Introdução
Os métodos de role-play devem ser interpretados à luz de estratégias de ensino que contemplem uma educação para a cidadania intercultural (Porto & Byram, 2015; Porto, Houghton & Byram, 2018) na qual os estudantes possam adquirir os conhecimentos e competências necessárias no âmbito de uma comunidade internacional que engloba vários conjuntos de valores culturais, crenças e comportamentos. A cidadania intercultural envolve a interação com outras realidades socioculturais do indivíduo bem como da sua perceção das relações com pessoas de diferentes grupos sociais. Estes princípios cognitivos e comportamentais devem ser postos em prática não somente no que diz respeito ao contacto com o Outro, mas devem constituir valores importantes para os estudantes independentemente do contexto em que se encontrem. Por estes motivos, a cidadania intercultural implica preparar os estudantes para agirem como “cidadãos ativos na comunidade local e na comunidade internacional” (Porto et al., 2018, p. 3) e a sala de aula de língua não materna apresenta-se como um espaço apropriado para o desenvolvimento desta atitude crítica onde as atividades de role-play podem possibilitar a abordagem e o diálogo sobre estes valores de uma forma ativa e participativa. No contexto de uma cidadania intercultural aplicada ao ensino de línguas que incentiva um espírito crítico e autónomo, este estudo tem como propósito compreender o impacto dos métodos de role-play no desenvolvimento de competências
comunicativas e socioculturais dos estudantes de Português da Universidade de Macau. O objetivo é analisar a forma como os estudantes encaram as atividades de role-play como método de aprendizagem de língua não materna e como meio para trabalharem diferentes competências enquanto cidadãos de uma sociedade global. Para este fim, foram realizados questionários nos quais os alunos registaram os seus pareceres sobre os métodos de role-play, as diferentes fases destas atividades e as implicações nas suas competências pessoais e sociais.
Revisão da literatura
As dramatizações, simulações ou recriação de situações quotidianas da vida real são estratégias de ensino usadas para aumentar o interesse e a participação dos alunos, pois o conhecimento é construído a partir da experiência do aluno e não da simples receção de conteúdos. Para Bork (2006) este tipo de atividade proporciona um contato mais direto e pessoal, fomentando um papel ativo na elaboração das tarefas e um clima interacional desejável, uma vez que os alunos organizam, constroem e apresentam os seus conteúdos além de discutirem e comentarem as prestações dos colegas. Estas atividades inserem-se numa visão do ensino que não aborda a língua apenas como um sistema gramatical e estrutural, mas como um meio comunicativo e comportamental que introduz uma maior relação entre a prática e a teoria.
Na visão de Checin (2018) com os métodos de role-play os alunos desenvolvem valores modelando e usando exemplos da vida real, desempenhando papéis atribuídos sobre uma determinada situação social, literária ou contemporânea, a fim de compreender essa situação de forma mais completa. Segundo Kuśnierek (2015) estas estratégias são parte de um ensino em que as crenças e valores do aluno são usados na interpretação da realidade e da sociedade, contribuindo para tornar a aprendizagem um processo ativo de construção de significado a partir da experiência e da reflexão sobre essa experiência do mundo. A aprendizagem é vista como um processo colaborativo no qual múltiplas perspetivas são consideradas e democraticamente discutidas, o que requer o papel preponderante do professor enquanto mediador. Neste âmbito, os professores devem investir tempo na conceção e organização destes métodos de ensino para criar as condições necessárias para o envolvimento e interação dos elementos da turma e para o
desenvolvimento das competências individuais dos alunos.
De acordo com Cherif e Somervill (1995) existem cinco passos necessários que o professor deve ter em conta para utilizar uma atividade de role-play, nomeadamente, a formulação do problema ou tópico a ser abordado, as personagens ou papéis que irão ser desempenhados, o contexto e as informações que os alunos devem conhecer ou pesquisar, as funções ou etapas que cada estudante ou grupo de estudantes deve cumprir e os procedimentos para a apresentação da dramatização da peça. Por estes motivos, os role-play requerem bastante tempo e compromisso para serem levados a cabo. Os autores salientam também que os professores devem possuir competências de mediação e resolução de conflitos dado que as dramatizações incluem “tópicos sociais, políticos, económicos e culturais, inseparáveis da nossa vida diária e, portanto, muito próximos das experiências dos alunos” (p.29). Em relação ao design das atividades de role-play no ensino de língua, Cherif e Somervill, descrevem algumas questões sobre as quais se deve refletir antes de realizar uma atividade desta natureza. Primeiro, é importante
escolher um tópico contemporâneo e importante do mundo real que proporcione aos alunos uma experiência desafiadora; em segundo lugar, a dramatização deve ser delineada para que não haja respostas certas ou erradas porque a avaliação depende da qualidade das pesquisas, da capacidade de persuasão dos participantes, da clareza e qualidade dos seus argumentos e da criatividade e inovação que apresentam. É também importante projetar a dramatização de uma forma que permita aos alunos planear, pesquisar e trabalhar cooperativamente, misturando, se possível, alunos com diferentes proficiências linguísticas. Os professores devem explicar detalhadamente o propósito da dramatização, explicitando as tarefas e as responsabilidades de cada indivíduo ou grupo. Devem também incentivar os seus alunos a usar diversos materiais de um amplo leque de fontes e referências para poderem estar abertos a uma grande variedade de opiniões e argumentos sobre o tema. No que respeita à fase de apresentação, é importante que o professor estabeleça o ambiente apropriado para um debate sério, organizando a sala de aula de forma adequada para a apresentação e discussão, informando os alunos das regras a adotar nesta fase da atividade. Por fim, os autores afirmam que os professores
devem elaborar algumas perguntas de avaliação para serem discutidas após a conclusão do projeto de dramatização e incentivar os alunos a participarem na análise crítica do role-play.
A literatura sobre a aplicação dos métodos de role-play no ensino de línguas revela também que estas atividades permitem ajudar a trabalhar diversos tipos de competências dos estudantes. De seguida, serão abordados alguns aspetos que a literatura sobre o tema destaca, nomeadamente, a importância destes métodos para desenvolver: as competências linguísticas, sobretudo de produção oral; as competências pessoais e interpessoais como a interação e o trabalho em equipa; a motivação e a autonomia do aluno no processo de aprendizagem; o espírito crítico (valores e atitudes) acerca das questões mais prementes da sociedade.
Vários estudos indicam que os role-play permitem superar a timidez ou o receio de falar em público e ajudam a desenvolver competências de oralidade, nomeadamente, de vocabulário, pronúncia e fluência (Lin & Suwanthep, 2011; Naidu & Linser, 2000; Rahayu, 2015; Rashid & Qaisar, 2017). Esta pode ser uma característica particularmente proveitosa para os estudantes mais introvertidos associados a culturas de aprendizagem mais focadas no conhecimento do que nas competências dos alunos ou na organização de atividades, como a cultura chinesa (Jin & Cortazzi, 2006). Por este motivo as atividades de role-play podem ser uma “máscara para os estudantes chineses combaterem a timidez e vergonha associada à produção e fluência oral” (Rahayu, 2015, p. 66) potenciando também a motivação e a criatividade, uma vez que os estudantes podem praticar conteúdos menos abordados pelos métodos mais tradicionais.
Os role-play possibilitam também desenvolver capacidades de iniciativa e organização, contribuindo para desenvolver a autoconfiança e as relações interpessoais e sociais dos alunos e para praticar a comunicação em diferentes contextos através do desempenho de diferentes papéis sociais (Bhattacharjee & Ghosh, 2013; Dorathy & Mahalakshmi, 2011; Krebt, 2017; Rahayu, 2015; Rashid & Qaisar, 2017; Rojas & Villafuerte, 2018). O sucesso das estratégias de aprendizagem tem maior probabilidade de ser alcançado quando os estilos pedagógicos adotados envolvem o engajamento e a interação ativa dos alunos. Os role-play, por recriarem cenários realistas, permitem que os alunos resolvam problemas desafiadores do mundo real num ambiente seguro enquanto constroem a capacidade de interagir e entender o Outro. Para Rojas e Villafuerte (2018) através dos role-play, ao contrário dos métodos tradicionais, as informações sobre os conteúdos linguísticos encontram-se relacionadas com situações reais, algo que está mais próximo da forma como as pessoas devem adquirir uma língua, ou seja, produzindo mensagens significativas e devidamente contextualizadas na língua de destino.
As atividades de role-play estão também ligadas ao desenvolvimento da autonomia na aprendizagem, preconizando um ensino onde o aluno tem oportunidade de assumir um papel dinâmico no processo de aquisição de conhecimento e participar ativamente na troca de informações, ao invés de ser um recetor passivo de materiais didáticos (Baranovskaya & Shaforostova, 2018; Bhattacharjee & Ghosh, 2013; Rashid & Qaisar, 2017; Rojas & Villafuerte, 2018). Para Rojas e Villafuerte (2018) os métodos de role-play dizem respeito a uma aprendizagem centrada no aluno onde o conhecimento é construído em interação com os colegas e o professor assume o papel de mediador da sala de aula. Esta ideia é partilhada por Baranovskaya e Shaforostova (2018) cujos resultados de pesquisa enfatizam também a importância destes métodos para promover a motivação e a autonomia.
Os autores defendem que é necessário envolver os alunos na definição dos objetivos e nos conteúdos de ensino e que as atividades de dramatização podem motivá-los a envolver-se ativamente no processo de aprendizagem. Por seu turno, o professor deve auxiliar ou mediar com clareza esta interação de modo a fomentar a participação e a autonomia dos alunos no processo de ensino e aprendizagem.
As aulas de role-play constituem também um ambiente favorável e produtivo para a promoção do pensamento crítico, em termos de competências, valores e atitudes (Bhattacharjee & Ghosh, 2013; Dorathy & Mahalakshmi, 2011; Krebt, 2017; Rashid & Qaisar, 2017). Este tipo de aulas são parte de um método de ensino holístico que inculca o processo de pensamento crítico e veicula conhecimentos sobre atitudes, emoções e valores morais. Através da variedade de situações recriadas e da discussão que normalmente estas atividades encerram, os alunos são incentivados a comunicar e a interagir, aprimorando as suas competências no idioma de destino, mas também partilhando uma reflexão crítica em relação às problemáticas do mundo real que são trazidas ou discutidas no espaço da sala de aula.
Estes métodos podem ainda assumir influência no desenvolvimento das características
individuais dos estudantes. As características individuais influenciam a aprendizagem da língua e também a aquisição de competências socioculturais, sobretudo os fatores que se relacionam com as atitudes, motivações, crenças ou valores que contribuem para a formação da identidade pessoal. Uma vez que os traços de personalidade “afetam significativamente os atos comunicativos, mas também a capacidade para aprender” (Conselho da Europa, 2001, p. 153), o ensino de línguas envolve também o desenvolvimento de características individuais como a abertura, o interesse e a motivação por novas experiências e por diferentes tópicos ou pontos de vista, aspetos de personalidade que devem ser trabalhados.
O desejo de aprender e conhecer é motivador para compreender outros modelos de interpretação da realidade, romper barreiras culturais e para a comunicação cultural e intercultural. Byram, Gribkova e Starkey (2002) referem que o papel dos professores é o de ajudar os alunos a desenvolver as suas capacidades de interação num mundo em que as pessoas possuem múltiplas identidades que compõem a própria individualidade. A importância da sala de aula enquanto espaço para desenvolver as competências individuais e sociais como partes integrantes da competência social e intercultural no contexto da aprendizagem de uma língua encontra-se expressa no seguinte excerto de Byram et al. (2002): Its essence of is to help language learners to interact on equal terms, and to be aware of their own identities and those of their interlocutors. It is the hope that language learners who thus become ‘intercultural speakers’ will be successful not only in communicating information but also in developing a human relationship with others. (Byram et al., 2002, p. 7).
Metodologia
Este estudo é baseado numa análise quantitativo-qualitativa, privilegiando uma abordagem conjunta, estatística e reflexiva, através da aplicação de questionário, instrumento composto itens padronizados de modo a “mensurar atributos ou características relacionadas com pessoas, organizações, processos ou fenómenos” (Coelho, Souza & Albuquerque, 2019, p. 3). Este questionário consiste numa fonte de pesquisa primária em que através da aplicação de questões se obtêm diretamente informações sobre factos ou “sobre a forma como os entrevistados adquiriram esses factos” (Sousa & Baptista, 2000). O questionário encerra algumas vantagens para um estudo desta natureza uma vez que permite interrogar uma determinada quantidade de indivíduos com vista a uma generalização, ou seja, permite conhecer o mesmo tipo de variável em vários indivíduos a respeito de uma grande diversidade de comportamentos, atitudes, opiniões ou preferências sobre fenómenos que ocorrem na sociedade.
Na formação das dez perguntas que constituem o questionário estão presentes diversos tipos de questões como as de resposta fechada, em que é escolhida uma (ou várias) opção entre muitas, as que viabilizam questões semifechadas, de resposta aberta e fechada na mesma questão, e as “questões de filtro” (Sousa & Baptista, 2000, p. 95) que filtram as pessoas para as quais a resposta não se adequa. Por ser constituído tanto por questões que requerem respostas abertas como fechadas, trata-se de um questionário de tipo misto com questões não muito longas para não desmotivar o inquirido e evitar ambiguidades ou diferentes interpretações. Contém também uma pergunta fechada formulada com base na escala Likert (Coelho et al., 2019) que solicitou aos entrevistados que avaliassem a sua concordância com as declarações numa escala de cinco pontos (de concordo inteiramente a não concordo nada). A construção do questionário teve em conta a objetividade e clareza para garantir que este seria de fácil preenchimento.
O processamento das respostas e a categorização das respostas foram realizados com o auxílio de um instrumento disponível na internet usado para a elaboração de questionários, denominado Google Forms. Segundo Vasconcellos e Guedes (2007, p.14) os questionários realizados com recurso à internet contribuem para diminuir o viés da amostra e permitem um menor tempo de realização, chegando com maior facilidade a um maior número de respondentes. Através deste meio implica também menores custos de realização e digitação por centralizar recursos e não necessitar de papel ou das várias etapas presentes no envio físico dos questionários e facilita também a análise de resultados pois pode ser efetuada com mais conveniência e celeridade.
Seleção dos participantes
Os participantes deste estudo são estudantes de três turmas da disciplina de Produção Oral em Português pertencente ao quarto ano de estudos da licenciatura em Português da Universidade de Macau. A amostra é composta por fontes primárias constituídas por um conjunto de população previamente definido, ou seja, uma “turma de alunos em que todos os elementos escolhidos possuem qualidades semelhantes” (Sousa & Baptista, 2000, p.76). As turmas são compostas por alunos originários de Macau e da China continental com bastante similaridade em termos de idade e contexto sociocultural.
A motivação da escolha dos estudantes está ligada ao teor da referida disciplina que, por se centrar nos aspetos ligados à produção oral, é mais propensa a incluir role-play nas suas aulas. Segundo informações recolhidas junto do professor e de alunos, além da atividade presencialmente analisada neste estudo, durante este semestre foram realizadas outras dramatizações que incluem debates sobre questões sociais como o ambiente ou a dependência das novas tecnologias, a criação e apresentação de argumentos para a realização de um filme, entrevistas aos colegas para recriar situações de contexto jornalístico, entre outros. A questão da proficiência em Português também foi considerada, pois os alunos destas turmas são finalistas da licenciatura, tendo realizado experiências de intercâmbio em Portugal e no Brasil no ano transato, pelo que teoricamente terão maior fluência do que os estudantes dos outros anos de ensino. As perguntas dos questionários foram antecipadamente lidas aos alunos de uma das turmas, o que permitiu aprimorar algumas perguntas em termos do vocabulário usado e da redução da ambiguidade de algumas questões. Os questionários foram aplicados às
três turmas durante o decorrer de uma aula no dia 22 de novembro de 2019. No
total, 69 estudantes responderem aos questionários com recurso aos computadores existentes na sala de aula. Acrescente-se ainda que a realização deste estudo teve em consideração o respeito pelos princípios éticos, nomeadamente, no que concerne à permissão da instituição, professores e estudantes para a obtenção de dados, bem como o tratamento dos mesmos de forma anónima e equilibrada, de acordo com as boas práticas científicas e com as recomendações éticas da RILP.
Conteúdo das questões
O questionário é constituído por dez questões e destina-se a reunir a perspetiva
dos estudantes sobre a influência dos role-play no desenvolvimento de diferentes competências, no processo de realização destas atividades e no contributo das mesmas para a motivação na aprendizagem de português. O questionário tem como enquadramento teórico os principais resultados decorrentes da literatura, referida anteriormente, que relaciona os métodos de role-play e o ensino de línguas.
A primeira questão destina-se à delimitação do perfil dos participantes em termos de público, feminino ou masculino. A segunda questão pretende recolher uma opinião geral sobre a importância das atividades de role-play na aprendizagem de português.
A terceira questão foca-se na importância para o desenvolvimento específico de competências linguísticas em português. A quarta questão, fechada para os alunos que previamente reconheceram a importância destas atividades no plano linguístico, pretende inferir que competências linguísticas os alunos consideram trabalhar mais (a produção e compreensão oral ou a escrita).
A quinta questão solicita que os alunos escolham de entre várias opções alguns aspetos individuais e socioculturais que consideram desenvolver mais através destas atividades e que a literatura sobre o tema destaca, tais como o trabalho em equipa, a capacidade de iniciativa, a tomada de decisões, a resolução de problemas, a organização do trabalho, a criatividade e originalidade, a compreensão da sociedade e do mundo ou o debate com a turma sobre os tópicos abordados.
As três questões seguintes relacionam-se com o processo de realização das tarefas de role-play. A sexta questão é sobre a fases que os estudantes revelam preferência por desempenhar, como por exemplo, a organização e estruturação do trabalho, a apresentação ou a discussão com os colegas. A sétima questão pretende perceber quais os temas de role-play que suscitam mais interesse (temas sobre cultura, sociedade, desporto, contexto profissional, etc.) e a oitava questão é sobre se os alunos têm preferência por realizar este tipo de atividades individualmente ou em grupo.
A nona questão centra-se na motivação para a aprendizagem da língua que estas atividades podem fomentar, tal como salienta a literatura desta temática.
A décima questão pretende descortinar a posição dos estudantes sobre a implementação
de mais atividades de role-play como estratégia de ensino ao longo da licenciatura de Português.
Resultados e discussão
Na tabela em baixo apresentam-se as respostas dos alunos aos questionários. Os números apresentados em cada resposta correspondem à frequência absoluta e à frequência percentual relativa:
Perguntas | Respostas | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
1-Sexo | F | M | ||||
50 estudantes (72,5%) | 19 estudantes (27,5%) | |||||
2-Considera que as atividades de role- -play são úteis para aprender português? | Sim 62 (89,9%) | Não 6 (6,7%) | Nem por isso 6 (6,7%) | |||
3-As aulas de role plays são importantes para desenvolver as competências linguísticas? | Sim 61 (88,4%) | Não 2 (2,9%) | Nem por isso 5 (7,2%) | "Este tipo de aulas não funciona bem em desenvolver capacidade de língua" 1 (1,4%) | ||
4-Se respondeu sim na pergunta anterior, assinale as competências que mais trabalhou com estas actividades. | Produção oral 56 (87,5%) | Compreensão oral 38 (59,4%) | Produção escrita 29 (45,3%) | Compreensão escrita 19 (29,7%) | ||
5- Considera que os role-plays são bons para desenvolver estas características: | Concordo totalmente 1 | 2 | 3 | 4 | Não concordo nada 5 | |
Trabalho em equipa | 20 (29%) | 30 (43,5%) | 15 (21,7%) | 4 (5,8%) | - | |
Capacidade de iniciativa | 13 (18,8%) | 38 (58,1%) | 13 (4,3%) | 3 (2,9%) | 2 (2,9%) | |
Tomada de decisões | 22 (31,9%) | 26 (37,7%) | 18 (28,1%) | 3 (4,3%) | - | |
Resolução de problemas | 21 (30, 4%) | 30 (43,5%) | 12 (17,4%) | 5 (7,2%) | 1 (1,4%) | |
Organização do trabalho | 26 (37,7%) | 24 (34,8%) | 16 (23,2%) | 3 (4,3%) | - | |
Criatividade e originalidade | 31 (44,9%) | 24 (34,8%) | 11 (15,9) | 3 (4,3) | - | |
Uso contextualizado da língua | 21 (30,4%) | 35 (50,7%) | 8 (11,6) | 5 (7,2) | - | |
Compreensão da sociedade e do mundo | 16 (23,2%) | 27 (39,1%) | 19 (27,5) | 7 (10,1) | - | |
Debater tópicos com a turma | 21 (30,4%) | 25 (36,2%) | 17 (24,6) | 5 (7,2) | 1 (1,4%) | |
Aplicaçao prática das matérias estudadas | 17 (24,6%) | 30 (43,5%) | 18 (26,1) | 4 (5,8) | - | |
6-Quais as fases do role-play que prefere desempenhar? | Brainstorming Discutir ideias com colegas 46 (66,7%) | Organização e estruturação do trabalho 43 (63,2%) | Apresentação oral 39 (56,5%) | Assistir às apresentações 36 (52,5%) | Discussão do trabalho após apresentação 32 (46,4%) | Produção escrita da tarefa 28 (40,6%) |
7-Quais são os temas que mais lhe interessam para a realização de role-plays? | Resolução de problemas 46 (66,7%) | Debater questões sociais e culturais 39 (56,5%) | Situações ligadas ao futuro profissional 33 (47,8%) | Temas sobre desporto 17 (24,6%) | "Nada" 1 (1,4%) | "Situações interessantes e desafiadoras" 1 (1,4%) |
8-Prefere realizar estas actividade em grupo ou individualmente? | Em grupo 59 (86,8%) | Individualmente 9 (13,2%) | ||||
9-Este tipo de aulas constitui uma maior motivação para aprender português? | Sim 46 (67,6%) | Tanto como as outras aulas 19 (27,9%) | Não 3 (4,4%) | |||
10- Considera que se deveriam incluir mais aulas de role-play na licenciatura? | Sim 37 (53,6%) | São suficientes 28 (40,6%) | Não 4 (5,8%) |
Fonte: Dados obtidos pelo autor deste estudo.
Neste estudo, participaram 50 estudantes do sexo feminino e 19 alunos do sexo masculino pertencentes a três turmas de Português. A primeira consideração a retirar dos resultados é a evidente predominância do sexo feminino que poderá ser interpretada como uma característica reveladora do perfil do público que atualmente estuda Português na China.
Em relação às atividades de role-play, as respostas expressivas da grande maioria dos participantes em relação à utilidade e à importância destes métodos para o desenvolvimento das competências linguísticas - sobretudo a produção e a compreensão oral - são denotadoras do apreço dos estudantes por estes métodos de ensino.
Os estudantes destacam ainda a utilidade dos role-plays para compreender e debater diversos tópicos relacionados com a sociedade e o mundo actual, permitindo adquirir mais vocabulário e utilizá-lo de forma que consideram mais prática e contextualizada. Esta questão reveste-se de importância na medida em que pode constituir uma estratégia de ensino pertinente para desenvolver as competências de oralidade dos alunos orientais. Através da pesquisa e do debate que os alunos efetuam a propósito deste tipo de atividades comunicativas, têm oportunidade para explorarem os seus conhecimentos sobre diferentes temáticas e também de trabalhar recursos como a expressão oral, a argumentação e a discussão e exposição de ideias.
Em relação aos temas dos role-plays, os estudantes dão preferência a temas que versem sobre a resolução de problemas, temas que abordem questões sociais e culturais, e que recriem situações que os preparem para o futuro profissional.
Estas repostas podem ser um indicador da utilidade destas atividades para explorar e diversificar os conhecimentos sociais e culturais dos estudantes para além dos conteúdos estritamente linguísticos, mas também para criar no espaço da sala de aula um ensino mais prático que fomente a participação e a reflexão crítica dos estudantes acerca de questões sociais. Do mesmo modo, as respostas demonstram que os role-plays podem ser importantes para recriar situações que preparem os estudantes para os futuros contextos profissionais que poderão vir a encontrar.
Algumas atividades na área da tradução simultânea, do ensino, do jornalismo ou dá área empresarial, entre outras, podem ser simuladas em aula para fomentar um ensino que se aproxime mais dos interesses práticos e profissionais dos alunos.
A maioria dos 69 alunos revelam também a importância destas atividades para trabalhar aspectos que consideram importantes como a capacidade de iniciativa, de criatividade e originalidade na realização de tarefas; a prática de resolução problemas e de tomada de decisões; ou a aquisição de conhecimentos a nível de organização, estruturação e apresentação dos seus argumentos e dos seus trabalhos.
Estas repostas sugerem a utilidade dos role-plays como estratégias que pressupõem várias etapas desde a conceptualização até à sua apresentação. Estas etapas são elaboradas de forma autónoma pelos estudantes - sob mediação do professor - permitindo que experimentem e trabalhem diferentes competências.
O planeamento, a organização, a apresentação e discussão são algumas das diferentes
partes dos role-plays que permitem aos estudantes construir os vários processos de um trabalho e praticar diferentes aptidões a nível linguístico e cultural.
De salientar que a expressiva maioria dos alunos revela preferência por trabalhar em grupo. Sendo a cultura de aprendizagem dos estudantes asiáticos caracterizada por uma menor flexibilidade e interação entre os elementos da turma (Jin & Cortazzi, 2006), a questão em torno da recetividade dos estudantes chineses a métodos de índole mais comunicativa que incluam atividades com maior participação e autonomia dos alunos, como o trabalho em grupo, constitui um tópico recorrente na literatura sobre o ensino de línguas estrangeira na China. Tal como destacado por autores como Clarke (2009), Liu, Zhang e Yin (2014), Rao (2002) ou Zhang, Wang e Li (2013), o presente estudo salienta também a abertura e a adesão dos alunos chineses a atividades comunicativas e à realização de tarefas em grupo.
Os alunos manifestaram com expressiva maioria o contributo destas atividades para a motivação da aprendizagem, o que não só revela o interesse pelos conhecimentos e procedimentos que envolvem, mas também pode ser interpretado como um interesse por estratégias que fomentem um ensino mais prático, comunicativo e relacionado com o quotidiano da sociedade e com o futuro socio-profissional dos estudantes. A maioria dos alunos revelou que este tipo de atividades deveria marcar mais presença nas aulas de licenciatura em português, denotando o seu apreço por este método de ensino e pelo contributo que tem para o interesse dos estudantes no processo de aprendizagem.
O feedback positivo dos alunos em relação à motivação associada às atividades de role-play, a preferência por trabalhar em grupo e por realizar atividades que abordem o debate sobre questões sociais, culturais e profissionais são bastante demonstrativas da importância da sala de aula como espaço privilegiado para a difusão dos valores da cidadania intercultural e para a aprendizagem da língua de forma interativa, de modo a ajudar os alunos a desenvolver as suas competências individuais, interpessoais e organizacionais ao mesmo tempo que adquirem conhecimentos e constroem responsabilidades.
Deste modo - mais do que o resultado final em si das atividades de role-play- as diferentes fases envolvidas neste processo (brainstorming, criação, organização e estruturação do trabalho, exposição escrita e oral, discussão e argumentação) constituem oportunidades únicas para os estudantes trabalharem um conjunto de características de grande utilidade e pertinência, não só enquanto falantes de língua, mas sobretudo enquanto cidadãos.
Conclusões
Este estudo revela que, na perspetiva dos estudantes de Português da Universidade
de Macau, os role-plays constituem uma estratégia de ensino produtiva e motivante possibilitando uma aplicação prática das matérias estudadas. Os role-plays são interpretados como forma de fomentar a interação e a cooperação entre os elementos da turma, de motivar os alunos para a aprendizagem da língua e de trabalhar as competências linguísticas. No que respeita às temáticas, os estudantes dão preferência aos temas sobre resolução de problemas e questões profissionais e socioculturais, o que é demonstrativo da vontade de adquirirem conhecimentos e desenvolverem competências diversificadas no espaço da aula de língua não materna.
Nos dias que correm é essencial promover um ensino prático e interativo em que a sala de aula não seja um espaço estanque ou alienado das expetativas e dos vários desafios que a sociedade apresenta aos seus cidadãos e aos estudantes, em particular. Embora, por vezes, devido a questões de cultura de ensino-aprendizagem ou de planeamento metodológico das instituições e dos professores, o ensino de línguas encontre alguma relutância em se libertar de métodos mais tradicionais, este estudo defende que os métodos de role-play são uma forma de trazer para a sala de aula as problemáticas do mundo atual, trabalhando estas temáticas num ambiente de interação, e estimulando uma atitude crítica, participativa e dialogante que também prepare os estudantes para o futuro enquanto cidadãos de um mundo intercultural.
Uma vez que o conhecimento no ensino intercultural é indissociável dos processos de socialização, envolvendo características de descoberta e interação (Byram et al., 2002), os métodos de role-play são importantes para procurar aplicar os conhecimentos em situações concretas de comunicação e cooperação.
Neste contexto, podem contribuir para a formação de uma “competência cultural
crítica” (Byram et al., 2002, p.13) que promova a reflexão sobre as práticas e procedimentos da própria cultura e das outras culturas. Ou seja, uma análise crítica dos estudantes em relação a si mesmos e aos seus valores, e de como estes influenciam as suas interpretações da sociedade e adquirem novas dimensões e significados ao longo do tempo e da interação com os demais.
O ensino de língua estrangeira deve promover uma atitude participativa e dinâmica
dos estudantes para que as suas ações em relação às questões sociais e culturais da sociedade possam ter um alcance global, partilhando um conjunto de valores humanísticos e universais como a interação com outras culturas e grupos sociais, a abordagem autocrítica ao diálogo intercultural, a liberdade, a igualdade ou a democracia (Porto & Byram, 2015). O presente estudo salienta a atitude favorável dos estudantes de Macau para que as atividades de role-play, devidamente estruturadas e contextualizadas, possam ajudar a fazer da sala de aula um espaço privilegiado para desenvolver competências, discutir e pôr em prática os valores de cidadania necessários para fazer frente aos desígnios da sociedade atual. Os métodos de role-play podem constituir um dos meios para transformar os conhecimentos teóricos em ação e para semear uma atitude crítica e responsável que floresça muito para além da sala de aula, tal como defendem Porto e Byram (2015): Empirical evidence demonstrates that foreign language education does in fact develop criticality in courses in higher education, and that the attainment of transformatory critique in action (taking action beyond the classroom) is at least sometimes possible. (Porto & Byram, 2015, p.11).
Futuras investigações
A ligação entre as atividades de role-play e os recursos tecnológicos também pode ser um factor relevante para a aplicação destes métodos de ensino. Num momento em que a tecnologia está presente em quase todas as vertentes das nossas vidas e que o acesso a recursos tecnológicos está cada vez mais disponível e globalizado, é essencial que o ensino de línguas faça uso das ferramentas que os estudantes utilizam para comunicarem e para se expressarem. É importante aproveitar o know-how tecnológico dos estudantes para integrar ativamente os conhecimentos adquiridos e explorar soluções criativas através de uma linguagem que dominam particularmente bem. A relação entre as novas tecnologias e os métodos de role-play, na perspectiva da motivação dos estudantes e na modernização ou atualização dos métodos de ensino, deverá ser alvo de análise em futuras investigações sobre este tema.
Outras abordagens, com vista a alargar os horizontes deste estudo poderão passar pela utilização de uma amostra mais extensa ou diversificada, bem como analisar a visão dos professores em relação à aplicação destes métodos no âmbito do ensino de Português a estudantes chineses. Seria igualmente importante explorar outros campos de análise de forma mais específica, tais como o impacto das atividades de role-play na superação de algumas características individuais dos alunos (timidez, introversão, falta de confiança), sobretudo a nível da produção e fluência na oralidade, o contributo destes métodos para o desenvolvimento do pensamento crítico dos alunos ou ainda para a aquisição de conhecimentos específicos sobre a cultura e a sociedade dos países de língua portuguesa.