J.A. | Ecological Indicators, 52, pp. 430-443 | 2015 | 132 |
Urban growth and environmental impacts in Jing-Jin-Ji, the Yangtze, River Delta and the Pearl River Delta | Haas, J.; Ban, Y. | International Journal of Applied Earth Observation and Geoinformation, 30(1), pp. 42-55 | 2014 | 132 |
Mapping ecosystem services: The supply and demand of flood regulation services in Europe | Stürck, J.; Poortinga, A.; Verburg, P.H. | Ecological Indicators, 38, pp. 198-211 | 2014 | 129 |
Os cinco principais trabalhos mais citados trazem importantes perspectivas acerca do escopo principal das pesquisas voltada à avaliação de serviços ecossistêmicos:
Valoração econômica de serviços ecossistêmicos providos por ecossistemas estuarinos e costeiros como pântanos, manguezais, recifes de coral próximos à costa, tapetes de ervas marítimas e praias de areia e dunas, a partir de uma visão econômica consensual sobre elementos físicos destes ecossistemas, como: dimensão das dunas, nível das marés, densidade de biomassa, tipo de vegetação, dentre outros (BARBIER et al., 2011);
Uma revisão a respeito da relação entre a biodiversidade e a pesquisa em rápida expansão e o campo de políticas de serviços ecossistêmicos diante da incongruência de inúmeras pesquisas e a necessidade de promover análises completas e interdisciplinares como subsídio para que políticas públicas possam definitivamente ser implementadas com eficácia no âmbito dos serviços ecossistêmicos (MACE; NORRIS; FITTER, 2012);
Proposição de um novo conceito, o de serviços de paisagem (Landscape services), a fim de promover o desenvolvimento sustentável da paisagem a partir de abordagem multidisciplinar focado em valor-função-estrutura (TERMORSHUIZEN; OPDAM, 2009);
Apresentação de um aplicado GIS para avaliação, mapeamento e quantificação de serviços ecossistêmicos culturais, de forma não monetária, a partir dos valores sociais percebidos pela população (SHERROUSE; CLEMENT; SEMMENS, 2011);
Avaliação dos serviços ecossistêmicos promovidos pelas florestas urbanas na China, através de múltiplas técnicas, ressaltando as variadas lacunas que ainda existem neste aspecto e o grande potencial que existe para o desenvolvimento de melhores métodos de pesquisa nesta temática (JIM; CHEN, 2009);
Proposição de uma estrutura de desenvolvimento de indicadores para avaliação dos serviços ecossistêmicos providos por florestas urbanas, a partir de combinação de dados de campo, um modelo funcional de floresta urbana e informações providas da literatura (DOBBS; ESCOBEDO.; ZIPPERER, 2011).
Como citado, o Brasil contribuiu com 16 publicações, sendo que 14 delas foram em colaboração com outros países, sendo: Canadá (2), Itália (2), Reino Unido (2), Argentina (1), Grécia (1), Holanda, (1), Noruega (1), Portugal (1), Espanha (1), Suécia (1) e Estados Unidos (1). Os trabalhos publicados pelo Brasil estão apresentados na Tabela 3. Nota-se que em sua maioria são pesquisas relacionadas aos ecossistemas aquáticos e avaliações econômicos, sendo que esta última continua a ser um dos principais enfoques das pesquisas relacionadas à serviços ecossistêmicos.
Artigo | Autores | Periódico | Ano | N. citações |
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Marine and coastal cultural ecosystem services: Knowledge gaps and research priorities | Rodrigues Garcia, J.; Conides, A.J.; Rodriguez Rivero, S.; Raicevich, S.; Pita, P.; Kleisner, K.M.; Pita, C.; Lopes, P.F.M.; Roldán Alonso, V.; Ramos, S.S.; Klaoudatos, D.; Outeiro, L.; Armstrong, C.; Teneva, L.; Stefanski, S.; Böhnke-Henrichs, A.; Kruse, M.; Lillebø, A.I.; Bennett, E.M.; Belgrano, A.; Murillas, A.; Pinto Sousa, I.; Burkhard, B.; Villasante, S. | One Ecosystem 2, e12290 | 2017 | 49 |
Theory and practice of water ecosystem services valuation: Where are we going? | Hackbart, V.C.S.; de Lima, G.T.N.P.; dos Santos, R.F. | Ecosystem Services, 23, pp. 218-227 | 2017 | 28 |
Emergy-based accounting method for aquatic ecosystem services valuation: A case of China | Yang, Q.; Liu, G.; Casazza, M.; Hao, Y.; Giannetti, B.F. | Journal of Cleaner Production, 230, pp. 55-68 | 2019 | 10 |
Pollination ecosystem services: A comprehensive review of economic values, research funding and policy actions | Porto, R.G.; de Almeida, R.F.; Cruz-Neto, O., Tabarelli, M.; Viana, B.F.; Peres, C.A.; Lopes, A.V. | Food Security, 12(6), pp. 1425-1442 | 2020 | 3 |
Exploring plural values of ecosystem services: Local peoples’ perceptions and implications for protected area management in the atlantic forest of Brazil | Coelho-Junior, M.G.; de Oliveira, A.L.; da Silva-Neto, E.C.; Castor-Neto, T.C.; Tavares, A.A.O.; Basso, V.M.; Turetta, A.P.D.; Perkins, P.E.; de Carvalho, A.G. | Sustainability (Switzerland), 13(3),1019, pp. 1-20 | 2021 | 0 |
Economic impact assessment of silting-up and erosion processes: How spatial dynamic models coupled with environmental valuation models can contribute to sustainable practices in sugarcane farming (Book Chapter) | De Campos Macedo, R.; de Almeida, C.M.; dos Santos, J.R.; Rudorff, B.F.T.; Filho, B.S.S.; Rodrigues, H.; de Sousa, W.C., Jr. | Sugarcane: Production, Consumption and Agricultural Management Systems, pp. 61-89 | 2014 | 0 |
As palavras mais comuns selecionadas pelos autores como palavras-chave foram: ecosystem services (75), valuation (20), cultural ecosystem services (18), economic valuation (13) (Figura 5). Nesse cenário economic valuation se apresenta como um indicador interessante pois aponta para a tendência dos trabalhos que, como visto, está bastante relacionada à valoração destes serviços, especialmente de forma monetária e econômica.
Diante da necessidade do desenvolvimento da análise dos serviços ecossistêmicos associada ao planejamento espacial, especialmente urbano, as abordagens de Análise de Decisão Multicritério (MCDA) têm se mostrado bastante adequadas. Assim, a utilização dessa metodologia possibilita a integração de aspectos ecológicos e socioeconômicos no planejamento relacionado às mudanças do uso e ocupação do solo; além de permitir lidar com a subjetividade e com as diferentes demandas das partes interessadas que no processo de tomada decisão (GRÊT-REGAMEY et al., 2017).
Estudos com uma análise mais ampla, tais como o de Maes et al. (2015) e Grafius, Corstanje e Harris (2018), apesar de não apontarem diretamente espécies ou funções específicas do ecossistema, apresentam potencial para auxiliar planejadores e gestores urbanos na determinação da importância geral da localização e formato do espaço verde na paisagem urbana. Vale lembrar, porém, que estes indicadores relacionados ao estado do ecossistema dão uma imagem incompleta do nível geral de prestação de serviços, especialmente no contexto urbano, onde muitos serviços resultam de uma combinação de insumos humanos e ecossistêmicos (CORTINOVIS; GENELETTI, 2019).
Embora progressos tenham ocorrido nos Sistemas de Suporte à Decisão (DSS), a seleção de ferramentas adequadas para a avaliação dos serviços ecossistêmicos, visando um processo de decisão específico, ainda é complicada, visto que não existem orientações claras a respeito da implementação destas ferramentas (GRÊT-REGAMEY et al., 2017b).
Um estudo de Grêt-Regamey et al. (2017b), no qual foram avaliados artigos que apresentavam ferramentas operacionais de avaliação de Serviços Ecossistêmicos, identificou que a maioria das ferramentas foi aplicada em países desenvolvidos, particularmente nos Estados Unidos da América e no Reino Unido. Em contraste, nos países em desenvolvimento, poucas ferramentas foram utilizadas; e, quando utilizadas, tratavam-se muitas vezes de ferramentas não desenvolvidas localmente, como TESSA e InVEST. A Tabela 4 apresenta as principais ferramentas de serviços ecossistêmicos levantadas pelos pesquisadores.
Tipologia | Ferramenta |
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Análise de Decisão Multicritério (MCDA) | Sim4Tree HEUREKA LANDIS MONSU |
Plataformas da web (mapas) | EnviroAtlas ESP-VT ESLab GecoServ Interdisciplinary Decision Support Dashboard (Painel de Apoio à Decisão Interdisciplinar) Our Ecosystem web mapping tool (Ferramenta de mapeamento web Nosso Ecossistema) |
Ênfase nos aspectos econômicos | Modelo de Simulação Ecológico-Econômica CBA-typology Benefit Transfer Toolkit (Kit de ferramentas de transferência de benefícios) Marxan |
Conjunto de Modelos | ARIES InVEST MIMES Wetland Ecosystem Services Model Prototype (Protótipo de modelo de serviços de ecossistema de áreas úmidas) |
Fonte: Grêt-Regamey et al. (2017b).
Nesse escopo, ressalta-se que existe uma implicação na utilização de métricas amplas e muito agregadas, já que estas podem simplificar demais as relações entre a função do ecossistema urbano e a estrutura da paisagem. Por isso, torna-se importante considerar a necessidade de buscar novos métodos que levem em conta as características únicas e demandas de escala do ambiente urbano, e que considerem também a diversidade de partes interessadas envolvidas, seus interesses e percepções. Esta deve ser uma ferramenta de apoio para práticas de gestão de ecossistemas sustentáveis; especialmente na orientação de políticas de uso da terra, aliviando o conflito de uso da terra e promovendo a construção de uma civilização ecológica isto é essencial (ZHANG et al., 2020; GRAFIUS, CORSTANJE, HARRIS, 2018).
De uma forma abrangente, para análises de serviços ecossistêmicos providos nos ecossistemas florestais, são frequentemente utilizados indicadores baseados em área, como a área de superfície relativa das florestas, especialmente para avaliar os serviços ecossistêmicos de regulação (MAES et al., 2016). Conforme recomendações de pesquisadores que já trabalharam com uma extensa gama de métricas espaciais, estudos futuros devem ser desenvolvidos com uma perspectiva mais rigorosa acerca da seleção destas métricas, utilizando-se de pesquisas especificamente destinadas a testar sua correlação e sensibilidades (GRAFIUS, CORSTANJE, HARRIS, 2018).
No que diz respeito à relação entre métricas e indicadores de paisagem e a provisão de serviços ecossistêmicos, estudos apontam que um indicador primário, o tamanho dos remanescentes de área natural, tem se mostrado claro e positivamente correlacionado com a capacidade de fornecimento de serviços ecossistêmicos de regulação. Dentre estes serviços citam-se o armazenamento de carbono e a abundância de polinizadores; onde remanescentes maiores mostram-se mais prováveis de armazenar mais carbono e sustentar mais polinizadores, não apenas no sentido absoluto, mas por unidade de área (CORTINOVIS; GENELETTI, 2019; GRAFIUS, CORSTANJE, HARRIS, 2018).
Um fator que deve ser considerado consiste em como estas condições se correlacionaram. No estudo de Grafius, Corstanje e Harris (2018), por exemplo, identificou-se que os fragmentos maiores que 10 ha armazenam mais carbono por área e suportam mais polinizadores, enquanto exibiam um risco maior de erosão do solo. Por sua vez, os remanescentes menores e isolados demostraram o oposto, e remanescentes maiores que 10 ha não exibiram nenhum benefício de área adicional (GRAFIUS, CORSTANJE, HARRIS, 2018).
Outros serviços de regulação, como a proteção contra a erosão e a regulação da qualidade do ar, por exemplo, só são fornecidos pela vegetação em áreas com condições específicas. No primeiro caso, em áreas com risco de erosão médio a alto, principalmente em regiões com uma parcela importante de terras aráveis em encostas e taxas de precipitação relativamente altas. No segundo caso, o serviço é deliberadamente restrito a grandes zonas urbanas. Estas são importantes constatações que podem ser e são altamente relevantes indicadores espaciais (MAES et al., 2016; MAES et al., 2015).
Já serviços ecossistêmicos como a produção de alimentos, recarga de água subterrânea e conectividade ecológica podem ser promovidos tanto em centros urbanos, quanto em periferias urbanas e áreas rurais (GRÊT-REGAMEY et al., 2017). Em meio urbano, os serviços de regulação geralmente produzem efeitos locais e/ou que alcançam uma escala intermediária, periférica, de sua fonte de geração (CORTINOVIS; GENELETTI, 2019). Desta forma, vale a pena reforçar que quando se fala em provisão de serviços ecossistêmicos, fatores ambientais como padrões de uso e ocupação do solo tem influência significativa sobre a heterogeneidade da provisão destes serviços (PARUELO et al., 2016).
Os serviços de regulação e de suporte estão predominantemente associados às áreas florestais, que por sua vez, apresentam menor potencial para os serviços de provisão (ZHANG et al. 2020; GUAN et al., 2020). Em contrapartida, citam-se, por exemplo, as terras agrícolas que têm alta capacidade de fornecimento de serviço de abastecimento, porém, baixa potencialidade para serviços de regulação, apoio e culturais (Fu e Zhang, 2014 apud GUAN et al., 2020).
Por sua vez, os serviços culturais, tais como áreas recreativas silenciosas, espaços recreativos públicos, apesar da possibilidade de serem providos em áreas urbanas, periurbanas e rurais, demandam locais específicos, associados principalmente à proximidade com localidades turísticas, florestas e parques (ZHANG et al. 2020). Além disso, estes serviços culturais, quando vinculados aos recursos naturais, podem ser também estimados pela concentração de DBO, já que este um indicador associado a parâmetros como “transparência”, “som” e “odor” e, consequentemente, vinculado às experiências dos visitantes (RIEGELS et al., 2020).
Quanto aos serviços de provisão, especificamente, esses estão relacionados a condições naturais mais específicas. Por conta de condições naturais vantajosas como terreno plano, solo mais fértil e clima ameno, as áreas próximas aos rios, por exemplo, apresentam maior aptidão para a prestação destes tipos de serviços (ZHANG et al., 2020). Maes et al. (2016) destacam as florestas como as principais fornecedoras de produtos alimentares silvestres e biomassa para materiais e energia.
Segundo Yao et al. (2016), o abastecimento de água pode ser considerado o mais importante de todos os serviços hidrológicos; entretanto, é também um dos serviços ecossistêmicos mais difíceis de avaliar devido à falta de dados espaciais e requerem abordagens de modelagem que sejam capazes de avaliar a contribuição específica das florestas para o abastecimento de água (MAES et al., 2016). Além disto, esse serviço é altamente dependente do escoamento superficial e subsuperficial, estando, portanto, correlacionado também à evapotranspiração no nível da bacia hidrográfica (PARUELO et al., 2016).
O estudo de Yao et al. (2016) verificou ainda que existe uma correlação negativa entre os índices de qualidade da água e os serviços hidrológicos, com exceção do Produto Primário Líquido (NPP) que, segundo sugerem os autores, está correlacionado com a degradação da qualidade da água, ocasionada, em muitos casos, pela fertilização nas áreas agrícolas. Por sua vez, o serviço de purificação da água pode ser vinculado também à concentração de DBO e presença de E. coli e Enterococos na água, como apontam Riegels et al. (2020).
Desta forma, verifica-se que as características de consistência de um ecossistema são essenciais para a prestação precisa de serviços deste ecossistema (ALMEIDA et al., 2016). As principais observações constatadas por Cortinovis e Ganeletti (2019) apontam para duas questões chave: como tratar um serviço ecossistêmico individual e como as decisões de planejamento urbano pode afetar o fornecimento de serviços ecossistêmicos.
Neste sentido, os autores sintetizaram algumas diretrizes importantes para serem consideradas pelos planejadores urbanos, são elas: (1) as classificações de uso e ocupação do solo das cidades devem ser capazes de indicar também as SPU, ou seja, as áreas provedoras de serviços ecossistêmicos; (2) devem ser consideradas e bem analisadas as multifuncionalidades das tipologias de infraestrutura verde e sinergia entre os múltiplos serviços ecossistêmicos; (3) a demanda por serviços ecossistêmicos urbanos de regulação e suas variações devem ser avaliadas e monitoradas para compreender os principais efeitos das decisões de planejamento (CORTINOVIS; GENELETTI, 2019).
Produção | Regulação | Habitat | Cultural |
---|---|---|---|
Produção de Alimentos: Localização variada; baixa declividade; proximidade a cursos/ corpos d'água; fertilidade do solo* Produção de água: Proximidade a cursos d'´gua; produção de água; qualidade da água (DBO e E. coli)* | Armazenamento de carbono: Tamanho Polinização: Tamanho Proteção contra erosão: Alta erobilidade do solo; alta declividade; vegetação com boa qualidade*,** Melhora da qualidade do ar: zonas urbanas; vegetação com qualidade Recarga de água: Localização variada (rural, urbana, periurbana) | Conectividade ecológica: Localização variada (rural, urbana, periurbana) Habitat: Tamanho | Lazer e recreação: Proximidade com locais turísticos; proximidade com visitantes; boa qualidade da água (DBO, cor, odor)* |
* Não se trata necessariamente de uma métrica de paisagem, mas é um indicador espacialmente representável.
** avaliado a partir de NDVI, por exemplo.
Fonte: Autor (2021).
4. Considerações Finais
O interesse pela pesquisa em avaliação de serviços ecossistêmicos tem crescido significativamente nos últimos anos. Apesar disto, o tema ainda se apresenta atual e em evolução, ou seja, não consolidado. Dada à transversalidade da temática e a possibilidade de avaliação em multiescalas (desde local a escalas continentais). A busca por procedimentos de gestão como a melhor forma de mapear e avaliar os serviços ecossistêmicos ainda está sendo bastante estudada.
A partir de 2012, com o significativo desenvolvimento das geotecnologias, estas se tornaram ferramentas potenciais para agilizar os diagnósticos e estudos dos serviços ecossistêmicas em escalas mais complexas. Países como Reino Unido, China, Alemanha, Austrália, Espanha e Holanda são os que mais têm se destacado neste campo de pesquisa.
Dentro do exposto, nota-se que há possibilidade de avaliar a correlação direta entre as métricas de paisagem avaliáveis espacialmente e o fornecimento de serviços ecossistêmicos. Apesar disto, o presente estudo identificou que ainda existem significativas lacunas, teóricas e práticas, para a aplicação destas tecnologias à avaliação do fornecimento de serviços ecossistêmicos por ecossistemas florestais, em diversas escalas. Desta forma, é um campo de estudo promissor e que demanda muita pesquisa.