SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.40A preparação didáctico-metodológica dos professores primários para o ensino do Português em Moçambique: estudo de caso no IFP de Nampula, 2017Ensino e aprendizagem do português (L2/LE) por alunos surdos em Moçambique índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Internacional em Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 2182-4452versão On-line ISSN 2184-2043

RILP vol.40  Lisboa dez. 2021  Epub 25-Fev-2022

https://doi.org/10.31492/2184-2043.rilp2021.40/pp.93-117 

Artigo Original

O lugar das normas gramaticais e das práticas de análise gramatical no ensino básico e na formação dos professores de língua portuguesa no Brasil1

Aquiles Tescari Neto1 

Wellington Michel Souza de Paula2 

1 Laboratório de Cartografia Sintática (LaCaSa), Pesquisa e Ensino, Departamento de Linguística, IEL/UNICAMP, Campinas, Brasil.

2 Laboratório de Cartografia Sintática (LaCaSa) Pesquisa e Ensino, Programa de pós-graduação em Linguística, IEL/UNICAMP, Campinas, Brasil.


Resumo

O trabalho tem por objetivo discorrer sobre o ensino de duas frentes dos estudos gramaticais, nomeadamente a frente das normas gramaticais e a da análise linguística/gramatical, contemplando o contexto brasileiro tanto da educação básica quanto da formação de professores de língua portuguesa. Valemo-nos, para isso, de uma discussão sobre programas de ensino dessas duas frentes na educação básica, tomando, como ponto de partida, as orientações oficiais dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), complementadas com a consulta a um livro de português recomendado pelo Programa Nacional do Livro Didático. Para a reflexão sobre o ensino dessas duas frentes no ensino superior, valemo-nos de uma consulta feita a projetos pedagógicos e/ou grade curricular de cursos de Licenciatura em Letras (português), oferecidos em universidades brasileiras. Ao final, argumentamos favoravelmente a um ensino de ambas as frentes tanto no ensino básico quanto na formação de professores de língua portuguesa.

Palavras-chaves: ensino de língua portuguesa; normas gramaticais; análise linguística; ensino de gramática; educação básica; formação de professores

ABSTRACT

The main goal of this paper is to discuss the teaching of two fronts of grammatical studies, namely that of “grammar standards” and that of linguistic/grammatical analysis. It takes into account the Brazilian context by considering language teaching both in basic education and in the training of Portuguese language teachers. We discuss some teaching programs where these two fronts appear in basic education by taking as a starting point the official guidelines of the National Curricular Parameters and the Common Core Curriculum. The analysis of those guidelines will be complemented by some reflections on a textbook recommended by the National Textbook Program. In order to discuss the teaching of those two fronts in higher education, some pedagogical projects of undergraduate courses in Modern Languages (Portuguese), offered by Brazilian universities, are consulted. We argue in favor of the teaching of these two fronts in both basic education and in programs of Modern Languages (Portuguese) teacher’s training.

Keywords: Portuguese language teaching; grammatical standards; linguistic analysis; grammar teaching; basic education; teacher training

1.Introdução

A centralidade do texto no ensino de língua portuguesa tem se tornado, nos últimos anos - entre os professores da educação básica e acadêmicos da grande área de Letras e Linguística -, uma assunção consensual no contexto brasileiro. Assim, como esperado, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (Brasil, 2017) incorporou essa mesma diretriz - cuja recomendação já figurava em documentos oficiais anteriores (Brasil, 1998, 2000) - para favorecer “[o] desenvolvimento das capacidades de leitura, produção e tratamento das linguagens” (Brasil, 2017, p. 67). Num cenário como esse, a gramática é vista como um meio de ampliação das capacidades de uso da língua/linguagem pelo estudante em suas tarefas de produção de textos escritos ou orais em determinadas situações comunicativas, não podendo ser trabalhada “como um fim em si mesmo” (Brasil, 2017, p. 71). Essa postura tem feito com que a importância dada ao ensino das normas gramaticais - cuja definição é dada mais adiante - seja posta em questionamento, principalmente se tal ensino se apresenta supostamente dissociado das funções sociais dos gêneros textuais.

A discussão sobre o espaço ideal da gramática nos currículos e nas aulas de língua portuguesa remonta, pelo menos, à Antiguidade Clássica, segundo Faraco (2017), em artigo em que faz uma revisão histórica do ensino de gramática. Nesse texto, o autor mostra que a gramática nasce “modelar” e normativa, pois excluía as demais variedades em prol de um protótipo de língua usado pelos poetas e pensadores gregos clássicos; sua função, enquanto disciplina, era a de ensinar os modelos a serem seguidos, através da leitura e crítica de textos eruditos, para preparar os alunos para os princípios da retórica.

Posteriormente, com o fim do império romano no Ocidente, a gramática - ou, mais precisamente, seu ensino - adquiriu um status central, uma vez que o objetivo passou a ser o ensino das regras gramaticais do latim clássico, que não era a língua nativa dos aprendizes. No Brasil, as revoltas pombalinas, no século XVIII, davam espaço a um ensino da gramática da língua portuguesa, porém com um viés normativo. A centralidade, então, do ensino de gramática era tamanha que os conhecimentos gramaticais (fonéticos, morfológicos e sintáticos) faziam parte dos processos de seleção para ingresso no ensino superior, o que motivou o surgimento de vários livros de gramática, que apresentavam em detalhes os itens gramaticais exigidos nesses certames.

Foi em meados de 1980, quando se discutiu a reforma do currículo do Estado de São Paulo pós-regime militar, que a gramática começou a perder o papel central no ensino de língua portuguesa. As reflexões desse período culminaram na publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (Brasil, 1998, 2000) que a colocavam como auxiliar de um ensino que deveria ser pautado na leitura, escrita e oralidade. São esses os mesmos princípios norteadores da BNCC de 2017. É importante ressaltar, porém, que a gramática nunca perdeu o seu espaço

- nem nas práticas escolares, nem nos documentos orientadores oficiais - e que a discussão atualmente feita se pauta, sobretudo, na maneira (ou nas maneiras) ideal(is) de ensiná-la.

A Linguística, com suas várias afiliações teóricas, tem-se ocupado em refletir sobre o espaço da gramática em sala de aula e sobre as metodologias mais adequadas para o seu ensino. Assim, no âmbito do que poderíamos chamar de “Linguística Geral”, Travaglia (2002) sugere que a abordagem de conteúdos que versem sobre teoria gramatical seja posta em segundo plano; no entanto, não descarta seu ensino. Para o autor, tanto a gramática enquanto competência inata ao ser humano (a gramática internalizada, no sentido de Chomsky (1986)), quanto a gramática vista como um conjunto de regras socialmente aceitas (a gramática normativa) devem compor o programa de ensino de língua materna.

Da Linguística Funcional, vale destacar o trabalho pioneiro de Castilho (2000), que, valendo-se de resultados das pesquisas sobre Análise da Conversação - no âmbito do projeto NURC -, apresentou um programa de ensino de língua portuguesa que dá vital importância à oralidade, em perspectiva multissistêmica. Dentre tantos outros trabalhos funcionalistas sobre ensino de língua, podemos citar o de Furtado da Cunha and Tavares (2016). Para as autoras, a gramática deve ser tratada “considerando a língua do ponto de vista do contexto linguístico e da situação extralinguística.” (Furtado da Cunha & Tavares, 2016, p. 37). Nesse sentido, a escola deve promover atividades de reflexão sobre os itens gramaticais, seja em situações orais e informais, seja em situações escritas e formais. Naturalmente, questões relacionadas ao continuum dos gêneros textuais (Marcuschi, 2000) encontram eco em propostas que levam em conta a língua em uso: para Marcuschi, fala e escrita não são categorias discretas, havendo um continuum de gêneros entre esses dois polos.

A Linguística Gerativa também tem contribuído com a discussão ao compreender que o aluno dispõe de um conhecimento internalizado da língua e que o papel da escola é explicitar esse conhecimento através de um trabalho reflexivo. Kato (1986), por exemplo, um dos trabalhos fundadores da reflexão sobre o ensino de línguas na perspectiva gerativista, já nas primeiras páginas do livro, deixa claro seu objetivo: “fornecer subsídios psicolinguísticos para o professor da área de Letras”. Também tendo como ponto de partida pressupostos gerativistas sobre a gramática universal e o conhecimento gramatical - internalizado do aluno

-, Avelar (2017), Medeiros Junior (2020), Pilati (2017), Pires de Oliveira and Quarezemin (2016), dentre outros, se voltaram a uma reflexão sobre o ensino de gramática nas escolas, levando em conta o fato de que o aluno já traz, para o espaço escolar, um conhecimento internalizado sobre as regras gramaticais da língua que aprendeu na primeira infância. É papel do professor de português levar em conta tal conhecimento ou, nos termos de Tescari Neto (2017), tornar explícito esse conhecimento implícito dos usuários de língua.

Também pesquisadores de outras tendências teóricas que lidam diretamente com teoria gramatical têm se voltado a questões relativas ao ensino de gramática. Vários são, nesse sentido, os estudos sobre o ensino de gramática na perspectiva da Sociolinguística, merecendo destaque o livro de Faraco (2008), que não só apresenta uma taxonomia interessante para os diversos tipos de normas - norma em sentido geral, norma culta/comum/standard, norma padrão, norma gramatical e norma “curta” - como também tece reflexões importantes acerca do lugar das diferentes normas na pedagogia linguística.

A propósito dos conceitos de norma, uma vez que o presente trabalho se volta a uma problematização do lugar da norma gramatical no ensino de língua portuguesa, vale a pena sintetizar de antemão os diferentes sentidos de norma na tipologia de Faraco (2008). Por norma, em sentido geral, designa-se o conjunto de hábitos lexicais, fonológicos, morfológicos e sintáticos corriqueiros ou habituais em determinada variedade (tanto na fala quanto na escrita). Assim, para Faraco, norma culta - e seria mais adequado, explica o autor, falar em norma comum ou standard (2008, p. 56) - corresponde ao conjunto de fenômenos fonológicos, morfológicos, lexicais e sintáticos, observáveis na fala e na escrita de grupos sociais mais ligados à cultura escrita em situações de maior monitoramento.

A norma padrão, por seu turno, “(…) é uma codificação relativamente abstrata, uma baliza extraída do uso real para servir de referência, em sociedades marcadas por acentuada dialetação, a projetos políticos de uniformização linguística.” (Faraco, 2008, p. 75). Foi no século XIX que a norma padrão foi codificada no Brasil. A elite letrada, em vez de tomar como referência a norma culta/comum/ standard, tomou como padrão o estilo dos escritores portugueses do romantismo (Faraco, 2008; Pagotto, 1998). A norma padrão é a que serve como referência às normas gramaticais, i.e., às normas descritas e prescritas pelos gramáticos, normas essas em certa medida “flexibilizadas” por eles através da incorporação de alguns elementos da norma culta/comum/standard nas prescrições.

Por fim, a normacurta” é uma designação criada por Faraco para se referir a “(...) um conjunto de preceitos dogmáticos que não encontram respaldo nem nos fatos, nem nos bons instrumentos normativos, mas que sustentam uma nociva cultura do erro e têm impedido um estudo adequado da nossa norma culta/comum/standard.” (Faraco, 2008, p. 92). São atitudes típicas da “norma curta” as hipercorreções e, sobretudo, os discursos preconceituosos e redutores sobre ocorrências variáveis inclusive na própria norma gramatical. São “guardiões” e “divulgadores” da norma dita curta os “comentadores gramaticais” - muitos deles escritores, jornalistas ou até professores -. Em tempos de redes sociais, o papel dos “comentadores” vai sendo ocupado cada vez mais pelos “youtubers”, que se destacam, de modo geral, por postagens de vídeos quase sempre carregados de estereotipadas asserções sobre correção gramatical.

Neste artigo, nossa postura não será jamais a de atacar a Gramática Normativa, nem no que diz respeito à proposição das normas gramaticais - a que chamaremos, dois parágrafos adiante, de “primeira frente” - tanto menos no que diz respeito às linhas de “análise” por ela propostas - a “segunda frente” - sobre o que também falaremos dois parágrafos mais à frente -. Fato claro para nós, a propósito da gramática tradicional e de sua inserção na escola brasileira, é a sua importância no ensino de língua portuguesa, haja vista o espaço que ainda é lhe dado nos livros didáticos e até mesmo nos documentos orientadores oficiais - à revelia, nesses últimos, lamentavelmente, de tantas outras teorias gramaticais importantes (ver, a esse respeito, a crítica avançada em Pires de Oliveira & Quarezemin (2016, p. 30)) -. Fato também claro - e reconhecido por tantos linguistas - é o de que seja direito do estudante o acesso às normas culta e gramatical, sendo tal acesso, em muitos casos, possível tão somente na escola (Ilari & Possenti, 1985). Então, a pergunta que lançamos é: por que não continuar a ensiná-la?

Talvez o papel que a gramática normativa tem desempenhado no contexto escolar, desde sua concepção - com uma valorização do viés normativo-prescritivo “do bem falar e do bem escrever” e seguindo um modelo linguístico de escritores eruditos -, tenha levado alguns estudiosos a responsabilizarem as nomenclaturas e a metalinguagem pelo insucesso das metodologias aplicadas ao ensino da língua. São válidas, então, nesse sentido, as palavras de Franchi (1991) quando observa que não se trata de fazer um terrorismo contra o passado e propor “futurismos” - talvez fosse, inclusive, até mais interessante usar o sufixo “-ice(s)” nesse contexto: “futurices” -, nem de abandonar as nomenclaturas e definições gramaticais; antes, cabe aos professores e profissionais da linguagem questioná-las e reconhecer suas limitações, propondo atividades em que seja possível operar sobre a língua e refletir sobre suas possibilidades estruturais e os sentidos que delas decorrem.

O ensino de gramática na Educação Básica tradicionalmente tem duas frentes principais e não excludentes: de um lado, o ensino das normas gramaticais - que contempla (ou deveria contemplar) uma reflexão sobre as normas prescritas pelos gramáticos, i.e., uma reflexão sobre as normas do que a tradição considera “o bem falar e o bem escrever” (chamemos a isso de “primeira frente” dos estudos gramaticais no contexto escolar) -; de outro, a análise (morfos)sintática (a “segunda frente”). Essas duas frentes principais podem ser desenvolvidas isoladamente (se tomadas, cada uma, como um objeto em si), combinadas (se prescrição e análise gramatical são trabalhadas em conjunto) ou até mesmo de maneira articulada - como sugerem os PCNS (Brasil, 1998, 2000) - com as atividades de leitura e produção textual. A seção 2 apresenta um detalhamento desses três modos de desenvolvimento dessas duas frentes do ensino de gramática.

É, pois, nosso principal objetivo, neste trabalho, discorrer sobre o ensino de gramática, considerando essas duas frentes - a frente das normas gramaticais e a da análise linguística/gramatical - tanto na educação básica quanto na formação de professores de língua portuguesa, no contexto brasileiro. Para isso, vamo-nos valer de uma discussão sobre programas atuais de ensino dessas duas frentes na educação básica, a partir de um breve exame primeiramente das orientações oficiais dos PCNs e da BNCC e, segundamente, de alguns excertos de um livro didático de língua portuguesa, distribuído pelo programa nacional do livro didático

- o PNLD, do FNDE (o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) -. A discussão sobre o ensino das duas frentes em cursos de formação de professores se baseará numa análise de projetos políticos pedagógicos e/ou grades curriculares das instituições de ensino. Argumentaremos em favor de uma pedagogia linguística que reconheça a importância de ambas as frentes tanto no ensino regular como também na formação de professores.

Para isso, organizamos o artigo assim: na seção 2, detalhamos cada uma das duas frentes do ensino de gramática e os modos como metodologicamente costumam ser trabalhadas no ensino de língua portuguesa; na seção 3, voltamo-nos especificamente à primeira frente - i.e., às normas gramaticais - no contexto tanto do ensino regular quanto da formação do futuro professor de português. A seção 4 discute a segunda frente - nomeadamente, a análise linguística - no ensino básico e em cursos de Licenciatura em Letras. A seção 5 apresenta argumentos em favor de um ensino de ambas as frentes tanto no ensino básico quanto na formação de professores de língua portuguesa. A seção 6 traz as nossas considerações finais.

2.Das duas frentes do ensino de gramática na Educação básica

Conforme dito no final da Introdução, uma das duas frentes do ensino de gramática na educação básica é o ensino das normas gramaticais, que envolve (ou deveria envolver) reflexões sobre as normas - prescritas nas gramáticas e livros didáticos - do que a tradição considera “o bem falar e o bem escrever”. A outra frente se volta sobretudo à reflexão metalinguística, i.e., à análise (morfos)sintática ou gramatical propriamente dita, para o que as teorias gramaticais - e inclusive a gramática normativa - se valem de uma “metalinguagem” própria (i.e., de um conjunto de termos, conceitos e construtos teóricos utilizados para a descrição e explanação dos fatos gramaticais). Há três opções metodológicas principais para o desenvolvimento de atividades relacionadas a essas duas frentes: as frentes podem ser trabalhadas isoladamente, combinadas ou até articuladas (sozinhas ou conjuntamente) com as atividades de leitura e produção de textos. Vejamos, nos parágrafos seguintes, uma descrição sucinta dessas três opções metodológicas (principais) de desenvolvimento das duas frentes do ensino de gramática.

A primeira opção metodológica é a de desenvolvimento isolado de ambas as frentes. Quando feitas “isoladamente”, cada frente é tomada como um objeto (praticamente autônomo) de conhecimento. Por esse viés, a análise, em funções sintáticas, dos termos da oração - ou “análise lógica” ou “análise gramatical” - não teria relação direta e necessária com a prescrição das normas gramaticais. Um exemplo dessa atitude fica explícito em Kury (1985), um manual de análise sintática “tradicional” até hoje bastante citado,2 presente inclusive nas referências de bibliografias de disciplinas de gramática e sintaxe de cursos de Letras das principais universidades brasileiras.3 Kury (1985) trata da análise sintática autonomamente, i.e., sem “misturá-la” com a prescrição gramatical.

Prescrição (de normas) e análise (sintática) aparecem misturadas em nossas gramáticas - o que aqui entendemos como sendo uma “segunda opção metodológica” -, fato já observado por linguistas, como vemos nas duas citações abaixo:

Na verdade, as gramáticas normativas comportam sempre partes de descrição, por exemplo quando se ocupam em classificar as palavras, em distinguir partes da oração, ou em segmentar as palavras em radical, vogal temática e desinência; mas as passagens descritivas das gramáticas normativas referem-se sempre às formas “corretas”, por isso descrição e prescrição se confundem. (Ilari & Possenti, 1985, pp. 3-4). Em geral nos referimos a essas gramáticas chamadas “tradicionais” (justamente porque remontam a uma tradição milenar) como normativas, esquecendo que elas são igualmente descritivas. É fácil perceber quando o gramático deixa de “descrever” e passa a elencar as “normas”. As conceituações, classificações, etc. são parte da descrição. As normas em geral são introduzidas por expressões como “não se deve...”, “é imperioso tal uso...”, “o bom uso da língua exige que...” (Duarte & Serra, 2015, p. 37)

Um exemplo concreto dessa “mistura” de descrição e análise gramatical pode ser observado no Lições de português..., de Bechara (1985): no capítulo IV, após descrever o “sujeito indeterminado” e as “orações sem sujeito”, Bechara dedica uma última seção, a seção 6, intitulada “Erro no emprego do verbo TER pelo HAVER”, chegando inclusive a afirmar: “[c]onstitui incorreção, na língua culta, o emprego do verbo ter em lugar de haver em orações como: Tem livros na mesa por Há livros na mesa.” (Bechara, 1985, p. 31). Também no capítulo V do mesmo livro, logo após a descrição do conceito de “núcleo” - o “termo que tem maior importância” (Bechara, 1985, p. 34) -, Bechara destaca uma série de casos a demandarem “cuidado especial”, como vemos em sua alínea “l”, p.ex.:

Cuidado especial há de merecer a concordância do verbo acompanhado do pronome se e sujeito no

plural posposto (...):

CERTO

ERRADO

Alugam-se casas.

Aluga-se casas.

Fazem-se chaves.

Faz-se chaves.

Consertam-se rádios.

Conserta-se rádios.

Vendem-se apartamentos.

Vende-se apartamentos.

OBSERVAÇÃO: Se o nome no plural vem precedido de preposição, não pode ser sujeito, e, por isso, o verbo fica no singular:

CERTO

ERRADO

Precisa-se de empregados.

Precisam-se de empregados.

Trata-se, neste caso, de sujeito de indeterminação do sujeito.

(BECHARA, 1985, p. 40)

Vê-se, pois, que descrição e análise - a “segunda frente” -, de um lado, e prescrição - a “primeira frente” -, de outro, acabam até mesmo por se confundirem na distribuição dos tópicos discutidos.

Há, por fim, um último modo de desenvolver as duas frentes do ensino de gramática, a saber, o modo recomendado pelos PCNs (Brasil, 1998, 2000) - e acolhido pela BNCC (Brasil, 2017): o ensino de língua portuguesa deve articular as atividades de leitura e produção (de textos orais e escritos) às de análise linguística.

São exemplos prototípicos dessa atitude metodológica os trabalhos da “Análise Linguística” - no sentido empregado em Geraldi (1984) e Mendonça (2006). Na análise linguística, o estudo da forma faz sentido tão somente se integrado ao dos gêneros textuais; daí a preferência por um trabalho integrado do estudo da morfossintaxe (no texto) com as atividades de leitura e produção. Embora mais se fale, em “Análise Linguística”, sobre aspectos da segunda frente descrita nesta seção (nomeadamente, sobre aspectos formais que, nos textos, geram os diferentes sentidos), é possível conceber situações concretas, em sala de aula, em que a análise linguística, se volte também à primeira das duas frentes (nomeadamente a aspectos da prescrição gramatical) na perspectiva do continuum dos gêneros textuais à la Marcuschi (2000), por mais (aparentemente) contraditório que isso possa parecer à primeira vista.4

3. O lugar da reflexão sobre as normas gramaticais nas aulas de português: a primeira frente

A seção anterior detalhou como as duas frentes do ensino de gramática - nomeadamente, a reflexão sobre a norma gramatical (“primeira frente”) e a análise gramatical (“segunda frente”) - são, na educação básica brasileira, habitualmente desenvolvidas através de três metodologias principais. Trataremos especificamente, agora, da reflexão sobre as normas gramaticais - a primeira frente - tanto na formação dos estudantes de Licenciatura em Letras, futuros professores de língua portuguesa, quanto na educação básica, obviamente considerando o contexto brasileiro.

Como já mencionado na Introdução, argumentaremos aqui que ambas as frentes devem ser trabalhadas não só na Educação Básica como também na licenciatura em Letras (e, por que não, na formação continuada do professor).

No que compete ao ensino regular, a BNCC (Ensino Fundamental e Médio),

ex., considera que as atividades de Análise Linguística, um dos “eixos” que compõem o objeto de estudo “Língua Portuguesa”, devem levar em conta tópicos relativos às normas gramaticais. Apesar de esses documentos tratarem esse eixo como eixo de análise da língua - o que aproximaria mais as atividades sugeridas às da “segunda frente” - algumas das habilidades que devem ser desenvolvidas pelos alunos do Ensino Fundamental abordam questões gramaticais a partir de um viés mais prescritivo. No caso da BNCC, p.ex., a habilidade EF08LP04, proposta para o 8º ano do Ensino Fundamental, estabelece que os alunos matriculados nesse ano escolar precisam “utilizar, ao produzir texto, conhecimentos linguísticos e gramaticais: ortografia, regências e concordância nominal e verbal, modos e tempos verbais, pontuação etc.” (Brasil, 2017, p. 183).

Em consonância com esses documentos, o livro didático (doravante LD) analisado para este artigo - incluído entre os livros recomendados pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e distribuído gratuitamente aos alunos da rede pública brasileira -5 aborda questões referentes à norma gramatical, também abrindo espaço não só para a descrição gramatical como também para a prescrição de normas. O LD Tecendo Linguagens - Língua Portuguesa (Oliveira & Araújo, 2018), por exemplo, no capítulo 4 da edição voltada ao 9º ano do Ensino Fundamental, traz alguns dos casos em que empregamos o acento grave indicador de “crase” (figura 1) e, em seguida, na atividade proposta aos alunos, pede a justificativa do uso ou não-uso desse acento, mais precisamente no item c (cf. figura 2).

Figura 1 Do emprego do acento grave indicador de crase.  

(Fonte:Oliveira & Araújo, 2018, p. 108)

Figura 2 Atividade sobre o uso do acento indicador de crase de acordo com a prescrição.  

O fato de esses assuntos figurarem não só nos documentos oficiais, mas também no material didático analisado, que auxilia o trabalho docente - e que, em alguns casos, assume mesmo um papel fundamental, haja vista a quantidade de alunos por sala e o pouco tempo de que dispõe o professor para dar conta de todo o conteúdo do programa -, nos permite afirmar (ou pelo menos reconhecer) que os tópicos voltados às normas gramaticais são fundamentais à formação do aluno, mesmo se a abordagem assumida pelo professor prioriza o texto (a exemplo do que recomendam as orientações oficiais do Ministério da Educação e Cultura).

Em relação à formação do professor de Língua Portuguesa em cursos de licenciatura em Letras, fizemos uma busca, no Google, por disciplinas obrigatórias da grade curricular - informadas por suas respectivas coordenadorias e disponibilizadas para consulta online e universal em site da universidade -. Considerando a primeira frente, que trata especificamente de questões relativas à norma gramatical, poucos são os cursos de Licenciatura em Letras que, em seu projeto político pedagógico (ou na página onde se informa a grade curricular do conjunto de disciplinas obrigatórias), contemplam uma disciplina que trate de tópicos sobre normas gramaticais (concordância, regência, colocação dos pronomes, emprego do acento grave indicador de crase, etc.). Uma pesquisa guiada por palavras-chave no Google (como, p.ex., “normas gramaticais/gramática/gramática normativa/ gramática tradicional/norma padrão” + “projeto pedagógico” + “letras”) retornou-nos, como obrigatórias, as disciplinas dos seguintes cursos de Licenciatura em Letras: Português:

Curso de Licenciatura em Letras - UNESP/São José do Rio Preto:

Disciplina informada sobre a “primeira frente”: Normas gramaticais da língua portuguesa;6

Curso de Licenciatura em Letras - UNESP/Araraquara:

Disciplina informada sobre a “primeira frente”: Gramática de língua portuguesa;7

Curso de Letras: português e inglês e literaturas - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ):

Disciplina informada sobre a “primeira frente”: Língua portuguesa I: por-

tuguês padrão;8

Curso de Licenciatura em Letras - UFMS/Câmpus de Três Lagoas:

Disciplina informada sobre a “primeira frente”: Gramática normativa da língua portuguesa;9

Curso de Licenciatura em Letras - UFPA/ Câmpus Cameta:

Disciplina informada sobre a “primeira frente”: Sintaxe do português.10

Os links indicados nas cinco notas de rodapé precedentes permitem a consulta ao projeto político pedagógico dos referidos cursos de licenciatura ou pelo menos à grade curricular - como é o caso do curso da UFMS/Câmpus de Três Lagoas -. Disciplinas específicas sobre normas gramaticais costumam, nos cursos de licenciatura em Letras (Português), figurar como disciplinas “optativas ou eletivas”, i.e., disciplinas que, a depender do instituto em que figuram na grade, podem ser ou não oferecidas ou mesmo cursadas.11

A primeira frente contempla, portanto, todo o conteúdo curricular voltado às normas gramaticais e à sua prescrição - naturalmente tendo em vista o continuum de monitoração estilística (Bortoni-Ricardo, 2003):12 é bastante complicado afirmar que a norma gramatical (tal qual prescrita pelos gramáticos) tenha gêneros onde deva ser empregada haja vista o fato de as normas serem, por natureza, “hibridizadas” por força do uso contínuo que um mesmo falante faz de mais de uma norma (Faraco, 2008, p. 44). Assim, se pensarmos no continuum dos gêneros textuais (Marcuschi, 2000), mesmo os gêneros de texto que se aproximam mais do polo da escrita (p.ex., artigos científicos, bulas de remédio, editais de concurso, etc.) não empregam a norma gramatical tal qual a encontramos nos bons instrumentos normativos: são sempre incorporados, nesses textos, elementos da norma culta/comum/standard, até mesmo porque os produtores de tais gêneros usam a norma culta com mais frequência no dia a dia.

Muito embora disciplinas que abordam as normas gramaticais (no sentido da primeira frente) tenham pouco lugar, de modo geral, em projetos pedagógicos de cursos de licenciatura em Letras,13 não temos dúvida de que uma reflexão sobre as normas, que permita ao licenciando em Letras compreender as motivações puramente gramaticais (i.e., do sistema) para algumas das regras prescritas,14 pode se revelar, sem dúvida nenhuma, importante instrumento na formação do licenciando, uma vez que, na educação básica, terá de abordar tais conteúdos junto a seus alunos. Tratemos, agora, da segunda frente.

4. O lugar da análise linguística nas aulas de português: a segunda frente

Conforme apontado na Introdução e na seção 2, a “segunda frente” dos estudos gramaticais se volta à reflexão metalinguística, propriamente. Trata-se, noutras palavras, da análise (morfos)sintática ou gramatical, também denominada, no contexto dos PCNs brasileiros, de “análise linguística”. Tradicionalmente, a análise gramatical é o que encontramos, em gramáticas e manuais de linguística, nos capítulos dedicados à morfologia e à sintaxe,15 do que são bons exemplos o estudo das classes de palavras e os processos de formação de palavras (tradicionalmente reunidos nos capítulos de morfologia nesses livros),16 e a análise sintática do período simples e do composto (obviamente integrantes dos capítulos de análise sintática).

Tais conteúdos ocupam boa parte do curriculum de língua portuguesa nas escolas brasileiras. Assim, no ensino regular, a partir do 6º ano do Ensino Fundamental, como visto na seção anterior, o eixo da Análise Linguística propõe um trabalho que visa à observação e à reflexão das regularidades e fenômenos da língua. Ressalta ainda a BNCC que o espaço dado à metalinguagem na sala de aula deve ser ocupado com atividades reflexivas e que promovam uma ampliação da competência comunicativa.

O LD analisado segue as orientações oficiais a fim de desenvolver as habilidades estabelecidas para cada ano/série. E, uma vez que os conteúdos de análise são intensificados nos anos finais do Ensino Fundamental - 6º ao 9º anos - devido à “maior capacidade de abstração dos estudantes” (Brasil, 2017, p.60), o material didático dedica boa parte de seus conteúdos para a análise (morfos)sintática, como podemos observar na Figura 3, retirada do LD Tecendo Linguagens - Língua Portuguesa (Oliveira & Araújo, 2018), do 6º ano.

Uma consulta ao sumário de um LD da Educação Básica (Figura 3) reforça a importância e o espaço dado à reflexão metalinguística no ensino de língua portuguesa. Além do trabalho com os gêneros textuais, que, como já foi abordado na Introdução, é central, há uma seção dedicada à “Reflexão sobre o uso da língua”, que se ocupa de estudos relacionados às classes de palavras - substantivo, no capítulo 1, e adjetivo, no capítulo 2 - e aos processos de formação de palavras - capítulo 2 -, aspectos gramaticais abordados pela “segunda frente”.

(Fonte: Oliveira & Araújo, 2018, p. 8)

Figura 3 Sumário de LD da Educação Básica com conteúdos de análise gramatical.  

Quanto aos cursos de licenciatura em Letras, há grande variação na forma como os projetos pedagógicos distribuem o conteúdo das disciplinas. Assim, há licenciaturas em que Morfologia e Sintaxe integram disciplinas distintas; há cursos em que Morfologia é oferecida junto com Fonética e Fonologia; há cursos ainda em que Morfologia é ferecida junto com sintaxe (“morfossintaxe”), o que deixa flagrante, em certa medida, o lugar dos estudos morfológicos nas teorias gramaticais atuais: deve a morfologia ser vista como um nível de análise independente da sintaxe e da fonologia ou deve ser integrada a esses dois níveis?

Essa discussão acompanha os estudos gramaticais há tempos, fato já mencionado, px., em Lyons (1969).

Como exemplos de cursos de Licenciatura em Letras em que morfologia e sintaxe integram disciplinas distintas - conforme anunciado em projeto político pedagógico (disponível à consulta pública pela internet) -, citamos os seguintes

Curso de Licenciatura em Letras: Português - Universidade Federal de Goiás, UFG:

Disciplinas da segunda frente obrigatórias: Morfologia do português; Sintaxe do português;17

Curso de Licenciatura em Letras: Português - Universidade Federal de São Paulo, UNIFESP:

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfologia; Sintaxe;18

Curso de Licenciatura em Letras - Universidade Estadual Paulista, UNESP (São José do Rio Preto):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfologia descritiva da língua portuguesa; Sintaxe descritiva da língua portuguesa;19

Curso de Letras: Licenciatura em Língua Portuguesa - Universidade Federal da Paraíba (UFPB):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfologia da língua portuguesa; Sintaxe da língua portuguesa;20

Curso de Graduação em Letras: Língua Portuguesa (licenciatura) - Universidade da integração internacional da lusofonia afro-brasileira (UNILAB, câmpus de Redenção, CE):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfologia e Morfossintaxe da língua portuguesa; Sintaxe da língua portuguesa.21

Ao ler a descrição das ementas desses cursos nos sites indicados nas notas de rodapé associadas, fica clara a opção, pela equipe responsável pela elaboração do ementário e do projeto pedagógico, em separar os programas dedicados à análise morfológica e à análise sintática, mesmo se considerarmos o último dos projetos pedagógicos informados, o da UNILAB de Redenção, CE, que contempla, para além de uma disciplina de “Sintaxe”, uma disciplina intitulada “Morfologia e Morfossintaxe da língua portuguesa”, cuja ementa é indicada a seguir:

Conceito, objeto e pressupostos teórico-metodológicos da Morfologia. Conceitos operacionais básicos. Análise mórfica. Estrutura e formação dos vocábulos: flexão nominal e verbal. Processos de formação de palavras: derivação e composição. Análise morfológica do português no Brasil. Relações morfossintáticas. As classes de palavras: critérios que subjazem as definições. Consciência morfossintática e aprendizagem da leitura e da escrita. (UNILAB, 2016, p. 54)

Como exemplos de cursos em que os conteúdos de morfologia são oferecidos em uma mesma disciplina que os conteúdos de fonética e fonologia - sendo a disciplina de sintaxe oferecida em separado -, citam-se os seguintes:

Curso de Licenciatura em Letras - Português: Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP):

Disciplinas da segunda frente informadas: Fonética, fonologia e morfologia; Prática de análise gramatical;22

Curso de Licenciatura em Letras (português e respectivas literaturas): Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR), câmpus de Paranaguá:

Disciplinas da segunda frente informadas: Fonética, fonologia e morfologia; Sintaxe;23

Curso de Licenciatura em Letras: português e inglês - Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVÁS):

Disciplinas da segunda frente informadas: Estrutura da língua portuguesa I (fonologia e morfologia); Estrutura da língua portuguesa II (sintaxe).24

Há também cursos de formação caracterizados pelo oferecimento de uma disciplina de “morfossintaxe”. Uma consulta ao Google - baseada em palavras-chave como “morfossintaxe + licenciatura + Letras + projeto pedagógico” -, retornou-nos, dentre outros, os seguintes cursos:

Curso de Licenciatura em Letras: português e literaturas: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfologia da língua portuguesa; Morfossintaxe da língua portuguesa; Sintaxe da língua portuguesa;25

Curso de (licenciatura em) Letras: português: Universidade Federal do Rio Grande (FURG):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfossintaxe I, Morfossintaxe II, Morfossintaxe III, Morfossintaxe IV;26

Curso de (Licenciatura em) Letras (Língua portuguesa e respectivas literaturas): Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfossintaxe I, Morfossintaxe II, Morfossintaxe III;27

Curso de Letras (português) - Licenciatura: Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES):

Disciplinas da segunda frente informadas: Morfossintaxe, Gramática I: prescrição, descrição e uso; Gramática II: constituintes oracionais e estruturas complexas.28

Independentemente do modo como as disciplinas de análise gramatical (morfologia e sintaxe) são desenvolvidas e distribuídas pelos cursos, a opção pelo oferecimento de disciplinas de morfossintaxe deixa evidente, em certa medida, que, para a equipe que elaborou o ementário e projeto pedagógico, há uma relação bastante íntima entre a morfologia e a sintaxe.

Cabe, por fim, ressaltar que a segunda frente, pelo menos no contexto brasileiro dos cursos de formação de professores de língua portuguesa, é, sem dúvidas, a frente mais privilegiada. Conforme dito na seção anterior, são poucos os cursos de Licenciatura cujo projeto pedagógico informa uma disciplina obrigatória voltada à reflexão e discussão das normas gramaticais. Os projetos pedagógicos parecem privilegiar a análise gramatical, através da oferta de disciplinas que contemplam os níveis de análise linguística: fonética, fonologia, morfologia, sintaxe e semântica.

Nossa conjectura para essa preferência - da parte das coordenadorias de curso e equipe dos institutos e Faculdades de Letras - pela elaboração de um programa de curso que conte sobretudo com disciplinas voltadas à segunda frente leva em conta primeiramente razões históricas: nos anos 60, os cursos de Licenciatura em Letras passaram a oferecer obrigatoriamente disciplinas de Linguística (Ilari, n.d.). Contudo, as áreas chamadas por Marcuschi (2005) de “tendências hifenizadas” (Linguística Textual, Sociolinguística, Pragmática, Linguística Aplicada, etc.) só passaram, de fato, a integrar os cursos de formação de professores de língua portuguesa a partir dos anos 80 (Segredo, 2011), o que terá levado os colegiados de curso a reformularem seus ementários, acolhendo novas disciplinas em substituição a outras.

O questionamento trazido por essas disciplinas terá criado uma cultura certamente um pouco avessa a um estudo das normas gramaticais, em certo sentido, mesmo entre os estudiosos de Linguística e Língua Portuguesa: a consciência “científica” trazida pelo exame de fenômenos naturais como a variação e a mudança linguísticas terá trazido consigo um questionamento sobre o papel da prescrição gramatical na pedagogia linguística não só na educação básica como também na formação dos futuros professores de português.

Para além dessas razões, há que se considerar o perfil investigativo do corpo docente das Faculdades e Institutos de Letras, responsáveis pela formação dos futuros professores de língua portuguesa: prescrição gramatical raramente figura como tópico de pesquisa entre os estudiosos da área de Letras e Linguística. Uma vez que os pilares da instituição universitária brasileira são o ensino, a pesquisa e a extensão, é compreensível o esvanecimento, nos currículos de Licenciatura em Letras, dessa primeira frente - as normas e prescrições gramaticais - em virtude do seu diminuto (ou quase inexistente) papel na investigação universitária.

Tendo, então, em vista o complexo cenário da formação do futuro professor de língua portuguesa - que, na educação básica, lidará, como vimos (cf. seção 3), com ambas as frentes -, apresentamos, na próxima seção, alguns encaminhamentos que, acreditamos, sejam úteis às coordenadorias de curso de Licenciatura em Letras e equipes responsáveis pelos projetos pedagógicos no que diz respeito à formação do professor de língua portuguesa no contexto das duas frentes do ensino de gramática.

5. Por que ambas as frentes são importantes na educação básica e na formação do professor de língua portuguesa?

O percurso histórico apresentado na Introdução deste artigo - a partir de uma breve resenha à revisão feita em Faraco (2017) - mostrou que a gramática já ocupou um espaço central no contexto de ensino de línguas, de maneira puramente normativa, assim como já foi trabalhada articuladamente com atividades de leitura de textos de pensadores clássicos. Isso evidencia que a questão sobre o lugar que as normas gramaticais deve(ria)m ocupar não é uma questão nova. Vale ressaltar que, na história dos estudos filosóficos e gramaticais, questões tradicionais têm sido constantemente repensadas à luz de novos desenvolvimentos nessas áreas.

Na história dos estudos linguísticos, as indagações sobre a plausibilidade da assunção de uma “gramática comum”29 a todos os homens têm sempre inquietado os filósofos, os gramáticos e os linguistas. De modo especial, as indagações acerca da Faculdade da Linguagem - órgão da mente/cérebro diretamente envolvido na aquisição da primeira língua (Chomsky, 1986) - ou, mais propriamente, de seu estado inicial, a “Gramática Universal”, acompanham os estudos filosóficos pelo menos desde Francis Bacon (século XIII) e têm sido, desde então, matéria de revisão, reformulação e ou mesmo de contestação. É nesse contexto que a Gramática Gerativa surge nos anos cinquenta do século passado, ressuscitando questões tradicionais fascinantes de investigação sobre a natureza da linguagem, questões essas reconhecidamente complementares às questões trazidas pela gramática tradicional, como afirma Chomsky (1986, p. 6 - tradução livre): “[o]s interesses das gramáticas gerativa e tradicional são, de certo modo, complementares [...]”. Se o próprio Chomsky reconhece como complementares os objetivos e questões trazidos por essas duas áreas dos estudos gramaticais, há que se perguntar: por que é que as duas frentes - de que estamos tratando no artigo - não podem ser harmoniosamente desenvolvidas nas aulas de língua portuguesa ou, mais propriamente, por que é que se observa uma certa tendência a uma redução do papel da gramática tradicional no que diz respeito até mesmo à primeira frente?

Como vimos na seção 3, muito embora estabeleça um eixo de “Análise Linguística”, a BNCC reconhece, em certa medida, a importância de tópicos sobre normas gramaticais (tais como regências nominal e verbal, colocação pronominal, uso do acento indicador de crase, etc., relativos, portanto, à primeira frente), tópicos esses que também são abordados no LD (aqui examinado) que segue esse documento. Um professor da Educação Básica, portanto, terá que trabalhar com tais tópicos, já por esses tópicos terem espaço garantido no currículo e nos materiais didáticos. Deste modo, é importante que as faculdades e institutos de Letras formem o futuro professor tendo em vista, de um lado, as expectativas impostas pelo exercício da docência no ensino regular, e, de outro, todo o saber produzido em anos de pesquisa em teoria linguística - saber esse que não deve, jamais, ficar de fora da formação do futuro professor. É fundamental, portanto, que, para lidar com questões puramente prescritivas - no espírito do que se desenvolve na primeira frente -, o docente tenha um embasamento teórico claro, adquirido durante sua formação universitária, para que não corra o risco de lidar com essas questões a partir do senso comum, disseminando - o que seria muito lamentável - preconceitos linguísticos de toda a sorte, algo que se tem tornado infelizmente uma prática comum entre os “comentadores gramaticais” e youtubers (partidários da norma “curta”), os quais, muitas vezes, não têm qualquer formação em Linguística Teórica.

Em vista, portanto, da dificuldade de o projeto pedagógico dos cursos de formação de professores de língua portuguesa incluir, a exemplo do que fazem os cursos de Letras citados na seção 3, disciplinas específicas sobre a primeira frente dos estudos gramaticais (i.e., disciplinas de reflexão sobre normas gramaticais), coordenadores de cursos de Licenciatura em Letras e equipe dos “Núcleos Estruturantes” (no caso específico do Brasil) podem propor que o conteúdo tipicamente associado às normas gramaticais (concordância, regência, emprego do acento grave indicador de crase, colocação pronominal, ortografia, etc.) seja dissolvido em disciplinas associadas à segunda frente ou mesmo em disciplinas de produção textual. Importa, contudo, garantir que qualquer que seja a frente a ser abordada, o ensino de gramática seja sempre reflexivo, a despeito da limitação de recursos terminológicos e técnicos da gramática tradicional.

Podemos citar dois exemplos sobre como, de um lado, a primeira frente pode ser trabalhada de maneira reflexiva e sobre como, de outro, a segunda frente também pode sê-lo, ainda que a escolha metodológica seja a de trabalhar as frentes como objetos (praticamente) autônomos. No que diz respeito à primeira frente, Tescari Neto and Perigrino (2020) sugerem partir do conhecimento internalizado dos usuários de língua natural para se chegar a algumas regras da norma gramatical. Subjaz à proposta dos autores a premissa de que, sendo a norma gramatical tão somente mais uma outra norma (ou gramática, no sentido chomskyano), é possível, em perspectiva comparativa, compreender as regras da norma gramatical a partir do conhecimento internalizado dos alunos. Isso pode ser desenvolvido tanto no ensino superior quanto na educação básica.

No que diz respeito ao ensino da segunda frente, muito se discute, atualmente, no Brasil, sobre o lugar da gramática normativa no ensino de língua portuguesa. Entre os linguistas brasileiros, são bastante comuns as críticas à descrição e análise de fatos gramaticais proposta pelas gramáticas tradicionais, mesmo no contexto do ensino na educação básica. Critica-se, por exemplo, a limitação da Nomenclatura Gramatical Brasileira (Brasil, 1959), cujas categorias não dariam conta de descrever de maneira abrangente por exemplo as funções sintáticas imaginariamente plausíveis. Esquecem-se, contudo, os críticos de que, muito mais do que formar “pequenos linguistas”, a Escola deve formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres. Para os propósitos, então, do ensino regular, bastam as categorias da gramática tradicional que, por si, dão conta de explicar um conjunto de fatos gramaticais. Conforme argumentado em Tescari Neto (2020) e em Tescari Neto and Garcia Martins (2020), as categorias gramaticais presentes nos manuais e gramáticas tradicionais, além de serem acessíveis a um grande público - qualquer curso de formação de professores tem uma disciplina ou um conjunto de disciplinas voltadas ao estudo da gramática tradicional (que seja em perspectiva crítica) -, estão longe de serem obsoletas, como apontado pelo grande linguista italiano Guglielmo Cinque, ao discorrer sobre o papel das gramáticas e das teorias linguísticas no ensino de língua materna:

Quiçá a melhor solução [para o ensino de gramática na escola] seja assumir uma posição moderadamente tradicional, reexaminando de maneira crítica as definições e categorias propostas nas gramáticas escolares, à luz dos resultados de pesquisas recentes sobre linguagem. As definições e categorias da gramática tradicional estão longe de serem obsoletas. Categorias tais como ‘nome’, ‘verbo’, ‘adjetivo’, ‘sujeito’ ou classificações de orações como ‘relativas’, ‘causais’, ‘concessivas’ e assim por diante ainda são úteis ao menos como denominações de objetos, nesse caso linguísticos, e podem ser empregadas para pensar a complexidade e a sistematicidade da gramática da própria língua materna, ou de uma língua estrangeira. Lembremos que não são nem análises nem explicações desses ‘objetos’; assim, nesse sentido, as categorias da gramática tradicional são não raro incompletas e devem ser utilizadas junto a outras ferramentas. Elas podem, no entanto, servir para uma primeira reflexão sobre linguagem. (Cinque, 2018, pp. 105-106 tradução de Joyce Mattos & Aquiles Tescari Neto).

Não nos restam, portanto, dúvidas de que uma pedagogia linguística compromissada no ensino de língua tanto na educação básica como também na formação do professor de português pode partir dos esquemas tradicionais, em perspectiva crítica, recorrendo, sempre que possível, a metodologias de teorias linguísticas.

6. Considerações finais

Iniciamos nosso percurso, na Introdução, com uma revisão de Faraco (2017), segundo o qual a Gramática historicamente sempre teve um espaço no ensino de línguas, mesmo depois da publicação dos PCNs, documentos em que o texto passa a ser o eixo central do ensino de língua materna. Nosso objetivo principal foi discutir o lugar das normas gramaticais e da análise gramatical (no ensino de português na educação básica). Discutimos também as opções metodológicas mais comumente desenvolvidas em matéria de pedagogia gramatical. Linguistas de várias afiliações têm procurado revisitar essa questão para trazer novas contribuições, à luz de teorias linguísticas - e a proposta avançada neste trabalho se soma também a esses esforços.

Assim, na seção 2, buscamos estabelecer as duas principais frentes que compõem o ensino de gramática na Educação Básica no Brasil, sendo uma delas voltada à prescrição de normas gramaticais - “primeira frente” - e a outra à análise/ reflexão de aspectos (morfos)sintáticos - “segunda frente”. Tais frentes não se excluem, já que é possível assumir opções metodológicas que as trabalhem separadamente, em conjunto e, até mesmo, de forma articulada. Uma vez que essas duas “frentes” de trabalho fazem parte da Educação Básica, buscamos entender como elas figuram no currículo escolar e em projetos pedagógicos de cursos de Letras. Na seção 3, vimos que tópicos que abordam questões de normas gramaticais num viés voltado ao que denominamos de “primeira frente” são contemplados pela BNCC, que guia a elaboração dos currículos escolares e, portanto, fazem parte da formação dos alunos do Ensino Fundamental brasileiro. Além disso, o LD analisado - que segue um critério de seleção aplicado aos demais livros didáticos e que também serve de apoio ao trabalho do professor - dedica um espaço inclusive para a prescrição gramatical. Apesar disso, ficou constatado, por meio de consulta às grades curriculares de projetos pedagógicos de alguns cursos de Letras brasileiros, que são poucos os cursos que oferecem aos futuros professores disciplinas voltadas a questões relacionadas às normas gramaticais.

No que diz respeito à “segunda frente”, a seção 4 mostrou que o trabalho com a análise reflexiva da língua, com questões relativas à morfologia e à sintaxe (ou mesmo à morfossintaxe), ocupa boa parte do currículo e dos materiais didáticos. A mesma constatação é válida no contexto dos cursos de Letras que, via de regra, contemplam tais conteúdos nas disciplinas de Sintaxe, Morfologia e Morfossintaxe.

A seção 5 argumentou que, em vista do fato de ambas as frentes serem contempladas, tanto nos currículos quantos nos materiais didáticos da Educação Básica, é de fundamental importância, portanto, que os cursos de formação de professores ofereçam, em seus ementários, um espaço para questões referentes à prescrição de normas, sem desconsiderar o espaço dado à análise linguística. Uma vez que essas questões terão que ser abordadas no contexto do ensino de línguas, é importante que sejam trabalhadas por profissionais preparados pelas faculdades e institutos de Letras que tendem a oferecer sólida formação em teoria linguística.

Referências

1. Avelar J O. (2017). Saberes Gramaticais: formas, normas e sentidos no espaço escolar. São Paulo: Parábola Editorial. [ Links ]

2. Bechara E. (1985). Lições de português pela análise sintática. (13th ed.) Rio de Janeiro: Padrão. [ Links ]

3. Bell A. (1984). Language Style as Audience Design. In Coupland, N. and A. Jaworski (1997, eds.) Sociolinguistics: a Reader and Coursebook, pp. 240-50. New York: St Mattin's Press Inc. [ Links ]

4. Bortoni-Ricardo S M. (2003). Educação em língua materna: a sociolingüística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial. [ Links ]

5. Brasil. (1959). Portaria n.º 36, de 28 de janeiro de 1959. Dispõe sobre a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB). Rio de Janeiro, Distrito Federal. [ Links ]

6. Brasil. (1998). Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF. [ Links ]

7. Brasil. (2000). Parâmetros curriculares nacionais: Ensino médio: partes I e II. Brasília: SEB/ MEC. [ Links ]

8. Brasil. (2016). PNLD 2017: língua portuguesa - Ensino fundamental anos finais / Ministério da Educação - Secretária de Educação Básica SEB - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretária de Educação Básica, 98 p. [ Links ]

9. Brasil. (2017). Base Nacional Comum Curricular. Secretaria de Educação Básica. Brasília: MEC, SEB. [ Links ]

10. Castilho A T. (2000). A língua falada no ensino de português. São Paulo: Contexto. [ Links ]

11. Chomsky N. (1986). Knowledge of Language: its Nature, Origin and Use. New York: Praeger. [ Links ]

12. Cinque G. (2018). A cosa può servire l'insegnamento della grammatica. In: Santipolo, M.; Mazzotta, P. (A Cura di.) L'educazione linguistica oggi. Nuove sfide tra riflessioni teoriche e proposte operative. Festschrift para Paolo Balboni. Torino: UTET Università, p. 105-110. [ Links ]

13. Donati C. (2008). La sintassi: regole e strutture. Bologna: il Mulino. [ Links ]

14. Duarte M E L, Serra C. (2015). Gramática(s), ensino de Português e "adequação linguística". Matraga, v. 22, n. 36, p. 31-55. [ Links ]

15. Faraco C A. (2008). Norma culta brasileira: desatando alguns nós. São Paulo: Parábola. Faraco, C. A. (2017). Gramática e ensino. Diadorim, Rio de Janeiro, Revista 19 volume 2, p. 11-26, Jul-Dez [ Links ]

16. Franchi C. (1991). Criatividade e gramática. São Paulo: SE/CENP. 39p. [ Links ]

17. Furtado da Cunha M A, Tavares M A. (org). (2016). Funcionalismo e ensino de gramática. Natal, RN: EDUFRN. [ Links ]

18. Geraldi J W. (1984). Unidades básicas do ensino de português. In: Geraldi, J.W (Org.) O texto na sala de aula: leitura & produção. 2.ed. Cascavel: Assoeste, p. 49-69. [ Links ]

19. Ilari R, Possenti S. (1985). Português e ensino de gramática. In: São Paulo (Estado). Secretaria da Educação. Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas. São Paulo, SE/CENP, p. 1-12. Ilari, R. Lingüística e ensino de língua materna. (n.d.). Museu da Língua Portuguesa, n.d. Disponível em: https://www.museudalinguaportuguesa.org.br/wp-content/uploads/2017/09/ENSINO-COMO-LINGUA-MATERNA.pdf Acesso: 15/12/2020Links ]

20. Kato M A. (1986) No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística. São Paulo: Ática. [ Links ]

21. Kury A G. (1985). Lições de português pela análise sintática. São Paulo: Ática. [ Links ]

22. Lyons J. (1969) Introduction to Theoretical Linguistics. Cambridge: Cambridge University Press. [ Links ]

23. Marcuschi L A. (2000). Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez. [ Links ]

24. Marcuschi L A. (2005). Perplexidades e perspectivas da Lingu¨ística na virada do milênio. Língua, linguística e literatura, vol.3., n.1, 11-35 [ Links ]

25. Medeiros Junior P. (2020). Gramática Sim, e daí? Reflexões acerca do ensino de gramática nos anos da educação básica. 1. ed. Curitiba: CRV, v. 1. 98p. [ Links ]

26. Mendonça M. (2006). Análise linguística no ensino médio: um novo olhar, um outro objeto. In: Bunzem, C., & Mendonça, M. (org.). Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, p.199-226. [ Links ]

27. Oliveira T A, Araújo L A M. (2018). Tecendo linguagens: língua portuguesa. (5th ed.) Barueri (SP): IBEP. [ Links ]

28. Pagotto E G. (1998). Norma e condescendência: ciência e pureza, Línguas e Instrumentos linguísticos 2, 49-68. [ Links ]

29. Perigrino M. (2020). Os advérbios no ensino de língua portuguesa: livros didáticos, metodologia gerativa e teoria da gramática. (Dissertação de Mestrado em Linguística), UNICAMP, São Paulo, Brasil. [ Links ]

30. Pilati E. (2017). Linguística, gramática e aprendizagem ativa (2nd ed.). São Paulo: Pontes. [ Links ]

31. Pires de Oliveira R, Quarezemin S. (2016). Gramáticas na escola. Petrópolis: Vozes. [ Links ]

32. Segredo L C. (2011). A Educação Linguística no Curso de Letras: contribuições para o ensino de Língua Portuguesa. (Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa), PUC, São Paulo, Brasil. Tescari Neto, A. (2017). Constituência sintática, ambiguidade estrutural e aula de português: o lugar da teoria gramatical no ensino e na formação do professor. Working Papers in Linguistics (Online), v.18, p.129-152. [ Links ]

33. Tescari Neto A, Perigrino M. (2018) O verbo e o substantivo em livros didáticos contribuições da gramática gerativa às aulas de português. Revista da Abralin, v. 17(1), p. 152-191. [ Links ]

34. Tescari Neto A, Perigrino M. (2020). Cartografia Sintática nas aulas de gramática: por uma metodologia de ensino da classe dos advérbios. In: Guesser, S.; Rech, N.F. Gramática, aquisição e processamento. Campinas: Pontes, p. 191-215. [ Links ]

35. Tescari Neto A, Garcia Martins M. (2020) Classes de palavras. Manuscrito, Unicamp. Travaglia, L. C. (2002). Para que ensinar teoria gramatical. Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v.10, n. 2, p.135-231, jul./dez. [ Links ]

36. Unilab. Projeto político pedagógico: graduação em Letras - Língua portuguesa. Redenção, CE, 2016. [ Links ]

1. Agradecemos a um dos pareceristas anônimos pelas valiosas observações feitas. Agradecemos também aos alunos do PIBID de Língua Portuguesa (IEL/UNICAMP, 2020) pelo feedback dado a uma versão preliminar deste texto. Nosso trabalho foi discutido com os membros do LaCaSa (IEL/UNICAMP),a quem agradecemos as questões colocadas.

2. O GoogleScholar contabilizava 201 citações ao manual no dia 27 de outubro de 2020 (Fonte: https://is.gd/scholar_kury ).

3. Uma busca pelo Google, em 27 de outubro de 2020, retornou-nos, com muita rapidez, para as palavras--chave “Kury” + “Novas lições” + “sintaxe” + “língua portuguesa” + “ementário” + “referências” (e similares), um vasto conjunto de ementas de disciplinas de cursos de formação de professores de língua portuguesa (“curso de Letras”), no Brasil, em que o Novas Lições de análise sintática (Kury, 1985) figurava entre as referências. Os links encurtados (e personalizados) a seguir são de sites contendo programas de disciplinas de Letras de universidades federais - uma por cada região do Brasil - em que Kury (1985) figura na bibliografia: Centro-Oeste - UFG: https://is.gd/ufg_letras; Sudeste - UFMG: https://is.gd/ufmg_letras; Sul -UFSM: https://is.gd/ufsm_letras; Nordeste - UFPB: https://is.gd/ufpb_letras; Norte - UFAM: https://is.gd/ufam_letras

4. Falamos especificamente, nesses casos, de atividades de reescrita e reelaboração textual, no espírito do proposto em Marcuschi (2000), mas naturalmente com uma atenção especial ao “eixo de monitoração estilística” (Bortoni-Ricardo, 2003): altera-se o gênero textual o que implica uma alteração natural de estilo: quanto mais “formal” o gênero, mais “formal” o estilo.

5. Um dos revisores apontou que outros livros didáticos poderiam ter sido analisados para que generalizações mais robustas pudessem ser feitas. Salientamos, porém, que os LDs de escolas públicas brasileiras são aprovados pelo PNLD, programa que segue uma série de critérios, o que faz, de certo modo, com que os materiais guardem uma certa identidade relativamente não só quanto as habilidades e objetos de conhecimento desenvolvidos ao longo das unidades didáticas como também quanto aos próprios eixos organizadoes da divisão do livro por unidades didáticas (gêneros textuais ou tópicos gramaticais ou escolas literárias, por exemplo). O Guia de Livros Didáticos, que pode ser consultado no site do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, do ano do livro analisado no artigo, em uma análise do ensino proposto pelas coleções, pontua que a maioria das coleções aprovadas contemplam “os principais tópicos das gramáticas pedagógicas tradicionais” (Brasil, 2016, p. 33). O ficheiro para consulta se encontra disponível no endereço seguinte, acessado no dia 3 de abril de 2021: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/programas-do-livro/pnld/guia-do-pnld/item/8813-guia-pnld-2017 .

6. https://www.ibilce.unesp.br/Home/Graduacao450/LetrasDiurno/projeto-pedagogico-sem-ementas-p2.pdf Acesso em 15 de novembro de 2020

7. https://www.fclar.unesp.br/#!/graduacao/cursos-de-graduacao/letras/sobre-o-curso/ Acesso em 10 de dezembro de 2020 .

8. http://cursos.ufrrj.br/grad/letras/files/2020/03/EMENTÁRIO-PORTUGUÊS-INGLÊS-LITERATURAS. pdf Acesso em 10 de dezembro de 2020

9. https://ensino.ufms.br/cursos/grade/0740 Acesso em 15 de novembro de 2020

10. Elencamos a disciplina no rol das disciplinas da primeira frente em vista de a ementa informada no projeto pedagógico contemplar “concordância” e “regência”. Entendemos, contudo, que, na prática, pode ser que o objetivo da disciplina não seja o de reflexão sobre normas gramaticais: “EMENTA: Coordenação e subordinação; a estrutura frasal sob o aspecto sintático, semântico e informacional; frase ativa, passiva e predicativa; os processos sintáticos de configuração da frase: regência, concordância e ordem.” (cf. http://www.campuscameta.ufpa.br/images/textos/ppc_curso_letras_cameta.pdf Acesso em 16 de novembro de 2020 )

11. Como exemplos de cursos de licenciatura em Letras a oferecerem disciplinas sobre normas gramaticais na modalidade optativa/eletiva, indicam-se os seguintes (a consulta aos sites indicados foi feita no dia 9 de dezembro de 2020): (i) UEMG - Unidade de Carangola (Português/inglês e literaturas); disciplinas da “primeira frente” informadas: “Norma padrão escrita I”; “Norma padrão escrita II”. Link: https://www.uemg. br/images/PPC_Letras_Port.Ing._Lic_Carangola_aprovado_coepe_28.12.16.pdf (ii) UFAL - curso de Licenciatura em Letras; disciplina informada sobre a “primeira frente”: Gramática normativa e ensino da Língua Portuguesa (cf. https://ufal.br/estudante/graduacao/projetos- pedagogicos/campus-maceio/ppc-letras-portugues.pdf ). Como não há, contudo, a ementa, não é possível prever se o curso trata da primeira, segunda ou ambas as frentes.

12. Trata-se, em certo sentido, do que o linguista neozelandês Allan Bell chamou (Bell, 1984) de “monitoramento do público” - ‘audience design’ -: a depender de seu(s) interlocutor(es), o produtor do texto escolherá as variantes mais adequadas à situação que, em conjunto, caracterizarão uma norma (oral ou escrita) adequada à situação comunicativa.

13. O foco, como veremos na próxima seção, em matéria formativa, se dá sobretudo no que diz respeito à segunda frente, mesmo quando abordada na perspectiva tradicional.

14. A exemplo do que é feito em Tescari Neto & Perigrino (2020), que se valem de metodologias de teorias linguísticas, sobretudo em perspectiva comparativa, para uma explanação das normas gramaticais.

15. Obviamente que se pode considerar, em certo sentido, como análise linguística, um estudo sobre fenômenos fonológicos - embora tal estudo não costume usualmente integrar os planos de ensino da educação básica - como também a questão mesma da representação (orto)gráfica dos sons da língua. Limitamo-nos aqui, contudo, tão somente ao nível morfossintático.

16. Não é, contudo, consensual que o estudo das classes de palavras se circunscreva necessariamente aos capítulos de morfologia. A esse respeito, vejam-se, dentre outros, Donati (2008), Perigrino (2020), Tescari Neto and Garcia Martins (2020) e Tescari Neto and Perigrino (2018, 2020).

17. Cf. https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/25/o/2014_PPC_port.pdf Acesso em 9 de dezembro de 2020 .

18. Cf. https://is.gd/letras_unifesp_ppp Acesso em 9 de dezembro de 2020 .

19. Cf. https://www.ibilce.unesp.br/Home/Graduacao450/LetrasDiurno/projeto-pedagogico-sem-ementas-p2.pdf Acesso em 9 de dezembro de 2020 .

20. Cf. http://www.cchla.ufpb.br/ccl/contents/documentos/ppc_letras-portugues-2019.pdf Acesso em 10 de dezembro de 2020 .

21. Cf. http://www.unilab.edu.br/wp-content/uploads/2011/11/Projeto-Pedag%C3%B3gico-Curricular-do-Curso-de-Licenciatura-em-Letras-Campi-Liberdade-e-Palmares.pdf Acesso em 10 de dezembro de 2020

22. https://www.iel.unicamp.br/arquivos/graduacao/Projeto_Pedagogico_do_Curso_de_Licenciatura_em_Letras_UNICAMP-2019.pdf Acesso em 10/12/2020

23. http://www.unespar.edu.br/PROGRAD/sobre/cursos/paranagua/ppc-de-letras-portugues-pgua-2.pdf. Acesso em 10/12/2020

24. https://www.univas.edu.br/docs/2020/graduacao/projetoPedagogico/30.pdf Acesso em 10/12/2020

25. http://www.portal.letras.ufrj.br/graduacao/cursos-de-graduacao/portugues-literaturas.html Acesso em 10/12/2020

26. Cf. https://prograd.furg.br/images/PPC-Letras-Portugus.pdf Acesso: 10/12/2020

27. Cf. http://www.uern.br/controledepaginas/proeg-projetos-pedagogicos-central/arquivos/4226ppc_letras_l_portuguesa_central.pdf Acesso em 10/12/2020

28. Cf. https://unimontes.br/wp-content/uploads/2020/03/resolucao_cepex197.pdf Acesso em 10/12/2020

29. Falamos aqui de “gramática” no sentido chomskyano de “gramática internalizada”, i.e., de um conjunto de regras e princípios que caracterizam a gramática adquirida pela criança.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons