Introdução
A água é um elemento fundamental para o desenvolvimento sustentável dos países, desde a protecção e conservação ambiental à segurança alimentar, ao aumento do turismo e investimento, à educação e promoção da igualdade do género, em todos os processos produtivos e às perdas de produtividade devidas a doenças e má nutrição (Mendes, 2010).
Em Angola, apenas 44% dos agregados familiares têm acesso a fontes apropriadas de água para beber, sendo que a zona rural é ainda mais dramática (INE,2016). A precariedade em termos de água de consumo nota-se mais entre as populações pobres, sendo que apenas uma em cada cinco pessoas, entre os 20% da população mais pobre, tem acesso a fontes apropriadas de água (PNDS, 2012).
Na Província do Huambo, o abastecimento de água à população não é díspar das demais províncias do país que apresentam ainda muitas assimetrias e lacunas no que se refere à cobertura territorial e deficiências em termos de qualidade da água fornecida. De acordo com os dados do Plano de Desenvolvimento Provincial, em 2014, apenas cerca de 11% dos agregados familiares tinham acesso a água proveniente da rede pública, 39% consumiam água por auto-abastecimento e 50% recorriam a fontes inapropriadas para o consumo (PDP, 2018).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), pelo menos dois bilhões de pessoas no mundo usam uma fonte de água contaminada com fezes. Estima-se que a água potável contaminada ocasione 502 mil mortes diarreicas por ano. No entanto, para padronizar e regulamentar a qualidade da água, a OMS aponta diretrizes internacionais para serem usadas como base em todo o mundo, com a intenção de proporcionar a proteção da saúde pública (Glowacki e Crippa, 2019).
Os critérios de qualidade da água da Organização Mundial da Saúde (WHO 1996, 2006, 2011) correspondem a uma dada fase do conhecimento científico, no que se refere à relação de causa/efeito, e estão em aperfeiçoamento constante, podendo ser introduzidos novos critérios ou alterados os existentes à medida que progride o conhecimento científico. As normas de qualidade fixadas em legislação nacional poderão sofrer do mesmo modo as correções necessárias. Segundo Boaventura e Leitão, (2013) citado por Manuel et al., (2018), o processo de tratamento da água pode ser menos ou mais complexo, incluindo etapas de pré-oxidação, coagulação-floculação, decantação, filtração, afinação e desinfeção, em função da qualidade da água bruta.
Importa realçar que, quanto pior for a qualidade desta água, tanto mais complexo e caro será o seu processo de tratamento para produzir uma água potável. Manuel et al. (2018) ressaltam que a principal causa de contaminação ou poluição destas águas está associada à ação natural, à ação antropogénica, originada principalmente pelo lançamento direto das águas residuais domésticas (contendo microrganismos patogénicos, poluentes orgânicos e nutrientes) e águas residuais industriais (que podem conter poluentes inorgânicos e orgânicos), sem tratamento ou com tratamento inadequado, e águas de drenagem das áreas agrícolas (contaminadas através do uso de fertilizantes e material em suspensão).
No que tange à disponibilidade de água potável e de saneamento básico para a sua população, Angola continua sendo ainda um dos países críticos, apesar do crescimento económico que o país está registando e do grande esforço do Governo nesta área através do Plano de Acção Estratégico do Sector de Águas para o período 2004-2016 (Resolução nº10/04). A saúde em Angola é ainda classificada entre as piores do mundo e o índice de doenças e mortes, sobretudo com origem na má qualidade da água, continua muito elevado (Manuel et al., 2018). A mortalidade infantil é estimada em 76,5 por 1000 nascidos vivos (175,9 em 2011) e a esperança de vida à nascença em 56 anos, embora fosse apenas de cerca de 39 anos em 2011 (Index Mundi, 2016).
A água utilizada para o consumo humano deve ser agradável ao paladar, à vista dos consumidores, não deve causar danos à saúde pública e, não causar deterioração ou destruição das diferentes partes dos sistemas de abastecimento. Angola é ainda um país em que a regulação da qualidade das águas, quer naturais e tratadas, não está plenamente implementada, embora no país haja legislação que permite a classificação das águas doces superficiais destinadas à produção de água para o consumo humano (Decreto Presidencial n.º 261/11). No entanto, não existe ainda legislação angolana que estabeleça adequadamente as normas de qualidade da água para o consumo humano e outros usos (rega, proteção da vida piscícola, recreio, etc.), pelo que é necessário recorrer a diretivas da OMS e a documentos legais de outros países, como por exemplo, de Portugal (Decreto-Lei n.º 306/2007), Brasil (portaria n.º 2.914/2011) que transpõe para o direito português e brasileiro diretivas da União Europeia e da América Latina sobre qualidade da água.
O presente estudo teve como objectivo avaliar a qualidade físico-química e microbiológica da água consumida pela população da cidade do Huambo.
Material e Métodos
Caracterização da Cidade do Huambo
A província do Huambo, também conhecida por ‘’ Planalto Central ‘’, ocupa o 11° lugar dentro do território angolano e fica situada na região centro-oeste de Angola. É limitada a noroeste e a leste pela província do Bié, a sul, pela província da Huila, a oeste pela cidade de Benguela e a noroeste pela província do Cuanza Sul. Corresponde à superfície planáltica de maior altitude do território angolano, situada acima da curva de 1500m. Estende-se para Sul, ocupando uma superfície de 35.771 km2 (2,61% da extensão nacional), sendo sua capital a cidade do Huambo. O município sede ocupa o 8° lugar dentro de um grupo de 11 municípios. A província atravessa regiões essencialmente agrícolas, e uma região urbana importante. Situa-se entre os paralelos 100 27’ e 140 16’ de latitude Sul e os meridianos 140 14’ e 170 37’ de longitude Este (Atlas Geográfico, vol. 1, 1986).
Tipos de Águas Estudadas
Nesta pesquisa, foram estudadas duas categorias de águas consumidas maioritariamente pela população da cidade do Huambo, que se agruparam em duas classes distintas:
1. Água tratada do Sistema de Abastecimento Público: Torneiras
2. Água não tratada de fontes alternativas: Poços profundos (cacimbas)
Colheitas das amostras
Foram colhidas amostras em 2 pontos da cidade em estudo, onde duas foram acondicionadas à temperatura ambiente e outra em condições de refrigeração (3 °C). Na rede de sistema de abastecimento público (torneiras) colheram-se oito amostras e oito em poços profundos (cacimbas). As amostras foram coletadas no período de manhã, nos dias 24 e 25 de Setembro de 2013 e 08 de Janeiro de 2014, e codificadas contendo o nome do coletor, horário e data da coleta e tipo de amostra, as amostras foram mantidas sob refrigeração e acondicionadas em caixas isotérmicas até a chegada no laboratório de Microbiologia do Instituto Superior Politécnico de Bragança. Na colheita das amostras teve-se a precaução que estas fossem homogéneas, ou seja representativas do local amostrado.
Análises microbiológicas
Para o procedimento das análises microbiológicas foram recolhidas amostras de água provenientes de diversas origens (torneiras e poços). A colheita foi efetuada de acordo com a NP - 1828 (1982), em condições de assepsia. Para a colheita das águas do poço usou-se frascos de mergulho devidamente esterilizados com a capacidade de 500 mL. A recolha foi feita com a máxima precaução evitando que os mesmos roçassem nas paredes e arrastassem alguns resíduos. De acordo com o Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de Agosto, para a colheita de águas da torneira teve-se em conta o seguinte: 1. Flamejar o algodão em álcool e desinfetar a torneira; 2. Deixar correr água durante 5 minutos para eliminar qualquer vestígio de matéria orgânica existentes na tubagem; 3. Recolher para um tubo estéril em condições de assepsia e identificar a amostra.
As análises microbiológicas foram realizadas de acordo com as Normas internacionais e Portuguesas e por Kits (Métodos Oficiais da AOAC). O material usado foi o comum no laboratório de microbiologia e todo ele foi lavado, passado por água destilada 20 minutos, seco em estufa e esterilizado pelo calor seco/estufa a 180º C durante 3 horas.
Análise físico-química
Para os parâmetros físico-químicos, as amostras foram colhidas em frascos plásticos, com a capacidade volumétrica de 1500 mL, que não sofreram qualquer tipo de preparação específica. Logo após a colheita, todas as amostras foram acondicionadas em caixas isotérmicas, mantidas sob refrigeração, e transportadas para Portugal no Laboratório de Microbiologia do Instituto Superior Politécnico de Bragança. Neste tipo de análises foi usado material comum de um laboratório de química. Todo o material foi lavado, passado por água destilado e seco em estufa.
Parâmetros Analisados e Metodologias Analíticas
A seleção dos parâmetros a analisar e a avaliação do cumprimento dos respetivos valores paramétricos ou limite baseou-se principalmente na legislação portuguesa (Decreto-Lei n.º 306/2007).
Os parâmetros físico-químicos analisados neste estudo foram: pH, oxigénio dissolvido (OD), condutividade, acidez, cloretos, cálcio, Sulfatos, Fosfatos, oxidabilidade, alcalinidade, dureza total, magnésio, nitritos, nitratos, e carência bioquímica de oxigénio.
Para determinação do pH utilizou-se um peagâmetro de bancada, marca Quimis, modelo 400 A e versão 1,01. Este foi devidamente calibrado e aferido com padrão de controlo analítico, sendo as calibrações necessárias efetuadas conforme manual do fabricante. A metodologia utilizada no processamento dos parâmetros: oxigénio dissolvido foi titulometria por precipitação, acidez (titulometria por neutralização), Fosfatos (titulometria de retorno), alcalinidade (titulometria por neutralização), Cloretos (titulometria por precipitação) e dureza (titulometria por complexação). Determinação do Cálcio colocou-se 50 mL da amostra a analisar num Erlenmeyer de 125 mL, 3 mL de hidróxido de sódio (NaOH - 1N) e 4 gotas do indicador de azul de eriocromo e titulou-se com EDTA até a mudança de cor para azul.
A concentração de nitratos mediu-se 10 ml de amostra para a cápsula, adicionado NaOH 0,1N e evaporar em banho-maria, tomar o resíduo e misturar com 2 ml de H2SO4 puro, para finalizar foi adicionado 15 ml de H2O desionizada, mais 15ml da solução de hidróxido de sódio e potássio e deixou-se arrefecer. Foi efetuado a leitura no espectrofotómetro a 435 nm. Para os nitratos mediu-se 50 mL da amostra para uma cápsula, adicionado 2 mL do reagente Zambelli e foi agitado para homogeneização da mistura, deixou-se repousar a solução durante 10 minutos, depois mediu-se a concentração no espectrofotómetro a um comprimento de onda de 525 nm.
À Carência Bioquímica de Oxigénio (CBO5) mediu-se 250 mL da amostra de água analisada e colocada em frascos de incubação (frascos de vidro de incubação, para impedimento da penetração da luz), foram adicionados 2 mL da solução de sulfato manganoso e 2 mL de solução de iodeto alcalina com azida de sódio, fechou-se (rolhar) cuidadosamente o frasco e agitou-se por inversão deixando o sobrenadante límpido de flocos de hidróxido de manganoso, depois adicionou-se 2 mL de H2SO4 concentrado, agitou-se até a dissolução total do precipitado e retirou-se 203 mL da amostra original para uma proveta graduada, foi titulada com a solução de tiossulfato de sódio 0,025N até obter uma coloração amarelo palha, por fim juntou-se 2 mL de solução de amido e prosseguiu-se com a titulação até o desaparecimento da cor azul. Determinação da concentração dos fosfatos foi colocado 20 mL da amostra de água a analisar (incluindo a testemunha) em balões de 25 mL, adicionado 1mL de ácido ascórbico e 4 mL da solução de desenvolvimento de cor, em seguida foi guardado no escuro durante 30 minutos e procedeu-se à leitura no espectrofotómetro a um comprimento de onda de 800 nm. De acordo com a legislação portuguesa, o valor paramétrico para o teor de fosfatos em água para o consumo humano é de 250 mg/L.
Os parâmetros microbiológicos analisados neste estudo foram: Número de colónias a 22 ºC a 37ºC, coliformes totais, Escherichia Coli (E.Coli) e Enterobacteriaceae.
Em termos de parâmetros microbiológicos, foi realizada uma análise qualitativa (presença/ausência) de coliformes totais e de Escherichia Coli (E.Coli). A análise e contagem de coliformes totais e E. coli foi realizada utilizando o SimPlate® da Bio Control (método oficial AOAC 2005.03) e procedeu-se de acordo com as recomendações do fabricante. O meio de cultura fornecido foi hidratado em 100mL de água estéril. Em todos os tubos de ensaio foram colocados 9 mL de meio de cultura previamente hidratado e 1mL da amostra, homogeneizou-se com auxílio do vortex. Seguidamente, verteu-se o conteúdo dos tubos para uma placa contendo 84 poços e espalhou-se uniforme e cuidadosamente o líquido com movimentos circulares para que os poços ficassem totalmente cobertos e sem bolhas de ar. Por último, o excesso foi removido. As placas foram incubadas a 37ºC durante 24 a 48 horas. Após o período de incubação, procedeu-se a enumeração dos coliformes totais através da contagem do número de poços em que ocorreu a mudança de cor do meio de cultura. Enquanto, para a identificação e enumeração da E.coli, procedeu-se à contagem do número de poços em que se observou a fluorescência após exposição da placa a uma lâmpada de UV a 365nm. Com base numa tabela fornecida pelo fabricante, calculou-se o número de coliformes e Escherichia coli presentes na amostra e os resultados foram expressos em UFC/mL.
Resultados e discussão
Do total de amostras analisadas, 40,0 % e 21,9 % (poços) e 25,7 % e 19,1 % (torneiras) excederam as recomendações do Nº de colónias a 22ºC e a 37ºC (Tabela 1). Foi considerado que as amostras que excederam os valores recomendáveis estariam em situação de não conformidade, como indicado no Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de agosto, e verificar assim a (a) normalidade dos valores, o qual recomenda que o número de colónias a 22ºC e a 37ºC da água destinada ao consumo humano não ultrapasse o valor de 100 UFC/mL e 20 UFC/mL respetivamente.
Desta forma, os valores recomendáveis não foram respeitados em 40,0 % e 21,9 % (poços) e 25,7 % e 19,1 % (torneiras) das amostras de água, respetivamente. Estes resultados indicam uma potencial contaminação e deterioração da qualidade da água (Mendes e Oliveira, 2004; Sartory, 2004). Deficiências ao nível de higienização nos tanques d’água e integridade do sistema de distribuição e abastecimento, um processo de tratamento e desinfeção da água ineficaz, e a presença de biofilmes, são igualmente potenciais causas para presença de microrganismos a 22 e 37ºC (WHO, 2006; WHO, 2011).
Foi detetada a presença de coliformes totais em 34,6% e 11,5% das amostras de água nos poços e torneiras respetivamente, valores superiores ao legislado. De acordo com o Decreto-Lei n.º 306/2007 de Agosto, os valores paramétricos para água destinada ao consumo humano são <10 UFC/mL.
Convém salientar que a contaminação das águas por coliformes totais pode ter outra origem (contaminação ambiental, manipuladores, transporte) que não apenas por fezes.
Em conformidade com Rocha et al. (2010), esse tipo de contaminação pode ocorrer durante a captação de água no sistema público; no entanto, na maioria das vezes, ela está associada à má condição de higiene na tubulação e no reservatório onde é acondicionada a água que alimenta as torneiras.
A falta de monitoramento acaba criando condições favoráveis para o desenvolvimento e a sobrevivência de micro-organismos patogênicos aos seres humanos.
Os resultados do presente estudo corroboram com os resultados encontrados por Benguela (2006) ao analisar o sistema de abastecimento de água de consumo da cidade do Huambo, verificou altos índices de contaminação por bactérias coliformes totais, sendo esta a principal causadora de doenças intestinais.
Como base nos parâmetros E. coli (indicador de contaminação fecal), não foi observado em nenhuma das amostras analisadas, o que poderá estar relacionado com as condições de transporte e manuseamento da água. Contudo, trata-se de microrganismos muito sensíveis às condições de stress (WHO, 2002).
Poço | Torneira | Valor Paramétrico | |||
---|---|---|---|---|---|
Temperatura ambiente | |||||
Número de colónias a 37ºC (UFC)/mL (48h) | Média S* | 8,273*10 3 ± 2,186*10 3 | 4,405*10 3 ± 1,91*103 | 20/mL | |
Número de colónias a 22ºC (UFC)/mL (48h) | Média S* | 5,73*10 5 ± 4,00*10 5 | 3,95*105 ± 2,57*105 | 100/mL | |
Coliformes totais (UFC)/100mL | Média S* | 4,00*101 ± 3,46*101 | 2,67*103 ± 1,15*103 | 0/100mL | |
Escherichia coli (UFC)/100mL | Média | <10 | <10 | 0/100mL | |
Enterobacteriaceae | Média S* | 2,67*101 ± 1,15*10 1 | 2,00*101 ± 0,00 | ______ | |
Condições de refrigeração | |||||
Número de colónias a 37ºC (UFC)/mL (48h) | Média S* | 6,591*10 4 ± 1,221*10 4 | 2,495*103 ± 1,600*103 | 20/mL | |
Número de colónias a 22ºC (UFC)/mL (48h) | Média S* | 5,85*103 ± 4,17*10 2 | 3,845*103 ± 1,582*103 | 100/mL | |
Coliformes totais (UFC)/100mL | Média S* | 6,6*10 1 ± 2,3*101 | 3,3*10 1 ± 2,3*101 | 0/100mL | |
Escherichia coli (UFC)/100mL | Média | <10 | <10 | 0/100mL | |
Enterobacteriaceae | Média S* | 4*10 1 ± 2,0*10 1 | 2,00*10 1 ± 0,00 | 0/100mL |
(UFC) unidades formadoras de colônias, (S*) desvio padrão.
Em um estudo similar realizado no Uíge, Manuel et al. (2018) observaram que as águas do sistema alternativo revelam haver contaminação fecal em quase 100% das amostras de água das cacimbas e em mais de 80% das amostras de água dos furos artesianos, concluindo que existe uma relação entre qualidade da água consumida e a prevalência de doenças de veiculação hídrica predominantes na população. Essas doenças só poderão diminuir com a melhoria da qualidade da água fornecida à população.
No estudo de Rocha et al (2012) sobre padrão microbiológico de potabilidade da água destinada ao uso humano no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), a análise deEscherichia coliapresentou resultados idênticos ao deste estudo, os quais mostraram-se negativos para a presença deste microrganismo.
De acordo com os dados obtidos através das análises efetuadas na água, os parâmetros físico-químicos (tabela 2) apresentaram o valor do pH com uma dispersão muito pequena (<5%). O valor médio do pH das amostras de água analisadas oscilou entre 6,0 e 6,8. As amostras de água do poço apresentaram um valor médio mais baixo comparativamente com as águas da torneira (Tabela 2).
Observa-se que os valores obtidos para a água da torneira estão de acordo com o estabelecido no Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de Agosto, que estabelece que o pH para as águas destinadas ao consumo humano devem situar-se entre 6,5 e 9,0. Embora este parâmetro não seja muito relevante a nível da saúde humana, verifica-se que o pH da água do poço foi ligeiramente inferior ao legislado.
De acordo com Massoud (1992); Wetzel (1993); Mendes e Oliveira (2004), o fósforo pode ser encontrado na natureza sob a forma mineral e orgânica. É caracterizado como elemento essencial à vida e não tóxico aos seres vivos. No entanto, o excesso deste nutriente na água aumenta a proliferação das bactérias contribuindo para o efeito no processo de eutrofização. O valor do nível de fósforo no presente estudo ficou abaixo do estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 306/2007, a qual regulamenta um limite máximo para o fosfato de 250 mg/L.
Parâmetros | Poço | Torneira | Valor Paramétrico | |
---|---|---|---|---|
pH (escala de Sõrensen) | Média S* | 6,04 0,65 | 6,80 0,00 | 6,5 - 9.0 |
Fosfatos (mg/L) | Média S* | 3,39 0,10 | 0,00 0,00 | 250 mg/L |
Nitratos (mg/L) | Média S* | 0,41 0,00 | 0,11 0,00 | 50 mg/L NO3 |
Alcalinidade (mg/L) | Média S* | 0,04 0,00 | 0,15 0,00 | 25 mg/L CaCO3 |
Cloretos (mg/L) | Média S* | 4,97 0,00 | 3,90 0,00 | 250mg/L |
Acidez (mg/L de CaCO3) | Média S* | 100,0 0,00 | 0,7 0,00 | 100 mg/L CaCO3 |
Nitritos (mg/L) | Média S* | 0,00 0,00 | 0,00 0,00 | 0,5 mg/L |
Sulfatos (mg/L SO4) | Média S* | 0,03 0,00 | 0,00 0,00 | 250 mg SO4 2/L |
Cálcio (mg/L) | Média S* | 1,20 0,00 | 1,60 0,00 | (não exceda 100 mg/L) |
Magnésio (mg/L) | Média S* | 1,94 0,00 | 2,43 0,11 | (não exceda 50 mg/L) |
Condutividade (μS/cm a 20°C) | Média S* | 16,40 0,00 | 19,50 2,66 | 2500 μS cm-1 |
Oxidabilidade (mg/L) | Média S* | 0,00 0,00 | 0,00 0,00 | 5 mg/L |
CBO5 (mg/L) | Média S* | 0,00 0,00 | 0,65 0,00 | 0,5 mg/L |
Dureza total (mg/L) | Média S* | 9,00 0,00 | 100,0 0,00 | 500mg/L CaCO 3 |
OD (mg de O2/L) | Média S* | 3,30 0,00 | 4,86 0,11 | 6 mg/L |
Oxigénio dissolvido (OD), Carência Bioquímica de Oxigénio (CBO5), (S*) desvio padrão.
Importa realçar que, o consumo de água com alto teor de nitrato leva a diminuição da capacidade de transporte de oxigênio no sangue, principalmente em crianças que podem desenvolver a metaemoglobinaemia. O Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de Agosto, estabelece um valor máximo de 50 mg/L NO3 para o nitrato, dessa forma, os valores analisados 41 % (poços) está dentro do limite que diz respeito ao consumo humano, 11% (torneira) valor inferior ao limite legal estipulado.
Em relação aos valores de alcalinidade, acreditasse que estes estão relacionados com a presença de bicarbonatos, caracterizado pela faixa de pH situada entre 6,5 - 9,0. Na análise da alcalinidade, observou-se valores abaixo de 25 mg/L CaCO3, indicando que as águas com níveis de alcalinidade baixo estão associadas a águas que provocam corrosão das condutas, já as águas com alcalinidade elevada causam incrustações de CaCO3 e, sendo assim, classificadas como águas impróprias para o consumo humano. Estudos realizados por Koch, (2010) dão conta de que as águas com alcalinidade muito elevada, tem grande poder tampão, isto é, o pH da água manter-se-á estável com a adição de um ácido. Quando a alcalinidade é muito baixa, pequenas quantidades de ácido podem diminuir drasticamente o pH.
Na avaliação dos parâmetros de cloretos, acidez, nitritos, sulfatos, cálcio, magnésio, condutividade, oxidabilidade, carência bioquímica de oxigénio e dureza total, observaram-se valores inferiores que não encontram-se dentro dos padrões legais vigentes em lei para as águas do consumo humano (Tabela 2). Dentre os gases dissolvidos na água, o oxigênio é um dos mais importantes na dinâmica e caracterização dos ecossistemas aquáticos (Nascimento, 2010). De acordo com Macedo, (2010) o teor de O2 na água varia principalmente com a temperatura e com a altitude, quanto maior sua concentração melhor a qualidade da água.
O OD é um excelente indicativo para se avaliar a qualidade das águas superficiais, sendo o critério mais importante na determinação das condições sanitárias dessas águas. A introdução de OD no recurso hídrico se dá por meio da fotossíntese, da ação de organismos areadores ou do próprio contato do ar atmosférico (Macêdo, 2002). É definido que o valor de OD não deve ser inferior a seis mg/L (Brasil, 2005). Ao examinar os resultados do presente estudo, percebe-se que em todos os pontos de coleta os valores encontrados para esta variável foram menores que o limite estabelecido.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (2008), o esgotamento do oxigénio na água pode estimular a redução microbiana do nitrato a nitrito e sulfato a sulfito, pode ainda causar o aumento da concentração de ferro ferroso (Fe2+) em solução.
Conclusões
Nos resultados obtidos nas análises das amostras de água é possível evidenciar que, de maneira geral, a província do Huambo apresenta más condições de fornecimento d’água para a população. As águas provenientes dos poços e das torneiras são directamente distribuídas para as residências, estando fora dos padrões de potabilidade definidos pelo Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de Agosto. Faz-se necessário uma constante monitoração, em parâmetros físico-químicos e microbiológicos de qualidade da água fornecida à população, evitando assim possíveis contaminações e danos à saúde daqueles que a utilizam.