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CIDADES, Comunidades e Territórios
versão On-line ISSN 2182-3030
CIDADES no.38 Lisboa jun. 2019
https://doi.org/10.15847/citiescommunitiesterritories.jun2019.038.rev01
RESENHA
Recensão do livro "Políticas de Habitação, 200 anos"
Review of "Políticas de Habitação, 200 anos"
Nuno Pires SoaresI
[I]CICS.NOVA - Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Portugal. e-mail: nhpsoares@fcsh.unl.pt.
Políticas de Habitação, 200 anos
Gonçalo Antunes
Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2018
O Livro Políticas de Habitação, 200 anos, da autoria de Gonçalo Antunes e publicado em 2018 pela Caleidoscópio, representa a maior obra de investigação sobre Políticas de Habitação realizada até hoje, em Portugal. Esta resulta de um enorme trabalho de pesquisa, com consulta exaustiva de documentação, muitas vezes original (legislação/textos/plantas e projeto), em que o autor evidencia a clara preocupação em analisar, interpretar, relacionar, espacializar e sintetizar a informação. O período de tempo é longo, abrangente e completo. A escala espacial é a nacional, embora o foco principal seja a cidade de Lisboa. É uma obra que cruza saberes teóricos e práticos da Geografia, da História, do Direito, das Políticas Públicas, do Urbanismo, da Sociologia e da Economia. Mas como Gonçalo Antunes refere logo na introdução, “… assente numa interpretação alicerçada na Geografia e, em particular, na Geografia Urbana.” O seu autor é formado em Geografia, de uma escola que desde a origem cruza a Geografia com o Planeamento Regional e onde se procura a síntese e a hierarquia, tanto dos elementos interpretativos como explicativos. Um legado que transparece na preocupação com o quadro espacial e no rigor de todo o trabalho realizado. Existe neste livro algo excecional no que se refere ao processo de comunicação, marcado não só por uma escrita clara e preocupada com o leitor, mas sobretudo pela intenção de explicar e ensinar. É uma obra que possui uma forte componente didática e, como tal, de grande utilidade para todos os que se interessam sobre este tema que é a habitação e as suas políticas. O investimento realizado na construção de mais de cem mapas originais faz parte da intenção de explicar o que ocorre no espaço e como se foi construindo e alterando a imagem da cidade de Lisboa. Fica claro ao leitor que, tanto os objetivos como as competências cartográficas de Gonçalo Antunes ultrapassam os propósitos ilustrativos e representativos. A cartografia, que desde sempre acompanha a Geografia é, neste trabalho, uma cartografia de investigação, cujo resultado permite ao leitor conhecer a evolução das lógicas espaciais da cidade, tanto por intermédio das políticas sociais de habitação como do próprio mercado livre. O autor consegue esse feito através de uma rigorosa utilização de bases cartográficas já existentes, ou profundamente refeitas para este propósito, sobre as quais regista a informação correspondente aos diferentes bairros ou conjunto de edifícios construídos no período temporal em análise. A par da cartografia existe um vastíssimo conjunto de fotografias que acompanha e enriquece a exposição narrativa. A imagem é supletiva, complementar e está muito para além da mera ilustração. A estrutura desta obra é diacrónica, minuciosa e precisa. Encontra-se segmentada em cinco capítulos, que começam com a “Questão habitacional na Monarquia Constitucional” e terminam com o Capitulo V “A Questão habitacional de Abril de 1974 à actualidade”. Este último capítulo merece destaque pela complexidade e pela forma como o autor interpreta e explica a multiplicidade de políticas num contexto particularmente dinâmico. Este capítulo, de 182 páginas, encerra com “Modelos e tendências: a Revolução, a Democracia e o Estado Social” seguido de “Conclusões Lisboa social”. São aproximadamente 60 páginas de grande fôlego intelectual, que o leitor recordará e às quais irá recorrer sempre que necessite de esclarecimento sobre as políticas de habitação neste período recente da história. Trata-se de um tema profundamente politizado e partidarizado. Mas ao longo das 640 páginas do livro só é percetível que o autor é um defensor do direito à habitação. As apreciações pessoais existentes são poucas, oportunas e singelas. Esta obra encerra com 24 anexos, nos quais se destaca a riqueza da informação. O último anexo - Mapa Síntese: Lisboa social/Geografia Residencial - é exemplificativo. Nele são representados, por intermédio de uma legenda clara e bem construída, todos os edifícios em Lisboa que têm uma origem social. Trata-se de uma inventariação cartográfica de grande complexidade, cujo investimento de tempo e trabalho merece, certamente, o reconhecimento e a valorização dos leitores. A um tema difícil não tem que corresponder uma obra enfadonha e cinzenta. Este livro é a prova de que, em presença de um autor comprometido com a intenção de saber interpretar e explicar o que foram as políticas de habitação no período temporal definido, é possível concretizar uma excelente obra científica e de leitura agradável. Conclui-se, por tudo o que foi dito, que este é (e será) um livro de leitura incontornável para todos os que estudam a cidade, a habitação e as suas políticas.