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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.40 no.3 Lisboa jun. 2024  Epub 30-Jun-2024

https://doi.org/10.32385/rpmgf.v40i3.13906 

Formação

Perfil do orientador de formação: critérios de seleção (workshop)

Family medicine teachers’ profile: selection criteria (workshop)

Ana Cristina dos Santos Ferreira1  2 
http://orcid.org/0009-0001-5160-4133

Marta Marquês2  3 

Joana Oliveira1  2  4 

1. USF Costa do Mar, ULS Almada Seixal. Costa da Caparica, Portugal.

2. Direção de Internato de Almada Seixal, CIMMGF LVT. Lisboa, Portugal.

3. USF Cova da Piedade, ULS Almada Seixal. Almada, Portugal.

4. Clínica Universitária de Medicina Geral e Familiar, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Lisboa, Portugal.


Resumo

O crescente número de orientadores de internato médico em MGF aumenta a capacidade formativa, o que não é acompanhado pela maior colocação de médicos internos na maioria dos locais. Assim, torna-se necessário estabelecer localmente critérios de seleção que garantam justiça e transparência no processo de atribuição de vagas para a colocação de novos internos. Com o objetivo de debater o tema entre orientadores realizou-se um workshop no Open Day do Orientador da ARSLVT, em maio de 2023. Convidados a selecionar as características que mais valorizavam, a partir de um processo de reflexão conjunta e metodologias participativas, os participantes sugeriram alguns sistemas mais objetivos de seriação de critérios aplicáveis ao orientador, à unidade e à equipa que o acolhe. Concluiu-se ser difícil a elaboração de critérios consensuais, uma vez que a valorização dos mesmos é subjetiva e decorre de experiências pessoais prévias e da realidade local.

Palavras-chave: Medicina geral e familiar; Orientador; Perfil do orientador de formação; Capacidade formativa internato

Abstract

The growing number of Family Medicine Teachers in Portugal increases training capacity, which is not accompanied by a higher placement of medical residents in some geographic locations. Thus, it is necessary to establish local selection criteria that guarantee fairness and transparency in the process of allocating positions for new residents. To discuss this topic among clinical teachers, a workshop was held during the ARSLVT Family Medicine Teachers Open Day, on May 2023. Participants were asked to select the characteristics they valued most through a collaborative reflection process and participatory methodologies. They suggested some objective systems for ranking criteria that could be applied to the clinical teacher, the health unit, and the welcoming team. It was concluded that developing consensual criteria is challenging, as their appreciation is subjective and stems from personal past experiences and the local reality.

Keywords: Family practice teacher; Clinical teacher profile; Residency specialty vacancies

Pertinência/Fundamentação

Os critérios para obtenção de idoneidade formativa de uma unidade de saúde encontram-se publicados pelo Colégio da Especialidade de Medicina Geral e Familiar (MGF) da Ordem dos Médicos portugueses.1 O perfil de um orientador de formação encontra-se bem definido noutras realidades, 2-3 tendo vindo a ser debatido pela Academia Europeia de professores de MGF (EURACT); 4-7 porém, em Portugal não dispomos ainda de uma definição consensual que permita a seleção dos orientadores de formação em funções, apoiada em critérios, na atribuição de um novo interno, existindo escassa literatura sobre este tema. 4,8-9

Em alguns locais da Região de Lisboa e Vale do Tejo, o número de especialistas em MGF que se propõe ser orientador de formação específica do internato de MGF, o que traduz a capacidade formativa, suplanta as necessidades expressas pelo menor numero de médicos internos em cada processo concursal. Noutros casos, o maior número de novos orientadores não traduz um maior número de vagas abertas a concurso por limitação de capacidade formativa para formações hospitalares.

A maioria dos especialistas que submetem candidatura a orientador preenchem os requisitos para obtenção de idoneidade formativa publicados pelo Colégio de MGF. As direções de internato de MGF selecionam orientadores em número correspondente às vagas do concurso daquele ano, baseando-se no contexto local quanto às características do médico especialista e da unidade funcional onde o interno é colocado. Contudo, esta tarefa provou não ser fácil pela inexistência de critérios formais, levantando questões relevantes ao nível da justiça e transparência do processo de escolha de orientadores de formação.

Recentemente as coordenações de internato de MGF traçaram em conjunto um documento de trabalho com o perfil do orientador ideal, como ponto de partida para esta discussão premente na atualidade da realidade desta especialidade.

Os diretores de internato sentiram igualmente necessidade de debater este tema com os principais interessados: os orientadores de formação. E assim nasceu a ideia de realizar um workshop para reflexão sobre esta temática.

Local de realização

No dia 30 de maio de 2023 realizou-se, no Centro de Formação da ARSLVT - Sobreda, o Open Day do Orientador 2023. Trata-se de um evento formativo anual, da iniciativa da Coordenação do Internato Médico de Medicina Geral e Familiar (CIMMGF), da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), que reúne orientadores de formação específica de MGF da ARSLVT, com vista à discussão aberta sobre diversos temas inerentes à formação. Pela pertinência do evento, este foi eleito pelas autoras como o espaço ideal para realizar este workshop.

Participantes

No workshop participaram 14 orientadores de formação, com grande variabilidade na sua experiência enquanto formadores, expressa em anos de serviço e número de internos orientados.

Estrutura

O workshop teve a duração de duas horas. Após uma introdução sobre a fundamentação do workshop foram lançadas as perguntas: Como se avaliam os orientadores? Devem existir critérios de seleção? A resposta dos participantes foi unânime e não gerou muito debate: perante a realidade atual torna-se necessário estabelecer critérios de seleção dos orientadores, focados não apenas neste, mas também na equipa e Unidade.

Depois da discussão inicial em plenário, os participantes foram divididos em quatro grupos de três a quatro elementos para desenvolver duas atividades:

  • Na primeira atividade foram atribuídas vinhetas com uma descrição breve de dois orientadores fictícios, incluindo as características pertinentes enquanto orientadores de formação. Cada grupo teve de selecionar qual o orientador que teria prioridade na atribuição de interno e fundamentar a sua decisão em grande grupo.

  • Na segunda atividade, após o debate sobre alguns critérios para a escolha de orientadores, foi proposto aos participantes elaborarem um rascunho de um sistema que permitisse uma escolha justa e transparente.

Principais conclusões

De forma global, foi percecionado pelas autoras o interesse dos participantes no tema em debate.

Apesar da duração limitada do workshop, que inviabilizava à partida formar inferências inequívocas sobre o assunto debatido, foram várias as conclusões que se conseguiram apurar no debate final em plenário:

  • A escolha de orientadores de formação deve ser transparente, baseando-se em critérios que sejam justos e de conhecimento geral dos orientadores.

  • As quatro propostas de sistema de seleção que foram elaboradas no workshop basearam-se em critérios não exclusivos do orientador, mas também atendendo às características do local de formação e da equipa.

  • Três das propostas elaboradas basearam-se em critérios eliminatórios, seguidos de critérios a serem aplicados de forma subjetiva e pouco específica. Os critérios eliminatórios incluíam: não cumprimento de critérios de idoneidade e critérios de logística.

  • Dois grupos de trabalho consideraram importante haver feedback formal sobre o orientador de formação, que seria emitido pelos seus internos, outros orientadores de formação e pela direção de internato. Um dos grupos propôs inclusivamente feedback também dos utentes, à semelhança do que se propõe aos internos na avaliação 360º.

  • Um grupo de trabalho propôs a introdução de um sistema de pontos, sendo que a cada critério corresponderia um número determinado de pontuação. O orientador que obtivesse maior pontuação seria o eleito para receber o interno.

  • Um grupo de trabalho considerou que os critérios deveriam ser distintos para orientadores que se propunham a receber internos pela primeira vez.

  • Foi consensual que devem ser criados critérios relacionados com a colaboração nas atividades do internato, nomeadamente: análise de videogravação de consultas (autoscopias), participação ativa nas sessões de aprendizagem relacional, elaboração de perguntas de escolha múltipla, participação em eventos como o Open Day e participação ativa nas equipas integradas de orientadores (EIO).

  • Os participantes consideraram relevante o contexto formativo da Unidade quanto a:

  • - número de internos existente, concordando que é desejável que o interno não seja o único colocado na Unidade;

  • - modelo organizativo (UCSP/USF), não tendo sido consensual a maior valorização de um em detrimento do outro;

  • - logística, relativamente a existência de gabinetes para internos, sobretudo em Unidades com mais internos em que é necessário elaborar escalas de ocupação dos postos de trabalho.

  • Será difícil (se não mesmo impossível) criar um sistema de critérios que seja de consenso unânime, devido às experiências prévias dos orientadores (quer como orientador quer como interno) que conferem algum grau de subjetividade a critérios que se pretendem objetivos, como também às diferentes características locais de cada unidade/ACeS/ARS.

  • Os critérios adotados deverão considerar sempre as características locais do ACeS, não podendo ser estanques.

As autoras reconhecem o workshop como um marco significativo na consciencialização dos orientadores sobre a importância do cumprimento das tarefas inerentes ao internato médico, sendo necessário reservar parte do horário de trabalho do orientador. Nas condições atuais não se pode presumir que a simples vontade de um especialista em MGF se tornar orientador seja suficiente para que lhe seja atribuído um interno. A avaliação dos orientadores deve ser uma realidade que requer atenção. É importante que este assunto seja debatido nas EIO, direções de internato e coordenações de internato, por todo o país, a fim de promover a sensibilização de todos. Este artigo visa fornecer uma possível framework para esta reflexão conjunta, que possibilite desejavelmente um consenso, se não nacional pelo menos regional, que permita assegurar a justiça e a transparência e contribua para a melhoria da formação de novos médicos de família no nosso país.

Agradecimentos

Aos catorze participantes do workshop, que partilharam as suas ideias e possibilitaram a criação colaborativa deste trabalho. À coordenação do Internato Médico de Medicina Geral e Familiar, por tornar o evento Open Day do Orientador uma realidade, proporcionando o espaço e tempo para a concretização do workshop.

Contributo dos autores

Conceptualização, AF, JO e MM; metodologia, AF, JO e MM; validação, AF e JO; recursos, AF, JO e MM; redação do draft original, AF e JO; revição, validação e edição do texto final, AF, JO e MM; visualização, AF, JO e MM; supervisão, AF, JO e MM.

Conflito de interesses

Os autores declaram não possuir quaisquer conflitos de interesse.

Referências bibliográficas

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Recebido: 05 de Setembro de 2023; Aceito: 24 de Maio de 2024

Endereço para correspondência Ana Cristina dos Santos Ferreira E-mail: anita.csf@gmail.com

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