Introdução
A incumbência dada atualmente ao campo da educação é gigantesca, pois ela deve ser capaz de unir pessoas em torno de objetivos comuns e trabalho colaborativo, de resolver conflitos por meio do diálogo, de mitigar crises humanitárias geradas por guerras e os efeitos das mudanças climáticas e ainda encontrar caminhos alternativos para a proteção socioambiental que consolide um modo de viver equânime. A sua oferta deve possibilitar igualdade de oportunidades a todos, sendo “uma condição fundamental para que exista equidade educativa numa sociedade” (Juárez Bolaños e Rodríguez Solera, 2016: 3; tradução própria). A igualdade de acesso deve ser assegurada para todos, incluindo a alfabetização e aquisição de conhecimento básico de matemática por jovens e adultos, mas também a educação profissional para aquisição de conhecimentos, competências técnicas e habilidades necessárias para o desenvolvimento sustentável, o trabalho e o empreendedorismo (ONU, 2015a).
A lacuna de oferta de uma educação de qualidade para jovens e adultos se concentra em zonas rurais, ampliando assim a desigualdade que tem afetado milhões de pessoas, expostas a pobreza multidimensional com diversas restrições entrecruzadas (falta de acesso à educação, mas também aos serviços de saúde, a uma moradia digna, a um emprego decente, etc.). Grande parte das populações afrodescendentes se encontra nesse limiar. Desse modo, é preciso
Promover um melhor conhecimento, reconhecimento e respeito quanto às culturas, à história e às tradições da população afrodescendente, inclusive por meio de pesquisas em educação, e promover a inclusão plena e correta da história e das contribuições da população afrodescendente [incluindo oferta de educação de qualidade em áreas rurais]. (ONU, 2015b: 11)
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico apontou que a “educação brasileira enfrenta problemas multidimensionais de equidade, exigindo respostas abrangentes que considerem os fatores negativos que há muito tempo influenciam os aspectos socioeconômicos, geográficos e raciais” e destacou que as crianças negras integram as famílias mais pobres brasileiras e carecem de acesso a uma educação de qualidade, incluindo as que vivem em comunidades rurais e não têm acesso às tecnologias digitais (OCDE, 2021: 13-14).
Parte do povo afro-brasileiro se encontra em áreas rurais, distribuído em territórios quilombolas. O processo histórico dessas populações mostra uma narrativa de lutas pela terra; pela vida e pelo respeito à diversidade sociocultural; pelo desenvolvimento de políticas públicas que reconheçam, reparem e garantam seus direitos à saúde, à moradia, ao trabalho e à educação de qualidade por jovens, adultos e idosos. Se constitui débito do governo brasileiro suprir as lacunas de políticas de proteção social básica específicas a essa população para que, de fato, possa usufruir da vida digna a que tem direito.
No intuito de produzir estudos com comunidades quilombolas para melhor conhecê-las, se propôs esta pesquisa para avaliar em que medida a educação de jovens e adultos pode contribuir para o desenvolvimento rural em territórios quilombolas brasileiros, e perceber quais os fatores que impactam na oferta de uma educação de qualidade para jovens e adultos afro-brasileiros em comunidades quilombolas rurais.
O estudo norteou-se pelo objetivo geral de compreender melhor o papel da educação em jovens e adultos, identificando fatores que potencializam e que inibem processos educativos articulados com processos de desenvolvimento comunitário rural, construídos coletivamente com uma comunidade quilombola da região norte do estado do Espírito Santo, Brasil. A pesquisa, que decorreu de abril de 2019 a abril de 2020, foi ancorada em dois objetivos específicos, a saber: (i) produzir uma radiografia da comunidade quilombola rural participante; e (ii) construir uma proposta de abordagem de investigação adaptada à educação de jovens e adultos articulada com processos de desenvolvimento comunitário rural no contexto da comunidade quilombola implicada no estudo.
1. Educação de jovens e adultos e desenvolvimento rural no Brasil
Organismos internacionais tais como a Organização das Nações Unidas e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura ressaltam que a aprendizagem e a educação de jovens e adultos ao longo da vida devem ser capazes de contribuir para a superação da pobreza, das desigualdades múltiplas, da exclusão e violência, da intolerância cultural, racial e religiosa, dos desastres naturais, da produção de riscos e escassez (Beck, 2011), substituindo-as por uma perspectiva de prosperidade, cidadania ativa e desenvolvimento comunitário sustentável (Caride Gómez et al., 2007; ONU, 2015a).
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, 2017: 7) destacou a educação de jovens e adultos como uma necessidade, pois inovações tecnológicas na produção de alimentos e na gestão de recursos naturais “requer[em] agricultores, criadores e pescadores inovadores e flexíveis […] [que] vão necessitar de novas competências e capacidades, além de novas ferramentas, novos processos e formas de organização e gestão da agricultura para tornarem a atividade mais eficiente económica, social e ambientalmente”, contribuindo para que comunidades rurais vulneráveis saiam da pobreza.
No contexto brasileiro, há que se considerar a existência de componentes dificultadoras no processo do desenvolvimento comunitário rural, tais como desigualdades raciais, racismo estrutural e ambiental. Estas foram construídos historicamente desde os primórdios da colonização do país, que assentou no processo da escravização dos povos africanos, marginalizando até hoje a população afro-brasileira, em particular as comunidades quilombolas rurais. Estas comunidades padecem com a falta de regularização fundiária de seus territórios e com um acesso insuficiente às políticas de proteção social básica, privando-as de um desenvolvimento comunitário sustentável bem como da concretização de uma vida com qualidade e dignidade humana. Conforme aponta Silva (2012):
Estas questões, que refletem claramente um cenário de desigualdade racial, relacionam-se diretamente com a problemática da justiça ambiental e especificamente servem para a caracterização de casos de racismo ambiental. Isto porque determinam um acesso desigual à água potável e ao saneamento básico, a localização de instalações poluidoras e de alto risco em áreas habitadas por negros - inclusive instalações estatais - e uma maior exposição aos riscos de desabamentos e de contaminação por resíduos tóxicos.
Na mesma linha, Ferraresi (2012: 280) afirma:
[...] a justiça ambiental é corolário ao alcance da sustentabilidade e que o alcance de uma vida digna constitui caminho para o desenvolvimento. Todas as formas de racismo devem ser condenadas e, assim, partindo-se da premissa de que o racismo ambiental, além de constituir discriminação, é atentado contra o direito à vida, deve ser fortemente combatido.
Neste artigo não serão aprofundadas questões sobre justiça e racismo ambiental no contexto brasileiro por se tratarem de temas que ultrapassam o escopo principal do estudo ora proposto. Tais questões implicam aprofundar pesquisas sobre a temática do “Estado de Direito Socioambiental” (ibidem: 263), enveredando pelos campos do direito, economia e política. Nesse trabalho tentou-se, sobretudo, delinear alguns limites e potencialidades dos processos educativos como possíveis caminhos a serem trilhados por essas populações em busca de autonomia, dignidade e desenvolvimento rural comunitário sustentado.
Na perspectiva do entrelaçamento entre a educação de jovens e adultos e o desenvolvimento comunitário, Loureiro e Cristóvão (2008: 1117) apontam para uma complementaridade, pois “por um lado, vê-se a educação de adultos como um elemento importante de desenvolvimento local; e encaram-se, por outro, os processos de desenvolvimento local (ou pelo menos parte deles) como espaços privilegiados de educação de adultos”. Os autores destacam que o desenvolvimento local está vinculado ao processo educativo, pois é através dele que a população endógena toma consciência dos seus desafios e desenvolve percepção para uma leitura ampliada do contexto comunitário, inteirando-se da realidade circundante e adquirem habilidades para a sua transformação.1
De acordo com Torres (2009), em fins da primeira década do século xxi, o Brasil concentrava 40% do total de analfabetos da região latino-americana, aproximadamente 13 milhões de brasileiros. Essa exclusão educacional tem levado ao acirramento das desigualdades sociais, impedindo milhões de brasileiros jovens e adultos de terem acesso ao emprego decente, ao empreendedorismo e às oportunidades sociais com potencial de bem-estar comunitário.
No entanto, a concretização de processos formativos no Brasil é um grande desafio devido à sua vasta extensão territorial, assim como à diversidade do povo brasileiro e o contexto em que habita. Buainain et al. (2013) destacam que o espaço rural brasileiro é heterogêneo e que, desde a década de 1960, vem se transformando com a utilização de novas tecnologias na produção agropecuária. Estas têm impactado significativamente a qualidade de vida das populações rurais, pois permitiram a transição do modelo tradicional da produção agrícola para o modelo capitalista de mercado dos produtos agrícolas. Essas mudanças, muitas das quais agressivas e destruidoras do ambiente, têm colocado, por si só, um grande contingente de pequenos agricultores na linha da pobreza - situação agravada pela ausência de competências necessárias para se incluírem no mercado agrícola e por não terem acesso às inovações tecnológicas e equipamentos agrícolas. Uma das lacunas apontadas pelos autores é a necessidade de aprofundamento de estudos sobre essa temática, que possam contribuir com informações sobre as diversas realidades rurais para implementação de políticas públicas mais assertivas e qualificadas, pois as que estão em vigência não atendem aos pequenos produtores rurais espalhados pelo diverso território brasileiro.
É importante ressaltar a condição desafiadora de jovens e adultos de pequenas comunidades rurais, incluindo os quilombolas, de se manterem com a produção agrícola tradicional, tendo em conta que, grande parte das vezes, deslocam-se para os centros urbanos e ficam sujeitos a empregos precários de baixa remuneração, o que contribui para o agravamento de vulnerabilidades. E conforme afirmam Carmo e Matias (2019: 56), a “condição vulnerável da precariedade também pode contaminar outras dimensões da vida, além da inserção profissional, em particular a incapacidade de fazer face às despesas e a dificuldade de fazer projetos de vida ou de formular planos a médio ou longo prazo”.
Desse modo, torna-se urgente adentrar o terreno das pequenas comunidades de agricultores rurais, em particular o das comunidades quilombolas, para identificar o nível de exclusão socioeducacional, profissional e de acesso às políticas de proteção social básica. Tal como explicam Navarro e Campos (2014), se, por um lado, existe um crescimento exponencial da produção agropecuária, com um elevado índice de produtividade que coloca o Brasil num excelente patamar econômico, por outro, há o aspeto perverso da marginalização de milhões de agricultores, agravada pela desconexão das ações governamentais com a realidade dessas populações - não proporcionando condições mínimas para o usufruto de uma existência digna.
O mundo rural brasileiro poderá beneficiar de leituras e moldagem de contextos plurais de modo permanente, implicando todas as partes interessadas (governo, comunidades rurais, setor privado, organizações e movimentos sociais, etc.) que possam produzir novos conceitos e práticas sobre os territórios rurais, subsidiados pela compreensão de três zonas de transição propostas por Henderson (2014), sendo elas: (i) zona do colapso - caracterizada por desestruturações, acidentes, contradições; (ii) zona da fibrilação - lugar das incertezas, dos riscos e da escassez, que Beck (2011) identifica como uma crise global afetando todos; (iii) zona de ruptura - que se refere ao tempo/espaço no qual se vislumbram oportunidades ocultas contidas nas catástrofes, na escassez, ou seja, quando se enxergam possibilidades e potencialidades implícitas (Bohm, 1980) no bojo das crises, tragédias e desastres.
Esse tipo de desenvolvimento tem um profundo valor educacional porque contribui para uma formação cidadã crítica, ampliando as capacidades destas populações de transformarem a sua realidade com suas próprias mãos, forjadas em tempos/espaços de aprendizagens colaborativas, desdobrando e concretizando alternativas de modos de viver e de produzir de forma próspera e sustentável (Loureiro e Cristóvão, 2008; Paiva e Sales, 2013; Rogers, 1995; Torres e Irala, 2014).
Uma das estratégias que poderá ser adotada por governantes, ao formular políticas sociais para reverter o quadro de pobreza e exclusão em um território rural plural, parece consistir em adentrar o terreno das pequenas comunidades rurais para melhor conhecê-las e, junto com elas, moldar processos educativos articulados com processos de desenvolvimento rural comunitário. Isso pode ser realizado por meio, por exemplo, do turismo de base comunitária - que tem se apresentado “em casos que têm em comum as lutas sociais, como a conservação dos recursos naturais, base da subsistência de diversas comunidades; a luta pela terra; a luta pelo direito à memória cultural; a luta por uma educação digna” (Sansolo e Bursztyn, 2009: 150) -, caracterizado pela endogeneidade e participação comunitária, entre outros aspetos.
Desse modo, o turismo rural de base comunitária possibilita a moldagem de “múltipla e complexa rede socioeconômica articulada entre si e com ações transversais focadas em temas como a saúde, a educação, a cultura e o meio ambiente” (Hallack et al., 2015: 24). Pode assim se constituir em estratégia de comunidades quilombolas rurais brasileiras no fortalecimento do engajamento comunitário, na manutenção de suas tradições ancestrais, na produção de sua existência com qualidade e bem-estar, tanto individual quanto coletivo, fazendo eclodir uma mudança de dentro para fora. Este tipo de turismo permite moldar um desenvolvimento rural comunitário, tirando as comunidades da situação de pobreza, pois “pode contribuir na revitalização da economia rural, gerando novas fontes de emprego e renda” (Maldonado, 2009: 25).
2. Comunidades quilombolas brasileiras
Quilombola é um termo derivado da palavra kilombo, de origem africana, para designar uma aldeia (Pereira, 2011). No Brasil, as comunidades quilombolas ganharam visibilidade a partir da segunda metade do século xix, caracterizadas como grupos de africanos que fugiram dos latifúndios de cana-de-açúcar, como forma de resistência e luta pelo fim do trabalho escravo. Até a década de 1960, essas populações habitavam terras comuns e adotaram um estilo de vida comunitário. Por meio de mutirões ou ajuntamentos seu modo de vida era cimentado na cultura ancestral, construindo suas habitações, produzindo alimentos baseados na agricultura familiar de subsistência, usando recursos advindos das florestas para uso medicinal, formando comunidades com vínculos familiares (Anjos, 2006).
De acordo com Furtado et al. (2014: 106) “[o] Brasil traz em sua história o tráfico e comércio de africanos e africanas vindos de várias partes da África [...]. Os primeiros africanos chegaram ao Brasil em 1554”. Foram, portanto, mais de 300 anos de escravidão. As autoras ressaltam que “[...] os quilombos, tidos como núcleos paralelos de poder, organização social e produção da subsistência, eram considerados a expressão mais radical de ruptura com o sistema latifundiário e escravista, e tinham como emblema principal o Quilombo de Palmares” (ibidem: 109).
O reconhecimento das comunidades quilombolas pelo governo brasileiro deu-se pelo Decreto Presidencial n.º 4.887/2003, que as definiu, no artigo 2.º, como “grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”,2 e atribuiu ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a competência para titulação territorial, ficando o reconhecimento sob responsabilidade da Fundação Cultural Palmares, que emite um título atestando que a comunidade se autointitulou quilombola.
Contudo, a titulação de um território quilombola exige o cumprimento de seis passos conforme orientações do INCRA divulgadas em 2016, a saber: (i) autodefinição quilombola; (ii) Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID); (iii) publicação do RTID; (iv) portaria de reconhecimento; (v) decreto de desapropriação; e (vi) titulação pelo presidente do INCRA mediante outorga do título coletivo, imprescritível e pró-indiviso à comunidade, em nome de sua associação legalmente constituída, sem nenhum ônus financeiro, sendo proibida a venda e penhora do território. Passar por todas estas etapas tem dificultado a titulação dos territórios quilombolas no Brasil que, em sua grande maioria, estão na segunda etapa desse processo. A regularização fundiária destes territórios é processo moroso e incerto que acaba reforçando situações de desigualdade e crescimento da pobreza entre as populações quilombolas. Pois, de acordo com Teisserenc e Teisserenc (2018: 52), esses processos remetem mais a questões políticas do que sociológicas, que exigem que essas comunidades se mobilizem, de modo a ganhar força local, para “conseguirem se organizar de modo relativamente consensual para defender os seus novos direitos e os interesses ligados a eles e […] se apresentarem como sujeito político e, assim, exercerem influência sobre o poder local”.
3. Abordagem metodológica
Esse trabalho ancorou-se numa abordagem participativa centrada na investigação-ação que é “um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes […] estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo” (Thiollent, 2011 [1985]: 20). Nesta abordagem, destacam-se os aspectos da resolução de problemas, da tomada de consciência e da produção coletiva de conhecimentos.
O estudo foi realizado, durante oito meses, com uma comunidade quilombola rural, localizada na região norte do estado do Espírito Santo, no Brasil. Na coleta dos dados para produção da radiografia dessa comunidade foram fornecidos formulários aos moradores, por meio de visitas domiciliares (as respostas foram depois numeradas de acordo com o género da pessoa que respondeu); questionários a agentes externos parceiros, via correio eletrônico; e realizadas entrevistas semiestruturadas presenciais com as lideranças endógenas e atores externos. A atividade educativa articulada com processos de desenvolvimento comunitário rural foi desenhada e executada, colaborativamente, com os quilombolas por meio de reuniões, de registros escritos e fotográficos das discussões, e forjada em diálogos coordenados por uma nutricionista quilombola da comunidade implicada no estudo, uma educadora ambiental externa e os pesquisadores. Em todo o processo de recolha de dados foram igualmente relevantes os diálogos informais.
Os dados coletados foram inicialmente analisados para permitir a identificação de categorias. Houve posteriormente exploração do material e tratamento dos dados, seguindo-se a interpretação e a análise final dos mesmos. Procedeu-se ainda à articulação desses dados com fundamentos teórico-metodológicas, produzindo conhecimento sobre a realidade pesquisada a partir da compreensão dos dados coletados de forma a responder às questões formuladas, tendo-se realizado sua ordenação, classificação e análise (Bardin, 2016 [1977]; Minayo, 2002).
Conforme referido na introdução deste texto, a investigação foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, tendo os participantes autorizado a sua realização por meio de assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido, cumprindo-se, assim, todas as orientações normativo-legais da ética em pesquisa. Além disso, a postura adotada no processo desta investigação-ação foi a de um estabelecimento de trocas, de partilhas na perspectiva de ganhos para todos os atores implicados, assente numa relação de horizontalidade, num processo de mútua compreensão (Minayo, 2002).
4. Resultados e discussões
A partir da análise dos dados obtidos com aplicação dos instrumentos de pesquisa adotados foi possível produzir uma radiografia da comunidade, identificando os principais desafios e potencialidades existentes, alcançando fatores que impactaram e que inibiram processos de educação de jovens e adultos articulados com processos de desenvolvimento rural comunitário. Foi ainda possível realizar a definição e a execução da atividade educativa não formal com a comunidade, concretizada no minicurso “Elaboração de toteiro turístico étnico de base comunitária”.
4.1. Radiografia da comunidade quilombola rural implicada no estudo
A radiografia da comunidade quilombola participante foi construída a partir da análise do conjunto de dados obtidos com a aplicação dos instrumentos de coleta de dados referidos, considerando o contexto socioeconômico e cultural, desvelando conteúdos que caracterizaram a comunidade em suas dimensões territorial, socioeconômica, ambiental/cultural assim como desafios/oportunidades de desenvolvimento rural comunitário.
4.1.1. Dimensão territorial
A comunidade quilombola teve o território demarcado pelo INCRA e reconhecido pela Fundação Cultural Palmares, mas não recebeu a titulação das terras. No espaço geográfico existem propriedades do setor privado, de particulares, de herança e cedidas. Nele residiam 41 famílias na altura em que decorreu o estudo, entre abril de 2019 e abril de 2020. Utilizavam-no, principalmente, para cultivos tradicionais da agricultura familiar de consumo próprio e de baixa produtividade, entre os quais se destacam o cultivo de hortaliças, mandioca (que é processada em farinha, goma, tapioca e beiju), urucum e frutas dos quintais, que são comercializados em feiras livres no município, mas também inclui a criação de animais domésticos de pequeno porte para consumo familiar. A acessibilidade e a mobilidade é feita por duas vias não pavimentadas internas ao território, e por uma via principal que liga a comunidade ao distrito-sede do município. Os principais meios de transporte utilizados pelos moradores são a bicicleta, a motocicleta e o transporte coletivo. Os equipamentos comunitários existentes são as nove casas de farinha e uma igreja católica, cujo espaço é utilizado para cultos e para reuniões comunitárias com parceiros externos.
4.1.2. Dimensão socioeconômica
Das 34 famílias participantes do estudo observou-se que, em sua maioria, são chefiadas por homens (20 famílias), com idades entre 31 e 50 anos, vivendo em união estável, com uma média de quatro pessoas por família. Predomina a religião católica. É uma comunidade de jovens, pois as pessoas até aos 30 anos de idade constituem mais de 70% dos moradores. A renda familiar mensal de 50% das famílias foi de aproximadamente 90 centavos de dólar por dia per capita. As principais fontes de renda são os trabalhos informais esporádicos (tais como diaristas em trabalhos agropecuários); a produção e comercialização dos produtos da agricultura familiar; aposentadorias e programas de transferência de renda. As dificuldades advindas da falta de acesso ao trabalho formal geram consequências que afetam a qualidade de vida destas famílias, conforme se expressaram alguns moradores:
Falta de crédito, falta de apoio financeiro para desenvolver qualidade de vida. (Resposta dada pelo Morador 1 ao formulário aplicado)
Como se vai plantar se não tem apoio? As pessoas estão caindo nas mãos de agiotas e perdem a terra. (Resposta dada pelo Morador 2 ao formulário aplicado)
Muitas pessoas têm mais dificuldades que outras e o governo não reconheceu isso no geral, e tem muitas famílias com dificuldade de renda. (Resposta dada pelo Morador 3 ao formulário aplicado)
Os cuidados de atenção à saúde básica da família, à epoca, estavam sob responsabilidade de uma agente comunitária de saúde, que realizava visitas domiciliares mensais e agendava consultas médicas e exames. Outra atividade realizada mensalmente, denominada “hiper-dia”, consistia em reunir a comunidade e dialogar sobre a saúde da mulher, a anemia falciforme (muito comum entre os quilombolas), os cuidados de higiene pessoal, a aferição da pressão arterial, entre outras orientações, realizadas pela enfermeira-chefe do posto de saúde do município. Conforme afirmou a profissional de saúde:
[...] realizamos acompanhamento de pessoas hipertensas e diabéticas com visitas domiciliares; palestras sobre saneamento básico; saúde bucal e avaliação da saúde bucal dos moradores; levantamento a respeito da anemia falciforme. Na comunidade tem uma criança portadora da anemia falciforme. Exames apontaram que cerca de 70% das crianças têm traços da anemia falciforme; existe um trabalho em andamento de prevenção [da doença] nessas crianças. (Entrevista realizada com a enfermeira-chefe do posto do município próximo à comunidade quilombola)
Não existem escolas na comunidade. A educação básica obrigatória para crianças e adolescentes é realizada em escolas urbanas no município. Não há oferta de educação formal para jovens e adultos. Em 2010, chegou a decorrer o programa BB Educar,3 no qual participaram 12 quilombolas. No entanto, nem todos os interessados participaram em razão do horário e da distância até ao local de realização da atividade, de acordo com o relato de um líder da comunidade:
Tinham mais pessoas que precisavam, ou queriam, e não fizeram devido à questão de horário. Estavam muito longe da sede aqui, do espaço da escola, e pelo horário ser a noite, então muitos não participaram. Tentamos reabrir a escola aqui da comunidade. Nós lutamos bastante para ter educação para jovens e adultos que não tiveram oportunidade e nós não conseguimos devido à falta de vontade política. (Entrevista com Líder comunitário 2)
Desse modo, o nível de escolaridade de jovens, adultos e idosos da comunidade é baixo ou inexistente, conforme dados obtidos através dos formulários. Dos 34 chefes de famílias abordados, 18 possuem o ensino fundamental completo; sete não frequentaram escola e não sabem ler ou escrever; dois frequentaram a educação de jovens e adultos; cinco possuem o ensino médio completo, um possui o ensino fundamental incompleto e um possui o ensino médio incompleto; ou seja, somente 14,7% dos adultos chefes de família na comunidade concluíram a educação básica.4
Lideranças endógenas e agentes externos ressaltaram a necessidade de formação profissional centrada na melhoria de técnicas e processos de produção dos quilombolas, e a captação de recursos para a comunidade, como indicou um parceiro da comunidade em resposta ao questionário: “Capacitações em várias áreas, desde a produção até à questão de logística ajudariam muito, abrem horizontes… pequenos núcleos de alfabetização de adultos também” (Parceiro externo 1).
Um dos representantes do movimento quilombola da região destacou a importância da educação para todas as faixas etárias em todas as comunidades da região. E salientou que a oferta de processos educativos deve estar de acordo com a realidade e faixa etária dos estudantes e com a cultura quilombola, mas mantendo abertura para compartilhar conhecimentos entre diversas culturas. Evidenciou:
Não há idade para a educação. Agora, não adianta chegar à comunidade e querer ter uma metodologia, uma filosofia da comunidade de italianos, por exemplo. Temos que aprender o que é dos outros, mas também os outros têm que aprender o que é nosso, [e] nós temos que estudar salvando o nosso território, a nossa cultura. (Entrevista realizada ao Representante 1 do movimento quilombola regional)
4.1.3. Dimensão ambiental/cultural
Na dimensão ambiental/cultural os resultados apontaram para uma severa crise hídrica no período do estudo, que afetou profundamente a vida dos quilombolas. Os recursos hídricos existentes na comunidade são as nascentes e o rio, que, devido a fatores climáticos e à intervenção humana (sobre-exploração dos recursos por parte de uma empresa de celulose), têm vindo a perder a sua riqueza: já não existem peixes suficientes para pescar e o volume de água tem diminuído sistematicamente. Para além disso, existe a questão fundiária do território que está paralisada, pois as entidades estatais não realizam a regularização do pertencimento das terras aos quilombolas.
Observou-se que os quilombolas associam quaisquer situações de escassez (socioeconômica, cultural e ambiental) às atividades da empresa de celulose que detém vasta extensão territorial para silvicultura do eucalipto e à questão fundiária não resolvida. Uma das leituras que fazem do seu contexto é a de que há escassez de água porque se destruiu parte da floresta para o plantio do eucalipto, o que secou rios e nascentes. Com a implementação de tal empresa, os quilombolas perderam parte do seu território e o governo brasileiro não agilizou (nem agiliza) o processo de titulação das terras (regularização fundiária). Estas questões estão entrelaçadas no cotidiano das comunidades quilombolas dessa região. A agricultura familiar foi prejudicada, conforme pontuaram moradores e agentes externos:
[Há] escassez de água, o rio está seco, e tem plantio de eucalipto nas nascentes. [...] [temos] dificuldades na questão fundiária e da água. (Entrevista realizada ao Líder comunitário 1)
Acho que uma questão é a produção, a terra e os meios, não basta ter a terra - é preciso ter os meios [...] é questão da técnica, do transporte, do maquinário para trabalhar a terra. A escassez da água se tornou crucial para eles [quilombolas] e até o próprio escoamento da produção. E as condições da estrada são ruins. Tem o desgaste da própria terra porque [está] cercada de eucalipto. O sumiço das nascentes, a própria fauna e a flora, os defensivos que são usados. O rio ficou assoreado. E vejo que [...] há um isolamento. Falta conhecimento da população externa daquela realidade, daquela comunidade. (Entrevista a um líder religioso sobre a comunidade quilombola)
A comunidade possui uma rica cultura e paisagens deslumbrantes com enorme potencial para o turismo étnico de base comunitária. Adultos e idosos quilombolas têm estreita conexão com o cultivo da mandioca e com as casas de farinha, que estão conectados com modos de vida ancestrais e com a terra. Conforme destacou um morador da comunidade, que é chefe de família:
A questão ambiental (recuperação de nascentes), a própria valorização do ser quilombola no resgate das suas raízes (o artesanato, a culinária, a casa de farinha), [pode] atrair turismo para conhecer o quilombola. Aproveitamento dos quintais, transformação das frutas em alimentos atraem pessoas em busca do produto natural para comercializar. (Resposta dada pelo Morador 5 ao formulário aplicado)
Sobre o significado de pertencimento a uma comunidade quilombola, alguns membros da comunidade afirmaram que significa luta, resistência dos povos negros, ter acesso à terra para cultivar e à moradia. É importante ressaltar que outros relacionaram o termo quilombola vinculado à falta de emprego e à falta de acesso a uma vida melhor, relacionando-o à falta de oportunidade; enquanto outros destacaram que pertencer a uma comunidade quilombola significa boa convivência e solidariedade. Portanto, o significado endógeno do termo quilombola aparece sob várias formas que se entrecruzam complementarmente, contribuindo para tal, certamente, os múltiplos e enraizados efeitos do racismo.
Eu acho que o quilombola é quem luta pelos direitos e quer trabalhar na terra, que defende muito seu próximo e é ser unido e morar numa comunidade. (Resposta dada pelo Morador 6 ao formulário aplicado)
Ser quilombola, afro, é não ter alternativa: é uma geração que não tem emprego. (Resposta dada pelo Morador 7 ao formulário aplicado)
É a raiz das pessoas nativas da região que nasceram e morreram na região por não ter outro jeito. (Resposta dada pelo Morador 8 ao formulário aplicado)
Eu nem sei o que é quilombola… eu sou negra. (Resposta dada pela Moradora 8 ao formulário aplicado)
4.1.4. Desafios/oportunidades de desenvolvimento comunitário rural
A segurança da comunidade estudada se constituiu em um desafio, pois existem conflitos endógenos (e outros) ocasionados pela questão da monocultura do eucalipto. Assim, há ocupação de terras por parte de uma empresa ligada à silvicultura do eucalipto, vizinha do território quilombola; e incêndios e furtos de produtos agrícolas das famílias quilombolas têm gerado insegurança na comunidade, conforme observou um dos agentes externos:
A comunidade tem problemas de disputa de terra com famílias, conflitos, incêndios. Um grande problema é a invasão por pessoas externas à comunidade. Invadiram algumas áreas de eucalipto vizinhas à comunidade trazendo algumas mazelas como roubo de mercadoria e a própria disputa; conflito diário de estar ali ocupando um espaço próximo. Porque já tinha uma cultura local; as pessoas já se conheciam. Hoje lá tem o externo vindo que não se sabe a procedência, muitos vêm de outras cidades, o que gera uma insegurança dentro da própria comunidade. Têm conflitos internos e tem o interno com o externo também. (Entrevista ao Parceiro 2 da comunidade quilombola)
Existem outros desafios referentes aos impactos das mudanças climáticas; às múltiplas restrições de acesso às políticas de inclusão social, educacional, saúde e aos insumos mínimos à agricultura familiar; conflitos endógenos, conforme observaram alguns moradores:
Falta de água por essa seca brava e de adubo. (Resposta dada pela Moradora 11 ao formulário aplicado)
Fiquei três meses sem água na cisterna. (Resposta dada pela Moradora 12 ao formulário aplicado)
Falta um posto de saúde na comunidade. (Resposta dada pelo Morador 13 ao formulário aplicado)
Falta uma escola de ensino fundamental, à noite. E alfabetização para adultos e idosos. (Resposta dada pela Moradora 14 ao formulário aplicado)
Não tenho energia e nem moradia. A Associação deveria ajudar com cesta básica. Tudo o que vem para a Associação não é repassado aos moradores. Somente a Diretoria se beneficia. (Resposta dada pela Moradora 15 ao formulário aplicado)
Porém, existem riquezas e oportunidades concretas de mudança social, ancoradas nos saberes dos próprios quilombolas como ponto de partida para trilhar outros caminhos e construir novas paisagens. Estas podem ser encontradas no fortalecimento de suas organizações coletivas; no território que entrelaçam pessoas e meio físico; na criação de espaços favoráveis à participação para análise crítica compartilhada sobre os desafios e riquezas existentes; nas parcerias externas e no estreitamento de parcerias endógenas (pela ampliação da oferta dos recursos comunitários existentes, tais como hortas, quintais, cultivo da mandioca, agricultura familiar, diversidade de recursos naturais para produção de artesanato, uso de plantas medicinais, culinária tradicional); em nascentes e no rio; em associações quilombolas e não quilombolas.
Observou-se que os principais fatores inibidores da oferta de uma educação de qualidade de jovens e adultos da comunidade em estudo foram principalmente: a ausência de oferta de políticas públicas específicas (saúde, educação, moradia, geração de trabalho e renda, etc.); conflitos endógenos enfraquecendo organizações comunitárias; infraestrutura e logística insuficiente ou inexistente (espaço físico, vias de acesso, transporte, educadores, etc.); e trabalhos informais, desemprego estrutural e êxodo rural, confirmando que a educação de jovens e adultos continua ocupando uma posição marginal dentro do sistema formal de educação brasileira (Torres, 2009).
Entretanto, o desvelamento do contexto da comunidade, para além das situações de privação ou escassez, fez emergir uma riqueza de saberes intangíveis, práticas tradicionais, belas paisagens com rica biodiversidade. Existe, portanto, um potencial para o turismo de base comunitária, sendo que alguns equipamentos comunitários poderão se constituir em fatores de inclusão socioeducacional, por meio da criação de tempos/espaços favoráveis de moldagem colaborativa de processos educativos estruturantes, de processos de desenvolvimento comunitário rural e de resolução de conflitos por meio do diálogo.
4.2. Elaboração de roteiro turístico étnico de base comunitária
No intuito de ressaltar e valorizar as tradições quilombolas da comunidade delineou-se uma atividade educativa que possibilitasse a sua integração no roteiro dos turistas. É neste contexto que surge o minicurso “Elaboração de roteiro turístico étnico de base comunitária”, que se realizou durante dois dias na comunidade quilombola, com carga horária de 16 horas. Participaram 22 pessoas, sendo 11 da comunidade quilombola; oito agentes externos que atuam como condutores turísticos do Parque Estadual de Itaúnas; duas educadoras ambientais (turismóloga e pedagoga) voluntárias da comunidade, que coordenaram as atividades educativas; e uma pesquisadora da equipa que esteve responsável pelo estudo de campo.
A leitura do contexto comunitário foi realizada através de um guia de questões, subdivididas em quatro eixos (ver Quadro 1), a saber: 1) Matéria-prima e localidades: de onde vem e onde é feito o manuseio da matéria-prima?; 2) Matéria-prima e utensílios: o que entra na produção?; 3) Quais os produtos culturais gerados na comunidade quilombola?; 4) Resultados: o que sai da comunidade?
Sobre matéria-prima e localidades, os participantes identificaram oito tipos de produtos na comunidade com potencial para compor o roteiro do turismo étnico de base comunitária. Referiram as infraestruturas, a parceria e os recursos naturais, nomeadamente as nove casas de farinha, os quintais, a praia, um parque de conservação do bioma da Mata Atlântica, a roça, o barro, o cipó e a madeira. No eixo matéria-prima e utensílios, identificaram 14 produtos referentes aos recursos naturais, culinária e produção artesanal. Já em relação aos produtos gerados na (e pela) comunidade foram identificados 15 produtos culturais, entre os quais se destacaram as habilidades tradicionais dos quilombolas na construção de suas moradias, a culinária e os saberes tradicionais (tais como as ladainhas). Quanto ao quarto eixo, foram apontados 16 produtos que saem da comunidade.
Foram arroladas as riquezas culturais vivenciadas, cotidianamente, pelas famílias quilombolas, tais como: os ofícios de benzedeiras e rezadoras; as casas de farinha; os carpinteiros; as agricultoras, que reconheceram a rica biodiversidade socioambiental do território.
Fonte: Elaboração coletiva no âmbito do minicurso realizado na comunidade quilombola implicada no estudo.
A materialização desta radiografia e a execução do minicurso com a comunidade quilombola demonstrou que a pesquisa-ação é uma abordagem auspiciosa para fortalecimento da participação comunitária por meio da construção colaborativa de processos educativos com jovens e adultos, que podem estruturar processos de desenvolvimento comunitário rural. Pois, permitiu a leitura compartilhada do contexto comunitário, amplificou os olhares sobre as riquezas concretas e potenciais existentes na comunidade, possibilitou aproximação e integração entre lideranças endógenas e agentes externos em torno da realização de objetivos comuns, criando tempos/espaços para o diálogo e aprendizagens colaborativas na leitura e na interpretação do ambiente sociocultural da comunidade.
Considerações finais
Esse estudo apontou que, potencialmente, há tempo/espaço favorável à implementação de processos educativos comunitários, formação profissional e valorização das raízes quilombolas com a comunidade concretizando o desenvolvimento comunitário rural. Nesse sentido, a educação com jovens e adultos assume um papel fundamental de contribuir para a resolução dos conflitos endógenos, bem como para a leitura e interpretação assertiva do contexto comunitário por meio de círculos de diálogo. Além disso, pode contribuir para o fortalecimento das organizações sociais quilombolas e da agricultura familiar. Pode também ampliar competências técnicas de gestão, produção e comercialização dos produtos da agricultura familiar e do turismo quilombola de base comunitária, ampliando as atividades econômicas através do afro-empreendedorismo, principalmente com mulheres e jovens quilombolas.
Entretanto, há fatores inibidores que exigem sensibilidade e apoio externo (setor público-privado e organizações da sociedade civil) para criação de tempos/espaços favoráveis à realização de processos educativos formais e não formais com a comunidade, tais como estruturação de espaço físico adequado, horário compatível com a sua rotina, formação em serviço de educadores quilombolas, entre outros. Se faz necessário aprofundar pesquisas e estudos junto com os quilombolas, definir com eles quais são as políticas prioritárias e como poderão ser implementadas de forma colaborativa.
A pesquisa realizada demonstrou que, apesar da existência de obstáculos, é possível articular a educação e o desenvolvimento comunitário no caso rural. Se os processos forem participados, essa conjugação torna-se mais evidente e de mais fácil e proveitosa concretização (Canário, 1999; Fragoso, 2005; Loureiro e Cristóvão, 2008; Maldonado, 2009; Rogers, 1995; Sansolo e Bursztyn, 2009).
Declaração de conflitos de interesse
A autora e os autores declaram não existir quaisquer conflitos de interesse.
Financiamento
A autora e os autores não receberam apoio financeiro para a investigação, autoria e/ou publicação deste artigo.