Processos e Desafios de Cidadania.
Com início nos anos letivos de 2017/2018 e de 2018/2019, uma reestruturação de planos curriculares nas Unidades Curriculares (UC) de Artes Plásticas I e II, integradas na Licenciatura em Educação Básica da Escola Superior de Educação do Politécnico de Lisboa, empenha-se seriamente na reformulação de conteúdos e de metodologias de lecionação, considerando a importância do desenvolvimento de processos criativos por parte de futuros professores e agentes educativos, para a consideração das artes, dos seus processos e técnicas além da perspetiva instrumental, decorativa e tecnicista (como manualidade). Avança-se, então, numa perspetiva cultural, social e ambiental, para a consideração das práticas artísticas enquanto meios de construção, discussão e comunicação de conhecimento, pela introdução de processos de pesquisa educacional baseados em arte (Art-Based Educational Research), incorporando, nos processos de ensino-aprendizagem, a capacidade crítica face às mudanças sociais e culturais (Matos & Ferreira & Pereira, 2021).
Empreendendo processos capazes de fazer coordenar a pesquisa educacional com recurso a processos e métodos de investigação baseados em arte, Art-Based Educational Research (Barone & Eisner, 2006), favorece-se a consideração de outros modos para a observação do fenómeno educacional, caracterizados mais pela capacidade de fazer despertar e emergir questões do que pela determinação de respostas fechadas. Operando com uma linguagem de cariz evocativo e, por isto, mais apta ao estímulo das faculdades da imaginação - convidam-se os estudantes ao preenchimento, com significado próprio, dos lugares em aberto, não determinando esta ação educativa um sentido fechado e literal (Barone & Eisner, 2006). Num tal sentido, foi como desafios de cidadania que trabalhámos os referentes propostos aos estudantes como indutores de partida, para os projetos a desenvolver, pensando-os por forma a fazer emergir questões de relevo do âmbito da ação social, cultural e/ou ambiental.
Propósitos e princípios orientadores os quais, acabámos por conseguir aferi-lo, verificámos de facto presentes e pedagogicamente considerados pelos nossos estudantes, pela leitura da reflexão crítica final, devolvida por cada um deles como corolário ao respetivo portfólio didático de aprendizagens: pela abordagem a questões como os valores da ecologia, do património material e imaterial, da multiculturalidade, da necessidade do desenvolvimento de espírito crítico face às imagens que povoam a realidade quotidiana e da atenção a distintas realidades sociais.
Sendo-lhes dada oportunidade para o desenvolvimento de processos criativos na primeira pessoa, para serem participantes, para experimentarem, para problematizarem e interpretarem uma experiência criativa e, desta pesquisa, fazer emergir e recriar questões, os estudantes recriam-se, recriando, consequentemente, a sua percepção da(s) realidade(s). Munidos então de uma consciência ativa, tornam-se estes estudantes (e futuros agentes educativos) parte da comunidade crítica e mais aptos a desenvolverem-se, a desenvolver recursos próprios, a atenderem às particularidades e a contribuírem para a melhoria das realidades sociais junto das quais venham a operar.
Entre os princípios fundamentais que presidiram à reestruturação dos planos curriculares nas UC de Artes Plásticas I e II, destacamos o incentivo ao trabalho intelectual (além das manualidades) e, com este, sublinhamos ainda, o desenvolvimento de uma consciência social, cultural e artística em permanente diálogo com as realidades múltiplas, que operacionalizamos por via de propostas de trabalhos desenhadas segundo uma abordagem projetual e baseada na experimentação. Favorece-se, por esta via, a formação de um ‘sujeito cultural‘, definido como alguém munido de um olhar crítico e consciente por sobre as realidades, capaz de refletir e inovar em termos sociais e tecnológicos, dada a competência própria para estabelecer pontes e relações diversas (Pereira, 2019).
No cruzamento entre processos criativos, vias de cidadania ativa e processos educativos, apresentam-se, seguidamente, a metodologia, os resultados e trechos da reflexão dos estudantes à volta de dois exercícios projetuais (entre os propostos em 2020/2021 na UC de Artes Plásticas II): i) um desafio para a desconstrução do retrato próprio e ii) a proposta para a criação de um objeto ou maleta pedagógicos, acompanhado do projeto para a sua implementação em contexto de educação formal ou não formal.
Princípios Metodológicos
As conclusões de um estudo comissariado pela UNESCO, conduzido em 2004 entre os seus membros (publicado 2006), documentam o modo como uma educação de qualidade através das artes, isto é, uma ação educativa capaz de fazer recurso de pedagogias criativas e artísticas, dos meios e dos processos seus característicos, como modos de investigação/ação, aumenta a cooperação, o respeito, a responsabilidade, a tolerância e o desenvolvimento do juízo crítico (Bamford, [2006] 2009).
Apontam no mesmo sentido os resultados do Global Education Monitoring Report da UNESCO para 2021/22, observando como, imediatamente a seguir às matérias das ciências, são as das artes as que os países reportam como aquelas nas quais os princípios orientadores da UNESCO, no que respeita aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e à sua Meta 4.7 - para o desenvolvimento sustentável e a cidadania global , são principalmente ensinados (UNESCO, 2021/2).
A chegada à UC de Artes Plásticas I, que se desenvolve ao longo do primeiro semestre da Licenciatura em Educação Básica (LEB), reconhecendo como muito importante (78%) a aquisição de conhecimentos na área das Artes Plásticas/Artes Visuais por parte do professor do 1º ciclo do Ensino Básico, verificamos que, de entre os conhecimentos a adquirir no âmbito da UC de Artes Plásticas, os nossos estudantes elegem como mais relevantes para a prática docente futura: i) o conhecimento das técnicas (48%); ii) o conhecimento de natureza pedagógica (46%); iii) o conhecimento dos processos artísticos [entendidos sobretudo como fazeres] (44%); iv) o conhecimento de natureza didática (43%); v) o conhecimento relativo à exposição de objetos artísticos (43%); vi) a ligação entre as artes plásticas e outras áreas do conhecimento (43%); vii) o conhecimento da obra de artistas (42%), (conclusões de um inquérito realizado à entrada do ano letivo de 2021/22, para a compreensão dos hábitos, perceções e representações dos estudantes em relação ao universo das Artes Plásticas e Visuais, ao qual respondeu um universo de 100 estudantes, de entre os 163 que compunham as 3 turmas do ensino diurno da LEB).
De forma consequente, as mais-valias e os maiores alcances da Educação Artística (consignada aqui às Artes Plásticas/Visuais somente e ainda segundo o mesmo inquérito realizado à entrada do ano letivo de 2021/22), veem-nos estes estudantes distantes de si próprios, isto é, profícuos não à ação prática e reflexiva própria enquanto futuros agentes educativos, mas favoráveis sim aos seus futuros alunos, nomeadamente: facultando um estímulo à curiosidade, dando espaço à imaginação e à criatividade, ao sentido e à vivência lúdicos [entendidos, percebe-se, em sentido de atividades que utilizam o lúdico em aceção também ela instrumental, como uma atividade externa ao sujeito e nem sempre aliada à construção de conhecimento], à livre expressão, ao desenvolvimento motor, ao desenvolvimento técnico, facultando o desenvolvimento de determinados aspetos cognitivos. De entre o universo de respostas analisadas, uma porém, alia a criatividade à flexibilidade e à fluidez, considerando a capacidade para “[…] criar cidadãos mais aptos para o mundo em constante mudança em que vivemos.” (respondente anónimo, 2021).
Grandemente irrelevado é o potencial de desenvolvimento intelectual e crítico, decorrente da experiência de processos criativos ou de metodologias artísticas, entendidos estes como processos de cognição, na formação do agente educativo. Ora, é justamente a oportunidade para o desenvolvimento de processos criativos, a ocasião para explorar, para experimentar de forma participante, para problematizar, reinterpretar e recriar - recriando-se e com isto recriando a realidade - que consideramos importante propiciar a estes estudantes. Vêm neste sentido as duas propostas de trabalho que apresentaremos de seguida. Propostas dinamizadas junto dos estudantes mediante “abordagem triangular” (Barbosa, 1998), considerando: a experiência do investigar; a experiência do fazer; a experiência da conceptualização e a da fruição (exercidas estas quer sobre o objeto de estudo, quer sobre a produção própria, em modo quer individual, quer de grupo) e desenhadas segundo uma abordagem projetual baseada na experimentação, para a criação de objetos sob moldes distintos, pensados para contextos reais diversificados, metodologicamente integradores do conhecimento teórico, de considerações culturais múltiplas e das práticas artísticas, contribuindo assim para a consequente estruturação do pensamento criativo.
Art Thinking é o princípio metodológico sistematizado por Luís Camnitzer [2007] (Acaso & Megías, 2017). Metodologicamente designa uma prática estruturante, questionadora, capaz de observar a arte não como um meio de produção, mas como uma forma de pensamento. Denomina um processo de problematização que coloca o espetador leigo ao mesmo nível que o artista, permitindo-lhes embarcar na mesma pesquisa e estabelecendo lugar a um diálogo criativo (Camnitzer, 2015). Determina a enunciação, pois, de processos de cognição e de indagação do mundo para a criação de conhecimento crítico, através de metodologias artísticas. Um paradigma que faz recurso da arte e do processo criativo não apenas como conteúdo, mas como metodologia (Acaso & Megías, 2017).
“Art Thinking is much more than art: it is a meta-discipline that is there to help expand the limits of other forms of thinking.” (Camnitzer, 2015).
Fazendo recurso de processos artísticos como metodologia e considerando a importância do desenvolvimento de pensamento criativo por parte destes estudantes, futuros agentes educativos em contextos formais e não formais, apresentamos as práticas e os resultados de dois projetos, entre aqueles que foram desenvolvidos na UC de Artes Plásticas II, do 2º ano da Licenciatura em Educação Básica, na Escola Superior de Educação do Politécnico de Lisboa, no ano letivo de 2020/21.
Processos e Resultados
Projeto: Desconstrução do Retrato Fig. 2 Fig. 3 Fig. 4
O exercício enunciado como Desconstrução do Retrato, desenvolvido em período de confinamento, na modalidade de ensino online, partiu da análise da obra e dos processos criativos de Lola Dupré (n.1982), artista e mulher nascida fora dos grandes circuitos artísticos, uma referência na arte contemporânea, com atividade ao tempo da nossa vivência.
Procurando identificar as questões a que a artista intenta dar resposta, deu-se início aos trabalhos por meio de um debate sustentado em imagens produzidas pela artista, muitas delas disseminadas por via da rede global, conduzindo ao entendimento do papel ativo desempenhado pela imagem na formação de juízos de valor e da consciência, promovendo uma sua leitura crítica e o desenvolvimento de literacia visual.
A investigação subsequente, desenvolvida pela prática, exercitou a leitura, a análise, a discussão e a interpretação de imagens e motivou entre os estudantes a reflexão em torno da identidade própria, cultural, do imaginário pessoal e coletivo, da representação simbólica (do próprio e de seus interlocutores). Concebeu-se o momento exploratório/investigativo seguinte, fazendo recurso do telemóvel como instrumento de registo fotográfico e mediador entre o ser individual e o ser social e cultural. Pretendemos com esta experiência oferecer ocasião aos estudantes para estudar/experimentar e refletir acerca da transformação, quer dos sentidos da imagem, quer da perceção da própria realidade por parte do recetor, preconizada pelo fotógrafo desde logo no momento da captura da imagem fotográfica. Para tal e enquadrando este estádio do desenvolvimento do trabalho, preparámos ainda para os estudantes um documento, que informou a análise e a discussão em grupo acerca das alterações provocadas na leitura da imagem decorrentes da composição fotográfica, observando: i) enquadramento fotográfico (planos de enquadramento, limites e fronteiras, pontos de vista, função enfática, icónica, dramática); ii) distância entre a máquina fotográfica e o objeto (tipos de plano); iii) ângulo de visão; iv) ponto ou área focal e profundidade de campo.
Assim despertos, prosseguiram os estudantes os seus trabalhos, envolvendo-se num período de investigação pela prática, no decurso do qual lhes foi individualmente proposto o desenvolvimento de um conjunto de autorretratos, para a experimentação do resultado quer de diferentes expressões, quer da ação de diferentes tipos de composição fotográfica, na leitura do autorretrato. De entre toda as fotografias recolhidas e munidos do conhecimento anteriormente desenvolvido os estudantes fizeram as suas leituras, sendo-lhes então pedida a seleção das quatro fotografias que lhes parecessem mais consentâneas com as suas intenções. Individualmente, olharam as fotografias obtidas, procurando ler nelas as suas características e potencialidades em termos de comunicação (Fig.1).
Além das ações citadas, este projeto permitiu também o desenvolvimento de dinâmicas de aula capazes de potenciar a relação entre o individual e o grupo como coletivo, dinâmicas estas aptas a ser futuramente transpostas para as práticas profissionais dos estudantes, em contexto educativo.
É disto exemplo o painel coletivo desenvolvido em modo presencial, em contexto já de sala de aula, que as imagens da Figura 5 ilustram. Uma dinâmica não descurada no modo de ensino à distância (quando nos deparámos, professores e estudantes, remetidos para situação de confinamento), fazendo-se então uso de plataformas digitais de trabalho colaborativo. Uma prática de trabalho caracterizada pelo envolvimento do estudante no grande grupo, que sistemática e estrategicamente interpomos nas fases de apresentação de propostas, de discussão e de reflexão finais do projeto. Pretende-se, com isto, incentivar não apenas a apresentação ao coletivo do trabalho próprio (que é de resto importante enquanto manifesto explícito do processo de pensamento individual), mas também a observação pelo coletivo da variedade de soluções, da diversidade de possibilidades, da divergência dos caminhos percorridos a partir de um mesmo ponto de partida, a aceitação da diferença, a partilha de experiências, sensações e perceções sobre a realidade, bem como de outros modos de ser e de fazer.
Desta investigação destacamos a atenção dada à interrogação dos sentidos da imagem e da comunicação visual na nossa sociedade, bem como as averiguações sobre o papel da fotografia na construção de imaginários individuais e sociais. Por esta via, fomentou-se junto dos estudantes o desenvolvimento de sentido crítico face ao ambiente imagético quotidiano, dentro do qual, muitas vezes, imperam os estereótipos de beleza, os filtros das aplicações digitais, mas não há lugar à consideração da personalidade, da multiculturalidade, ou daquilo que nos torna diferentes e únicos.
Pela via que vimos expondo, desconstruímos também o uso das ferramentas digitais de manipulação da imagem, na procura das expressões, do inusitado e do detalhe. Ensaiaram-se, percepcionaram-se e desenvolveu-se reflexão individual e coletiva acerca das resultantes de experiências múltiplas com contrastes de forma, alterações de tom, de enquadramento, de textura visual, de dimensão e de composição. Articulando estas experiências no objetivo individual e coletivo da “desconstrução do retrato”, procuraram-se os vários “eus” dentro de cada possibilidade proposta.
Projeto: Maleta Pedagógica
Já o projeto para a criação de um objeto ou Maleta Pedagógica, pretendendo assumir-se como projeto de natureza artístico-pedagógica, isto é, como projeto capaz de nascer e desenvolver-se a partir da consideração de pontos diversos de interceção entre questões de natureza estética, artística e pedagógica - constituiu-se, por um lado, como uma síntese das aprendizagens realizadas ao longo dos dois semestres da UC de Artes Plásticas e, por outro, como projeto de iniciação à investigação educacional baseada em arte. O projeto, com momentos de desenvolvimento individual que depois confluíram para o trabalho de grupo, partiu da análise dos processos investigativos e da obra de três artistas de contextos culturais distintos: Roy Lichtenstein (1923-1997), Alighiero e Boetti (1940-1994) ou Vik Muniz (n.1961). Indutores oferecidos não como um fim em si mesmos, autorreferenciais, mas pelo modo como os encontramos relacionados com aspetos importantes da contemporaneidade, como sejam as questões de literacia ou cultura visual associadas à ação da imagem sobre a sociedade, ou ainda as problemáticas relacionadas com a exclusão social, de natureza ambiental ou geográfica, lidando com a mudança social.
Considerando o processo criativo como método investigativo, iniciaram-se os trabalhos pela observação da obra de cada um dos artistas e, assim, das problemáticas por eles abordadas constituindo-se, neste primeiro momento, numa investigação desenvolvida pelos estudantes auxiliada pela leitura de bibliografia de referência e ensaios críticos sugeridos pelas docentes. À volta destas problemáticas, cada estudante começou por elaborar um mapa mental, como aquele que observamos na Figura 6.
Posteriormente, esta investigação serviu como suporte ao debate e à troca de ideias entre pares. Daqui resultou a problematização do pensamento individual (subjetivo) e o desenvolvimento de reflexão à volta de uma questão de investigação considerada central, a qual direcionou os estudantes para a consideração de um conjunto de problemáticas e de questões evocadas pela obra, muito além da sua dimensão material e da perceção/experimentação primária. Um processo pertinente, concorrendo para a observação dos diversos processos criativos como processos investigativos, no sentido da desconstrução junto dos estudantes da ideia corrente de que a criatividade é apanágio de alguns e não o resultado de um continuado trabalho de investigação e reflexão sobre os resultados.
Mobilizando metodologias de natureza artística e projetual, fez-se recurso de técnicas e ferramentas de desenvolvimento criativo, pessoal e coletivo e desenharam-se propostas integradoras de saberes e mobilizadoras de conhecimentos de natureza técnica, estética e cultural, para o desenvolvimento de projetos artísticos tendo em conta questões pedagógicas e de cidadania (Fig. 7 e Fig. 8). Tais dinâmicas, verificámo-las muito em particular na reflexão desenvolvida sobre a obra de Vik Muniz, atendendo ao seu compromisso social em prol de causas comunitárias e sociais.
Nos vários projetos desenvolvidos, interrogando, interpretando e avançando com um processo de reflexão em torno dos diversos indutores artísticos propostos, referenciados à obra de Alighiero e Boetti, os estudantes utilizaram vários elementos da linguagem visual, atendendo à diversidade cultural como meio de construir novas mensagens.
Os resultados obtidos com os projetos desenvolvidos pelos estudantes, concebidos, conforme a intenção e o interesse de cada um dos grupos de trabalho, para públicos que vão do pré escolar ao final do primeiro ciclo do ensino básico, visaram questões e áreas tão diversas e abrangentes como: as do desenvolvimento sensorial e motor; do desenvolvimento da perceção, da cognição, da criação de materiais didáticos próprios ou da comunicação nas múltiplas áreas curriculares; não descurando ainda as da sustentabilidade; dos direitos cívicos e culturais; da cidadania global ou as da apreciação da diversidade cultural.
Da forma que vimos enunciando e com os projetos que vimos mencionando, pretendemos potenciar junto dos estudantes: a compreensão de metodologias de trabalho projetual; a aplicação dos seus princípios na concepção e planificação de projetos/atividades capazes de auxiliá-los na operacionalização de processos criativos e artísticos como processos de investigação; o estimulo à criatividade; o despertar/aguçar dos sentidos e o desenvolvimento da sensibilidade estética, considerando contextos formais e não formais de aprendizagem.
Nota Final: Uma Outra Perspetiva do Mundo
Da análise qualitativa dos processos individuais e coletivos, observando a reflexão redigida pelos estudantes no balanço do trabalho desenvolvido ao longo do semestre, observamos como foi possível concretizar e validar algumas das premissas que havíamos estabelecido com o desenho dos exercícios propostos, nomeadamente: a consideração das práticas artísticas enquanto espaços/processos de construção, discussão e comunicação de conhecimento, pela introdução de processos de pesquisa educacional baseados em arte, para a incorporação nos processos de ensino-aprendizagem de dinâmicas propiciadoras do desenvolvimento de capacidade crítica face à diversidade e às mudanças sociais e culturais; para o estímulo, em suma, de um comportamento exploratório que parte da experiência e da experimentação, para o fomento de associações de ideias, para o avanço de interpretações diversas, integradoras e transformadoras do indivíduo (esteja ele no papel quer de professor, quer de estudante) e, consequentemente, do tecido social. Transcrevemos alguns dos testemunhos coligidos.
“Esta unidade curricular fornece-nos uma outra perspetiva do mundo que nos rodeia e a forma como olhamos e pensamos sobre ele.” (A. Rosa, 2021).
“[…] momentos de pesquisa, debate, discussão, ponderação, pensamento, simulação, projeção e criação […] bastante relevante para o nosso trabalho, futuramente, como educadores e professores e, simultaneamente, enquanto observadores do mundo que nos rodeia e das inúmeras possibilidades de ação e arte existentes.” (L. Lopes, 2021).
Das reflexões individuais dos estudantes, com sentido para o seu desenvolvimento profissional, extraímos: o entusiasmo perante os resultados inesperados como fator impulsionador de investigação futura; a importância dos momentos de partilha de resultados para a construção comum e em grupo; a relevância da metodologia de trabalho em modo projetual; a importância da observação dos processos, contemplando e considerando o lugar significativo do erro e da reformulação de hipóteses; o relevo do trabalho com indutores artísticos reais, capazes de suscitar o debate e para isto a necessidade de providenciar leituras capazes de fornecer dados no que respeita à interpretação multidisciplinar dos diversos indutores propostos; o lugar à cooperação e à aceitação, decorrente dos múltiplos momentos de estudo de fontes seguido de discussão e de debate de ideias (quer entre os estudantes, quer entre aqueles e o professor); a multitude de questões, disciplinas e áreas de saber que gravitam e se interligam à volta de cada um dos referenciais artísticos ponderados e investigados; a consideração da geografia humana e cultural como dimensão importante e fundamental da obra e do projeto; a capacitação do estudante como agente com responsabilidade social e não apenas como aluno.
“A ideia final selecionada tinha como temática central os países do mundo, a interculturalidade, a viagem, no fundo a geografia, que é uma das dimensões importantes para o artista na realização das suas obras. […].
Visto que a mensagem comunicada pelas obras do autor e a intencionalidade das suas obras estava muito relacionada com a aceitação do outro, o valorizar de outras culturas diferentes e o dar voz e reconhecimento aos outros, criando projetos coletivos, a nossa ideia final centrou-se exatamente no mesmo, promovendo estes aspetos que interessavam ao autor.” (C. Alves & R. Santos, 2021).
Fechando esta nossa comunicação, gostaríamos de sublinhar como, tendo em conta o carácter global da educação artística e o seu potencial transformador, nos parece da maior compatibilidade e de suma importância o intento de desenhar projetos capazes de formar, junto de futuros agentes da ação educativa, uma pré-disposição para ações capacitadoras de possibilidades individuais e sociais. Favorece-se assim a formação de uma consciência exigente e ativa em relação ao meio ambiente, à sociedade e ao outro, contribuindo, consequentemente, para o desenvolvimento global. Esta, afirmamos ainda, tem constituído na nossa prática preocupação fundamental e recorrente.