Profissionalização, profissionalismo e profissionalidade: grupo profissional dos Mediadores Artísticos e Culturais
Iniciamos o presente texto com a identificação dos conceitos centrais que nos serviram de pano de fundo para a análise exploratória realizada, que na segunda parte apresentamos. Conceptualmente central para a análise, partimos do conceito de profissionalização, entendido como um processo que inclui a sequencialidade de etapas entre a emergência de uma ocupação e o reconhecimento de uma profissão, sem que corresponda necessariamente a um percurso unidirecional e constante, tomando portanto a definição “fundadora” de Wilensky (1964). Posteriormente, partindo desse entendimento da profissionalização como um processo, Abbott (1988, 1991) acrescentou a adoção de uma abordagem dinâmica que permite considerar profissões como um sistema, que resulta quer de forças externas (como as alterações tecnológicas e organizacionais e fatores culturais ou naturais), quer de forças internas (como seja o desenvolvimento de novos conhecimentos ou mudanças na estrutura social das profissões). Trata-se portanto de um processo que diz respeito a um percurso que pode ter avanços e recuos, em resultado da influência de fatores, tanto internos como externos ao próprio grupo profissional. Embora se trate de um processo construído por um coletivo, que partilha elementos e atributos comuns, não corresponde necessariamente a um conjunto socioprofissional internamente indiferenciado. A interrogação em torno da aparente homogeneidade há muito questionada pelas correntes interaccionistas (Rodrigues, 1997, 2012), permitiu que desde então se entendesse que num grupo profissional se reunem profissionais com estatutos e condições de exercício (da sua prática) profissional distintos, assim como com diferentes trajetórias formativas e profissionais. Actualmente, pode afirmar-se que o que é comum aos grupos profissionais é a vontade aliada à necessidade de serem reconhecidos, como refere Evetts (2003: 397) “there is an extensive agreement about the appeal of the idea of profession and professionalism and its increased use in all work contexts”. Também Carapinheiro e Rodrigues (1998) identificaram essa importância, na sociedade portuguesa (do final do século XX), apontando as profissões e o profissionalismo como referências valiosas no imaginário social. Estas autoras, consideraram, à época, que o profissionalismo constituía uma inspiração e aspiração para diversos grupos (Carapinheiro & Rodrigues, 1998). Nas análises desenvolvidas posteriormente, a importância das profissões (e grupos profissionais) e do profissionalismo continuou a ser identificada (Funck, 2012). Aliás, o crescente interesse pelas profissões (e grupos profissionais) nas últimas décadas, com alargamento do campo de análise e de investigadores envolvidos (Evetts, 2006, 2011; Parding, Bellini & Maestripieri, 2021), tem assentado sobretudo no enfoque dado às estratégias de afirmação dos grupos profissionais, na busca de alcançar o respetivo reconhecimento e elevados níveis de poder, estatuto e autonomia (Bellini & Maestripieri, 2018). Portanto, são atualmente questões centrais na investigação a (in)definição das fronteiras entre grupos profissionais, a par da identificação e compreensão da diferenciação interna dos mesmos; com diferentes perspetivas e enfoques, em parte em linha com outras problemáticas centradas nas questões da(s) diversidade(s) e desigualdade(s) (Parding, Bellini & Maestripieri, 2021). É com este olhar que desenvolvemos a análise sobre o processo de profissionalização dos profissionais que desenvolvem a sua ação na área da MAC.
Antes de avançarmos, é necessário que situemos ainda o uso do termo e do conceito de profissionalidade, no presente exercício. Estrela (2014) num artigo de discussão em torno dos conceitos profissionalização, profissionalismo e profissionalidade docente, assinala os equívocos e algumas das razões para o facto de o termo profissionalidade ter feito caminho, nas palavras da autora, sobretudo nos países europeus de línguas latinas, ocupando, em certa medida o lugar do termo profissionalismo nas línguas anglosaxónicas . Sem pretendermos participar da discussão sobre os usos destes termos, consideramos que conceptualmente a opção de Estrela (2014) é adequada para o exercício que pretendemos, assim, damos atenção à explicação da autora que, em certa medida, resolve o equívoco dando a pista para o uso dos termos e conceitos de profissionalismo e profissionalidade: “Há muitos anos que vimos adoptando o conceito de profissionalismo como o ideal colectivo de serviço que integra a profissionalidade e lhe confere sentido, sem o qual a profissionalidade fica ameaçada de um simples tecnicismo ou de uma grande subjetividade. Os conceitos estão, pois, reciprocamente implicados.” (Estrela, 2014: 9). Portanto, a profissionalidade relaciona-se com profissionalismo, na medida em que, na busca de uma crescente autonomia e poder, os grupos profissionais orientam-se para o (seu) desenvolvimento profissional, por forma a alcançarem elevados níveis de estatuto. Ou seja, o desenvolvimento profissional assenta nas ações levadas a cabo pelo coletivo que constitui o grupo profissional, mas com (esse) sentido conferido, como refere Estrela (2014). Assim, pode considerar-se que a profissionalidade se refere “às capacidades requeridas pelo exercício profissional que a formação pretende incentivar” tomando a interpretação de Bourdoncle (1993) mobilizada pela autora (Estrela, 2014: 9). Ora, a compreensão e análise em torno de um grupo profissional que assume a mediação artística e cultural, os medidadores artísticos e culturais, pressupõe a análise do respetivo processo de profissionalização. Sendo um grupo emergente , portanto em fase inicial de profissionalização, merece que analiticamente procuremos encontrar as pistas que permitam traçar o retrato da presente fase do processo.
Mediadores Artísticos e Culturais em Portugal
Para um traçado breve do enquadramento teórico do presente exercício, consideram-se os seguintes elementos (comummente identificados) como definidores das profissões (Gonçalves, 2008; Rodrigues, 1997, 2012), a saber: (reconhecimento da) função social; formação e qualificação; associativismo profissional; regulação ética e deontológica e conhecimento profissional. Apresenta-se de seguida um breve retrato, considerando os elementos caracterizadores do grupo profissional em análise. Para o presente exercício tomamos a definição sobre a função profissional deste grupo, avançada por Martinho (2013: 15) que afirma: “Por mediadores culturais entendemos aqueles que asseguram um modo específico de as pessoas se relacionarem com a cultura e as artes”. Contudo, considerando terminologicamente como coincidente com mediadores artísticos e culturais, na medida em que incluímos teórico-analiticamente os diplomados da licenciatura em MAC . Sobre os contornos e fronteiras definidoras do que se entende por mediação artística e cultural, assinalamos a hibridez, tomando a análise apresentada por Mörsch & Holland (2015), que assinalam a diversidade terminológica, considerando os diversos contextos geográficos, culturais e linguísticos (Mörsch & Holland, 2015) .
Quando consideramos os mediadores artísticos e culturais compreendemos que se trata de um grupo profissional cujo processo de profissionalização é marcado pela muldimensionalidade de funções e pela complexidade de definição de perfis profissionais. Seja na realidade portuguesa, seja na de outros países, os estudos sobre mediação artística e cultural e mediadores artísticos e culturais confirmam esta ideia (Gomes & Martinho, 2009; Martinho, 2011, 2013; Maryse, 2015; Svensson, 2015; Mörsch & Holland, 2015). Se por um lado, é reconhecida a crescente importância e necessidade social das competências e funções desempenhadas pelos profissionais das áreas cultural e artística em geral, por outro, o reconhecimento da especificidade das respetivas funções e formação, apresentam-se difusas.
Relativamente ao reconhecimento da necessidade da MAC e da ação dos mediadores artísticos e culturais, uma primeira nota prende-se com a variação do crescimento da área das Artes e da Cultura. Na consulta às Estatísticas da Cultura em Portugal, dos últimos anos, é visível o crescimento do reconhecimento das Artes e da Cultura assim como a crescente presença de profissionais da área, em vários indicadores. Apresentam-se algumas ilustrações empíricas, em jeito de anotações. Primeira anotação, nas estatísticas de 2020 o emprego cultural foi estimado em 141,2 mil pessoas, representando 2,9% do total da economia . Igualmente, se se lerem as análises publicadas pelo OPAC (Observatório Português das Atividades Culturais) relativas ao Emprego Cultural, para o mesmo ano, os dados sobre o emprego cultural mostram que em Portugal cresceu (3,5%), contrariando a tendência europeia que registou um retrocesso, com baixa de -2,7% . Para uma aproximação empírica, sugere-se a leitura dos resultados do Inquérito aos Profissionais Independentes das Artes e da Cultura , conduzido pelo OPAC, cujos resultados enfatizam a heterogeneidade do grupo, com inserções profissionais marcadas pela precaridade e pluriatividade, combinando estatutos independentes e dependentes, com situações contratuais diversas . Tomamos agora os estudos de Gomes & Martinho (2009) e Martinho (2011, 2013) que identificaram as dificuldades de enquadramento deste tipo de profissões emergentes, tais como os técnicos de serviços educativos, programadores, curadores, gestores culturais, entre outros. A aproximação prende-se com a possibilidade de nesses “outros” poderem, ou não, ser incluídos os mediadores artísticos e culturais. É nosso entendimento que sim, na medida em que distinguem os grupos profissionais segundo a sua natureza, sendo as possibilidades avançadas por estes autores: Artística (criadores e intérpretes); Técnico-artística (profissionais que prestam apoio técnico a criadores e intérpretes); e ainda Mediação (profissionais que asseguram funções de organização, produção, divulgação e que enquadram a exposição pública dos bens culturais). Precisamente, nesta última possibilidade parece inscrever-se o grupo a que nos estamos a reportar. Portanto, se por um lado, poderemos encontrar um espaço em que se situam, por outro, esse espaço é razoavelmente difuso e híbrido, pela simultaneidade de funções elencadas, assim como coincidência destas com as de outros.
Continuando com os trabalhos sobre os medidadores artísticos e culturais, se por um lado se assinala o crescimento e alargamento da esfera das artes e da cultura, com a entrada destes “novos” grupos profissionais, por outro, as entidades empregadoras mantêm nos seus quadros persistentes problemas resultantes da rigidez que caracteriza os regulamentos da administração pública e que representa um obstáculo à integração de novas funções, como por exemplo, a da mediação artística e cultural. Para os profissionais destes domínios colocam-se vários problemas que vão da qualificação necessária/exigida, ao enquadramento jurídico do regime de trabalho. Essas têm sido as reivindicações mais vincadas pelos profissionais das Artes e da Cultura em Portugal: a definição de um estatuto socioprofissional. É recente a publicação do decreto-lei que aprovou o Estatuto dos Profissionais da área da Cultura (Dec-Lei nº 105/2021, de 29 de novembro), podendo ler-se no preâmbulo que o Estado deve promover a democratização da cultura, incentivando e assegurando o acesso de todos os cidadãos à fruição e criação cultural. Para isso, reconhece-se então, no mesmo normativo, a necessidade de serem criadas as condições para o desenvolvimento de um setor cultural dinâmico e equilibrado, que garante boas condições de trabalho aos seus profissionais.
A reivindicação a que se aludiu não é recente, nem tão pouco uma singularidade da sociedade portuguesa, sendo a publicação deste decreto-lei um marco num movimento geográfica e temporalmente mais alargado. Referimo-nos à Conferência do Porto Santo, Da democratização à democracia cultural: repensar instituições e práticas , realizada em abril de 2021, da qual resultou a Carta do Porto Santo , um documento sintetizador e de manifesto, com definição de (16) recomendações dirigidas aos decisores políticos, (14) às organizações culturais e educativas e (8) aos cidadãos, como se pode ler no texto da mesma, pretende-se que seja um farol para orientar as políticas.
Embora possamos identificar marcos do processo de profissionalização dos grupos profissionais das artes e da cultura, em geral, sobre os medidadores artísticos e culturais em Portugal, em particular, o exercício é como temos vindo a demonstrar, revestido de alguma dificuldade. Se se considerar as classificações das profissões voltamos a enfrentar uma das barreiras à sua identificação, consequentemente, ao seu reconhecimento. Portanto, a função é reconhecida, como demos conta anteriormente, seja no quadro das políticas para a cultura, seja na elaboração das respetivas estatísticas oficiais. Contudo, o grupo dos medidadores artísticos e culturais é ainda invisível nas classificações das profissões. Considerando a Classificação das Profissões em vigor em Portugal , Classificação Portuguesa das Profissões (CPP2010), se se pesquisar “Mediadores Artísticos e Culturais” não obtemos qualquer correspondência, em nenhum dos grupos. Optando por Mediação/Mediadores, vamos encontrar duas respostas. Uma primeira, relacionada com a mediação de Seguros, que consideramos inválida por não se inscrever na área das Artes e da Cultura. Uma segunda, que associa a mediação ao desempenho de funções que se inscrevem no âmbito da Intervenção Social , que se relaciona com o Trabalho Social , que não correspondendo centralmente à função da mediação artística e cultural, pode ser considerada, embora menos distante, como apontam Cruz, Vieira e Vohlgemuth (2021). Outra via de pesquisa, resulta na busca a partir dos Grandes (Sub)Grupos, pesquisando já não o termo mediação, mas considerando a área de desempenho de funções profissionais na área das Artes e Cultura. Assim, o que mais se aproxima é o Grande-Grupo 2, Especialistas das actividades intelectuais e científicas, por se encontrarem aí agrupados os do Grande-SubGrupo 26, Especialistas em assuntos jurídicos, sociais, artísticos e culturais. Contudo, descendo ao nível da profissão os mediadores artísticos e culturais, ou apenas mediadores culturais, não são identificados. Já os artistas podem ser encontrados em Artistas criativos e das artes do espetáculo (265) e outros profissionais afins, como os Curadores de museus (2621.2), são catalogados tendo em comum o desempenho de funções de criação artística. Estes profissionais encontram-se posicionados, por isso, num patamar elevado da classificação, por serem produtores/criadores/decisores (em detrimento dos outros profissionais classificados em posições inferiores, por assumirem funções de aplicação/execução). Se se considerar a dimensão técnica da função da mediação, ainda que associada a uma qualificação de nível superior, mas indistinta quanto à área, pode então considerar-se o Grande Grupo 3, Técnicos e profissões de nível intermédio. Num exercício de aproximação, a possibilidade dos Técnicos de nível intermédios dos serviços jurídicos, sociais, desportivos, culturais e similares (34) pode ser considerada na medida em que a sua ação profissional, tal como descrito na CPP2020, “Compreende as tarefas e funções dos técnicos de nível intermédio dos serviços jurídicos, sociais e religiosos, da actividade física, desporto e das actividades culturais, artísticas e culinárias” (CPP2010), sendo uma das entradas relativas aos Organizadores de conferências e eventos (3332.0). Neste caso, o que é comum aos diversos (sub)grupos é o desempenho de funções de execução de planos, projetos, programas elaborados por outros (que desempenham funções de decisão/criação), reunido-se aqui os profissionais que se ocupam, genericamente, do que poderemos designar como trabalho “no terreno”, junto dos destinatários que assumem diferentes designações, “utentes”, “clientes”, “públicos”, “beneficiários”, etc .
Os grupos profissionais definem-se e posicionam-se também em função dos níveis de qualificação exigidos para o desempenho profissional. Genericamente, as profissões cujo exercício implica uma formação longa (de nível superior), a par de uma certificação cujo reconhecimento é exclusivo do grupo são as que têm um estatuto profissional mais elevado, com elevada autonomia, apoiada na tomada de decisão e regulação ética e deontológica, sediadas no próprio grupo (Rodrigues, 2012). No caso dos mediadores artísticos e culturais, embora detenham níveis de qualificação escolares elevados, como os estudos e fontes anteriormente indicadas demonstram, são provenientes de diferentes áreas, tipos e vias de formação. Considerando a oferta formativa no ensino superior em Portugal, é recente a licenciatura em Mediação Artística e Cultural, da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Lisboa, mantendo-se desde a sua criação sem congénere no sistema, seja nos subsetores universitário ou politécnico, público ou privado . À escassez da oferta de formação na área específica, sendo ainda um curso recente, significa que em Portugal há (ainda) poucos licenciados em Mediação Artística e Cultural , pese embora que licenciados e mestres de outros cursos se (auto)identificam como mediadores artísticos e culturais (Martinho, 2011). Portanto, no processo de profissionalização do grupo profissional há que ter em linha de conta que, a partir da diplomação específica na área, há “novos” protagonistas a integrar o grupo profissional. Assinala-se ainda, no traçado do retrato que pretendemos sistematizar, a criação de uma associação cujos fundadores são sobretudo diplomados da licenciatura referida, protagonizando um importante papel no processo de profissionalização do grupo profissional . A Associação Portuguesa de Mediação Artística e Cultural assume o que se espera deste tipo de associativismo. Neste caso, constituem uma face visível (possuem um site e presença nas redes sociais, como Facebook e o Instagram) reunindo um conjunto de profissionais que se mobiliza e investe na divulgação de informação sobre a área e a promoção da participação de profissionais relacionados com a área (como é exemplo o Podcast Pontas Soltas). Na definição da sua missão é clara a ideia da divulgação e afirmação da área, com vista ao seu reconhecimento. Nos objetivos apresentados pode ler-se essa intenção, também refletida na defesa do profissionais da MAC e no alargamento do seu âmbito de intervenção. Esta associação, ainda recente, não parece pretender aproximar-se de uma modalidade associativa que assuma a função de regulação ética e deontológica do grupo profissional, ficando esta dimensão alocada aos referencias e normativos das entidades a partir da quais ou para as quais os profissionais da MAC desenvolvem a sua prática profissional. Por fim, o último elemento a considerar prende-se com o conhecimento profissional, sendo neste caso pautado pela pluralidade e carácter difuso da sua natureza e fontes. Os profissionais desta área mobilizam conhecimentos muito diversificados seja para uso teórico - associado sobretudo à concepção/elaboração dos programas, projetos e ações a desenvolver - , seja para uso prático - diretamente relacionado com a ação a realizar, nas organizações, integrados em redes, nas comunidades, junto dos públicos e outros profissionais, metodológica e eticamente sustentada. As questões relacionadas com o conhecimento radicam numa problemática mais alargada, que se prende com a definição da própria mediação artística e cultural, não se ocupando dessa discussão o presente exercício, regista-se apenas que não há uma definição conceptualmente unívoca, pelo contrário, há uma assinalável diversidade, espelhada até na terminologia usada, consequentemente também nas traduções consideradas (Mörsch & Holland, 2015; Cruz, Vieira & Vohlgemuth, 2021). Também para esta dimensão a associação anteriormente indicada pretende contribuir, procurando promover ações de produção, discussão e divulgação de conhecimento, incluindo a investigação sobre a área e o próprio grupo.
Análise dos resultados das pesquisas desenvolvidas pelos estudantes da Licenciatura em MAC
Procedimentos metodológicos
Metodologicamente a pesquisa realizada centrou-se no processo formativo desenvolvido no âmbito licenciatura em MAC da ESELx, concretamente na Unidade Curricular (UC) Profissionalidade e MAC, do 3º ano do curso . Tecnicamente foi desenvolvido um processo de análise documental exploratória, em dois planos. Num primeiro, consideraram-se as intencionalidades curriculares da UC, no quadro dos objetivos formativos e do Plano de Estudos do curso e a operacionalização das mesmas no trabalho de pesquisa sugerido aos estudantes. Num segundo plano, enquadrado pelo primeiro, analisaram-se as 23 pesquisas desenvolvidas pelos estudantes organizados em grupos, nos 4 anos letivos entre 2018/19 e 2021/22. A análise dos trabalhos de pesquisa desenvolvidos pelos estudantes foi realizada considerando as seguintes dimensões: as questões analíticas definidas e respetiva problematização; as abordagens metodológicas privilegiadas, sejam os métodos as técnicas de recolha, sejam os sujeitos, instituições e fontes considerados; os resultados alcançados e as conclusões.
Proposta formativa: UC Profissionalidade e MAC
A UC Profissionalidade e MAC oferece uma proposta formativa orientada para a última etapa de formação dos futuros profissionais, tendo como pano de fundo as condições de emergência, o reconhecimento da função e a afirmação do grupo profissional em referência (Carvalho e outros, 2012; Rodrigues, 2012; Parding, Bellini & Maestripieri, 2021). Curricularmente esta UC é oferecida no 3º ano, por forma a que os estudantes possam mobilizar conhecimentos e experiências formativas anteriores, tanto no âmbito das UC de natureza teórica, teórica-prática, como prática (sobretudo as UC em que são realizados os estágios, em contextos profissionais concretos). Para melhor enquadrar a análise, inicialmente propõe-se a apresentação das intencionalidades curriculares da UC, no quadro dos objetivos formativos e do Plano de Estudos do curso. Uma vez que a UC visa contribuir para o desenvolvimento de competências de pesquisa, a par do aprofundamento do conhecimento em torno das questões apontadas na primeira parte do presente texto, a proposta formativa assenta na realização de pesquisa e análise realizados em pequeno grupo, que constituem a base para a discussão, posteriormente, em grande e grupo.
Como se pode ler na Ficha Curricular da Unidade Curricular (FUC) a UC Profissionalidade e MAC tem como objetivo central: “Contribuir para a discussão em torno da definição da profissionalidade dos agentes com responsabilidade na mediação artística e cultural”, operacionalizados nos seguintes conteúdos: “(1) compreensão do reconhecimento da função social destes profissionais, a partir da análise do seu posicionamento nas classificações das profissões, à luz dos desafios económicos, políticos, culturais e artísticos nas sociedades contemporâneas; (2) identificação dos contextos em que os agentes institucionais envolvidos na mediação artística e cultural desenvolvem a sua intervenção; (3) no reconhecimento das práticas profissionais desenvolvidas por esses profissionais; (4) definição dos perfis profissionais, os seus percursos formativos e de inserção profissional.” Portanto, o processo de pesquisa realizado pelos estudantes constitui-se como estratégia central do trabalho a desenvolver na UC. Mais concretamente, é lançado o desafio de serem realizados procedimentos de pesquisa, envolvendo o questionamento, a problematização e análise de informação empírica para o efeito recolhida, numa aproximação/iniciação a processos investigativos. Neste caso, considerando-se como pano de fundo para a problematização e definição das questões o conhecimento que já detêm relativamente aos contextos, instituições e profissionais que desenvolvem ação no âmbito da mediação artística e cultural. Para a problematização e análise é sugerido que mobilizem os conteúdos e recursos trabalhados no âmbito da UC, que em grande medida coincidem com a apresentação que se fez na primeira parte do presente texto e que se prendem com a discussão de conceitos como profissão, profissionalização e profissionalidade, a par de documentos centrais como as Estatísticas da Cultura, a Classificação das Profissões, relatórios de instituições responsáveis pela definição e operacionalização das políticas culturais, entre outros, como observatórios, fundações, programas e associações.
Na primeira sessão de trabalho é apresentada aos estudantes a proposta formativa, identificando no quadro dos objetivos do ciclo de estudos, para quais concorre a presente UC. Nessa apresentação é explicitada a intencionalidade com que foi curricularmente concebida a UC, dando conta que a proposta assenta na ideia de mobilização de conhecimentos e experiências anteriormente realizados, nas restantes UC do curso e outras situações formativas, para além dos conteúdos programáticos da UC. Dos objetivos do curso de licenciatura em Mediação Artística e Cultural , a UC pretende contribuir para os que se prendem essencialmente com o aprofundamento do conhecimento no âmbito da área profissional: Conhecer e compreender os públicos, os contextos e os equipamentos de produção e divulgação artísticas e Identificar redes de intervenientes e políticas na divulgação artística e cultural . Noutro grupo, reúnem-se os objetivos relativos ao desenvolvimento de competências profissionais, relevantes para o exercício da prática profissional no âmbito da MAC: Desenvolver competências profissionais no sector da mediação artística e cultural; Promover o desenvolvimento de competências que habilitem para a formação ao longo da vida; Ser um profissional reflexivo. Por fim, o objetivo relacionado com a dimensão técnica e procedimental do processo de pesquisa proposto: Promover a investigação nos domínios artístico e cultural.
A concretização da proposta formativa assenta no desenvolvimento estratégico da aproximação dos estudantes (o mais fidedignamente possível) aos processos de produção, divulgação e discussão do conhecimento. Para tal, é lançado um call, a partir do qual os estudantes são desafiados a escolher uma linha de pesquisa a desenvolver, para posteriormente definirem as questões de pesquisa a realizar, definindo os procedimentos metodológicos adequados ao desenvolvimento da mesma; e ainda, a seleção e identificação dos referenciais teóricos e fontes a considerar. No call lançado o enquadramento funda-se na proposta programática da UC, como demos conta anteriormente, sendo identificadas 4 linhas para o desenvolvimento das pesquisas (programaticamente coincidentes com os conteúdos apresentados na FUC):
“A) Função social e posicionamento dos agentes de mediação artística e cultural;
B) Contextos institucionais e políticas de desenvolvimento da mediação artística e cultural;
C) Práticas e conceções dos profissionais de mediação artística e cultural;
D) Perfis profissionais dos agentes com responsabilidade na mediação artística e cultural: percursos formativos e de inserção profissional.”
Os estudantes em pequenos grupos iniciam o trabalho escolhendo a linha de pesquisa a desenvolver, para que no final seja produzido um documento que se orienta por um guião , que se aproxima da estrutura habitual dos textos a apresentar em situações como seminários ou congressos, com posterior edição no formato de atas. Os estudantes submetem, numa primeira etapa, um resumo de curta dimensão (350 palavras) para validação da proposta; posteriormente, submetem um resumo de dimensão mais alargada, incorporando já as alterações sugeridas ao primeiro resumo, princiais referências teóricas e previsão dos procedimentos metodológicos a serem desenvolvidos. No final dos processos de pesquisa os grupos apresentam oralmente os trabalhos, num formato aproximado ao usado em seminários e congressos, procurando-se agrupar as apresentações por temáticas, como se de paineis de seminário ou congressos se tratasse, convidando todos a comentarem, contribuindo com questionamento crítico e sugestões de melhoria. Depois das comunicações orais, os autores dos trabalhos concluem a escrita dos mesmos, sugerindo-se que sigam o formato de texto de atas.
Questões de pesquisa, problemáticas e metodologias privilegiadas
Análise dos trabalhos de pesquisa desenvolvidos pelos estudantes foi realizada considerando as seguintes dimensões: as questões analíticas e problemáticas definidas; os métodos as técnicas de recolha de informação empírica (os sujeitos, as instituições e as fontes considerados); por fim, os resultados alcançados e as conclusões. Inicialmente procedeu-se à leitura integral das pesquisas, identificando em cada trabalho as unidades de texto a codificar, com posterior agrupamento nas categorias de análise (emergentes), em cada dimensão de análise (exceptuando a dimensão relativa aos métodos e técnicas de recolha de informação). Posteirormente, procedeu-se a agrupamento das unidades de texto recortadas, agregando-as em categorias mais abrangentes. Os resultados apresentados dizem respeito a este nível mais agregado, privilegiando-se na apresentação a citação direta de excertos das pesquisas em análise, dado o carácter exploratório do trabalho apresentado .
A desigual distribuição do número de pesquisas por ano letivo, resulta dos grupos serem criados pelos estudantes, variando a dimensão desses grupos. Como se pode ler no quadro seguinte, no somatório dos anos letivos é evidente que as linhas 2 e 4 são as que reúnem um maior número de trabalhos realizados. Tomando em linha de conta as apreciações e justificações que ao longo desses 4 anos os estudantes partilharam em grande grupo, pode afirmar-se que: por um lado, a escolha pela linha 2, faz-se sobretudo pela coincidência com as realidades conhecidas dos estudantes, por via das experiências anteriores, respondendo assim à sugestão explícita de mobilização de conhecimentos anteriormente adquiridos/desenvolvidos no âmbito do curso; por outro, pela possibilidade de aprofundamento do conhecimento em torno dos perfis profissionais, num exercício de antecipação da fase seguinte dos seus percursos, ou seja, a inserção profissional.(Quadro 1)
As distribuição das questões de pesquisa evidencia as problemáticas que têm reunido o maior interesse dos estudantes. Um primeiro grupo de questões prende-se com as práticas profissionais em MAC. Estas, a par das questões relativas aos contextos (maioritariamente organizações culturais) ilustram a necessidade e vontade expressa pelos estudantes de preparação da inserção profissional futura, pela possibilidade de antecipação do cenário a considerar ulteriormente. As escolhas dos estudantes, resultam também de estratégias de rentabilização de experiências anteriormente vividas, pela possibilidade de garantir (uma boa) acessibilidade a fontes e interlocutores a inquirir ou observar no desenvolvimento das pesquisas. Já as questões que incidem maioritariamente sobre a definição da MAC, têm sido justificadas pela necessidade e interesse dos estudantes de sistematização do conhecimento que no final do percurso formativo, parece (ainda) disperso, por um lado; mas também pela possibilidade de explorar e aprofundar conhecimento sobre a MAC, sobretudo noutros países.(Quadro 2)
As abordagens metodológicas privilegiadas no desenvolvimento das pesquisas são sobretudo de natureza qualitativa, como se pode observar no quadro seguinte. No que diz respeito aos métodos e técnicas usados , dos 23 trabalhos analisados é evidente a sobrerepresentação da Análise Documental. Em grande medida, por ser uma técnica que é comummente combinada com outras, mas também porque os autores das pesquisas dispõem de um intervalo de tempo curto, apenas um semestre letivo. Sem surpresa, é a observação a técnica menos usada, precisamente pela extensa ocupação de tempo que implica, sendo por isso uma opção menos considerada, dados os constrangimentos de gestão de tempo dos estudantes.(Quadro 3)

Quadro 3: Distribuição dos Trabalhos de pesquisa analisados por métodos, técnicas de pesquisa e fontes: Análise Documental
Relativamente às fontes e interlocutores/sujeitos considerados, pelo facto de os estudantes optarem em muitos casos por pesquisas sobre a formação em MAC, tomando a licenciatura como referencial, são maioritariamente os diplomados, os futuros profissionais, os formadores, parceiros e empregadores, mas também, os dispositivos de formação, particularmente os que se prendem com as expriências formativas em contextos de estágio. Esta tem sido aliás uma das estratégias para se aproximarem das organizações culturais, dos profissionais e responsáveis dessas organizações. Por fim, duas pesquisas destacam-se pela singularidade dos exercícios desenvolvidos. Uma que se ocupou da identificação e mapeamento das publicações sobre MAC, com análise documental aprofundada, considerando as autorias por instituição, país, data, tipo e língua de publicação, a par das definições de MAC e outros conceitos afins e respetivos referenciais teóricos. Uma outra, em que foi realizado o levantamento dos normativos de enquadramento da cultura e das artes, comparando as políticas culturais de diferentes países europeus.(Quadro 4)

Quadro 4: Distribuição dos Trabalhos de pesquisa analisados por métodos, técnicas de pesquisa e fontes/sujeitos: Entrevista, Questionário e Observação
A análise das pesquisas realizadas por questões analíticas definidas e respetiva problematização e abordagens metodológicas privilegiadas, sejam os métodos as técnicas de recolha, sejam os sujeitos, instituições e fontes considerados, permite compreender que os trabalhos desenvolvidos pelos estudantes servem, globalmente, para que aprofundem o conhecimento em torno da MAC. Mais particularmente, no que se prende com a formação e inserção profissional dos mediadores artísticos e culturais e as organizações culturais. Têm procurado assim conhecer as conceções e práticas dos profissionais da MAC e mais pontualmente dos responsáveis pela programação e gestão dos serviços educativos, assim como do recrutamento dos profissionais.
Principais resultados e conclusões das pesquisas analisadas
Analiticamente apresenta-se de forma descritiva e exploratória os resultados alcançados e as conclusões dos processos de pesquisa desenvolvidos. Opta-se por dar voz aos autores das pesquisas, por representarem as preocupações dos futuros profissionais, das primeiras 4 edições da licenciatura, no último ano de formação.
Dos resultados alcançados uma grande parte prende-se com o reconhecimento social da MAC, consequentemente da relevância da existência do grupo profissional. Neste âmbito é marcante a preocupação dos autores das pesquisas relativa à hibridez da área e à necessidade da sua definição e afirmação, assim como dos profissionais da mesma. No sentido de esbater essa hibridez e enfatizando a potencialidade da MAC, encontra-se em vários trabalhos o sublinhado da necessidade de definição pelo traçar de fronteiras profissionais face a outros grupos, co-existentes nos contextos profissionais.
“É necessário reunir e discutir as fronteiras que as separam, para que a especialização de MAC consiga tornar-se evidente. Sim, é uma área polivalente que reúne equipas compostas por profissionais de diferentes áreas, (...) para não ser confundido com o animador sociocultural, gestor cultural, programador ou outro profissional da cultura ou das artes.” (TG8_19/20)
“É importante relembrar que esta é, de facto, uma profissão emergente no contexto português e que, apesar de existir quem desempenhe, nas suas funções, processos de MAC, esta é apenas uma pequena parte da voz discursiva: onde estão então os mediadores? (...) o Mediador continua a surgir como fragmentado no leque das profissões, não estando tão presente quanto seria desejável na produção académica.” (TG8_19/20)
A necessidade de definição e afirmação do grupo e respetivo campo profissional é reforçada pela identificação de uma porosidade dos perfis dos agentes que desenvolvem a sua ação em MAC, ganhando ampla visibilidade nos documentos escritos das pesquisas desenvolvidas, embora no presente texto se apresentem apenas pequenos excertos ilustrativos.
“Pode concluir-se que não existe um perfil objetivo para um mediador artístico e cultural, considerando, assim, a pertinência do presente estudo. Após todas as informações analisadas verifica-se que se encontram a desempenhar funções da mediação profissionais sem formação específica para a mesma, contudo altamente qualificados noutras áreas.” (TG2_19/20)
O conjunto dos resultados das pesquisas desenvolvidas que se ocuparam da identificação dos traços e funções dos profissionais em MAC inquiridos e/ou observados, permite elencar competências técnicas e relacionais, consideradas pelos autores das pesquisas como de importância e relevância elevadas para o traçar dos perfis destes profissionais .
“Consideramos que para se ser um mediador artístico e cultural é necessário ter gosto pelo trabalho, sendo que, todas as pessoas abordadas defenderam esta mesma ideia. Porém, não chega apenas ter gosto pelo trabalho, mas também, ter a capacidade de cativar públicos, comunicando e criando uma ponte entre o artista, a obra e os públicos. Um mediador deve ser capaz de ligar este triângulo, para que funcione com eficácia.” (TG2_18/19)
Relativamente às características sociodemográficas dos profissionais inquiridos e/ou observados os resultados não se distanciam dos estudos publicados sobre os mesmos, emergindo como um grupo profissional juvenilizado, qualificado e feminizado.
“Realizando uma análise geral dos resultados do questionário, podemos concluir que a maior parte dos profissionais neste setor é do sexo feminino e pertencem à faixa etária adulta, entre os 26 aos 35 anos e entre os 46 aos 55 anos (...). Os mediadores têm formações diversas e todos os inquiridos têm altas qualificações académicas (ensino superior).” (TG3_19/20)
A centralidade dos contextos museológicos, destacando-se os serviços educativos, como organizações em que maioritariamente se encontram os mediadores contactados no âmbito das pesquisas, faz parte do conjunto de resultados apurados em vários dos trabalhos desenvolvidos.
“Os museus foram o tipo de local que teve mais respostas e isso deve-se à existência de serviços educativos nos mesmos. Nenhum inquirido respondeu trabalhar em galerias, centros culturais e cinemas/cineteatros. A maior parte dos inquiridos trabalha por conta de outrem, no entanto o número de mediadores que trabalham por conta própria foi mais alto do que o esperado, o que implica que os mediadores podem trabalhar como freelancers.” (TG3_19/20)
Sobre as práticas profissionais em MAC, os principais resultados apontam ainda para os mediadores artísticos e culturais entendidos como agentes de operacionalização das políticas no quadro das organizações culturais e artísticas, com e junto das populações. Nas últimas citações apresentadas é ainda enfatizada a dimensão política da MAC, reforçando a importância desta profissão.
“Os equipamentos culturais exercem o papel de estabelecer um elo com a comunidade alargada: elo esse que é assegurado pelos mediadores artísticos e culturais. No fundo, os mediadores artísticos e culturais exercem o seu papel na sociedade aliados às diferentes organizações culturais” (TG3_20/21)
“Finalizando, chegamos também a conclusão de que o trabalho do mediador artístico e cultural é um ato político, que incentiva a democracia, a igualdade entre todos e a construção da cidadania. Dentro das instituições, o mediador artístico e cultural situa-se entre a política cultural da instituição e o público, sendo um lugar privilegiado para despertar as consciências, dar vozes e sensibilizar ao mundo através da arte.” (TG4_20/21)
Pela importância da formação no processo de profissionalização dos grupos profissionais, em algumas pesquisas os autores fizeram o mapeamento da formação na área a nível europeu, comparando os Planos de Estudo dos cursos. Outros tomaram a (própria) licenciatura em MAC, concluindo sobre a importância de uma formação profissionalizante, destacando nos resultados a relevância da realização dos estágios em organizações culturais e artísticas. Globalmente, no que diz respeito à iniciação e inserção profissional dos diplomados do curso e de outros mediadores com formações diversas, as pesquisas apontaram para dificuldades no processo de obtenção do emprego, pelo carácter difuso atribuído pelos empregadores aos profissionais da área, a par de uma precaridade das condições contratuais. Contudo, foram também identificadas potencialidades nos percursos analisados, sobretudo pelas vantagens da pluriatividade, assim como o contributo do associativismo dos profissionais da área na divulgação da mesma.
“Mesmo sendo complicado de arranjar trabalho dentro da área da mediação não é impossível e cada vez mais vai havendo lugar dentro das instituições e organizações culturais para nós. (...) que se deve apostar numa formação após a licenciatura (...) os estágios durante a licenciatura são fundamentais para a nossa formação e preparação para o mundo do trabalho” (TG2_21/22)
“A Mediação é uma área de empregabilidade ainda bastante complicada, por vezes desconhecida por muitas entidades. (...) o trabalho realizado pela Associação Portuguesa de Mediação Artística e Cultural também tem sido fundamental para dar a conhecer ao país aquilo que estamos a fazer e quais os nossos objetivos, aquilo de que somos capazes.” (TG3_21/22)
Os autores das pesquisas, à data da realização das mesmas, encontravam-se todos no final do percurso formativo, sendo frequente a troca de ideias sobre (os seus) futuros profissionais. A proximidade da protagonização do processo de profissionalização do grupo profissional traduziu-se numa reflexão que acompanhou parte das conclusões dos trabalhos realizados. Por um lado, com o sublinhar da importância do questionamento, pesquisa, análise e da própria reflexão para o (seu) posicionamento enquanto futuros profissionais em MAC. Por outro lado, pelo reconhecimento da especificidade da sociedade portuguesa nesse processo.
“Para concluir, este trabalho veio reforçar a urgência de um posicionamento atento e reflexivo por parte do mediador e das instituições para, em conjunto, criarmos uma base sólida do seu perfil e da sua ação.” (TG2_20/21)
“A mediação artística e cultural ainda é uma ocupação recente em Portugal quando comparado com outros países, como o caso da Alemanha e do Reino Unido. Os mediadores têm desenvolvido a noção de que as artes poderão ter impactos positivos socias, e são também um elemento de transformação.” (TG3_20/21)
Notas finais
Os resultados das pesquisas desenvolvidas pelos estudantes constituem contributos para a exploração e aprofundamento do conhecimento em torno dos protagonistas da MAC, sejam os profissionais, sejam os dirigentes das organizações/empregadores, sejam ainda os responsáveis pela formação. A análise das pesquisas permitiu identificar as questões e problemáticas que são do interesse dos estudantes, futuros profissionais da área, assim como as conclusões e reflexões produzidas no processo de pesquisa, face aos resultados encontrados. Sinteticamente, os resultados das pesquisas contribuíram para a aproximação às condições dos contextos profissionais, com particular destaque para as organizações culturais, seja nos modos de programação, relação com os (potenciais) públicos e aos (próprios) profissionais, com a oportunidade de os inquirir sobre as suas práticas e concepções profissionais. Globalmente, os resultados apontaram para a necessidade de afirmação da área e dos profissionais da mesma, com reconhecimento dos desafios como o da (in)definição de fronteiras face a outros agentes que se encontram nas mesmas organizações culturais.
A análise permite concluir que o exercício proposto aos estudantes contribui para que na antecipação do futuro profissional, se aproximem dos diversos cenários, seja das organizações empregadoras, seja dos (futuros) pares, dirigentes e públicos, seja ainda das possibilidades de participação no associativismo profissional. Não menos importante, mas inicialmente mais distante para todos, a realização das pesquisas tem permitido também a possibilidade de uma experiência aproximada aos processos de produção, divulgação e discussão do conhecimento na e sobre a área. Outro efeito prende-se com o reconhecimento dos (futuros) profissionais em MAC sobre a necessidade de uma ação conjunta, em diferentes escalas e esferas. Servindo estas pesquisas e o debate que no final se faz em grande grupo para: um balanço em torno da MAC; a discussão em torno das incertezas, paradoxos e desafios que os profissionais das Artes e Cultura enfrentam em Portugal; o reconhecimento da relevância da mobilização (de cada) profissional e do grupo profissional dos mediadores artísticos e culturais, com reconhecimento da complexidade, pluraridade e complementaridade entre profissionais de áreas de formação afins, que partilham contextos e organizações profissionais, desempenhando muitas vezes as mesmas funções.
Por fim, parece poder-se concluir que as questões de pesquisa desenvolvidas no âmbito destes trabalhos podem ser consideradas como pontos de partida/agenda para processos investigativos a ser desenvolvidos futuramente, dada a necessidade de conhecer mais aprofundadamente a realidade da mediação artística e cultural em Portugal e no mundo, assim como sediar a produção, divulgação e discussão da área no seio do grupo profissional, em articulação com os das áreas afins. Seja pela necessidade de reforço do desenvolvimento profissional na presente etapa de profissionalização do grupo profissional, seja pela necessidade de visibilização e discussão pública, a par da publicação de resultados em torno da mediação artística e cultural.
















