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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.40 no.6 Lisboa dez. 2024  Epub 31-Dez-2024

https://doi.org/10.32385/rpmgf.v40i6.13675 

Estudos originais

Défice de vitamina B12 em diabéticos sob metformina: um estudo transversal

Deficit of vitamin B12 in diabetics on metformin: a cross-sectional study

Joana Amaral1 
http://orcid.org/0000-0002-3054-2148

Ana Pacheco2 

Eduardo Sousa3 

Mariana Figueiredo1 

Mónica Ornelas4 

1 Médica de Medicina Geral e Familiar. USF Amora Saudável, ULS Almada/Seixal. Amora, Portugal.

2 Médica de Medicina Geral e Familiar. ECSCP Almada-Seixal, ULS Almada/Seixal. Amora, Portugal.

3 Médico de Medicina Geral e Familiar. USF Rosinha, ULS Almada/Seixal. Amora, Portugal.

4 Médica Interna de Medicina Geral e Familiar. USF Amora Saudável, ULS Almada/Seixal. Amora, Portugal.


Resumo

Introdução:

A diabetes mellitus tipo 2 afeta cerca de 13,3% dos portugueses. A metformina foi durante muitos anos considerada a primeira linha farmacológica na diabetes, continuando atualmente recomendada em diabéticos sem comorbidades cardiorrenais. Até 30% dos diabéticos sob metformina apresentam défice de vitamina B12, que pode manifestar-se como neuropatia potencialmente irreversível, mimetizando a neuropatia diabética. O doseamento periódico de vitamina B12 encontra-se recomendado em várias fontes bibliográficas, não sendo, porém, consensual a sua metodologia.

Objetivos:

Identificar a prevalência de deficiência de vitamina B12 em diabéticos sob metformina e a sua relação com outras variáveis, visando reduzir comorbidades evitáveis e contribuir para o desenvolvimento de diretrizes médicas e terapêuticas mais precisas.

Métodos:

Este trabalho consiste num estudo transversal. Em sessão clínica sensibilizou-se a equipa médica de uma unidade de saúde familiar para o doseamento da vitamina B12 nos utentes diabéticos sob metformina. Critérios de inclusão: adultos com diagnóstico de diabetes mellitus tipo 2 sob tratamento com metformina. Critérios de exclusão: história de cirurgia bariátrica, diagnóstico de anemia perniciosa e diagnóstico de síndroma malabsortivo. Variáveis analisadas: doseamento de vitamina B12, proporção de défice, sintomatologia, duração do tratamento com metformina, dose de metformina utilizada, terapia simultânea com inibidores da bomba de protões e diagnóstico concomitante de hipotiroidismo.

Resultados:

Ao longo de 20 meses foram solicitados doseamentos de vitamina B12 a 362 diabéticos sob metformina. Destes, 58 diabéticos (18,02%) apresentaram défice e apenas seis utentes com défice de B12 apresentaram sintomas. Todos os indivíduos com défice encontravam-se sob metformina há seis ou mais anos e a dose de metformina mais utilizada na população com défice foi de 2000 mg/dia.

Conclusões:

Este doseamento periódico permite a correção precoce de possíveis défices e evita as suas consequências, como o desenvolvimento de uma neuropatia potencialmente irreversível em utentes diabéticos, população já dotada de grande fragilidade.

Palavras-chave: Défice de vitamina B12; Metformina; Neuropatia periférica

Abstract

Introduction:

Type 2 diabetes affects about 13.3% of the Portuguese population. Metformin was for many years considered first-line pharmacology in diabetes and is currently still recommended as such in diabetics without cardiorenal comorbidities. Up to 30% of diabetics on metformin have vitamin B12 deficiency, which can manifest as potentially irreversible neuropathy, mimicking diabetic neuropathy. Periodic dosing of vitamin B12 is recommended in several bibliographic sources, however there is no consensus on its methodology.

Objectives:

We aim to identify the prevalence of vitamin B12 deficiency in patients undergoing metformin therapy and its relationship with other variables, reducing avoidable comorbidities and contributing to developing more precise therapeutic and medical guidelines.

Methods:

This work consists of a cross-sectional study. The medical team of a primary healthcare unit attended a clinical session about the importance of measuring the blood levels of vitamin B12 in patients with type 2 diabetes under metformin. Inclusion criteria: adults diagnosed with type 2 diabetes treated with metformin. Exclusion criteria: history of bariatric surgery, diagnosis of pernicious anemia, and diagnosis of malabsorptive syndrome. Variables analyzed: vitamin B12 serum levels, proportion of deficit, symptomatology, duration of treatment with metformin, dose of metformin used, simultaneous therapy with proton pump inhibitors, and concurrent diagnosis of hypothyroidism.

Results:

Over 20 months, vitamin B12 measurements of 362 diabetic patients on metformin were requested. Of these, 58 patients (18.02%) showed a deficit and only six patients with B12 deficit presented symptoms. All individuals with a deficit had been using metformin for 6 years or more and the more commonly used dose of metformin in the population with deficit was 2000 mg/day.

Conclusions:

This periodic measurement allows early correction of possible deficits and avoids their consequences, such as the development of a potentially irreversible neuropathy in diabetic patients, a population already holding great frailty.

Keywords: Vitamin B12 deficiency; Metformin; Peripheral neuropathy

Introdução

A diabetes mellitus tipo 2 afeta cerca de 13,3% da população portuguesa.1-2 A metformina foi durante muitos anos considerada primeira linha farmacológica na diabetes, continuando atualmente recomendada, em combinação com intervenções no estilo de vida, em diabéticos sem comorbidades cardiorrenais. 3-4

A metformina é um dos fármacos mais prescritos globalmente. Possui evidência de eficácia e segurança de longa data e tem um custo reduzido. 4-5

Até 30% da população exposta à metformina apresenta deficiência de vitamina B12. 6-11

A vitamina B12, também conhecida por cobalamina, é uma vitamina hidrossolúvel que participa na síntese de DNA, no metabolismo de ácidos gordos e na produção de energia, contribuindo ativamente para o adequado funcionamento do sistema hematopoiético, neurocognitivo e vascular. 12

O défice desta vitamina, definido como valores séricos inferiores a 200 pg/mL, 13 pode manifestar-se como anemia macrocítica, alterações cognitivas, alterações de memória, demência e hiper-homocisteinemia, com aumento de risco cardiovascular, risco de enfarte agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral. Pode ainda simular o aumento de HbA1C14 e causar neuropatia potencialmente irreversível que mimetiza a neuropatia diabética. 7,15 Apesar de ainda não ser totalmente claro o mecanismo fisiopatológico desta neuropatia sabe-se que, sendo a vitamina B12 coenzima para a metilmalonil-CoA mutase produzir metionina, é fundamental na produção de mielina. 12

A neuropatia resultante manifesta-se através da diminuição da sensibilidade vibratória, da proprioceção e da sensibilidade cutânea nos membros inferiores, 12 sintomas também presentes na neuropatia diabética. 5

A neuropatia diabética afeta cerca de metade dos indivíduos com diabetes mellitus tipo 2, sendo um fator de risco para úlceras, infeções, fraturas, amputações e alterações da qualidade de vida e produtividade, bem como sobrecarga dos cuidados de saúde. 5

A sintomatologia sobreponível entre a neuropatia diabética e neuropatia por défice de vitamina B12 dificultam o seu diagnóstico diferencial, que chega a ser indistinguível mesmo em estudos de condução nervosa. 5 Estes fatores conduzem frequentemente a diagnósticos erróneos, assumindo-se neuropatia diabética face a uma neuropatia periférica por défice de vitamina B12. 5

Nos Estados Unidos estima-se um custo anual de 4,6 a 13,7 biliões de dólares com a neuropatia diabética, cerca de um terço dos custos associados à diabetes. 5

Ao assumir-se que a neuropatia por défice de B12 se trata de neuropatia diabética prescrevem-se, por exemplo, anticonvulsivantes e antidepressivos tricíclicos na tentativa de aliviar sintomas e melhorar a qualidade de vida dos utentes. 5 Isto implica o consumo de recursos e efeitos secundários desnecessários, quando a suplementação com cianocobalamina seria suficiente para a melhoria clínica. 5

Outro fator que determina a importância e urgência no diagnóstico deste défice passa pela irreversibilidade do mesmo. Enquanto a anemia por deficiência de vitamina B12 é reversível, a neuropatia é irreversível e a sua progressão pode apenas ser interrompida pelo início da terapia de reposição, uma vez que culmina na desmielinização seguida de degeneração axonal e consequente morte neuronal. 16

O doseamento periódico dos níveis de vitamina B12 permite a deteção precoce e evicção do desenvolvimento desta neuropatia, 17 sendo recomendado pela Associação Americana de Diabetes (ADA), desde 2017, 3 e por outras fontes bibliográficas. 18-20 Estas recomendações são maioritariamente vagas, sendo, no entanto, notória a sua relevância crescente com orientações (recentes) da organização global KDIGO (Kidney Disease | Improving Global Outcomes), recomendando o doseamento anual dos níveis de vitamina B12 em tratamento prolongado com metformina (superior a quatro anos) ou perante risco de baixos níveis de vitamina B12 (síndroma de má absorção ou ingestão dietética reduzida como a dieta vegan). 21

A causa não dietética mais comum de deficiência de vitamina B12 é a anemia perniciosa. Outras causas comuns incluem antecedentes de cirurgia bariátrica e diagnóstico de síndroma malabsortivo. Causas menos comuns incluem o uso de medicamentos como metformina e inibidores da bomba de protões e o diagnóstico de hipotiroidismo. 13,17,22

Este estudo visa identificar a prevalência de défice de vitamina B12 associado à terapêutica com metformina e analisar fatores associados, como eventuais sintomas (anemia e neuropatia), duração do tratamento e dose de metformina utilizada.

Pretende-se contribuir cientificamente para a compreensão do défice de vitamina B12 associado à terapêutica com metformina (epidemiologia, sintomatologia e outros fatores associados) e corrigir precocemente eventuais défices e suas consequências, revertendo a anemia macrocítica e interrompendo o desenvolvimento de uma neuropatia periférica, não diabética, mas potencialmente irreversível nos doentes diabéticos.

Métodos

Desenho do estudo

Foi realizado um estudo transversal.

Em sessão clínica sensibilizou-se a equipa médica de uma unidade de saúde familiar para o doseamento da vitamina B12 aos utentes diabéticos sob metformina. Tendo por base uma revisão bibliográfica, foi exposta a prevalência do problema e suas consequências.

Posteriormente, durante as consultas de vigilância de diabetes mellitus, os médicos dessa unidade de saúde solicitaram o doseamento de vitamina B12 aos utentes diabéticos sob esta terapêutica.

Decorridos vinte meses foram recolhidos e analisados os dados referentes a esta população.

O presente estudo respeitou a Declaração de Helsínquia e foi aprovado pela comissão de ética da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.

População

Os critérios de inclusão foram: adultos (≥18 anos) com diagnóstico de diabetes mellitus tipo 2 (ICPC-2 T90) sob tratamento com metformina. Os critérios de exclusão foram: antecedentes de cirurgia bariátrica, diagnóstico de anemia perniciosa e diagnóstico de síndroma malabsortivo.

Estes critérios foram aplicados através da consulta dos processos clínicos dos utentes, recorrendo às bases de dados MIMUF®, S.Clínico®, RSE® e PEM®.

Análise

Dentro da população selecionada, que cumpria os critérios de inclusão e exclusão definidos, analisaram-se diversas variáveis: doseamento de vitamina B12 (código A-634 do S.Clínico), proporção de défice (valores inferiores a 200 ng/L - valorizada a determinação com o valor mais baixo), sintomatologia (anemia por deficiência de vitamina B12/folatos - ICPC-2 B81 - e neuropatia - ICPC-2 N94), duração do tratamento com metformina, dose de metformina utilizada, terapêutica simultânea com inibidores da bomba de protões e diagnóstico concomitante de hipotiroidismo (ICPC-2 T86).

A sintomatologia foi avaliada tendo por base diagnósticos de anemia e neuropatia codificados no processo clínico dos utentes com défice de vitamina B12, sendo confirmados através da consulta dos registos médicos do mesmo. Verificou-se que o diagnóstico de anemia teve por base o hemograma e o de neuropatia a sintomatologia do doente e exame objetivo médico.

Foi criada uma base de dados, onde foi atribuído um ID por cada utente elegível para o estudo, assegurando desta forma a anonimização dos dados.

Os autores extraíram os resultados das diferentes variáveis com recurso às bases de dados MIMUF®, S.Clínico®, RSE® e PEM® e registaram-nos na base de dados.

A análise de dados foi realizada em SPSS® (Statistical Package for Social Sciences), v. 25 e os resultados foram expressos em frequências pela utilização de variáveis categóricas.

O presente estudo não foi financiado e não se identificaram conflitos de interesse na sua realização.

Resultados

A amostra de 779 pessoas foi composta por 367 homens (47,11%) e 412 mulheres (52,89%). A idade média da amostra foi de 72,16 anos. Como exposto na Tabela 1, ao longo de 20 meses foram solicitados doseamentos de vitamina B12 a 362 pessoas, correspondendo a 46,47% de todos os diabéticos sob metformina. Destes, 58 (16,02%) apresentaram défice. A população que apresentou défice foi composta por 26 homens (44,83%) e 32 mulheres (55,17%) e a idade média foi de 75,22 anos.

Tabela 1 Caracterização da população estudada em função do doseamento e dos níveis de vitamina B12 

O valor de vitamina B12 entre 100-200 ng/L foi o intervalo de défice mais frequente, apresentado por 53 pessoas (91,38%) (Tabela 2).

Tabela 2 Frequência de intervalos de défice de vitamina B12 

Todos os indivíduos com défice faziam metformina há seis ou mais anos e a dose de metformina mais utilizada na população com défice foi a de 2000 mg/dia (n=38, 65,52%). Cerca de 27,59% (n=16) encontrava-se medicado com dose de metformina inferior a 2000 mg/dia e 6,90% (n=4) com dose superior a 2000 mg/dia.

Na Tabela 3 constata-se que apenas seis (10,34%) dos utentes com défice apresentaram sintomatologia: um anemia (1,72%) e cinco neuropatia (8,62%). Entre os utentes com défice, 25 (43,10%) faziam simultaneamente um inibidor da bomba de protões. Entre os utentes sem défice, 97 (31,91%) encontravam-se também medicados com inibidor da bomba de protões. Apenas três (5,17%) dos utentes com défice apresentaram diagnóstico concomitante de hipotiroidismo (ICPC-2 T86).

Tabela 3 Frequência de terapêutica com IBP, sintomatologia e diagnóstico de hipotiroidismo 

Discussão

O presente estudo pretende contribuir para a compreensão do défice de vitamina B12 associado à terapêutica com metformina, clarificando as recomendações atuais.

Conhecem-se apenas dois estudos retrospetivos que estimam a prevalência de défice de vitamina B12 em diabéticos portugueses sob metformina. 17,23 Dos utentes diabéticos sob metformina com doseamento de vitamina B12, 16,02% apresentaram défice, valor concordante com o intervalo de 10-30% reportado em estudos anteriores. 6-11,17,23 Apurou-se que a totalidade de indivíduos com défice fazia metformina há seis ou mais anos, dados concordantes com a bibliografia, que aponta para a redução na concentração de vitamina B12 com o aumento da duração da terapia com metformina. 18 Em 91,38% dos casos, o défice foi diagnosticado perante valores de B12 entre 100-200 ng/L, sendo poucos os indivíduos sintomáticos (10,34% dos utentes com défice), como previamente reportado na literatura. 21 Entre os utentes com défice, 43,10% faziam simultaneamente um inibidor da bomba de protões. Este valor é ligeiramente superior aos 31,91% dos utentes sem défice medicados com inibidor da bomba de protões. Apenas três (5,17%) dos utentes com défice apresentaram diagnóstico concomitante de hipotiroidismo (ICPC-2 T86), sendo importante salientar que a maioria dos utentes com este diagnóstico se encontrava controlado, em estado eutiroideu.

A adição do doseamento sérico de vitamina B12 às análises habituais dos utentes diabéticos sob metformina permite a identificação do seu défice. Permite também identificar indivíduos com risco aumentado de défice no futuro ao identificar valores borderline (200-300 ng/L). Esta avaliação laboratorial poderá considerar-se, assim, um rastreio, já que cumpre os seguintes critérios: incide na população diabética, que tem elevada prevalência de doença (16,02% neste estudo); identifica um défice que conduz a doença grave, com elevada comorbilidade e impacto na qualidade de vida, passível de tratamento efetivo e consequente modificação do curso da doença; o doseamento é reprodutível, fiável, pouco invasivo, aceitável pela população e cómodo, uma vez que se sugere a sua adição às análises habitualmente pedidas ao utente diabético; a sensibilidade e especificidade deste doseamento são muito variáveis, mas aceitáveis. Assim, o diagnóstico seria facilmente confirmado, permitindo a instituição de um tratamento disponível, aceitável, acessível e efetivo, constituindo também um programa economicamente viável.

Como alternativas ou adjuvantes a esta avaliação, a literatura identifica o doseamento de ácido metilmalónico e homocisteína (aumentados no défice de cobalamina). 6,23 No entanto, estes dois últimos parâmetros não são comparticipados nos cuidados de saúde primários.

Com a crescente incidência de diabetes mellitus e diagnósticos mais precoces é expectável que existam cada vez mais utentes a fazer metformina por períodos prolongados. 12 Perante o défice, a suspensão da metformina constituiu uma atitude terapêutica pouco comum, uma vez que as biguanidas são eficazes no controlo da DM e a suplementação com cianocobalamina corrige o défice.

Atualmente não existe consenso sobre a vigilância e tratamento adequado da deficiência de B12 em diabéticos sob metformina, apesar da descoberta desse efeito ter ocorrido há cerca de meio século. 5

Sabendo que as reservas de vitamina B12 no organismo têm uma duração média de dois a cinco anos e que o tratamento prolongado com metformina (superior a quatro anos) aumenta o risco do seu défice, sugere-se um doseamento pelo menos a cada quatro anos nos utentes sem défice. 18,21-22

Como limitações do presente estudo identifica-se a ausência de grupo de controlo e a não inclusão de marcadores indiretos e mais sensíveis de défice de vitamina B12, como a homocisteína e o ácido metilmalónico, 23 que, por não serem comparticipados, não foram doseados. O diagnóstico de neuropatia baseou-se apenas na consulta retrospetiva de registos clínicos que refletem sintomas dos doentes e exame objetivo médico, sem implicar a realização de exames complementares de diagnóstico específicos. Sublinhe-se ainda que a metodologia seguida na investigação limita o estabelecimento de causalidade entre os parâmetros analisados.

Apesar das suas limitações, o estudo releva dados que reforçam a importância do rastreio de défice de vitamina B12 em diabéticos sob metformina. Este doseamento periódico permite corrigir precocemente eventuais défices e evitar as suas consequências, como o desenvolvimento de neuropatia potencialmente irreversível nos doentes diabéticos, população por si só já dotada de grande fragilidade.

Conclusão

No presente estudo, 16,02% dos utentes diabéticos sob metformina com doseamentos de vitamina B12 apresentaram défice, encontrando-se todos medicados com metformina há seis ou mais anos. A maioria dos indivíduos com défice de vitamina B12 apresentava valores de 100-200 ng/L e encontrava-se assintomático (89,66% dos utentes com défice).

O estudo argumenta a favor do doseamento dos níveis de vitamina B12 durante a terapêutica com metformina, sendo necessária mais investigação sobre outras variáveis que possam influenciar os valores séricos de vitamina B12 e a duração do tratamento deste défice.

Contributo dos autores

Conceptualização, JA; metodologia, JA, AP e ES; validação, JA, AP e ES; análise formal, JA, AP, ES, MF e MO; investigação, JA, AP, ES e MF e MO; recursos, JA, AP, ES, MF e MO; curadoria de dados, JA, AP, ES, MF e MO; redação do draft original, JA; revisão, validação e edição do texto final, AP, ES, MF e MO; visualização, JA e ES; supervisão, JA; administração do projeto, JA.

Conflito de interesses

Os autores declaram não possuir quaisquer conflitos de interesse.

Financiamento

O presente estudo não foi objeto de qualquer financiamento.

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Recebido: 05 de Dezembro de 2022; Aceito: 25 de Junho de 2024

Endereço para correspondência Joana Amaral E-mail: joanaritaferreiraamaral@gmail.com

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