1. Introdução
No Brasil, o processo de urbanização e expansão de novas áreas urbanas nos municípios se realiza por meio do parcelamento do solo feito de forma regular ou irregular (Barreiros & Abiko, 1998). Se a cidade é dividida entre porção legal e ilegal, a população moradora em situação desfavorável acaba por ter dificuldades ao acesso às oportunidades de trabalho, cultura e lazer. Para as formas legais de entendimento das cidades, como os cadastros nas prefeituras, os assentamentos irregulares simplesmente não existem (Rolnik, 2001).
As ocupações irregulares ao diminuírem as áreas verdes, ocupando morros e encostas, beira de córregos, vales, aterros sanitários em áreas de preservação ambiental, acabam por se transformar em áreas de risco, pois os assentamentos em sua maioria encontram-se em locais impróprios, precários e sem infraestrutura mínima para moradia. No entanto, devido ao fato dos moradores dessas ocupações se tratarem de pessoas com baixa renda que não possuem condições de acesso ao mercado imobiliário, essa acaba por fim se tornando sua única opção de moradia (Ministério das Cidades & IPT, 2007).
Para a construção de uma cidade sustentável e mais sadia, cabe ao município realizar a regularização fundiária e exigir que os novos projetos a serem construídos cumpram os requisitos mínimos de infraestrutura e habitabilidade para que estes não voltem a ser irregulares. O mesmo deve possuir controle das novas ocupações irregulares através de fiscalização. Para que não surjam novas ocupações, e suscitar políticas públicas para produção de habitação popular regulares (Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2011).
A Vila dos Pescadores, foi selecionada como área potencial para estudo de reassentamento da população residente , pois: a) situa-se em uma área de risco, classificada pela prefeitura municipal de Porto Alegre; b) está em uma Área de Preservação Permanente (APP); c) localiza-se na Beira do Lago Guaíba, impedindo a realização do projeto de continuidade da extensão da orla, espaço público de lazer da população porto-alegrense e d) faz frente para uma via de ligação entre o centro e a zona sul e suas casas não apresentam recuo frontal, impedindo a duplicação da Avenida Guaíba, uma das soluções apontadas no Plano Diretor da cidade para melhorar o fluxo viário da capital.
O objetivo geral desta pesquisa tem como finalidade demonstrar, através de pesquisas bibliográficas, a importância da realização de projetos de reassentamentos humanos para populações em situação de vulnerabilidade social que ocupam irregularmente as áreas de preservação permanente, como a Vila dos Pescadores de Porto Alegre, RS, e as medidas que devem ser tomadas para realização deste reassentamento.
A pesquisa busca trazer uma reflexão à população e aos gestores municipais sobre quais fatores geram essas habitações irregulares e a importância de realizar reassentamentos de populações em situação de vulnerabilidade em áreas próximas ao seu local de origem, e quais as medidas que devem ser tomadas para evitar futuros problemas relacionados com as políticas habitacionais. Cabe salientar que este estudo é um recorte do trabalho de conclusão de curso em Arquitetura e Urbanismo da autora Leticia de Souza.
Para alcançar o objetivo da pesquisa, o trabalho foi dividido nas etapas de Fundamentação Teórica e Estudo de Caso. A adoção do método de pesquisa é descritiva, pois reúne dados para analisá-los a fim de diagnosticar novos fenômenos ou encontrar novas explicações (Gerhardt & Silveira, 2009).
2. Fundamentação Teórica
2.1. Os assentamentos humanos informais e as áreas de preservação
A falta de acesso a uma moradia digna, enfrentada pelas populações pobres da América Latina, está associada ao padrão de urbanização e ao desenvolvimento das cidades, onde o crescimento desordenado e excludente se intensificou a partir da metade do século XX, impulsionado pelo processo migratório do campo e pelo início da industrialização (Alfonsin & Fernandes, 2004).
Com a “Revolução de 1930” começou o processo de industrialização brasileira, a qual ocasionou, no Brasil, um processo de crescimento urbano intensivo, provocando grandes transformações socioeconômicas e espaciais. A combinação desses processos resultou numa enorme concentração econômica com consequente exclusão política e segregação sócio-espacial da maior parte da população (Fernandes, 1998).
Como consequência desse processo de urbanização, em 1970, metade da população brasileira já vivia nas regiões metropolitanas e no final do século XX este número chegava a um terço. Assim, surgiram os grandes centros metropolitanos, como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador, Bahia, entre outros, nos quais, desde o desenvolvimento da história do urbanismo brasileiro nunca houve um planejamento urbano para o assentamento de famílias de baixa renda, sendo as questões habitacionais deixadas em segundo plano. O crescimento da população urbana, aliado à ausência de diretrizes para o planejamento urbano, revela um grande problema nas cidades do Brasil. Maricato (2011) considera que as décadas de 80 e 90 do século XX compuseram um quadro de “tragédia urbana” no país com recorrentes enchentes e desmoronamentos, poluição dos recursos hídricos e do ar, impermeabilização exagerada da superfície do solo e desmatamento. Tais prejuízos, aliados à exclusão social, que, segundo a autora, sempre fez parte do crescimento urbano no Brasil, refletem aspectos que ao longo dos anos limitaram a condição de bem-estar dos brasileiros nos centros urbanos (Maricato, 2011; Silva & Romero, 2011).
Na perspectiva socioeconômica, a ocupação nas áreas de preservação, tornou-se irreversível em algumas cidades brasileiras, devido à sua consolidação, uma vez que, historicamente, muitas cidades se desenvolveram urbanisticamente privilegiando as ocupações em topos de morros e nas margens de rios e lagos (Ministério Público Federal, 2018).
Mudanças culturais e danos ambientais significativos são reflexos do processo de metropolização, através do qual os aglomerados e as favelas se instalam conforme cresce a população, enfraquecendo a proximidade da vida cotidiana e o bairro deixa de ser o lugar de integração das amizades, das relações familiares e com colegas de trabalho, obrigando a população a percorrer grandes distâncias para realização das atividades diárias. Além disso, há a desigualdade encontrada na distribuição de serviços públicos oferecidos, tendo as áreas mais pobres maior carência de saneamento, drenagem, equipamentos de saúde, educação, áreas de lazer e espaços verdes. Isto resulta em mudanças na reorganização do espaço para produção, circulação e consumo de mercadorias aliada à qualidade, distribuição e força de trabalho, resultando na gentrificação: um fenômeno que afeta principalmente os mais pobres e gera um aburguesamento de uma determinada área, com substituição dos habitantes locais por uma população mais abastada (Fernandes, 1998; Françoise, 1979; Furtado, 2014; Wagner, 2017).
O espaço, em particular o espaço urbano, tem grande importância para o capital, tendo em vista que ele é capaz de fazer o mercado financeiro circular, como construções de turismo, shoppings, entre outros. Porém, operações de rearranjo espacial são executadas com afinco pelo Estado em parceria com o capital a fim de criar novos espaços para seguir esta lógica de circulação do mesmo. Assim, a propriedade fundiária assume grande papel neste cenário tendo em consideração que ela é a garantia legal, pois é o registro formal de contrato entre comprador e consumidor. Nesse viés, quando há pessoas de baixa renda morando numa zona de alto valor deve-se, sempre que possível, realizar uma regularização fundiária e dar o registro do terreno ao morador a fim de garantir a sua moradia, pois regularizar tais áreas traz segurança e dignidade aos moradores, através de endereços formais, tornando possível o acesso a financiamentos e permitindo ao município a ordenação do solo urbano, pois insere estas áreas nos cadastros municipais, gerando informações para arrecadação de tributos (Botelho, 2007; Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2011; Nobrega & Daflon, 2013).
Os principais instrumentos urbanos utilizados para ordenar as ocupações irregulares ocorrem através da regularização fundiária e da criação de ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), a qual possui subsídios para financiamento da construção de casas populares regulares. O programa de regularização fundiária é um processo urbanístico, social e jurídico, que objetiva a regularização da posse da terra para a população de baixa renda no seu local de origem. Ele permite o acesso à infraestrutura urbana e possibilita a qualificação das condições de moradia das famílias beneficiadas. O programa garante a permanência das famílias nas suas regiões de origem (Lei Federal n. 10.257; Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2011).
Para a construção de uma cidade sustentável e mais sadia, cabe ao município realizar esta regularização fundiária e exigir que os novos projetos a serem construídos no local cumpram os requisitos mínimos de infraestrutura e habitabilidade para que este não volte a ser irregular novamente. O município deve, inclusive, possuir controle das novas ocupações através de fiscalização, para que não surjam novas ocupações irregulares, e suscitar políticas públicas para produção de habitações populares regulares (Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2011).
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (2011), na sua cartilha, afirma que, para realização da regularização fundiária, é necessário:
atentar para os aspectos urbanísticos, que exigem o desenho das vias de circulação, a observância do tamanho dos lotes, a alocação de casas precárias ou situadas em situação de risco, tudo para que esse espaço urbano venha a realmente se integrar na cidade. Além disto, é imprescindível que se realize a regularização jurídica das área a fim de que se dê segurança aos moradores. E todo o processo deve levar em conta os aspectos ambientais e sociais, envolvendo toda a população (p.21).
Não se pode realizar uma regularização fundiária sem antes observar e estudar as condições em que a gleba se encontra e analisar como ela se relaciona com seu entorno, com a finalidade da melhor integração com a cidade, levando em conta todos os aspectos ambientais e sociais que envolvem a população.
A regularização de grande parte das áreas irregulares é permitida por legislação, porém, de acordo com a Lei Federal n. 6.766 (1979), que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências, o parcelamento do solo não ocorrerá em:
I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas; Il - em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados; III - em terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas exigências específicas das autoridades competentes; IV - em terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação; V - em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção (Lei Federal n. 6.766, 1979).
Sendo assim, a Vila dos Pescadores (objeto de estudo deste trabalho), por se caracterizar como uma área de risco sujeita a inundações e por se situar em área de APP, não poderia ser regularizada na gleba em que se encontra consolidada atualmente. Para regularização dessa comunidade, deveria ser feito um planejamento de reassentamento, através de Habitação Social, em terreno apto a moradia saudável e próximo ao seu local de origem, a fim de se evitar o processo de gentrificação.
2.2. As áreas de risco e ocupações irregulares em Porto Alegre
Como metodologia para a escolha de uma área de estudos, primeiramente foi analisado o mapa das áreas de risco de Porto Alegre e selecionada uma área onde já existe um interesse público de realizar um reassentamento, conforme já descrito anteriormente.
De acordo com o Departamento Municipal de Habitação de Porto Alegre (como citado em Coutinho, Menezes, Ten Cate & Oliveira Júnior, 2020), em 2020 dos 99.856 núcleos familiares de Porto Alegre, totalizando 236.906 pessoas identificadas no Cadastro Único, 26.619 núcleos encontram-se em Irregulares e em Vilas, representados por 26,6% da população, com um total de 67.695 pessoas.
Na Figura 1, está demonstrada a totalidade das 478 áreas de risco de Porto Alegre, de acordo com os resultados do Levantamento de Informações Territoriais - LIT, no ano de 2010. A Vila dos Pescadores é uma dessas áreas de risco.
Fonte: Dados de 2019, recuperados em dezembro de 2020, de https://www.google.com/maps/d/u/0/viewer?ll=-30.084859803087106%2C-51.0662034866525&z=11&mid=1H0PfsLkO41tmanS6HTQpLKlSDV8
Infelizmente, as ocupações irregulares tornaram-se um problema muito comum nos dias atuais, trazendo sérios reflexos nas áreas ambientais e urbanísticas, além de graves e inevitáveis consequências relacionadas à segurança pública. Como agravante, na maioria das vezes, as ocupações irregulares são em Áreas de Preservação Permanente, próximas a recursos hídricos ou em encostas dos morros, como o caso da Vila dos Pescadores.
A maior parte dessas áreas tem o seu uso legalmente restrito ou proibido por legislação específica, que busca preservar os recursos naturais e o bem-estar social da população. Em adição, nas áreas de ocupação irregular, em geral, não há saneamento básico e infraestrutura urbana, potencializando as vulnerabilidades locais já existentes e os riscos aos quais essa população de baixa renda se encontra exposta. Esse crescimento desordenado e precário, aliado à degradação contínua do ambiente natural (consequente da falta de educação ambiental da população), resulta num território frágil, sujeito a desastres ambientais e de saúde coletiva (Barreiros & Abiko, 1998; Lei Federal n. 10.257, 2001).
De acordo com o Estatuto da Cidade, sancionado pela Lei Federal n. 10.257 (2001), quando a ocupação ocasionar risco para a saúde ou para a vida dos moradores, o Poder Público garantirá ao morador o direito de moradia, realocando-o, sendo papel do Plano Diretor da Cidade definir em quais áreas o Poder Público poderá realizar o reassentamento, necessitando de uma medida necessária para a definição dos critérios para atendimento da população que será removida, a fim de evitar que o reassentamento ocorra em regiões precárias e distantes do seu local de origem.
As AEIS (Área Especial de Interesse Social), definidas pelo PDDUA (Plano Diretor de Porto Alegre), são áreas destinadas à produção e manutenção de HIS (Habitação de Interesse Social) e são classificadas em AEIS I, AEIS II, AEIS III e AEIS IV, definidas nos Artigos 76, 77 e 78 como:
AEIS I e II referem-se a áreas já ocupadas e cuja regularização é possível de ser feita no próprio local;
AEIS III trata de terrenos ainda não ocupados, identificados para a implantação de projetos habitacionais de interesse social;
AEIS IV têm o objetivo de permitir a regularização de conjuntos habitacionais.
As Áreas Especiais de Interesse Social de Porto Alegre, podem ser visualizadas na Figura 2.
Fonte: Recuperado em dezembro de 2020, de https://www2.portoalegre.rs.gov.br/spm/default.php?p_secao=310
Conforme se pode observar no Mapa de Localização das AEIS em Porto Alegre, é perceptível que as áreas nas quais são implementados os projetos de Habitações Sociais são as extremidades da cidade, identificadas com cor roxa no mapa. Essas áreas são definidas por Endres (2013) como tendo carência de equipamentos e transporte público.
2.3 A Vila dos Pescadores
A Vila dos Pescadores situava-se originalmente na Ilha da Pintada, uma das ilhas da cidade de Porto Alegre, porém com a grande enchente que ocorreu em 1941, essa comunidade, caracterizada por pescadores, sofreu com a perda das suas casas e passou a habitar o atual terreno no bairro Vila Assunção, local que já era conhecido e frequentado por eles em épocas de pesca. Essa área passou a ser considerada uma área de preservação permanente (APP) com a criação do Código Florestal Brasileiro em 1965, através da Lei Federal 4.771, pois está localizada imediatamente às margens do lago Guaíba. Sendo assim, a área atual é uma ocupação irregular, na qual os moradores locais não possuem saneamento básico adequado, expondo a população ali residente a grandes riscos, inclusive de saúde (Farinon, 2013).
A área de estudo onde encontra-se a Vila dos Pescadores está demarcada em amarelo na Figura 3, situa-se nas margens do Lago Guaíba, no bairro Vila Assunção em Porto Alegre, RS - Brasil.
Conforme Farinon (2013), a Vila dos Pescadores possui no total 130 casas, compostas por 146 famílias que tendem a aumentar e permanecer no local através de aumentos nas construções irregulares, também conhecidos como puxadinhos. Oito casas possuem o uso misto, com pequenos comércios acoplados. De entre os comércios locais estão: salão de beleza, armazém e bares.
Conforme o PNUD, Ipea e FJP (2010), em 2000, a população total da Vila dos Pescadores era de 495 pessoas, e em 2010 passou para 490. Ela é considerada potencialmente ativa, com base nos dados de 2010, em que 350 pessoas, representando 71,43% da população total, encontram-se na faixa etária entre 15 e 64 anos, como ilustra a Figura 4.
Fonte: Recuperado em Maio de 2023, de http://www.atlasbrasil.org.br/perfilhttp://www.atlasbrasil.org.br/perfil/udh/1431490200032#sec-demografia/udh/1431490200032#sec-demografia)
A Figura 5 demonstra que Vila dos Pescadores possui renda per capita média da UDH de R$ 818,43, em 2010, enquanto no município Porto Alegre é de R$ 1.758,27 e na Região Metropolitana (RM), composta por 34 Municípios, é de R$ 1.143,12.
Fonte: Recuperado em Maio de 2023, de http://www.atlasbhttp://www.atlasbrasil.org.br/perfil/udh/1431490200032#sec-demografiarasil.org.br/perfil/udh/1431490200032#sec-demografia)
Analisando morfologicamente, as edificações em geral possuem baixo padrão construtivo e são resultantes de autoconstrução. Quanto à infraestrutura urbana do entorno, em alguns trechos da vila não existe passeio público e nos locais onde possui, consiste de uma faixa com apenas um metro de largura, bastante irregular e desgastada pelo tempo, não possuindo acessibilidade, conforme ilustrado na Figura 6. Além disso, o acesso às redes de energia elétrica e de água, em sua maioria, ocorre por ligações clandestinas e o destino do esgoto sanitário, em geral, é o próprio Lago Guaíba.
Atualmente, a região da Vila dos Pescadores não possui ciclovia; a Av. Guaíba traz insegurança ao pedestre pois possui uma via estreita, com casas edificadas no alinhamento da calçada, de um lado, e grande densidade de vegetação, no outro, juntamente com a ausência de iluminação pública e de equipamentos urbanos, caracterizando a Av. Guaíba como uma rota de passagem que liga a Zona Sul da Capital com o Centro da mesma.
Em visita à gleba, além das análises já citadas, foi possível identificar uma tipologia padrão das residências que compõem a Vila dos Pescadores, podendo ser observadas através das Figuras 7, 8 e 9, de própria autoria. As alturas das residências variam entre 1 e 2 pavimentos. Também foi identificado que os terrenos não possuem delimitadores de lotes, as residências são todas geminadas lateralmente, sem recuo frontal, não possuindo espaço para um terreno permeável, dificultando a ventilação e a iluminação e criando uma densidade de casas com condições insalubres de moradia.
Cabe salientar que muitos moradores da Vila dos Pescadores trabalham no entorno, prestando serviços para as famílias do bairro Vila Assunção, como atividades domésticas e de construção civil. A comunidade da Vila dos Pescadores se sente inserida no bairro, que é um local de fácil acesso ao centro e não deseja sair do seu local de origem, principalmente pelo sentimento de pertencimento e de identidade ao local (Farinon, 2013).
2.4 Fatores que reforçam a importância e necessidade do reassentamento
Além da área ser caracterizada como de risco e irregular, outros fatores importantes ressaltam a importância e necessidade do reassentamento da Vila dos Pescadores, como a intenção da Prefeitura Municipal de revitalizar toda a extensão da Orla do Guaíba, através do programa “Guaíba Vive”, criado originalmente em 1989, a fim de garantir o livre acesso à população nas faixas de orla, valorizando e preservando os espaços públicos abertos, garantindo a manutenção e equilíbrio dos ecossistemas e, por consequência, melhorando a qualidade de vida da população em geral. O programa dividiu-se em 19 áreas setorizadas por toda a extensão dos 70 km de orla para melhor se realizar as análises (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2003).
Uma das propostas do programa aponta a remoção da população ali consolidada, não informando se a mesma deve ser reassentada ou não. É apenas indicado que as residências possuem ocupação irregular e que geram inconvenientes urbanos por (1) obstruírem a paisagem e o acesso de faixa à orla; (2) ocuparem a área para implementação da Diretriz de duplicação da Av. Guaíba e (3) por não possuírem saneamento sanitário (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2003).
O projeto Guaíba Vive não está em tramitação na Prefeitura de Porto Alegre, porém atualmente há um novo programa denominado “Orla POA”, no qual são demonstradas as melhorias realizadas na extensão da área de Orla e suas revitalizações (http://www2.portoalegre.rs.gov.br/smgae/default.php?p_secao=68, recuperado em dezembro de 2021). Sendo assim, é notório que mesmo que o Programa Guaíba Vive não seja mais divulgado, seus ideais e objetivos estão saindo do papel, mas com outro nome de programa.
Diante desta análise, atualmente, a grande dificuldade dos Novos Conjuntos Habitacionais para Habitação de Interesse Social está na distância em que eles estão sendo construídos do centro da cidade e dos equipamentos públicos. Isto ocorre devido à especulação imobiliária, que influencia para que sejam construídos os novos conjuntos habitacionais distantes dos centros da cidade. Devido ao alto custo dos terrenos e com potencial de exploração imobiliária nas áreas nobres e centrais, surgiu a preocupação com a população da Vila dos Pescadores, uma vez que esta, com baixa renda, é a que mais necessita dos equipamentos públicos e de situar-se próxima ao centro com facilidade de mobilidade urbana. Assim, pensando no bem-estar da população da Vila dos Pescadores e em evitar a gentrificação da mesma, caso haja continuidade das diretrizes do Plano Diretor com a duplicação da Av. Guaíba e a requalificação urbana deste trecho da Orla de Porto Alegre, surge a necessidade do reassentamento num lugar mais próximo àquele onde a Vila dos Pescadores se encontra hoje, seguindo as diretrizes estabelecidas pelo Estatuto da Cidade. Esta medida trará tanto qualidade para os moradores ali presentes como para toda a população de Porto Alegre, que poderão usufruir da orla e terão o trânsito entre Centro e Zona Sul facilitado.
3. Estudos de Caso
É dever da administração pública buscar soluções e estratégias para as irregularidades urbanas através de casos concretos com a finalidade de melhorar as condições urbano-ambientais e gerar a inclusão social (Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2011). Assim, seguindo as recomendações da Cartilha de Regularização Fundiária, e com o propósito de obter conhecimento sobre a satisfação de uma comunidade que foi reassentada sem seu consentimento, foi realizado o estudo de caso sobre o Reassentamento Rubens Lara, o qual faz parte do Projeto Serra do Mar no estado de São Paulo, apresentado por Débora Carvalho, em 2015, com a finalidade de obtenção do título de Mestrado em Engenharia Civil; e o estudo de caso da Nova Ponte do Guaíba, localizado na cidade de Porto Alegre no estado do Rio Grande do Sul, tema de estudo militante investigativo desenvolvido pelo Centro de Direitos Econômicos e Sociais - CDES Direitos Humanos, organização não governamental.
3.1 Reassentamento Rubens Lara
Em 2009, o Ministério Público exigiu que o Estado de São Paulo e o Município de Cutubão extinguissem fisicamente todos os núcleos de habitações existentes dentro do Parque Estadual Serra do Mar (PESM) uma vez que as mesmas nunca poderiam ser urbanizadas e consolidadas, pois o PESM é o maior parque brasileiro de preservação da Mata Atlântica. Assim, surge o programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistemas dos Mosaicos de Mata Atlântica, conhecido como Projeto Serra do Mar (PSM) (Cavalheiro, 2015).
Segundo o BID (Banco Interamericano do Desenvolvimento) e o Governo de São Paulo (2009, como citado em Cavalheiro, 2015), o objetivo do PSM é melhorar a gestão das Unidades de Conservação (UCs), reduzir o impacto das populações localizadas dentro do PESM e recuperar as áreas degradadas causadas pelas ocupações irregulares. Além da remoção das casas inseridas no PESM, o programa consiste em realocar habitações que estejam localizadas em áreas de risco, sendo que nem todas serão reassentadas no município de Cutubão. Algumas famílias foram reassentadas em municípios vizinhos.
O conjunto Rubens Lara (Figura 10), é um dos 16 núcleos de ocupação irregular que foram reassentados pelo PSM. Este projeto foi reconhecido pela construção alternativa pelo Sustainable Social HousingInitiative - SUSHI e pela ONU por possuir um programa de práticas sustentáveis na construção habitacional (Conselho Brasileiro de Habitação Sustentável, 2010, como citado em Cavalheiro, 2015). Ele possui 1.840 unidades habitacionais (UH) distribuídas em 26 condomínios, com 3 tipologias adotadas, contendo uma área total construída de 140.644,73 m² com terreno de 197.475,50 m² (São Paulo, 2009, como citado em Cavalheiro, 2015).
Fonte: Recuperado em dezembro de 2021, de http://arquivo.ambiente.sp.gov.br/serradomar/2014/12/AF_I_MIOLO_Livro-Serra-do-Mar1.pdf)
Foram adotadas três tipos de tipologia, conforme a Figura 11. Em cada condomínio as UH variam de quantidade sendo de 12 a 192. Os apartamentos são compostos por ambientes variando entre 48m² e 59m², possuindo sala, cozinha, banheiro, área de serviço, dois ou três dormitórios (São Paulo, 2009, como citado em Cavalheiro, 2015).
O maior problema enfrentado pelos moradores reassentados foi a adaptação em conviver num apartamento, tendo em consideração que, anteriormente, todos habitavam em casas, gerando assim o estranhamento da proximidade e as regras de convivência com os vizinhos. É observado que os condomínios com quantidades menores de Unidades Habitacionais são melhor administrados e cuidados, em contrapartida são os que mais se apropriam da área condominial, além da criação de espaço comercial (Cavalheiro, 2015).
Dos moradores entrevistados, 45,3% deles não queriam sair do seu local de origem e o principal motivo dos 54,2% quererem sair relacionava-se com as características do local em que habitavam, por ser uma área de risco. Em relação à habitação atual, em comparação às residências anteriores, os moradores mostraram-se muito satisfeitos com a nova habitação, principalmente pela qualidade da construção, saneamento e localização. O fator que deixa a desejar apenas é o fato de serem reassentados em apartamentos nos quais a metragem quadrada é bem menor do que as casas de origem (Cavalheiro, 2015).
O fator que mais agrada a população é a infraestrutura e a proximidade dos serviços que o reassentamento proporcionou. O principal impacto gerado foi o pagamento das taxas de condomínio, que, por se tratar de uma classe com baixa renda, é um fator impactante na vida dos moradores e, ainda, daqueles que que possuíam comércio, pois os mesmos, ao serem reassentados, perderam sua fonte de renda (Cavalheiro, 2015).
3.2 Projeto da Nova Ponte do Guaíba
O projeto da Nova Ponte do Guaíba realizado na cidade de Porto Alegre demonstra o resultado da falta de um projeto planejado para reassentamentos urbanos e traz uma reflexão sobre como devemos iniciar um processo desta natureza. O projeto faz parte do Programa de Aceleramento do Crescimento (PAC) na sua primeira edição, resultado da parceria entre o Governo Federal, Estadual e a Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Sob responsabilidade do Departamento de Infraestrutura Terreste (DNIT), com finalidade de desenvolver economicamente a região Sul do estado, servindo como um acelerador de projetos do Movimento Ponte do Guaíba (Muller et al., 2020).
O projeto da construção da nova ponte que liga a Cidade de Porto Alegre a Cidade de Eldorado do Sul passa por uma Unidade de Conservação Ambiental e o Parque Estadual Delta do Jacuí, além de afetar diretamente a população da Ilha Grande dos Marinheiros, Ilha das Flores, Vila Tio Zeca e Vila Areia. Em Julho de 2014 foi realizado o cadastro socioeconômico da população atingida e, em Outubro do mesmo ano, as obras foram iniciadas, mesmo não possuindo estratégia para o reassentamento da população, marcando um início de incertezas para as comunidades, tendo em vista o desencontro de informações recebidas pelo governo. (Muller et al., 2020).
A proposta de reassentamento foi estabelecida no edital da licitação pública para a obra. Assim, a partir de formulário proposto pelo DNIT foi realizado o cadastro socioeconômico. Neste cadastro, que consistia no levantamento inicial da demanda, foi realizado questionamento direto com as famílias de quais seriam as possíveis modalidades de reassentamento. Ocorre que desde o edital da licitação pública já estava estabelecido as modalidades (PAGINA 81 do EDITAL de LICITAÇÃO). As modalidades para a remoção das famílias conforme o edital da licitação consistia em: indenização por desapropriação; Programa de Abrigamento Provisório (aluguel-social ou Vilas de Passagem); Reassentamento definitivo (poderá ocorrer em três modalidades: indenização, compra assistida e construção de unidade habitacional). (Muller et al., 2020, p. 59)
Todavia o andamento do projeto de reassentamento não andou junto ao projeto da construção da ponte. A obra teve início em 2014, logo após o cadastro das comunidades, e no ano de 2017 os terrenos ainda não haviam sido desapropriados para construção das unidades habitacionais, via programa “minha casa minha vida”. Os moradores da Ilha Grande dos Marinheiros acabaram por optar pela modalidade de reassentamento através da compra assistida, abrindo mão do direito de permanecer no mesmo território, enquanto os moradores da Vila Tio Zeca e Areia esperam, há mais de uma década, por um reassentamento no município de Porto Alegre/RS, residindo em casa de passagem até a concretização da obra (Muller et al., 2020).
Em matéria publicada no Correio do Povo em Janeiro de 2023, é apontado que, apesar da Ponte ter sido inaugurada em 2020, com 97% da obra concluída, resta ainda concluir 4 alças de acesso na ponte, a qual aguarda lançamento para edital de concessão e, enquanto as famílias ainda não forem reassentadas, não será possível concluir a ponte.
O projeto da Nova Ponte do Guaíba demonstra, claramente, que, para se dar início em uma obra pública, deve-se, em primeiro lugar, realizar um planejamento urbano completo, que consiste em planejar todas estratégias a fim de conseguir realizar as ações necessárias para alcançar o objetivo final. Neste caso, o projeto de reassentamento e o cadastro, juntamente com as entrevistas às comunidades atingidas, deveriam ter sido realizados antes mesmo do início das obras, em 2014. Já com o estudo de caso do Conjunto Residencial Rubens Lara, é possível observar como o reassentamento habitacional influência na vida da comunidade a ser realocada e melhora sua qualidade de vida, principalmente pela infraestrutura oferecida e a proximidade dos serviços, ainda que o planejamento e as políticas que regem os atuais assentamentos deixem a desejar, porém servem de modelo para novas práticas e soluções a serem revistas.
4. Medidas a serem adotadas para realização dos reassentamentos
O direito à habitação para as pessoas que vivem em favelas e cortiços é uma pendência histórica, que necessita de medidas efetivas de legalização e urbanização desses territórios para realizar a justiça social brasileira, decorrente das formas segregadoras da ocupação do território brasileiro, que existe desde a abolição dos escravos, no final do século XIX, e do regime de propriedade fundiária, pela Lei de Terras de 1850. A aplicação das medidas efetivas de legalização e urbanização, com finalidade de eliminar a exclusão espacial e social na qual se encontram as cidades brasileiras, dá-se através da aplicação dos instrumentos jurídicos da política urbana para regularização fundiária, encontrada no artigo 183 da Constituição Federal, juntamente com as medidas jurídicas de urbanização. A regularização fundiária tem este compromisso de recuperar um tempo histórico para se movimentar no mesmo sentido, sendo uma medida de responsabilidade da Administração Pública que busca encontrar resoluções e planos baseados em casos concretos, com finalidade de gerar inclusão social, melhorando as condições urbano-ambientais (Lei Federal n. 10.257, 2001; Ministério Púbico do Rio Grande do Sul, 2011).
Contudo, o sistema financeiro de habitação deve ser reformulado, pois acaba por realizar medidas discriminatórias que geram exclusão e impedem o direito à habitação a uma parte considerável da população brasileira. Assim, a obrigação da realização de políticas públicas, principalmente as urbanas e habitacionais, visa impedir o regresso do direito à habitação e impede que o sistema financeiro dificulte o acesso para esta população. São instrumentos da política de regularização fundiária: as ZEIS/AEIS; a concessão do direito real de uso; a concessão de uso especial para fins de moradia; o usucapião especial de imóvel urbano e; a assistência técnica e jurídica para a população que necessitar da proteção dos direitos à moradia (Lei Federal n. 10.257, 2001).
De acordo com o guia “Como Atuar em Projetos que Envolvem Despejos e Remoções”, desenvolvido pela Relatoria Especial da ONU para a habitação adequada, todas as medidas que a tornem adequada no novo local devem ser concluídas antes da remoção, como as construções das casas, escolas, instalação de saneamento básico, etc. A nova habitação, terra ou território deve ter qualidade superior ou equivalente à original, o que inclui as mesmas condições ambientais, geográficas e estruturais, como por exemplo, condições para escoamento da produção e espaços de convívio social. Ainda, devem estar localizadas o mais próximas possível do local original e das fontes de meio de subsistência. Além disso, os custos de deslocação para o trabalho ou para aceder a serviços essenciais no novo local de residência não devem impactar no orçamento das famílias, assim como os locais para onde as pessoas serão deslocadas não devem estar situados em áreas de proteção ambiental, de terra contaminada ou próximas de fontes de poluição que possam afetar o direito à saúde mental e física dos habitantes (Muller et al., 2020).
Quando se começa a pensar um projeto de infraestrutura e urbanização que vai exigir a remoção de pessoas e comunidades - antes mesmo de iniciar o planejamento - deve-se avaliar, rigorosamente, a sua necessidade e adequação. O Guia “Como Atuar em Projetos que Envolvem Despejos e Remoções”, sugere mapear os atingidos e avaliar o impacto do projeto, levantando todos aqueles que serão atingidos direta ou indiretamente, identificando especialmente os grupos mais vulneráveis da população.
Assim, para a regularização fundiária ter sucesso, é necessário conscientizar a população sobre a importância da regularização antes do processo se iniciar, para então poder ser realizado o levantamento da quantidade de ocupantes na região, o número de famílias, o número de habitantes por moradia, emprego, renda e quantidade de filhos menores de idade. Para determinar qual o melhor instrumento de regularização é necessário identificar as residências situadas em áreas de risco ou que precisam de reassentamento para a implantação de infraestrutura urbana e fazer um estudo sobre a situação jurídica do imóvel, qual o tempo que o mesmo se encontra no local e a quem pertence (Ministério Público do Rio Grande do Sul, 2011). O caso da Nova Ponte do Guaíba é resultado da falta do planejamento do projeto de reassentamento antes de se iniciar uma obra pública, o que ocasiona descaso relativamente à população afetada, que fica sem saber sobre o futuro da sua habitação e, em alguns casos, tendo que abrir mão do direito de permanecer no seu território de origem, perdendo o sentido de pertença ao local, contrastando com os resultados positivos observados no estudo de caso do Conjunto Residencial Rubens Lara.
4.1 Reassentamento da Vila dos Pescadores: uma proposta
Conforme já descrito anteriormente, a área de intervenção foi identificada a partir da percepção de uma forte tendência de revitalização da orla do Guaíba, após uma análise de áreas vulneráveis da cidade de Porto Alegre e uma análise de problemas relacionados à mobilidade urbana e falta de espaços públicos para a população. Com o propósito de evitar o mesmo caso que ocorreu com as comunidades atingidas pela construção da Nova Ponte do Guaíba, se foi pensando numa proposta de reassentamento hipotético para a população da Vila dos Pescadores, com finalidade o desenvolvimento do Trabalho de Conclusão de Curso - TCC da autora Leticia de Souza.
O terreno para o reassentamento, conforme ilustrado na Figura 12, foi escolhido por se situar mais próximo à Vila dos Pescadores (em frente ao seu local atual), estar em cotas mais elevadas e possuir possibilidade de conectividade com a Orla do Guaíba. Essa gleba encontra-se na Av. Guaíba, no Bairro Vila Assunção, na cidade de Porto Alegre, Estado do Rio Grande do Sul, e não possui edificação existente, tendo área total de 8.764,80 m².
A Figura 13 ilustra uma proposta de reassentamento da população da Vila dos Pescadores em local próximo ao local de origem, com Habitação Social de tipologia escalonada. Além disso, o projeto propõe a liberação e duplicação da importante via de ligação entre zona Sul e Centro e a utilização da área de orla como área pública de parque a ser utilizada por toda a população.
5. Considerações finais
Conforme já descrito ao longo deste trabalho, entre as principais consequências do processo de urbanização irregular, estão os problemas socioambientais relacionados com a ocupação humana em áreas de risco, como locais de enchentes e inundação, oferecendo grandes riscos à população local. Nessas áreas em geral, não há saneamento básico e infraestrutura urbana, potencializando as vulnerabilidades locais já existentes e os riscos aos quais a população de baixa renda encontra-se exposta. Esse crescimento desordenado e precário, aliado à degradação contínua do ambiente natural, resulta num território frágil, sujeito a desastres ambientais e de saúde coletiva.
Devido ao fato de a Vila dos Pescadores se encontrar numa gleba situada às margens do Lago Guaíba, caracterizando-se como APP, considerada área de risco, não pode receber infraestrutura para regularização fundiária. Para poder realizar a regularização da habitação destas famílias é necessário o reassentamento desta população.
Foi possível realizar uma reflexão de quais medidas podemos extrair para dar início ao planejamento dos reassentamentos urbanos, através dos estudos de casos do Conjunto Residencial Rubens Lara e do projeto da Nova Ponte do Guaíba.
No estudo de caso do Conjunto Residencial Rubens Lara, salienta-se a importância de manter os moradores no seu local de origem e considerar, além da infraestrutura básica, a metragem quadrada e tipologia da residência de origem da população a ser reassentada para o efetivo sucesso do reassentamento. Tratando-se de conjuntos habitacionais nos quais é cogitado cobrar taxa condominial dos moradores reassentados, é necessário também uma pesquisa local para aferir se a população terá condições de arcar com os custos condominiais, pois é insuficiente propor melhorias da qualidade de vida, prejudicando, simultaneamente, a economia familiar das famílias realocadas. Já no caso do projeto da Nova Ponte do Guaíba, é evidente a necessidade de se planejar como se efetivará o reassentamento das famílias antes de se iniciar uma obra pública, a fim de se evitar que a comunidade entre numa zona de incertezas, sem saber o futuro e sem ter a garantia da sua própria habitação.
Através destes estudos e dos dados coletados, podemos afirmar que a Vila dos Pescadores é uma área potencial para um projeto de reassentamento, que forneça a infraestrutura básica necessária para que a população residente tenha uma melhor qualidade de vida e não fique mais exposta a riscos de saúde e geográficos. A fim de garantir o sucesso do reassentamento, o processo de planejamento deve-se iniciar com um projeto de habitação para a realocação da comunidade atingida com a conscientização prévia da população sobre a necessidade desse deslocamento, levando em consideração as condições existentes de moradia da comunidade.
Sendo assim, no caso da Vila dos Pescadores, o reassentamento da população em um local próximo, levando em conta as medidas apontadas no capítulo 4 - proximidade do local de origem, planejamento da infraestrutura, condições de emprego, renda e transportes - seria uma solução adequada para a melhoria da qualidade de vida dos moradores que hoje vivem em situação de risco. Além disso, a proposição do alargamento da Av. Guaíba para reduzir problemas de mobilidade urbana no município, bem como a revitalização do espaço público da orla do Guaíba, para torná-lo um espaço de convívio e de livre acesso, são necessidades reais da cidade de Porto Alegre. Essas medidas de intervenção são necessárias para melhorar a qualidade de vida tanto da população residente na Vila dos Pescadores quanto da população porto-alegrense em geral.