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Revista Internacional em Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 2182-4452versão On-line ISSN 2184-2043

RILP vol.35  Lisboa jun. 2019  Epub 29-Jul-2021

https://doi.org/10.31492/2184-2043.rilp2018.35/pp.83-102 

Artigo Original

Conhecimento etnobotânico da Província da Huíla (Angola): um contributo baseado nos registos de campo do colector José Maria Daniel

Francisco Maiato Pedro Gonçalves1  2 

Júlia Elizeth Tchamba3 

Fernanda Maria Oliveira Pires Lages3 

José Luís Mateus Alexandre3 

1ISCED Huíla, Departamento de Ciências da Natureza, Herbário do Lubango, Angola

2Universidade de Hamburgo, Instituto de Ciências Vegetais e Microbiologia, Alemanha

3 ISCED Huíla, Departamento de Ciências da Natureza, Herbário do Lubango, Angola


Resumo

O presente estudo tem como objetivo divulgar a vida e obra do colector José Maria Daniel, relativamente ao conhecimento etnobotânico da Província da Huíla. Extratos da vida e percurso profissional constam da sua auto-biografia. As informações sobre o uso de plantas fazem parte dos cadernos e notas de campo de JMD, encontrados nos arquivos do Herbário do Lubango. Estas informações foram organizadas e introduzidas numa base do Excel, constituindo um total de 787 registos de diversas plantas, correspondentes a 158 espécies, das quais 57 têm uso medicinal, enquanto as restantes foram referenciadas como ornamentais, forrageiras, tóxicas ou venenosas, alimentares e condimentares. Organizou-se a informação conforme a família, género e espécie a que pertencem as plantas, seguida dos usos que lhes são atribuídas e a forma de utilização, constituindo um significativo contributo para a divulgação do conhecimento florístico da região e dos usos das plantas pelas suas populações.

Palavras-chave: Herbário do Lubango; José Maria Daniel; plantas medicinais; Província da Huíla

Abstract

The present study aims to disclose the life and work of the collector José Maria Daniel, regarding the ethnobotanical knowledge of Huíla Province. Excerpts of his life and professional career are part of his auto-biography, while the information on the use of plants are in notebooks and field notes of JMD found in the archives of the Herbarium of Lubango. This information was organized and introduced in an Excel spreadsheet, constituting a total of 787 records of several plants, corresponding to 158 species, from which 57 are used medicinally, while the remaining were referred as ornamental, forage, toxic or poisonous, food and condiments. These information were organized according to family, genus and species to which the plants belong, following by the uses attributed to them and form of utilization, constituting a significant contribution to the dissemination of the floristic knowledge of the region and the uses of plants by their populations.

Keywords: herbarium of Lubango; Huíla province; José Maria Daniel; medicinal plants

1. Introdução

As plantas medicinais são usadas um pouco por todo o mundo e em muitos países constituem muitas vezes o único recurso disponível para as populações, principalmente nas áreas rurais. Estima-se que cerca de 80% da população africana usa a medicina tradicional nos cuidados primários de saúde (WHO, 2003). Os elevados custos dos medicamentos convencionais e dos cuidados de saúde, e a aceitação que os medicamentos tradicionais gozam junto das populações por motivos culturais e espirituais, estão na base do recurso à medicina tradicional (Cunningham, 1988). Angola, com a sua diversidade de ecossistemas que se estende desde as florestas tropicais no norte do país, ao deserto do Namibe a sul (Lovett, 2018), possui uma vasta flora estimada actualmente em 7.076 espécies nativas e 226 espécies introduzidas (Goyder & Gonçalves, in prep.), e uma rica e transversal medicina tradicional disseminada entre os principais grupos étnicos que, desde cedo, despertou o interesse de vários investigadores (Mendonça et al., 2015). Entretanto, apesar do país ser detentor desta diversidade de plantas e do conhecimento das suas potencialidades na cura de determinadas doenças, apenas uma pequena parte desta informação se encontra disponível para consulta (Costa, 2012).

Isto deve-se ao facto da maior parte dos estudos etnobotânicos feitos no continente africano não terem sido publicados, pois foram realizados por missionários, exploradores e especialistas em várias áreas científicas, como botânicos, médicos e antropólogos, encontrando-se dispersos em arquivos pessoais, bibliotecas, museus e herbários (Liengme, 1983). Estes dados podem ser uma valiosa fonte de informação para o conhecimento da diversidade de plantas e da sua utilização pelas populações. A etnobotânica surge neste contexto como uma área multidisciplinar que permite documentar o saber tradicional, fazendo simultaneamente o reconhecimento da diversidade florística, dando pistas sobre o seu estado de conservação, permitindo desta forma que a potencialidade das plantas como medicinais, bem como os hábitos e costumes das populações que as usam, sejam conhecidos (Costa, 2012).

Devido à grande riqueza cultural do seu povo e à relativa sensação de insegurança durante os longos anos de conflito militar em Angola, grande parte dos estudos etnobotânicos que se conhecem hoje foram realizados na Província da Huíla, localizada a sudoeste de Angola. Com uma extensão territorial de cerca de 78.719 km2, a sua população é actualmente estimada em 2.497.422 habitantes, distribuída maioritariamente por três grandes grupos étnicos: Nyaneka-humbi, Nganguela e Umbundu (INE, 2016). Do ponto de vista climático, distinguem-se na região duas estações. O inverno, que começa em Maio e se estende até Setembro, é geralmente seco e frio, com temperaturas baixas e ausência completa de chuvas. A estação chuvosa - o verão - vai de Outubro a Abril, é quente, com temperaturas médias entre 19 e 21°C e precipitação média de 700-1000 mm/ano, sendo o mês de Março o mais chuvoso (Köppen-Geiger, 1936). Para a Província da Huíla reconhecem-se oito principais tipos de vegetação (Barbosa 1970). Entretanto estudos recentes apontam para cerca de treze comunidades vegetais e respectivas associações (Chisingui et al., 2018). A província possui um dos mais importantes acervos biológicos do país, entre os quais se destaca o Herbário do Lubango (LUBA), estabelecido na década de 50 do século passado pelo então Instituto de Investigação Científica de Angola (IICA). O herbário, conta actualmente com cerca de 20.000 exemplares e tem como principais colectores Grandvaux Barbosa, Azancot de Menezes, Romeu Santos, Rui Correia e José Maria Daniel (Gonçalves, 2009; Goyder & Gonçalves in prep.). Associada a estas colecções existe uma vasta informação sobre a ocorrência e uso das plantas na Província da Huíla. Infelizmente as informações sobre a vida e o trabalho de muitos colectores não é fácil de encontrar - não estão disponíveis para a comunidade científica. O levantamento e análise dos registos destes colectores é de extrema importância, pois permitirá aprofundar os conhecimentos sobre a diversidade florística regional, bem como a disseminação do conhecimento sobre a utilização das plantas locais pela população. Assim, pretende-se com este trabalho divulgar a vida e a obra de José Maria Daniel (JMD), um dedicado explorador e estudioso da flora angolana, com particular realce aos seus trabalhos no domínio da etnobotânica realizados na Província da Huíla.

2. Materiais & métodos

2.1. Área de estudo

O presente estudo baseou-se nos registos de campo de JMD, relativamente à utilização das plantas locais pelas populações dos diferentes municípios da província, onde realizou a maior parte do seu trabalho, nomedamente nos municípios do Lubango, Humpata, Chibia e Gambos (Figura 1).

2.2. Aquisição e tratamento da informação

Os registos sobre o uso das plantas constam, tal como se referiu acima, dos cadernos e notas de campo de JMD (Figura 2). Estas informações foram compiladas e introduzidas numa base de dados digital em formato MS Excel. Os dados foram organizados de forma hierárquica desde a família, género e espécie, seguida dos usos atribuídos às plantas e a forma da sua utilização. Adicionalmente compilou-se toda a informação das plantas que, não tendo sido referenciadas como medicinais, lhes foram atríbuídas outros usos, como é o caso das plantas ornamentais, forrageiras, tóxicas ou venenosas, alimentares e condimentares. A correcção e actualização dos nomes dos taxa foi feita com recurso à mais recente bibliografia fito-taxonómica disponível (Germishuizen et al., 2006; Figueiredo & Smith, 2008), bem como através da consulta de outras fontes disponíveis online (www.theplantlist.org; www.ipni.org; www.ville-ge.ch). Para uniformizar a nomenclatura, e considerando que parte dos nomes dos taxa estavam desatualizados, recorreu-se à Checklist de Plantas de Angola para os nomes aceites e para os sinónimos (Figueiredo & Smith, 2008). Os nomes vernáculos na língua nacional Nyaneka e os nomes em português foram escritos com base na literatura existente para o país (Gossweiler, 1953; Figueiredo & Smith, 2012).

Figura 1 Mapa de Angola e respectiva divisão admistrativa em dezoito províncias. A província da Huíla e os quatro municípios onde se concentraram os trabalhos etnobotânicos do colector estão em destaque. 

Figura 2 Notas dos cadernos de campo do colector José Maria Daniel, contendo número de colector, nome da planta, nome local e respectiva utilidade.  

3. Resultados

José Maria Daniel (Figura 3) nasceu na Província da Huíla, aos 12 de Setembro de 1943, na Comuna da Huíla, Município do Lubango. Fez os seus estudos primários até a 6ª Classe no Seminário Arquidiocesano do Jau, Missão Católica da Comuna da Huíla. Em Fevereiro de 1964 juntou-se ao extinto IICA, destacado no Centro de Estudos do Lubango, onde permaneceu até Maio de 1967. No ano seguinte foi transferido para Luanda como técnico praticante. Durante este período, JMD beneficiou de várias formações, tendo realizado estudos florísticos com o Eng. Agrónomo Óscar Azancot de Menezes nas Províncias de Benguela, Cuando Cubango, Cunene, Huambo, Huíla, Malange e Namibe. Em 1974 foi nomeado como Técnico na Secção de Plantas da mesma instituição, onde permaneceu até 1994. Durante este período adquiriu competências e prática na conservação de material vegetal, manutenção e gestão de equipamentos de laboratório, combinada com outras competências na área da fito-sistemática. Fez parte de várias expedições botânicas organizadas pela então Secção de Botânica como colector auxiliar, preparando ainda soluções a partir de raízes, folhas de ervas e cascas de troncos de arbustos e de árvores. Participou igualmente de vários inquéritos etnobotânicos conduzidos pela Dra. Manuela Batalha nas províncias do Bengo, Cuanza Sul, Lunda Norte, Lunda Sul, Malange e Moxico.

Figura 3 Colector e ex-curador do Herbário do Lubango José Maria Daniel (1943-2015) com o primeiro autor num trabalho de campo no município da Chibia, província da Huíla em Junho de 2008 (Foto: Ananias José). 

JMD foi um dos mais proeminentes botânicos angolanos após a independência do país em 1975, tendo colhido em quase todas as províncias de Angola. Deixou um acervo de cerca de 3.000 exemplares botânicos todos depositados no Herbário do Lubango (LUBA). Este número poderá ser ainda maior, a julgar pelo enorme quantidade de material depositado no Herbário ainda por avaliar, por se desconhecer o número de exemplares depositados noutros herbários do país, como é o caso do Herbário de Luanda (LUA), onde JMD trabalhou durante vários anos, após a extinção do IICA. Em 1987 fez parte dos quadros do Instituto Nacional de Saúde Pública do Lubango (INSPL), colocado no Laboratório do Centro de Estudo de Microbiologia Aplicada, Medicina Tradicional e Divisão Etnobotânica, onde ajudou na organização dos ficheiros de plantas medicinais e preparação de várias soluções. Participou ainda nos inquéritos de etnobotânica e antropologia médica, nas cidades do Lubango e Moçâmedes, tendo entrevistando vários terapeutas tradicionais. A sua vasta experiência com a flora do país, em particular a da Província da Huíla, inclui ainda pesquisas sobre plantas forrageiras, ornamentais, tóxicas ou venenosas, alimentares e condimentares. Com a extinção do INSPL, JMD foi transferido para o Herbário do Lubango, actualmente albergado no ISCED Huíla, onde com dedicação contribuiu para a manutenção e conservação deste importante acervo, numa altura em que o Herbário se encontrava numa situação de quase abandono. Durante este período contribuiu com o seu vasto conhecimento sobre flora angolana para a formação e treino de várias gerações de estudantes angolanos. Passados três anos foi novamente convidado a dar o seu contributo de reorganização do Herbário do Lubango e prestar apoio nos trabalhos de campo no âmbito do Projecto “Angolan Biodiversity Assessment and Capacity Building”, promovido por Brian John Huntley, Professor Emérito na Universidade de Cape Town, África do Sul e ex-director do SANBI (Instituto Nacional de Biodiversidade da África do Sul). Infelizmente JMD não concluiu este trabalho, pois após sofrer um acidente vascular cerebral em 2009, a sua saúde deteriorou-se irremediavelmente, acabando por falecer no Hospital Central do Lubango por insuficiência cardio-respiratória. A sua vida inteiramente dedicada à flora angolana, constitui um importante legado para a nova geração de jovens biológos angolanos.

As informações referentes às plantas medicinais, órgãos utilizados, formas de utilização e informações sobre possíveis doenças que curam estão resumidas na Tabela 1. Outras informações contidas nos cadernos e notas de campo de JMD incluem plantas tóxicas ou venenosas, forrageiras, ornamentais, alimentares e também condimentares (Tabela 2). As plantas referidas como medicinais constituem cerca de 33% do total de espécies registadas, seguida das alimentares (20%), ornamentais (18%), forrageiras (16%), tóxicas/venenosas (12%) e com apenas (1%) as condimentares. A família Fabaceae foi a mais representativa das plantas medicinais, seguida das famílias Vitaceae, Passifloraceae, Lamiaceae, Poaceae. As restantes estão representadas por um único taxon (Figura 4).

Cerca de 787 registos de plantas úteis foram feitos só para a Província Huíla, tendo-se destacado o município do Lubango com maior número de registos (86%), seguindo-se a Humpata (7%), a Chibia (4%) e os Gambos (3%). Para os restantes municípios não foram encontradas quaisquer informações. No total de 67 registos de plantas medicinais foram feitos, 10 registos foram excluídos desta análise por deficiência de informação no que se refere, por exemplo, às partes usadas ou às indicações terapêuticas. O presente estudo contribuiu ainda com novos registos de nomes locais e comuns em Nyaneka e também Português, e que constituem adições à recém publicada lista de nomes comuns da flora angolana. A lista de sinónimos referidos neste estudo encontra-se em anexo e inclui 31 espécies de plantas (Anexo 1).

Figura 4 Percentagem das principais famílias de plantas medicinais do arquivo do colector e ex-curador do Herbário José Maria Daniel. 

Tabela  Principais plantas medicinais documentadas para a Província da Huíla, partes usadas e principais doenças que curam. Estas informações basearam-se nos registos de campo do colector José Maria Daniel. As espécies com o expoente (e) são endémicas da região e (*) constituem as plantas introduzidas e/ou naturalizadas. 

Nome ( científico e Família) Forma de utilização e órgãos da planta utilizados Atributos terapêuticos
Abutilon mauritianum (Jacq.) Medik. (Malvaceae) Decoção das folhas Emulgente
Adenia lobata (Jacq) Engl. (Passifloraceae) Decoção dos rebentos e folhas Anti-helmíntico
Adenia rumicifolia (Engl & Harms) (Passifloraceae) Decoção da casca do tronco, frutas comestíveis Fracturas dos membros
Aerva lanata (L) Juss. ex Schult. (Amaranthaceae) Infusão da planta Anti-diarreica
Blumea gariepina DC. (Asteraceae) Infusão da planta Alívio de dores reumáticas
Boerhavia adscendens Willd. (Nyctaginaceae) Decoção do rizoma Combate de hemorragia
*Brassica nigra Carvalho & Vasconcelos (Brassicaceae) Cataplasma da sementes Reumática
*Cajanus cajan (L.) Millsp. (Fabaceae) Decoção das folhas Gargarejos e dores de dentes
Canarium schweinfurthii Engl. (Burseraceae) Resina do tronco Feridas e úlceras
Cassia angolensis Welw. ex Hiern (Fabaceae) Infusão da casca do tronco Desparasitante
Catha edulis Forssk. (Celastraceae) Infusão de folhas secas Mastigatório (acção não especificada)
*Chenopodium ambrosioides L. (Chenopodiaceae) Infusão das folhas Oxiurose
Cissus aralioides (Welw. Ex Baker) Planch. (Vitaceae) Raspas da casca do caule Coloca-se sobre as feridas para evitar infecções
Cissus rubiginosa (Welw. Ex Baker) Planch. (Vitaceae) Maceração das folhas Dores no pescoço
Cissus sp. (Vitaceae) Maceração das folhas Esfregaço sobre o corpo afugenta serpentes
e Cochlospermum angolense Welw. ex Oliv. (Cochlospermaceae) Decoção da raiz Hepatites, depurador sanguíneo
Combretum camporum Engl. (Combretaceae) Decoção da casca da raiz Anti-helmíntico
Crassocephalum multicorymbasum (Klatt) S.Moore (Asteraceae) Infusão das folhas Desinfectante, calmante, dores reumáticas.
Crotalaria amoena Welw. ex Baker (Fabaceae) Decoção das raizes Contra retenção urinária
Cymbopogon densiflorus (Steud.) Stapf. (Poaceae) Decoção das raízes Prisão de ventre
Cynodon dactylon (L.) Pers. (Poaceae) Decoção das raizes Diurético e doenças inflamatórias das vias urinarias
*Datura stramonium L. (Solanaceae) Maceração das folhas, fumaça Alívio de dores reumáticas
Dichapetalum lujae De Wild & T.Durand (Dichapetalaceae) Decoção da raiz Vermes intestinais (lombrigas)
Diospyros lycioides Desf. (Ebenaceae) Decoção das raizes Purgante
e Dolichos dongaluta Baker (Fabaceae) Rizoma Anginas gangrenosas
Dorstenia psilurus Welw. (Moraceae) Rizoma Doenças do aparelho urinário e dores menstruais
Euclea divinorum Hiern (Ebanaceae) Decoção da casca da raiz Purgante
Fragaria vesca L. (Rosaceae) Infusão do rizoma e folhas Anti-diarreico
Garcinia mannii Oliv. (Clusiaceae) Decoção da semente Dores estomacais
Hannoa klaineama Pierre ex Engl. (Scrophulariaceae) Infusão da casca da raiz e do tronco Cólicas e febres
Heeria sp. (Anacardiaceae) Infusão das folhas Vómitos
Hymenodictyon floribundum (Hochst. & Steud.) Rob. (Rubiaceae) Decoção das cascas Febrífuga e anti-palúdica
Lannea antiscorbutica (Hiern) Engl. (Anacardiaceae) Casca e entrecasca Infecções escorbúticas, anti-fungico e contração do canal vaginal
Lefebvrea welwitschii Engl. (Apiaceae) Planta inteira Dores toráxicas
Lippia asperifolia (Verbenaceae) Decoção da planta inteira Banhos puérperais
Lonchocarpus sericeus (Poir) Kunth ex DC. (Fabaceae) Folhas, casca fresca ou seca e suco Actividade microbiana (não especificada)
e Millettia aromatica Dunn. (Fabaceae) Fricção do cerne tronco Cefalalgias reumáticas
Millettia drastica Welw. ex Baker (Fabaceae) Decoção da semente Purgante
Mimusops cuneifolia Baker (Sapotaceae) Decoção da casca Prisão de ventre
Monodora myristica (Gaertn.) Dunal (Annonaceae) Sementes Corrimento e dores estomacais
Monodora tenuifolia Benth. (Annonaceae) Decoção das raizes Desinterias e dores de dentes
Mucuna pruriens (L.) DC. var. pruriens (Papilionaceae) Decoção das flores e maceraçao das raizes Combate de tosse e constipações
Myrothamnus flabellifolius Welw. (Myrothamnaceae) Infusão da planta Dores lombares, distúrbios renais, hemorroides, demenorreia, tónico energético, resfiamentos e loção para escoriações
Ocimum americanum L. (Labiatae) Infusão da planta Anti-helmíntica e doenças dos olhos
Ocimum viride Willd. (Labiatae) Infusão das folhas e extremidades florais Febrífuga e sudorífica, tónico e calmante
Osyris lanceolata Hochst. & Steud. (Santalaceae) Infusão da planta inteira Pneumonia
Palisota sp. (Commelinaceae) Maceração das folhas Dores intestinais
Parinari curatellifolia Plach. ex Benth. (Chrysobalanaceae) Infusão das folhas Febres altas
Paropsia brazzalana Baill. (Passifloraceae) Infusão das folhas Anti-fungíco, elimina caspa
Peltophorum africanum Sond. (Fabaceae) Infusão das raizes Combate a biliose
Picralima klaineana Welw. ex Hiern (Apocynaceae) Decoção do fruto Dores intestinais
Pimpinella platyphylla Welw. (Umbelliferae) Decoção da raiz Usado contra cólicas e diarreias
Pistia stratiotes L. (Araceae) Cataplasma das folhas misturando com o leite de coco Tratamento de hemorroides
Plumbago zeylanica L. (Plumbaginaceae) Raizes Lepra e anti-caustica
Ptaeroxylon obliquum (Thumb.) Radlk (Pteroxylaceae) Decoção da casca do tronco Anti-paludico
Pterocarpus tinctorius Welw. (Fabaceae) Planta inteira Carminativa
Spathodea companulata Beauv. (Bignoniaceae) Flores Tratamento de chagas e feridas ulcerosas

Tabela 2 Nomes locais em Nyaneka (Nya) e em Português (PT) dos principais taxa, e respectivas famílias referidos no presente estudo como ornamentais (Or), forrageiras (Fo), alimentares (Al), tóxicas ou venenosas (To) e condimentares (Co). (*) Plantas introduzidas e/ou naturalizadas. 

Nome científico (Família) Nome local (Nya) Nome local (PT) Or Fo Al To Co
Acacia brevispica Harms (Fabaceae) Olukienye          
Acacia tristis (Welw. ex Oliv.) A.Schreib. (Fabaceae) Omunkhondo          
Adenodolichos huillensis Torre var. huillensis (Fabaceae) Omanhingua          
*Agave sisalana Perrine (Agavaceae)   Sisal        
Albizia adianthifolia (Schumach.) W.Wight var. intermedia (Fabaceae)            
Albizia coriaria Wel. ex Oliv. (Fabaceae)            
*Amaranthus caudatus L. (Amaranthaceae) Omboa Chorões-dos-jardins        
Amaranthus lividus L. (Amaranthaceae) Omboa          
Amaranthus sp. (Amaranthaceae) Omboa          
Amblygonacarpus obtusangulus (Oliv.) Harms            
Ancylanthos sp. (Rubiaceae) Enngen          
Andropogon gayanus Kunth. (Poaceae) Kota-kota          
Annona muricata L. (Annonaceae)   Fruta-pinha        
Bauhinia tomentosa L. (Fabaceae) Otyengangu          
Bidens biternata (Lour.) Merr. & Shuff. (Asteraceae) Omukolokoho          
Bobgunnia madagascariensis (Desv.) J.H.Kirkbr. & Wiersema (Fabaceae) Omuhombo Pau-rosa        
*Bougainvillea glabra Choisy (Nyctaginaceae)   Buganvília        
Brachiaria brizantha (A.Rich.) Stapf. (Poaceae)   Capim-ocinde        
Brachystegia sp. (Fabaceae)            
*Canna indica L. (Cannaceae)   Cana-da-Índia        
Capsicum annuum L. (Solanaceae) Omundungu Pimententeira-jindungo        
*Capsicum sp. (Solanaceae) Okatiata          
Carissa edulis (Forssk.) Vahl (Apocynaceae) Omunhongolo          
Cassia fistula L. (Fabaceae)   Cana-fistula        
Chrysophyllum argyrophyllum Hiern (Sapotaceae) Omutomboti          
Clematis chrysocarpa Welw. ex Oliv. (Ranculaceae) Epeke-peke          
Colophospermum mopane (J. Kirk ex Benth.) J.Léonard (Fabaceae) Omuntiati          
Conyza gouanii (L.) Willd. (Asteraceae) Ombambambilingui          
*Cosmos bipinnatus Cav. (Asteraceae)   Cosmea        
Cynodon dactylon (L.) Pers. (Poaceae) Otyiwena Escalrracho        
*Dianthus caryophyllus L. (Caryophyllaceae)   Craveiro        
Dichrostachys glomerata (Forssk.) Chiov. (Fabaceae) Muhaniambungu          
Dioscorea quartiniana A.Rich. (Dioscoreaceae)            
*Dahlia rosea Cav. (Astercaeae)   Dálias        
Echinochloa pyramidalis (Lam.) Hutch. & Chase (Poaceae)            
Eragrostis racemosa (Tumb) Steud. (Poaceae)            
Eriospermum flexuosum Welw. ex Baker (Eriospermaceae) Otchilombangolongo          
Euphorbia rhipsaloides Welw. (Euphorbiaceae)   Almeidinha        
Fadogia monticola Robyns (Rubiaceaceae) Otyiningui          
Ficus elastica Roxb. (Moraceae) Omulemba Figueira-da-borracha        
Ficus gnaphalocarpa (Miq.) Steud. ex Miq. (Moraceae) Omukuyumbua        
Ficus petersii Warb. (Moraceae) Omuholo          
Ficus pygmaea Welw.ex Hiern (Moraceae) Otchikuiu          
Ficus welwitschii Warb. (Moraceae) Omulemba-mbuja          
Gerardiina angolensis Engl. (Orobanchaceae)            
Gnidia chrysantha Gilg. (Thymaelaceae)            
*Gomphrena globosa L. (Amaranthaceae)   Perpêtuas-roxas        
Heeria argyrocrysea Engl & Gilg. (Asteraceae)            
Helichrysum steetzii (Vatke) O.Hoffm. (Asteraceae) Oluhiti          
Heteropogon contortus (L.) Roem. & Schuet. (Poaceae) Capiongo Capim-osoke        
Hyparrhenia familiaris (Steud.) Stapf. (Poaceae)            
*Ipomoea batatas (L.) Lam. (Convolvulaceae)   Batata-doce        
*Jacaranda mimosifolia Dow. (Fabaceae)   Jacarandá        
*Lantana camara L. (Verbenaceae)   Lantano        
*Leucaena glauca Benth. (Fabaceae) (sin. Leucaena leucocephala (Lam.) De Wit.)   Lantoro        
*Ligustrum japonicum Thumb. (Oleaceae)   Alfenheiro-do-Japão        
Loudetia simplex (Nees) C.E.Hubb. (Poaceae)            
*Melia azedarach L. (Meliaceae)   Amargoseira        
Melinis minutiflora P. Beauv. (Poaceae)   Capim-gordura        
*Mirabilis jalapa L. (Nyctagynaceae)   Maravilha-do-Perú        
*Morus alba L. var. multicaulis (Perr.) Loudon (Moraceae)   Amoreira-branca        
Mucuna stans Welw. ex Baker (Fabaceae) Hainumata Feijão-maluco        
Mundulea sericea (Willd.) A. Chev. (Fabaceae) Onkongo          
*Nasturtium offcinale R.Br. (Brassicaceae)   Agrião-de-água        
*Nasturtium sp.( Brassicaceae)   Agrião        
*Nerium oleander L. (Apocynaceae)   Cevadilha      
Parinari curatellifolia Planch. ex Benth. (Chrysobalanaceae) Ontyahi          
*Parkinsonia aculeata L. (Fabaceae)   Espinheiro-de-Jerusalém      
Peucedanum angolense (Welw. ex Ficalho) Cannon (Apiaceae) Ondunda          
Phragmites mauritianus Kunth. (Poaceae) Humbu Caniço        
*Physalis peruviana L. (Solanaceae) Omutipatipa          
Phytolacca dodecandra L´Hér. (Phytolaccaceae            
*Pimpinella anysum (Apiaceae)   Erva-doce        
*Populus alba L. (Salicaceae)   Choupo        
Psorospermum tenuifolium Hook.f. (Hypericaceae)            
Pteleopsis anisoptera (Welw.ex M.A.Lawson) Engl & Diels (Combretaceae) Omuhihi          
*Raphanus raphanistrum L. (Brassicaceae)   Rabanete; Couve-nabo        
Rhus natalensis Bernh. (Anacardiaceae) Omukukumbendye          
Rhus sp. (Anacardiaceae)            
Rhynchelytrum repens (Willd.) C.E.Hubb. (Poaceae) Onkhulungumbe Capim-favorita        
*Rosa spp. (Rosaceae)   Roseira        
*Sambucus nigra L. (Adoxaceae)   Sabugueiro        
Setaria flabellata Stapf. (Poaceae)            
Sida alba L. (Malvaceae)          
Sorghum cafrorum (Retz.) P.Beauv. (Poaceae) Oinaha Massambala         
Sorghum sp. (Poaceae)   Massambala        
Sorghum sp. (Poaceae) Omuha          
Strychnos aculeata Soler (Strychnaceae)            
Stylosanthes sp. (Fabaceae)            
*Tagetes erecta L. (Asteraceae)   Cravo-da-Índia        
Tarchonanthus camphoratus L. (Asteraceae) Omukando Pau-quicongo-da-Huíla        
Tephrosia cephalantha Welw. ex Baker (Fabaceae)            
Tephrosia vogelii Hook.f. (Fabaceae) Kadia-sasa Mata-peixe        
Tetrapleura tetraptera (Schumach. & Thonn.)Taub. (Fabaceae)            
*Thevetia peruviana (Pers.) Schum. (Apocynaceae)   Chapéu-de-Napoleão        
*Thuja orientalis L. (Cupressaceae)   Árvore-da-vida        
Vernonia gerberiformis Oliv. & Hiern subsp. macrocyanus (O. Hoffm.) C.Jeffrey (Asteraceae) Ekakaholua          
Vetiveria nigritana (Benth.) Stapf. (Poaceae)            
*Vigna unguiculata (L.) Walp. (Fabaceae) Macunde Feijão-frade        
*Zea mays L. (Poaceae)   Milho        
*Zinnia elegans Jacq. (Asteraceae)   Zínia        

4. Discussão

Angola é um país com com imensa diversidade biológica que desde cedo despertou o interesse de colectores botânicos, como Friedrich Welwitsch, Hugo Baum e John Gossweiler que se destacaram pela importância das suas coleções (Figueiredo & Smith, 2008; Figueiredo et al., 2009). Existem, entretanto, muitos outros colectores que deram o seu contributo para o conhecimento da flora do país e da Província da Huíla em particular (Gonçalves, 2009). Encontrar informação sobre estes colectores não é uma tarefa fácil, pois os dados sobre a sua vida e obra encontram-se dispersos por várias fontes e, muitas vezes, publicados em diferentes línguas (Figueiredo & Smith, 2008). A vida e obra dos colectores nacionais é ainda mais difícil de investigar, porque muitos deles trabalharam apenas como auxiliares dos principais colectores da época, não tendo sido referidos nem devidamente reconhecidos no que se refere ao espólio que deixaram e no que produziram para o conhecimento da flora angolana. Poucos são os colectores nacionais que se destacaram no período pós-independência de Angola, uma vez que o país mergulhou numa guerra civil, que destruiu as infraestruturas que existiam na altura, relegando a investigação científica para segundo plano.

O conhecimento etnobotânico de Angola é escasso e encontra-se restrito ao conhecimento tradicional sendo, no entanto, reconhecido o seu valor social, cultural e também espiritual. Apesar do poder de cura que é atribuído às plantas, muito pouco tem sido feito relativamente ao respectivo conhecimento químico. Para o conhecimento etnobotânico de Angola podem-se destacar os trabalhos pioneiros de Brito Teixeira (1960), Óscar Azancot de Menezes (unpub.) e Manuela Batalha Van-Dúnem (1979; 1994) cujos resultados não estão adequadamente explorados. Mais tarde, destacaram-se os trabalhos de Bossard (1996) sobre a medicina tradicional no Centro e Oeste de Angola, de Rosa Melo (2008) sobre plantas medicinais dos Handas do Sul de Angola e, mais recentemente, um estudo de Raquel Kissanga (2006) sobre a valorização da flora e utilização das plantas lenhosas como combustível e na construção no planalto central e sudeste de Angola.

O trabalho de José Maria Daniel tem um elevado valor para a divulgação do conhecimento da flora da Província da Huíla, bem como da sua utilização pela população local, com destaque para quatro municípios, nomedamente Lubango, Humpata, Chibia e Gambos. A ausência de informação florística referente aos restantes municípios deve-se, provavelmente, às dificuldades de acesso a estas áreas durante o período em que o colector trabalhou, e pela insegurança que caracterizou muitas regiões do país. Grande parte das plantas referidas neste estudo como medicinais, encontram-se igualmente referidas em vários estudos desenvolvidos no país e noutras regiões, com ênfase à parte austral do continente africano. Os órgãos utilizados, bem como as respectivas aplicações variam muito de região para região. Estudos realizados em Angola indicam a utilização das raízes carnosas de Cochlospemum angolense no tratamento preventivo de icterícia e de biliosas, além de ser um excelente diurético; Lippia asperifolia cuja infusão das folhas é utilizada no tratamento de pontadas e dores de peito provocadas, possivelmente por constipações, enquanto a infusão das folhas e inflorescências de Cymbopogon densiflorus está referida como sendo um eficaz febrífugo, em constipações e possivelmente pneumonias (Teixeira, 1960). Num outro estudo realizado no Zimbabwe algumas das plantas referidas no nosso estudo como medicinais, alimentares e forrageiras são assinaladas com outras aplicações, como acontece, por exemplo, com Carissa edulis (=Carissa spinarum), Parinari curatellifolia, Diospyros lycioides, Peltophorum africanum, Lantana camara e Lippia asperifolia (Maroyi, 2013), algumas espécies como Colophospermum mopane, Cynodon dactylon e Ficus sycomorus (Ficus gnaphalocarpa), referidas apenas como forrageiras por JMD, são atribuídos outros atributos, assim como é o caso de C. mopane cujo produto resultante da infusão das folhas, cascas do tronco e raíz moída, é utilizado no tratamento de disenterias, alívio de dores estomacais e no tratamento de doenças venéreas como a sífilis (Ribeiro et al., 2010; Chinsembu, 2016).

Ficus sycomorus cujos frutos são comestíveis, é utilizado no tratamento de micoses e de outras doenças dermatológicas, enquanto às folhas de Cynodon dactylon são atribuídas propriedades ginecológicas (Ribeiro et al., 2010). Diospyros lyciodes, Euclea divinorum, Peltophorum africanum e Plumbago zeylanica foram igualmente referidas no tratamento de várias infecções de transmissão sexual, num estudo recente realizado na Zâmbia (Chinsembu, 2016). Pelo contrário este estudo é coincidente com as aplicações atribuídas à espécie Myrothamnus flabellifolius, no que se refere às múltiplas utilidades da planta, e com Hymenodictyon floribundum, pelas propriedades anti-palúdicas da casca deste arbusto, comum nas regiões montanhosas do planalto da Huíla (Bossard, 1996).

As plantas forrageiras e tóxicas principalmente para o gado, constituem outra importante fonte de informação do colector. Esta vasta lista, inclui herbáceas como Sida alba e várias gramíneas como Mellinis minutiflora, Brachyaria brizantha, Heteropogon contortus e Andropogon gayanus. Algumas destas espécies foram referidas como forrageiras de grande valor nutricional para o gado, num estudo realizado entre as comunidades pastoris da Bibala, Cahama e Gambos, municípios pertencentes às Províncias do Namibe, Cunene e Huíla, respectivamente (Maiato & Sweet, 2011). As plantas tóxicas ou venenosas incluem várias espécies da flora local como Bobgunnia madagascariensis, Mucuna stans, Mundulea sericea entre outras, e espécies introduzidas como Nerium oleander, Parkinsonia aculeata e Agave sisalana, esta última cultivada em larga escala em quase toda a África austral para fins industriais (Walters et al., 2011).

Outras espécies que não fazem parte da flora nativa foram introduzidas devido provavelmente ao seu valor nutricional, medicinal ou mesmo ornamental, tornando-se naturalizadas. Assim, Lantana camara e outras da flora local como Parinari curatellifolia e Rhus natalensis têm um reconhecido valor nutricional e até hoje a planta inteira ou pelo menos partes destas têm sido utilizadas como plantas alimentares e/ou medicinais. Pimpinella anisum, além de ser usada na alimentação, têm um reconhecido valor medicinal. O milho (Zea mays) é de extraordinária relevância por fazer parte da dieta alimentar das populações da região, devido ao seu grande valor energético e riqueza em amido (Melo, 2008). O valor do milho como planta medicinal também foi muitas vezes referido em estudos realizados no país no tratamento de infecções urinárias, prevenção e tratamento de má nutrição, hipotensão, doenças musculares e ósseas, sendo ainda um excelente diurético (Costa & Pedro, 2013). Estudos realizados no Brasil são coincidentes no que se refere ao uso de todos os órgãos da planta para fins medicinais, no tratamento da hipertensão, cistites e também no tratamento de doenças renais (Vendruscolo & Mentz, 2006).

Finalmente, foi possível constatar que a infusão e decoção constituem as principais formas de preparação e utilização medicinal das plantas, o que pode estar ligado ao facto de que estas formas de preparação permitem várias aplicações dos extratos como medicamento. Relativamente aos órgãos usados destacam-se as folhas, raízes e, nalguns casos, principalmente nas herbáceas, o uso da planta inteira na preparação das soluções. Estas informações constituem uma questão preocupante, devido ao facto de que a remoção de raízes ou de plantas inteiras poderá a longo prazo levar à diminuição ou mesmo a extinção local de algumas destas espécies, se tivermos em conta a grande procura no uso de plantas medicinais que se verifica actualmente.

5. Conclusão

O presente estudo resume as principais informações contidas nos cadernos e notas de campo do colector JMD, no que se refere à utilização de plantas na Província da Huíla. O trabalho representa um significativo contributo para o conhecimento da flora da região, dos usos e costumes das populações que utilizam estas plantas como medicinais e para diversos fins. Grande parte dos dados aqui apresentados basearam-se nas informações prestadas pela população e por terapeutas tradicionais. Neste contexto, é encorajada a realização de trabalhos mais aprofundados e cientificamente sustentados que permitam a descoberta da composição química e dos princípios activos destas plantas visando a produção de medicamentos para o tratamento das várias doenças que afligem a nossa sociedade.

Anexo 1 Algumas espécies referidas no texto e respectivos sinónimos. A lista de sinónimos foi extraída da checklist de Plantas de Angola de Figueiredo & Smith 2008

Nome científico Sinónimo
Acacia tristis (Welw. ex Oliv.) A.Schreib. Acacia hebeclada DC. subsp. tristis DC.
Adenia letouzeyi W.J. de Wilde Adenia lobata Engl.
Adenia rumicifolia Engl. & Harms Adenia lobata (Jacq.) Engl. subsp. rumicifolia (Engl. & Harms) Lye
Amblygonocarpus andongensis (Oliv.) Excell & Torre Amblygonocarpus obtusangulus (Oliv.) Harms
Blumea gariepina DC. Blumea decurrens (Vahl.) Mersem
Boerhavia adscendens Willd. Boerhavia diffusa L.
Carissa edulis (Forssk.) Vahl. Carissa spinarum L.
Chrysophyllum argyrophyllum Hiern Englerophytum megalismontanum DC.
Combretum polystictum Welw. ex Hiern Combretum camporum Engl.
Crassocephalum multicorymbasum (Klatt) S.Moore Solanecio mannii (Hook.f) C.Jeffrey
Eragrostis chalcantha Trin. Eragrostis racemosa (Thunb.) Steud.
Euphorbia rhipsaloides Welw. Euphorbia tirucalli L.
Fadogia monticola Robyns Fadogia homblei De Wild.
Ficus brevicula Hiern Ficus pygmaea Welw. ex Hiern
Ficus gnaphalocarpa (Miq.) C.C.Berg. Ficus sycomorus L.
Ficus welwitschii Warb. Ficus cordata Thunb. subsp. cordata Thunb.
Gomphrena globulares L. Gomphrena globosa L.
Hannoa klaineana Pierre ex Engl. Quassia undulata (Guill. & Perr.) D.Dietr.
Heeria argyrocrysea Engl & Gilg. Ozoroa argyrochrysea Engl. & Gilg.)R.Fern. & A.Fern:
Helichrysum steetzii (Vatke) O.Hoffm. Helichrysum kraussii Sch.
Hymenodictyon kurria Hochst. Hymenodictyon floribundum (Hochst. & Steud.) Rob.
Lefebverea welwitschii Engl. Lefebverea grantii (Kingston ex Oliv.)
Leucaena glauca Benth. Leucaena leucocephala (Lam.) De Wit.
Lippia asperifolia Rich. Lippia javanica (Burm.f.) Spreng.
Mimusops cuneifolia Baker Manilkara obovata (Sabine & G.Don) J.H.Hemsl.
Ocimum viride Willd. Ocimum gratissimum L. subsp. gratissimum L.
Osyris abyssinica Hochst. & A.Rich. Osyris lanceolata Hochst. & Steud.
Picralima klaineana Welw. ex Hiern Picralima nitida (Stapf) T.Durand & H.Durand
Pimpinella platyphylla Welw. Pimpinella huillensis Welw. Ex Engl.
Rhynchelytrum repens (Willd.) C.E.Hubb. Melinis repens (Willd.) Zizka subsp. repens
Vetiveria nigritana (Benth.) Stapf. Chrysopogon nigritanus (Benth.) Veldkamp

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6. Agradecimentos: Os autores agradecem à Direcção do ISCED Huíla pelo apoio prestado, à equipa do Herbário do Lubango pela colaboração no acesso às informações constantes nos cadernos de campo, e a José Camôngua Luís pela elaboração do mapa da área de estudo abrangida por este trabalho.

Recebido: 21 de Maio de 2018; Aceito: 01 de Outubro de 2018

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