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Da Investigação às Práticas

versão On-line ISSN 2182-1372

Invest. Práticas vol.13 no.1 Lisboa maio 2023  Epub 28-Mar-2023

https://doi.org/10.25757/invep.v13i1.322 

Artigos

A leitura funcional como processo de promoção de autonomia pessoal e social de alunos com perturbação do desenvolvimento intelectual

Functional reading as a process to promote the personal and social autonomy of students with intellectual development disorders

La lectura funcional como proceso de promoción de la autonomía personal y social de los alumnos con perturbación del desarrollo intelectual

La lecture fonctionnelle comme processus favorisant l'autonomie personnelle et sociale des élèves ayant des perturbations du développement intellectuel

i St. Julian´s School

ii Escola Superior de Educação de Lisboa, Instituto Politécnico de Lisboa


Resumo

No presente estudo procurou-se compreender como se processa o ensino-aprendizagem de alunos com Perturbação de Desenvolvimento Intelectual (PDI), em particular conhecer as conceções e as práticas pedagógicas que os docentes desenvolvem, no sentido de promover competências leitoras e de autonomia facilitadoras da integração na vida ativa.

Enquadrando-se num paradigma interpretativo, o estudo de caso realizado privilegiou como técnicas de recolha de dados a pesquisa documental e a realização de entrevistas e de observações naturalistas.

Em termos gerais, os resultados mais significativos sublinham a importância do professor de educação especial (PEE) na intervenção e inclusão de alunos com PDI, a necessidade de maior colaboração entre docentes e técnicos e a relação evidente entre a leitura funcional e o desenvolvimento da autonomia pessoal e social.

Palavras-chave: Autonomia pessoal e social; Educação Inclusiva; Leitura funcional; Perturbação do Desenvolvimento Intelectual

Abstract

In this study, we sought to understand how the teaching-learning process of students with Intellectual Development Disorder (IDD) is processed, in particular to know the pedagogical concepts and practices that teachers develop, in order to promote reading skills and autonomy as these skills are critical to facilitate integration into societal life.

Framing an interpretive paradigm, the case study focused on data collection techniques comprising document research, interviews and naturalistic observations.

In general terms, the most significant results underline the importance of the special education teacher in the intervention and inclusion of students with IDD, the need for greater collaboration between teachers and technicians and the evident relationship between functional reading and the development of personal and social autonomy.

Keywords: Personal and Social Autonomy; Inclusive Education; Functional reading; Intellectual Development Disorder

Resume

En el presente estudio se buscó entender cómo se procesa la enseñanza-aprendizaje de los alumnos con perturbación del desarrollo intelectual (PDI), en particular conocer las concepciones y las prácticas pedagógicas que los profesores desarrollan, en el sentido de promover competencias lectoras y de autonomía facilitadoras de la integración en la vida activa.

Dentro de un paradigma interpretativo, el estudio de caso realizado privilegió como técnicas de recoja de dados la pesquisa documental, la realización de entrevistas y de observaciones naturalistas.

En general, los resultados significativos refieren la importancia del profesor de educación especial (PEE) en la intervención e inclusión de alumnos con PDI, la necesidad de mayor colaboración entre profesores y técnicos y la relación clara entre la lectura funcional y el desarrollo personal y social.

Palabras - clave: Autonomía personal y social; Educación inclusiva; Lectura Funcional; Perturbación del desarrollo intelectual

Résumé

Dans la présente étude, nous avons cherché à comprendre comment le processus d'enseignement-apprentissage des élèves ayant une Perturbation du Développement Intellectuel (PDI) se déroule, en particulier, connaître les concepts et les pratiques pédagogiques que les enseignants développent, afin de favoriser les compétences en lecture et l'autonomie qui facilitent l'intégration dans la vie active.

Encadrant un paradigme interprétatif, l'étude de cas réalisée a privilégié la recherche documentaire, les entretiens et les observations naturalistes comme techniques de recueil de données.

De manière générale, les résultats les plus significatifs soulignent l'importance de l'Éducateur Spécialisé (ÉS) dans l'intervention et l'inclusion des élèves avec PDI, la nécessité d'une plus grande collaboration entre enseignants et techniciens et l’évidente relation entre la lecture fonctionnelle et le développement de l'autonomie personnelle et sociale.

Mots-clés: personnelle et sociale; Éducation Inclusive; Lecture fonctionnelle; Perturbation du Développement Intellectuel.

Introdução

Assegurar a formação de indivíduos autónomos e capazes de participar de forma ativa na sociedade em que vivem, são finalidades da escola e da educação inclusiva que atualmente se preconiza. Nesse sentido, na legislação em vigor assegura-se a frequência do ensino regular de alunos com Perturbação de Desenvolvimento Intelectual (PDI). Para todos os alunos e, em particular, para estes, a aquisição de competências leitoras é crucial para o desenvolvimento da autonomia pessoal e social e, inerente a este fator, para a inclusão de cada indivíduo na sociedade, assim como, para o exercício da cidadania. Na realidade, estes alunos frequentam a escola todos os dias, mas como é que os docentes asseguram a participação e o sucesso de cada um?

Reconhecendo a importância do desenvolvimento de competências no âmbito da leitura funcional, no presente estudo procurámos conhecer as conceções e práticas que professores e técnicos do 2º e 3º ciclos utilizam de forma a promover a autonomia pessoal e social e a inclusão de alunos com PDI na escola. Neste enquadramento, tornou-se pertinente entendermos o que é feito na escola, que tipo de intervenção é realizada com estes alunos para que este processo seja bem-sucedido.

Revisão da literatura

Inclusão e Educação Inclusiva

A Inclusão é um processo que abrange mudanças, em que o progresso da aprendizagem e a participação dos alunos é feito de modo contínuo, ao longo da vida. Neste sentido, a legitimação de orientações educativas e a implementação de respostas educativas no âmbito da inclusão e de uma educação inclusiva, tem vindo a aumentar ao longo dos anos, tendo por base documentos orientadores, convenções, declarações internacionais e normativos legais que vêm sendo lançados e aprovados, com vista ao direito inalienável que o ser humano tem à educação, em todas as suas vertentes, conforme consta no artigo 26º, da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), (1948).

A inclusão inicia-se precisamente com o “reconhecimento das diferenças dos estudantes”, com práticas inclusivas de ensino e aprendizagem onde se têm em conta e se respeitam as diferenças (Booth & Ainscow, 2002, p.8).

Nesse âmbito, a criação de respostas adequadas a cada aluno constitui um fator fundamental para prevenir a exclusão, o insucesso e o abandono escolar, sendo benéfica para todos e para a sociedade em geral (Madureira & Leite, 2003).

Na Educação Inclusiva, todos os intervenientes no processo são imprescindíveis, no entanto o professor de educação especial (PEE) tem um papel fundamental nas equipas educativas que integra, constituindo-se:

como um impulsionador de processos de mudança, podendo contribuir para o desenvolvimento de comunidades educativas solidárias e tolerantes e, assim fazendo, para a criação de uma cultura escolar onde a democracia, a igualdade e a dignidade humana constituam os valores de referência (Madureira, 2014, p.81).

“Sem uma inclusão efetiva, as oportunidades de participar na vida comunitária, lazer, desporto, (…) ficam muito diminuídas. Um ambiente que não favoreça a inclusão é igualmente restritivo de uma participação e atividade junto das comunidades de pertença” (Rodrigues, 2014, p.12).

Para aceder e participar na vida em sociedade é fundamental adquirir competências leitoras. Neste sentido é necessário ensinar a cada um e a todos os alunos, a competência da leitura.

Aprendizagem da leitura

A aprendizagem da leitura é feita em diferentes etapas, pode desenvolver-se através de diversos métodos e modelos e envolve processos cognitivos que integram duas componentes básicas: a descodificação e a compreensão (Esteves, 2013).

Com base na sua revisão da literatura, Lopes et al. (2014), refere que na aprendizagem da leitura em línguas alfabéticas, como é o caso da língua portuguesa, são importantes as diversas habilidades específicas, designadas frequentemente por componentes da leitura, como é o caso da consciência fonémica, o conhecimento fónico, a fluência, o vocabulário, a compreensão oral e a compreensão da leitura.

Os múltiplos processos cognitivos que estão implícitos na aprendizagem da leitura, normalmente agrupam-se em dois grupos. Por um lado, “os processos de nível inferior, microprocessos ou processos de baixo nível, que estão implicados na descodificação das palavras escritas”, por outro lado os “processos de nível superior, macroprocessos ou processos de alto nível, implicados na compreensão de uma frase ou texto” (Das, Naglieri & Kirby, 1994; Linuesa & Gutiérrez, 1999; Shaywitz, 2008, citados por Cruz, 2020, p.27).

A aprendizagem da descodificação implica:

percorrer um caminho de apropriação de estratégias que requerem um ensino explícito, consistente e sistematizado por parte de quem ensina. A escolha das metodologias de ensino da decifração espelha uma opção pedagógica entre dar primazia a estratégias de correspondência de som / grafema (metodologias fónicas, i.e., sublexicais), ou privilegiar estratégias de reconhecimento automático e global da palavra (metodologias de pendor mais global, i. é., lexicais) (Sim-Sim, 2009, p. 15).

Em relação ao processo da compreensão da leitura, pode-se definir como sendo:

o ato de perceber e interpretar a informação contido num texto, sendo que a compreensão bem-sucedida requer que o leitor interaja de modo profundo com o texto, pois ela é mais a construção de significado do que uma mera memorização passiva (Cruz, 2020, p. 143).

Relativamente aos métodos, Sim-Sim (2009) refere que:

A velha “guerra dos métodos de ensino da leitura” (fónico ou global) é hoje obsoleta e completamente ultrapassada. A investigação das últimas décadas veio mostrar que ambas as estratégias didáticas (fónicas e globais) são importantes e necessárias para que todas as crianças aprendam a decifrar (p. 15).

Por outro lado, “uma coisa são os métodos outra são as estratégias utilizadas para os operacionalizar e outra coisa ainda (de enormíssima importância) é o professor, ser humano, com todas as suas características que vai servir de mediador” (Pereira et al, 2006, p. 25).

Na intervenção educativa com alunos com PDI é comum usar processos de leitura funcional, de forma a potenciar o desenvolvimento de competências funcionais facilitadoras de um maior grau de autonomia. Um dos objetivos desta perspetiva funcional é “a dimensão longitudinal, ou seja, o seu impacto ao longo da vida” (Costa, 2006, p. 7).

Perturbação do Desenvolvimento Intelectual

Ao longo dos anos a designação Perturbação do Desenvolvimento Intelectual teve outras terminologias, tais como atraso mental, retardo mental ou deficiência mental. Hoje, designada por PDI e enquadrada pela DSM-V, nas perturbações do neurodesenvolvimento, é a perturbação mais complexa de diagnosticar e intervir por se tratar de uma patologia que atinge o Sistema Nervoso Central. Esta problemática afeta a componente funcional e as capacidades do indivíduo, provoca limitações e cria necessidades de apoio. A PDI, designada medicamente como uma síndrome neurodesenvolvimental que se inicia desde o nascimento até à maioridade, inclui um défice cognitivo associado a um défice no funcionamento adaptativo nos domínios concetual, social e prático, quer isto dizer que o indivíduo tem simultaneamente um défice intelectual e um défice de autonomia. Em conformidade com a DSM-V na PDI têm de estar presentes três critérios:

A. Défices em funções intelectuais como raciocínio, resolução de problemas, planeamento, pensamento abstrato, discernimento, aprendizagem académica e aprendizagem pela experiência, confirmados tanto pela avaliação clínica como por testes de inteligência individualizados e estandardizados; B. Défices no funcionamento adaptativo que resultam na falha em atingir padrões de desenvolvimento e socioculturais de independência pessoal e responsabilidade social. Sem suporte contínuo, os défices de adaptação limitam o funcionamento numa ou mais atividades da vida diária, como comunicação, participação social e subsistência independente, em múltiplos ambientes, como casa, escola, trabalho e comunidade; C. Início dos défices intelectuais e adaptativos durante o período do desenvolvimento (APA, 2015, p. 17).

Santos (2008), na sua revisão da literatura, evidencia um conjunto de características comuns nas pessoas com PDI. De uma forma geral, as pessoas com PDI apresentam:

necessidades de apoios ao nível da aquisição - para concretizar uma dada atividade, e do desempenho - no transfer das habilidades aprendidas para novas situações (Bulgheroni, Vago, Ursilla e Riva, 2007, citados por Santos, 2018).

O desenvolvimento sensoriomotor comprometido (e.g.: posturas atípicas, dificuldades no equilíbrio, limitações visuoespaciais, (…), entre outros);

as dificuldades a nível social (e.g.: dificuldades na compreensão social e no estabelecimento de relações interpessoais, comportamentos desajustados (Santos e Morato 2012, citados por Santos 2018, p. 103).

Na área académica, os alunos com PDI têm tendência a revelar limitações no processo de aprendizagem, nomeadamente na leitura, na escrita, na matemática e nas noções espaciotemporais (Santos, 2018).

Estes alunos apreciam as rotinas e a repetição. Segundo Coll et al. (2004):

há motivos compreensíveis para isso. A inteligência é a capacidade de adaptação a situações novas. A pessoa com baixa capacidade intelectual encontra maiores dificuldades nessa adaptação, e consequentemente, experimenta insegurança e ansiedade diante da novidade da situação ou da tarefa (p. 199).

Todas as características e necessidades dos alunos com PDI, referidas anteriormente, devem ser acauteladas, no processo de ensino e aprendizagem.

A aprendizagem de alunos com Perturbação de Desenvolvimento Intelectual

A aprendizagem de uma atividade ou o desenvolvimento de uma competência, requer mais tempo nos alunos com PDI pois esquecem facilmente o que aprenderam, têm mais dificuldade em realizar abstrações e em fazer generalizações. Por este motivo é fundamental selecionar o que é efetivamente relevante em termos de aprendizagem, sendo imprescindível a possibilidade de praticarem ao longo da vida aquilo que aprenderam, nos espaços e locais onde vivem (Costa et al., 1996).

O sucesso da aprendizagem da leitura, nos alunos com PDI, normalmente decorre de currículos de caráter funcional. Para Lou Brown, citado por Costa (1996), os currículos funcionais caracterizam-se pela sua funcionalidade e utilidade para o aluno em questão pois são elaborados tendo em conta o contexto natural do aluno e a idade cronológica e são estabelecidos objetivos de forma a responder às necessidades de cada um. Estes currículos integram a planificação e realização de atividades funcionais.

Com os alunos com PDI é necessário concretizar as aprendizagens através da manipulação, recorrendo a objetos e materiais concretos. As atividades devem ser geridas passo a passo, criando sequências de aprendizagem segmentadas e trabalhando sistematicamente esses segmentos para que o aluno consiga realizar o que é pretendido. A este propósito, Santos (2018) refere que o domínio dos conceitos matemáticos passa pela “utilização de dinheiro em contextos reais, não só nos estabelecimentos escolares, como a papelaria da escola, mas também na comunidade que impliquem a noção de poupança, compras e pagamentos, trocos e trocas entre outros (p. 109).

Segundo a mesma autora:

A decomposição das tarefas, isto é: os conceitos complexos devem ser divididos em componentes mais simples, e a sua análise deve ser maturada antes da sua apresentação (Vasconcelos, et al., 1998). Desta forma, se enfatiza a importância do ensino estruturado onde as atividades e conteúdos devem ser baseados em saberes previamente adquiridos (Sanches, 2011) para uma maior consolidação das aprendizagens, isto é: complexificação crescente e alternância entre tarefas mais simples e tarefas mais complexas (p. 110).

Santos (2018), acrescenta ainda:

A utilização de frases simples e curtas, a repetição das instruções, a minimização de elementos distráteis, a análise não-verbal das respostas dos alunos com PDI, a criação de um ambiente facilitador caracterizado pela flexibilidade (Cagran e Schmidt, 2011) e disponibilidade, a utilização de estratégias instrucionais, atividades de aprendizagem e de métodos de avaliação alternativos, bem como o acesso ao sucesso são outras as estratégias que podem e devem ser utilizadas em contexto de sala de aula. A escuta ativa, o ensinar e utilizar a comunicação interativa, aumentativa e alternativa, caso o aluno necessite (p. 111).

Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e Leitura Funcional

A aquisição de competências leitoras, nos alunos com PDI, é complexa. Estes alunos têm mais qualidade de vida se o processo de aprendizagem da leitura for de caráter funcional, geralmente focado na aquisição de vocabulário significativo para as tarefas do quotidiano, como as palavras relacionadas com a atividade de cozinhar, fazer compras no supermercado ou consultar um horário de trabalho. (Browder & Snell, 1993, citados por Browder & Rohena-Diaz, 1996).

Segundo Palha (2016), o currículo do 2º ciclo de escolaridade, dos alunos com PDI, deverá considerar os objetivos curriculares:

eminentemente funcionais, isto é, estarem fortemente relacionados com a independência do sujeito, com inclusão, sempre que indicado, de períodos significativos de treino das aprendizagens académicas funcionais (leitura, escrita e matemática)” (p. 13).

Os currículos de caráter funcional têm como princípio “garantir o direito a uma vida de qualidade às pessoas com deficiências acentuadas, promovendo a autonomia e a integração familiar, social e laboral, na medida das suas possibilidades” (Madureira & Leite, 2003, p. 117).

Para uma pessoa com PDI é difícil tomar decisões, assim como, elaborar um plano de ação ou um projeto de vida. Por estes motivos, é fundamental educar para a tomada de decisões, a expressão de desejos, no sentido de ir desenvolvendo a sua “identidade pessoal” e o seu “projeto futuro acerca de si mesmo” (Coll et al., 2004).

A capacidade de gestão da própria vida ou da autonomia pessoal e social varia conforme a idade, mas é necessário, com os alunos com PDI, desde cedo dar-lhes oportunidade de se irem apropriando de comportamentos e hábitos inerentes à autonomia. Desta forma vão desenvolvendo competências pessoais para lidarem com as exigências do meio, ou seja, terão mais sucesso no comportamento adaptativo e na autodeterminação. À escola cabe acima de tudo promover o melhor possível o neurodesenvolvimento e ajudar a família a capacitar estes alunos com comportamentos pessoais e sociais que lhes proporcionem uma vida em sociedade com a devida independência e autonomia pessoal e social (Palha, 2014).

Parece-nos importante perceber que práticas são implementadas e que estratégias são utilizadas com estes alunos, de modo a assegurar a sua autonomia e a integração na vida ativa. Nesse âmbito, a aprendizagem da leitura constitui um domínio fundamental no acesso à informação e nas aprendizagens ao longo da vida. No entanto, os alunos com “capacidades intelectuais abaixo da média” têm dificuldades em aprender a ler (Lyon, 2003, citado por Cruz, 2020, p. 73).

Por este motivo, e pelas características inerentes à problemática da PDI, estes alunos devem ter uma abordagem funcional das aprendizagens e uma intervenção “multi-modal, eclética, flexível e centrada em variáveis relacionadas com o sujeito, com a família e com a comunidade” (Palha, 2016, p. 11).

A análise dos estudos que integram o mesmo tipo de população e que tratam as questões da aprendizagem da leitura e da escrita, revela que diversas metodologias podem ser utilizadas para desenvolver competências leitoras, de escrita e de autonomia pessoal e social nos alunos com PDI. O estudo de Carramate (2012) teve como objetivo “desenvolver a capacidade leitora de um aluno com Incapacidade Intelectual nas vertentes da decifração e da compreensão do material escrito utilizando a metodologia de experiências de aprendizagem mediatizada” (p. 2). Dos resultados da intervenção, a autora refere que houve sucessos consideráveis e que “a capacidade leitora desenvolvida já permite ao aluno utilizar a leitura para se informar, para adquirir e aprofundar conhecimentos e ler para se recrear em momentos de lazer” (p.2). A investigação-ação de Coelho (2012) teve como objetivo geral “construir uma estratégia de alfabetização para um adolescente com Dificuldade Intelectual e Desenvolvimental” (p. 49) baseando-se em estratégias de alfabetização implícitas em vários modelos teóricos, entre eles, a psicogénese da leitura e escrita e o método e alfabetização de Paulo Freire. Constata-se nos resultados que é possível um adolescente com Dificuldade Intelectual e Desenvolvimental aprender a ler e a escrever. O estudo de Cunha (2012) incidiu “na aprendizagem funcional da comunicação oral e escrita em duas crianças com défice cognitivo” (p. 2) em que foram desenvolvidas atividades funcionais para a promoção da autonomia, através do planeamento baseado nos currículos funcionais e centrado nas atividades da vida diária. O autor refere que “após a implementação da intervenção, concluiu-se que a aplicação de atividades de um currículo funcional melhorou as competências de autonomia e de comunicação oral e escrita das alunas” (p. 102). O estudo de Leitão (2018) teve como objetivo geral “saber se a construção e o uso quotidiano de um manual personalizado de apoio à aquisição de competências funcionais para um aluno com Currículo Específico Individual pode potenciar o seu desenvolvimento pessoal e social” (p. 21). Tratou-se de um plano e intervenção, na lógica de investigação-ação, em que foram elaborados manuais personalizados, “de acordo com os interesses e capacidades funcionais dos alunos, centrando-se em atividades do dia-a-dia, selecionadas a partir da análise dos interesses, gostos e necessidades dos alunos em estudo” (p. 3). Depois da intervenção, foi possível concluir que “os manuais individuais contribuíram para o desenvolvimento pessoal e social dos alunos participantes” (p. 149).

Os estudos atrás referidos, abordam o desenvolvimento de competências leitoras, a aprendizagem da leitura e da escrita e as competências e atividades funcionais para a autonomia. No entanto, o desenvolvimento de competências de leitura funcional com vista à autonomia de alunos com PDI não constitui objeto de estudo nos trabalhos analisados.

Perante esta realidade, parece evidente a necessidade e pertinência de realizar mais investigação neste domínio.

Neste contexto, a questão que presidiu à realização deste estudo foi a seguinte:

Como é que os professores, de 2º e 3º ciclos, desenvolvem competências leitoras nos alunos com PDI e de que forma a aquisição dessas competências promove a autonomia pessoal e social?

De modo a conseguir responder a esta questão geral consideramos importante formular outras questões de natureza mais específica, a saber:

Quais as estratégias que os professores utilizam para desenvolver as competências leitoras em alunos com PDI?

Que práticas implementam os professores, de forma a promover as competências de leitura funcional para uma maior autonomia pessoal e social dos alunos com PDI?

Com que dificuldades se deparam os professores e que processos desenvolvem para as superar?

O que pensam os professores sobre o desenvolvimento de processos de leitura funcional junto de alunos com PDI?

Na opinião dos professores que implicações tem, no desenvolvimento da criança/jovem, aprender a ler de forma funcional?

Enquadrámos a nossa investigação numa metodologia qualitativa, num paradigma interpretativo, realizando para tal um estudo de caso, centrado na análise das conceções e das práticas de um grupo específico de professores e técnicos especializados, de modo a responder às questões da investigação. Como técnicas de recolha de dados privilegiou-se a pesquisa documental e a realização de entrevistas e de observações naturalistas.

Metodologia

Como referido anteriormente, o estudo insere-se numa metodologia qualitativa, num paradigma interpretativo utilizando uma metodologia prática por pretender compreender a ação humana no processo de comunicação (Coutinho, 2011).

Neste âmbito, trata-se de um estudo de caso intrínseco, um plano de investigação que implica um estudo de um caso específico e circunstanciado (Coutinho, 2011). Entre outros, tem como objetivos, explorar, descrever e explicar uma situação concreta, naquilo que ela tem de específico e único (Stake, 1995, citado por Coutinho, 2011).

Este estudo realizou-se numa Escola Básica do 2º e 3º Ciclos, situada no distrito de Lisboa. O processo de recolha de dados foi devidamente autorizado e obteve-se o consentimento informado dos participantes.

Participantes

Utilizou-se o tipo de amostra intencional (Flick, 2005) constituída por seis profissionais de educação, mais concretamente, quatro professores da Educação Especial (PEE), um professor de português do ensino regular (PER) e uma terapeuta da fala (TF). O critério subjacente à escolha dos participantes foi o de trabalharem com alunos com PDI. (Tabela 1)

Tabela 1: Caracterização dos participantes 

Todos os professores de educação especial têm mais de 30 anos de tempo de serviço, a professora de ensino regular tem 26 anos e a terapeuta da fala, 12 anos. Os PEE e o PER têm mais de 20 anos de experiência profissional com alunos com NEE, mais concretamente com PDI. A TF tem 10 anos de experiência com estes alunos. Todos os participantes possuem formação especializada, exceto a PER.

Uma vez que um dos objetivos do estudo incide na caracterização das práticas dos docentes, três alunos com PDI, um a frequentar o 5º ano de escolaridade e dois a frequentarem o 7º ano de escolaridade, participaram indiretamente no estudo, uma vez que integraram as observações.

Numa primeira fase, fizemos a pesquisa e a análise de documentos orientadores da escola, da legislação, dos processos dos alunos e de outros documentos que os docentes nos facultaram. A consulta e análise destes documentos permitiu a apropriação de um conjunto de informações relativas à problemática dos alunos e respetivo contexto escolar.

Na segunda fase, realizaram-se observações em contexto escolar que foram registadas em protocolos de observação naturalista. Foi possível observar algumas práticas implementadas pelos professores e técnicos para a promoção de competências leitoras e da autonomia pessoal e social junto de alunos com PDI. Realizaram-se ainda seis entrevistas semiestruturadas a cinco docentes e uma terapeuta da fala, tendo como objetivo geral: identificar e caracterizar as estratégias e os métodos de leitura que os professores de português dos 2º e 3º ciclos, os professores de Educação Especial e os terapeutas da fala utilizam para desenvolver competências leitoras de alunos com PDI de forma a promover a autonomia pessoal e social. O guião da entrevista integrou os seguintes blocos: as conceções dos participantes sobre a Educação Inclusiva; a prática pedagógica e o desenvolvimento de competências leitoras; a perceção sobre a importância da leitura funcional; as dificuldades na prática pedagógica; e as atividades de leitura funcional realizadas para a promoção da Autonomia Pessoal e Social. As entrevistas foram realizadas numa sala de aula, na escola onde os professores lecionam e a terapeuta da fala trabalha. A duração das seis entrevistas variou entre os vinte e os quarenta e seis minutos.

Por último, numa terceira fase, prosseguimos o estudo fazendo a análise de conteúdo dos dados obtidos através de observações direta e indireta da realidade (entrevistas e observações naturalistas). Relativamente às entrevistas, após a sua realização, procedeu-se “à constituição do corpus documental” (Esteves, 2006, p. 112) fazendo a sua transcrição, que deu origem aos respetivos protocolos. Na fase seguinte, procedeu-se à leitura flutuante de todas as entrevistas com o intuito de nos apropriarmos da informação global e de levantar hipóteses, decorrentes dos discursos das participantes, na tentativa de identificar as categorias que emergiam do discurso. De seguida, passámos à redução dos dados, fazendo o recorte das UR que, segundo Esteves (2006) “é uma das operações mais delicadas de um processo de análise temática” (p. 114). Foram utilizadas UR semânticas ou temáticas que expressam um determinado “sentido ou significado, independentemente da palavra ou palavras com que foram expressas na mensagem” (Esteves, 2006, p. 114). Posteriormente, passámos à transformação das UR em indicadores e ao cálculo das respetivas frequências absoluta e relativa, processo enquadrado nos procedimentos abertos da categorização. À medida que íamos analisando as várias entrevistas, íamos comparando com as anteriores, para verificar analogias e diferenças na inserção de subcategorias e categorias iguais às já registadas, ou para criação de novas. Durante este processo mantivemos algumas, modificamos outras, traduzindo-se num trabalho contínuo e dinâmico. É de realçar que, apesar de ter sido realizada uma abordagem mista, predominou um processo de análise indutivo, o que permitiu identificar temáticas que não tinham sido inicialmente equacionadas no guião de entrevista. Na base do procedimento indutivo surge a componente “exploratória” em que pode surgir uma ou mais hipóteses que são passíveis de reajustes durante a investigação (Albarello et al, 1997, p.97).

A análise de conteúdo das observações naturalistas partiu, numa primeira fase, do tratamento dos dados registados que emergiam dos protocolos das observações (Esteves, 2006). De seguida, procedeu-se à categorização e, para tal, foram construídas grelhas para cada observação, onde integrámos os temas, as categorias e as subcategorias com os respetivos indicadores.

No sentido de garantir a validade e a credibilidade durante o processo de análise de conteúdo, procurámos assegurar a fidelidade intra-codificador e inter-codificador (Esteves, 2006), quer na análise das entrevistas, quer das observações. Neste processo contou-se com a colaboração de um professor universitário.

Apresentação e discussão dos resultados

Resultados das Entrevistas

Da análise de conteúdo das entrevistas a quatro PEE, uma PER e uma TF, emergiram os temas e categorias apresentados na tabela seguinte:

Tabela 2: Resultados da análise de conteúdo das entrevistas: temas e categorias 

Como se pode verificar, o tema mais abordado é o das Práticas de leitura funcional. As entrevistadas falaram com maior ênfase deste tema, no entanto não deixaram de manifestar os seus sentimentos e de referir as suas preocupações e as dificuldades sentidas na intervenção com os alunos.

Referiram ainda vários aspetos presentes no processo de aprendizagem da leitura dos alunos com PDI, assim como, as questões relacionadas com a inclusão.

Práticas de leitura funcional

No tema referente às Práticas de leitura funcional, as entrevistadas sublinham um conjunto de dimensões a considerar, sendo evidente a preocupação em referir estratégias e atividades que implementam, bem como a importância da colaboração entre docentes e técnicos para o sucesso da intervenção com os alunos. Relativamente às estratégias para o desenvolvimento de competências leitoras, a mais referida pelas PEE é a da realização das atividades práticas e úteis da vida diária, conforme exemplo: “(…) é importante que eles consigam perceber qual a utilidade do que se está a fazer (…)” (PEE2). As PEE e TF também referem a utilização de materiais de leitura partindo das necessidades e vivências dos alunos, assim como, a escolha de atividades em função das suas características e interesses: “É fundamental partir sempre do centro de interesse dos alunos e das suas necessidades.” (PEE1). A diversificação de recursos e estratégias constitui para todas as entrevistadas uma mais-valia para a promoção de competências leitoras. A TF destaca o recurso a diferentes Sistemas de Comunicação Aumentativa e Alternativa (SAAC) que ajudam no processo da aprendizagem da leitura e escrita quando refere, por exemplo: “(…) também utilizo outros sistemas de comunicação que ajudam depois na leitura e escrita, como o GRID (…)”; “(…) os símbolos do SPC, (…)”. Duas PEE (3 e 4) e a TF abordam ainda a importância de recorrer à estratégia da repetição de tarefas como podemos constatar nos exemplos seguintes: “A estratégia passa pela repetição, (…)” (PEE3); “Têm de repetir muitas vezes até adquirirem essas competências para o bem deles.” (TF).

Contrastando com esta diversidade, a PER considera que uma das estratégias para desenvolver competências leitoras, nos alunos com PDI, é a leitura em voz alta, referindo a sua utilização como decorre do excerto seguinte: “Nas minhas aulas não faço muito mais que isso.” (PER).

Esta significativa diferença no discurso da PER e das PEE sobre práticas de leitura funcional parece-nos compreensível, uma vez que esta docente tem menos experiência e formação na implementação de processos de ensino e aprendizagem de leitura funcional.

As atividades promotoras de autonomia pessoal e social constitui uma das categorias onde se verifica um elevado número de UR. Todas as PEE salientam a importância da realização de atividades no exterior da escola. A dinamização destas atividades contempla diversas saídas do espaço escolar, ao longo do ano letivo, para diferentes contextos de aprendizagem e de promoção da autonomia, nomeadamente a ida às compras ao supermercado, onde a leitura está implícita. Nestas e noutras atividades, as docentes promovem o treino de competências necessárias para os alunos serem autónomos, nomeadamente as regras de convivência social e escolar. O exemplo seguinte é revelador das práticas referidas: “(...) nos espaços comerciais treinamos as competências socialmente aceites, (...)” (PEE1). Por outro lado, as multiatividades adaptadas, em que os alunos participam e que integram várias modalidades desportivas, são enumeradas pelas PEE e pela TF como sendo cruciais para o desenvolvimento de competências de autonomia. Também as atividades de culinária são consideradas muito significativas para o desenvolvimento dessas competências, como referem as entrevistadas: “Promovem a autonomia porque sabemos que o que aprendem aqui, por exemplo as receitas, tentam fazer em casa, no caso dos pais que ajudam.” (PEE3); “Nas AVD’s, com as receitas, aprendem a fazer uma refeição simples, (…)” (PEE4).

No que diz respeito à colaboração no processo de ensino e aprendizagem da leitura funcional, destaca-se a ideia da importância da planificação conjunta entre todos os profissionais envolvidos no processo. É importante que os PEE respondam aos pedidos dos PER e que se trabalhe em parceria com as famílias, com os Diretores de Turma (DT) e PER de diferentes disciplinas: “(…) porque se não for um trabalho articulado também não funciona, (…)” (TF); “Tem de existir um trabalho de parceria com a família.” (PEE1). O papel do PEE é realçado neste processo, sendo considerado um recurso imprescindível de parceria e colaboração na partilha de materiais, de estratégias e de informações sobre os alunos com PDI, conforme salientado nestes exemplos: “Socorro-me das colegas da Educação Especial.” (PER); “(…) cada vez pedem mais ajuda ao professor de Educação Especial, (…)” (TF).

Relativamente às estratégias e atividades implementadas no processo e ensino aprendizagem da leitura funcional é bastante importante para as participantes, conforme atrás referido, que seja utilizado material específico e que tenha a ver com os interesses, vivências e rotinas dos alunos: “Tem é que ser através dos interesses deles (…)” (TF). As participantes enumeram ainda atividades de leitura e escrita associadas às necessidades do quotidiano, mais concretamente as relacionadas com a confeção de receitas, com a realização de cálculos com dinheiro e com a identidade do aluno.

Quando questionadas sobre as dimensões fundamentais que o professor deve conhecer para desenvolver processos de leitura funcional, as participantes foram unânimes ao considerarem a necessidade de conhecerem o aluno, as suas competências e rotinas. A PEE4 abordou de forma pormenorizada a questão do conhecimento, por parte dos docentes, das expetativas da família: “(…) o que é que a família espera para aquele filho também é importante.”; “o que é que para si é mais importante ele fazer, o que é que neste momento o preocupa e gostava que ele aprendesse?”. Este aspeto é essencial no trabalho que se faz com os alunos visto que a família é parceira da escola quer no percurso escolar, quer na preparação para a vida.

Sentimentos, preocupações e dificuldades

Relativamente ao tema Sentimentos, preocupações e dificuldades decorrentes da prática, destacaram-se categorias relacionadas com as preocupações e com as dificuldades que as entrevistadas têm na sua intervenção com os alunos com PDI. Referiram ainda alguns sentimentos que identificam na sua ação educativa. Relativamente às preocupações, a promoção da participação nas atividades escolares é a preocupação mencionada com maior relevância, pelas participantes, conforme exemplo: “Sempre que há qualquer outra atividade que alguma turma faça, nós tentamos levá-los sempre.” (PEE2). Por outro lado, as participantes demonstram preocupação com a diversificação das interações entre pares pois tendencialmente, os alunos com esta problemática, relacionam-se maioritariamente com os alunos com NEE e com os PEE com quem estão mais tempo. Referem ainda que, a falta de interação torna-se mais acentuada à medida que vão crescendo: “(…) mas o que eu vejo é que à medida que vão crescendo o afastamento é maior, (…)” (PEE4).

A preocupação com a autonomia pessoal e social esteve sempre presente no discurso das participantes. Além das questões da autonomia referidas anteriormente, as participantes manifestaram ainda, mas com menor expressão, as preocupações com a participação dos alunos em contexto de sala de aula e com o futuro profissional.

A frustração relativa ao ritmo lento com que os alunos com PDI fazem as suas aprendizagens e a dificuldade em diversificar materiais para que aprendam de forma efetiva e significativa constituíram as dificuldades na intervenção mais sublinhadas. A PEE4 destaca a frustração que sente na sua prática, relata o que pensa e como se questiona sobre este ponto: “Às vezes pergunto-me porque é que o aluno não evolui…”; “Uma pessoa também se questiona, é um problema meu?”.

Apesar das entrevistadas sublinharem a importância da colaboração entre profissionais que participam no processo de ensino e aprendizagem, a PEE4 não deixa de referir a dificuldade em planificar e intervir conjuntamente com os PER: “O que eu sinto de mais difícil é mesmo o trabalho com os professores das turmas, (…)”.

A falta de motivação dos alunos para a aprendizagem da leitura também constitui uma dificuldade significativa na intervenção (PEE 2 e PEE3), bem como, a dificuldade da colaboração dos pais no processo da promoção de autonomia dos filhos e a falta de expetativas destes em relação à aprendizagem da leitura e escrita (PEE3 e PEE4). Por outro lado, o PER refere as dificuldades em gerir a diversidade das turmas e a falta de experiência em lidar com os alunos com esta problemática.

No discurso da PEE1, a diversidade de sentimentos na intervenção com os alunos com PDI foi evidente quando referiu sentimentos de persistência e vontade de continuar o trabalho com estes alunos, verbalizando com insistência que não se pode desistir: “Por mais que dê vontade de desistir, não posso!”.

Aprendizagem da leitura nos alunos com PDI

No que concerne ao tema da Aprendizagem da leitura nos alunos com PDI, as participantes destacam com maior ênfase as características desses alunos, referindo as suas dificuldades e especificidades. O sublinhar destas características justifica de alguma forma a opção pela leitura funcional como processo de aprendizagem. Neste âmbito, referem a pertinência dessa opção para os alunos com esta problemática, concordando com esta perspetiva de aprendizagem da leitura. Em relação às características dos alunos com PDI que foram enumeradas, são acentuadas as dificuldades no desenvolvimento de competências leitoras e outras que estão associadas ao processo de aprendizagem, como é o caso das dificuldades na memorização, na abstração/generalização e na interpretação.

Todas as participantes realçam que a leitura funcional como processo de aprendizagem, promove a autonomia pessoal e social dos alunos, conforme ilustram os excertos seguintes: “O que me interessa que eles leiam Camões e não saibam apanhar o autocarro? O que me interessa é que consigam interpretar as instruções, os passos de uma simples receita (…)”(PEE1); “(…) porque com esta aprendizagem estamos a prepará-los para a sociedade que eles encontram (…)” (PEE3); “(…) porque isso vai permitir que eles no futuro não dependam tanto do outro, de adultos, ou de outros.” (PER).

Quanto aos pressupostos educativos para a aprendizagem da leitura funcional, à partida é necessário ter em conta as dificuldades dos alunos na leitura, trabalhar os pré-requisitos e fazer um trabalho individualizado fora da sala de aula (PEE2).

Perceção global sobre a inclusão

A perceção global sobre a inclusão constitui o tema onde a ambivalência de opiniões é mais evidente, como se pode constatar através da análise das categorias que emergiram do discurso. O fator facilitador da inclusão indicado com maior relevância foi a existência dos pares como modelo, conforme destaca uma das participantes: “Em termos facilitadores, é sempre a questão do modelo, (…) eles estarem com os pares, (…)” (TF). A atitude dos professores do ensino regular constitui outro fator considerado facilitador para o processo de inclusão ser bem sucedido, como a PEE4 refere, por exemplo: “No fundo é muito a forma como cada professor olha para essa questão e como desenvolvem o trabalho da turma de modo a responder a todos e também àqueles alunos (…)”.

Em relação aos fatores que são considerados como dificultadores da inclusão, a não aceitação dos alunos pelos PER é o que tem maior destaque. O PEE visto como um intruso na sala de aula, a insegurança demonstrada pelos PER face à intervenção dos PEE, a falta de formação e de informação dos PER, o apoio insuficiente prestado aos PER, são outros exemplos de fatores dificultadores que também foram enumerados pelas entrevistadas, embora com menor ênfase. Ao serem questionadas sobre a pertinência da inclusão, algumas participantes (PEE2, PEE4 e TF) concordam sem hesitar que os alunos com PDI devem estar incluídos na escola regular, outras embora concordem com a inclusão, demonstram reservas neste processo (PEE1, PEE3 e PER).

Resultados das observações

Com o intuito de conhecer e caracterizar as práticas implementadas pelas participantes fizeram-se quatro observações naturalistas em diferentes situações e contextos de aprendizagem: confeção de refeições numa sala / cozinha adaptada; aula de português, numa sala de aula e almoço dos alunos com PDI, no refeitório da escola. A duração das quatro observações variou entre os vinte e cinco e quarenta e cinco minutos. Foi efetuada a análise de conteúdo destas observações, da qual emergiram os temas e categorias apresentados na tabela seguinte:

Tabela 3: Síntese da análise de conteúdo das observações 

Legenda: O1 e O2 - Confeção de receitas | O3- Aula de português | O4- Almoço no refeitório

O tema referente à Autonomia pessoal dos alunos surgiu em todos os contextos observados. Já os outros dois temas emergiram das observações realizadas no âmbito das atividades de confeção de receitas (PEE e TF) e de uma aula de português (PER e PEE).

Autonomia pessoal dos alunos

Estratégias para promover a autonomia dos alunos

Confeção de receitas

Estas duas observações (O1 e O2) foram efetuadas numa sala/cozinha adaptada onde os alunos confecionaram refeições através de receitas elaboradas numa perspetiva funcional. A sistemática informação verbal sobre a realização da tarefa e sobre os utensílios a utilizar para cada fase/etapa da confeção da receita foi a estratégia mais relevante. Foi também percetível a permanente monitorização, por parte das PEE e TF, daquilo que os alunos faziam autonomamente. Foi notório o cuidado que as participantes tiveram com a segurança pessoal dos alunos, usando a estratégia de os alertar para a utilização correta dos utensílios na execução das tarefas. Também se observou a preocupação em exemplificar a ação a realizar e a prestação de ajuda, quando necessário, durante a execução das tarefas.

No contexto destas observações, as participantes foram respondendo às questões colocadas pelos alunos, chamando à atenção quando alguma tarefa era executada incorretamente.

Aula de português

Na aula de português, onde estavam a PER e a PEE1, as estratégias utilizadas pelas professoras para a promoção da autonomia pessoal integraram a comunicação oral com os alunos durante a aula, e no caso concreto do aluno A1, dando informação pertinente para refletir, pedindo-lhe para pensar sobre as datas para agendar a apresentação de um trabalho. Durante a aula foi visível o aluno A1 questionar a PEE1 e esta responder-lhe, elucidando-o. Simultaneamente, a mesma docente de educação especial, orientou o aluno A1 nas regras de entrada na sala de aula. Foi percetível a estratégia de envolver a família, quando a PEE1 pergunta ao aluno A1 se vai escolher com a mãe a personagem a apresentar no trabalho e quando o informa que vai enviar um e-mail à Encarregada de Educação com a informação relativa ao trabalho pretendido pela PER.

Almoço no refetório

No almoço no refeitório, a estratégia observada com mais relevância foi a da prestação de apoio individual aos alunos. Verificou-se essa necessidade, nos alunos A1 e A3, quando retiravam a refeição da linha de serviço e, quando pegavam incorretamente na faca para comer. As orientações verbais dadas aos alunos para a concretização da sequência de tarefas na linha de serviço foi outra das estratégias implementadas. Atentos às ações dos alunos, professores e funcionários, iam-nos orientando para tirarem os talheres e a refeição das bancadas de serviço. Neste contexto foi também observável a orientação direta que uma das docentes deu ao aluno A1 para assegurar a sua higiene pessoal. Neste âmbito, ainda foi visível o alerta que a PEE1 fez ao aluno A1 para a correta utilização da faca, promovendo assim a apropriação dessa competência e o cuidado com a segurança pessoal.

Aspetos positivos e competências adquiridas

Confeção de receitas

Relativamente a esta categoria foi visível a execução correta das tarefas solicitadas pelas professoras e indicadas na receita da salada russa que os alunos iam lendo. Foi muito interessante observar o questionamento que os alunos faziam às professoras quando lhes surgia alguma dúvida relativamente a algum passo da receita. Nestas aulas práticas, foi observado o treino de competências nas tarefas domésticas que poderão posteriormente ser transferidas e úteis em contexto familiar.

Aula de português

Foram visíveis as competências de autonomia adquiridas pelo A1 no comportamento adequado manifestado no início da aula, apanhando os livros que tinham caído no chão e de seguida colocando-os na mesa onde tinha os restantes materiais e onde se sentou. Observou-se também o correto manuseamento do caderno de trabalho, ao folheá-lo para começar a trabalhar.

Durante a aula foi visível a interação verbal do aluno com a PER fazendo perguntas e respondendo à questão colocada pela docente.

Almoço no refetório

Neste contexto todos os alunos revelaram competências adquiridas sendo capazes de retirar os utensílios e a refeição da linha de serviço de forma autónoma e posteriormente, de se dirigirem para a mesa levando cada um o seu tabuleiro.

Aspetos negativos e dificuldades

Confeção de receitas

Na confeção de receitas a maior dificuldade decorre da necessidade que os alunos demonstram de apoio direto das PEE e TF para concluírem tarefas. A preparação de refeições é uma das atividades realizadas com regularidade, promovida pelas PEE e TF, onde os alunos aprendem a confecionar diferentes receitas e a treinarem tarefas domésticas, como por exemplo, pôr a mesa e/ou lavar a loiça.

Aula de português

Na observação efetuada, o aluno A1 revelou dificuldade em compreender as perguntas que lhe são colocadas e em executar instruções.

Almoço no refetório

Observamos a dificuldade da aluna A3 em comportar-se adequadamente à mesa. Com o aluno A1 verificou-se a dificuldade de ter um discurso adequado e coerente durante uma conversa com uma das docentes.

Percebemos que alguns procedimentos que os alunos devem ter, na execução das tarefas previstas, ainda não estão adquiridos, como por exemplo não passar o cartão no leitor de cartões ou não retirar da linha de serviço o talher para o tabuleiro.

Práticas de Leitura Funcional

Confeção de receitas

Competências adquiridas na leitura / Expressão oral

Relativamente às competências adquiridas, durante a confeção de receitas, observamos o aluno A1 a ler palavras e frases simples. As alunas A2 e A3 a selecionarem os ingredientes necessários, na etapa da tarefa em que estavam, através da leitura das palavras que constavam na receita.

Dificuldades na compreensão da leitura / Expressão oral

Em relação às dificuldades foi visível, durante o diálogo que as PEE estabeleciam com os alunos, que o aluno A1 dizia incorretamente o género e o pronome pessoal numa frase. Observamos também a aluna A3 a responder incorretamente à questão colocada pela PEE2 sobre um ingrediente a usar e o aluno A1 a ler de forma incorreta a sequência da receita e a enumerar um dos ingredientes.

Estratégias dos professores para o desenvolvimento de competências leitoras

Uma das estratégias observadas consistiu na correção da expressão oral dos alunos, pelas PEE1 e PEE2, retificando os erros gramaticais e levando os alunos a refletirem sobre os aspetos onde tinham errado. A leitura em voz alta foi outra das estratégias usadas para desenvolver competências leitoras, quando a PEE1 pediu ao A1 para ler os passos da receita. Também foi possível observar os PEE a colocarem questões aos alunos, sobre diferentes aspetos inerentes à leitura das receitas, assim como, a imediata correção que faziam quando os alunos liam incorretamente. É importante frisar ainda o reforço positivo que a PEE1 deu ao aluno A1, quando este leu corretamente uma palavra solicitada pela docente.

Recursos utilizados para o desenvolvimento de competências leitoras

As PEE e a TF utilizam diversos recursos relacionados com a preparação de refeições, mais concretamente, receitas com instruções simples e com ilustrações para demonstrar os diferentes passos das tarefas a realizar, assim como, objetos e embalagens reais onde os alunos leem determinadas palavras, frases ou dados numéricos.

Das observações realizadas, julgamos poder inferir que, durante a confeção de receitas, o envolvimento e interesse dos alunos ao utilizarem e manusearem os recursos descritos, é evidente.

É interessante perceber todo o processo desenvolvido na implementação deste tipo de atividades. Os alunos começam por elaborar uma lista de compras com tudo o que é necessário para ir comprar ou ir buscar à horta. Posteriormente, vão às compras com as PEE (ao supermercado, por exemplo). Numa outra fase, numa sala com cozinha adaptada, é desenvolvida a atividade de confeção da receita trabalhando, por um lado, a leitura funcional e, por outro, a autonomia pessoal e social.

Práticas de leitura em sala de aula

Aula de português

No contexto de sala de aula, numa aula de português, a categoria com mais destaque foi a referente às estratégias que a PER e a PEE1 utilizam para o desenvolvimento de competências leitoras.

Estratégias dos professores para o desenvolvimento de competências leitoras

A solicitação por parte do PER para o aluno A1 ler em voz alta foi uma as estratégias observadas para o desenvolvimento de competências leitoras durante a aula de português. A par desta estratégia, foi visível a da orientação que a PEE1 deu ao aluno A1, pegando num lápis na mão e apontando para as páginas do livro, ajudando o aluno a seguir a leitura.

A PEE1 também ajudou o aluno A1 no manuseamento do livro que estavam a ler na aula, nomeadamente na identificação das páginas e na forma como se devem segurar para se conseguir ler.

O registo do sumário e da data da aula no caderno foram também tarefas face às quais o aluno necessitou de apoio da PEE.

É de realçar que, embora estivessem duas docentes na sala de aula, a maior parte das estratégias observadas para o desenvolvimento de competências leitoras foram utilizadas pela PEE1 durante o apoio direto ao aluno; com efeito, foi evidente nesta observação que a PER apenas solicita ao aluno a leitura em voz alta, tendo sobretudo revelado preocupação com a sua participação na aula.

Aspetos negativos e dificuldades dos alunos

Em vários momentos, durante a aula, foi evidente a dificuldade de concentração e de foco da atenção, do aluno A1. Entre outros aspetos, podemos referir: o facto de nem sempre estar a olhar para o livro para seguir a leitura; fixar o olhar num mesmo ponto durante algum tempo; ler alto fora da sua vez e não conseguir manusear o livro corretamente.

Competências adquiridas na leitura

Relativamente às competências adquiridas foram visíveis, no aluno A1, a leitura silenciosa e a leitura em voz alta que fez durante a aula.

Em síntese, a análise das observações referentes à confeção de receitas revela a importância que a leitura funcional tem para estes alunos, facilitando o acesso à informação, à aprendizagem e ao desenvolvimento da autonomia. O facto de os alunos conseguirem ler palavras-chave e frases simples, facilita-lhes o acesso à informação e, nesse sentido, é possível inferir que embora possam precisar de ajuda do outro em algumas áreas da sua vida, as competências adquiridas poderão contribuir para aumentar a sua autonomia pessoal e social.

Em relação às práticas de leitura em sala de aula, foi visível a importância que a PEE tem na vida escolar destes alunos. O apoio prestado continuamente e as estratégias utilizadas pela docente para o desenvolvimento de competências leitoras permitem que o aluno progrida no seu desempenho durante as aulas de português.

Dos resultados obtidos nas entrevistas e nas observações podemos concluir que, em termos gerais, há consistência entre as perceções que as participantes têm sobre os temas abordados e as práticas que desenvolvem. No entanto, importa também sublinhar que face a alguns aspetos existe ainda alguma ambiguidade.

Com efeito, em relação às questões da inclusão, quer nas entrevistas, quer nas observações foi evidente alguma ambivalência relativamente à necessidade de colaboração entre profissionais, mais concretamente entre as PEE e a PER, tendo sido sublinhada a necessidade de existir maior envolvimento por parte dos PER, no percurso escolar dos alunos. Por sua vez, o PEE não deverá ser visto como um “intruso” na sala de aula, mas antes como um profissional que colabora com os PER e que tem uma intervenção especializada no percurso escolar dos alunos.

Assim sendo, a vida escolar dos alunos com PDI será mais produtiva se as atividades que se planificam e as tarefas que se realizam forem pensadas e planificadas em conjunto.

“Trata-se em última análise, de construir, nas escolas, uma cultura profissional de colaboração, de respeito mútuo e de aprendizagem recíproca” (Madureira & Leite, 2019, p. 7).

Em relação à leitura funcional, é evidente que o tipo de estratégias utilizadas são promotoras da autonomia pessoal e isso é visível, quer pelos instrumentos de trabalho utilizados, quer pelas atividades realizadas. As atividades preparadas pelas PEE e TF, diferenciam-se daquelas que são realizadas em sala de aula, pelo PER uma vez que têm como finalidades principais o desenvolvimento de competências de autonomia e de independência dentro e fora da escola (Costa, 2006).

Neste tipo de atividades, como é o caso da confeção de receitas, além da preocupação de terem um caráter funcional, procura-se ainda que sejam geradoras de outras aprendizagens, assegurando-se assim a interdisciplinaridade e a realização de aprendizagens significativas, aspetos preconizados na legislação em vigor, mais concretamente no DL nº 55/2018, de 6 de julho, no que diz respeito ao trabalho de natureza interdisciplinar e de articulação curricular, em projetos que respeitam as especificidades da turma e/ou de um grupo de alunos.

É importante sublinhar a sequencialidade do processo de ensino e aprendizagem e a pertinência do tipo de atividades desenvolvidas pelos alunos com PDI. Os alunos com este tipo de comprometimento cognitivo devem usufruir de abordagens funcionais nas suas aprendizagens, de modo a conseguirem adaptar-se ao mundo que os rodeia e a serem capazes de interagir com diversas pessoas e ambientes, garantindo-se assim, a sua qualidade de vida (Brown et al, 1979, citado por Costa, 2006).

Esta abordagem, incentiva uma visão da aprendizagem, na qual os alunos são envolvidos de forma ativa e participativa, integrando o que aprendem na sua experiência pessoal (Booth & Ainscow, 2002).

Considerações finais

A metodologia seguida, de natureza qualitativa, permitiu compreender a dinâmica do trabalho das participantes (PEE, PER e TF), mais concretamente, no que diz respeito às práticas implementadas para a aquisição de competências leitoras nos alunos com PDI; permitiu ainda identificar as estratégias utilizadas no ensino da leitura funcional, bem como, o seu impacto nas aprendizagens dos alunos, nomeadamente ao nível da autonomia pessoal e social. Também foi possível conhecer as dificuldades com que as participantes se deparam e o que fazem para as superar.

Reportando-nos aos resultados globais do presente estudo podemos constatar que as práticas de leitura funcional emergiram com mais relevância, o que é compreensível, perante as questões colocadas na entrevista.

No entanto, para além das práticas, nas entrevistas, os professores também referiram as suas opiniões sobre a aprendizagem da leitura funcional, sobre as questões da autonomia, sobre estratégias, atividades, materiais e recursos que utilizam com os alunos.

Por sua vez, a análise de conteúdo realizada, permitiu encontrar temas que não estavam previstos no guião da entrevista, como por exemplo: os sentimentos e preocupações que as participantes experimentam na intervenção e que foram abordados pelos professores e terapeuta da fala, de modo significativo.

Nas entrevistas, os professores descreveram com mais pormenor e de forma compreensiva as suas práticas, enumerando o tipo de estratégias que utilizam, os materiais que constroem e as interações que estabelecem. Embora, nas observações efetuadas, não tenha sido possível verificar todos os aspetos referidos nas entrevistas, julgamos possível apontar para a existência de coerência e consistência entre o que foi dito e o que foi observado.

Neste estudo, sublinha-se a importância do papel dos PEE no percurso escolar dos alunos com PDI. São os PEE que os acompanham e apoiam sistematicamente, agilizando práticas e estratégias para a promoção do sucesso, neste caso, para a aquisição de competências leitoras e para a promoção da autonomia pessoal e social. O PEE constitui um recurso especializado que deve articular e colaborar com os PER, com outros técnicos e com as famílias, de forma a assegurar as respostas educativas mais adequadas a cada aluno.

Neste estudo, é evidente que os PEE e a TF se preocupam muito com a qualidade das respostas educativas. A recolha de dados assim o demonstrou pois estes, na planificação e preparação de material e/ou de recursos tentam responder às necessidades e características de cada aluno e às expetativas que cada família tem para os seus filhos. Além destes aspetos, proporcionam aos alunos situações de aprendizagem diversificadas e significativas dentro e fora da escola e prestam-lhes o devido apoio. Têm sempre presente a promoção da autonomia pessoal e social e a preocupação com o futuro dos alunos. A sua intervenção é, sempre que possível, realizada em contextos reais para que os alunos consigam desenvolver competências funcionais que lhes sejam úteis e que se possam transferir para outros contextos do seu quotidiano.

Dos resultados obtidos foi possível identificar um conjunto de estratégias e atividades de natureza funcional, implementadas pelas participantes, que contribuíram para o desenvolvimento de competências leitoras e para a promoção da autonomia pessoal e social dos alunos com PDI.

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Recebido: 09 de Janeiro de 2022; Aceito: 01 de Março de 2023

Luísa Cristina Perpétuo Gomes Professora licenciada em Ensino Básico - 1º Ciclo, com Especialização em Educação Especial - Ramo Problemas de Cognição. Mestre em Educação Especial na área e especialização: Problemas de Cognição e Multideficiência. Exerce funções docentes, em escolas públicas, desde 1998. Atualmente, encontra-se a coordenar o 1º ciclo do currículo bilingue, num estabelecimento de ensino particular. St. Julian´ s School - Colégio Inglês de São Julião, Quinta Nova, 2775-588 Carcavelos / luisa.luigom@gmail.com

Isabel de Lacerda Pizarro Madureira Professora Adjunta na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Lisboa. Membro do Departamento de Formação e Investigação em Educação e Desenvolvimento. Doutorada em Educação na área da Formação de Professores, exerce funções docentes na ESELX no âmbito da Formação Especializada em Educação Especial e da Formação Inicial de Professores. Escola Superior de Educação de Lisboa, Instituto Politécnico de Lisboa, Campus de Benfica do Instituto Politécnico de Lisboa, 1549-003 Lisboa / isabelmo@eselx.ipl.pt

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