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Tourism & Management Studies
versão impressa ISSN 2182-8458
TMStudies vol.10 no.Especial Faro dez. 2014
GESTÃO - ARTIGOS CIENTÍFICOS
Ideal and real teaching competencies in distance education in a management course: a study in a Brazilian institution
Kely César Martins de Paiva1; Valéria Rezende Barros2; José Ricardo Costa Mendonça3; Andreia de Oliveira Santos4; Michelle Regina Santana Dutra5
1Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Ciências Econômicas, Departamento de Ciências Administrativas, Centro de Pós-graduação e Pesquisas em Administração (CEPEAD/CAD/FACE/UFMG), Avenida Antônio Carlos, 6.627, Prédio FACE, s. 4054 - Campus Pampulha – CEP 31270-901 - Belo Horizonte – MG - Brasil, kelypaiva@face.ufmg.br
2Faculdade Novos Horizontes, Rua Alvarenga Peixoto, 1270 – Santo Agostinho – CEP 30121-180 – Belo Horizonte – MG – Brasil, valeria.barros@unihorizontes.br
3Universidade Federal de Pernambuco, Centro Acad êmico do Agreste, Núcleo de Gestão, Programa de Pós-Graduação em Administração (PROPAD/NG/CAA/UFPE), Rodovia BR-104 km 59 - Nova Caruaru - CEP 55002-970 - Caruaru - PE – Brasil, jrcm@ufpe.br
4Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG), Campus II, Avenida Amazonas, 7675 – Gameleira – CEP 30510-000 - Belo Horizonte – MG - Brasil, andreiasantos@des.cefetmg.br
5Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH), Avenida Cristiano Machado, 4000 – União - CEP 31160-900 - Belo Horizonte – MG - Brasil, michelle.dutra@prof.unibh.br
RESUMO
O objetivo desse estudo foi descrever e analisar como se configuram as competências docentes, ideais e reais, na educação a distância (EAD), na percepção de discentes e docentes de um curso de graduação em Administração de uma instituição particular brasileira. O referencial teórico abordou competência profissional docente e especificidades na EAD. O estudo de caso, exploratório e descritivo, contou com abordagens quantitativa e qualitativa (triangulação). 107 questionários foram respondidos por alunos e foram realizadas 10 entrevistas (5 alunos, 5 professores). Os resultados apontaram um desnível entre o que se espera do professor e o que ele efetivamente vem realizando junto aos alunos, fato preocupante para todos os envolvidos. Diante dos achados e das limitações, sugestões para pesquisas futuras foram alinhadas.
Palavras chave: Competência profissional, competência docente, educação a distância, administração, professor.
ABSTRACT
The aim of this study was to describe and analyse how competencies – ideal and real – are being taught in distance education (DE), as perceived by students and teachers in an undergraduate management degree programme of a Brazilian private university. The theoretical discussion focuses on professional and teaching competence and specific characteristics of DE. This exploratory and descriptive case study included quantitative and qualitative approaches (triangulation). Data were collected with 107 questionnaires completed by students and 10 interviews conducted with five students and five teachers. The results show a gap between what is expected of teachers and what they actually have been doing with their students. This is alarming for all concerned. Given the findings and limitations of this study, suggestions for future research are outlined.
Keywords: Professional competence, teaching competence, distance education, management, teacher.
1. Introdução
Incentivada pelo governo federal, pelos avanços tecnológicos, pela disseminação da internet e pela política mundial de inclusão digital, a educação a distância (EAD) se fortaleceu no Brasil na última década (Dias & Leite, 2010). Note-se que esse processo também advém de novas necessidades das organizações e do mundo do trabalho, com implicações nas interações entre as pessoas (Barros, 2003). Mediada por uma tecnologia, a EAD é uma forma de ensino em que os envolvidos, professores e alunos, encontram-se em locais diferentes no momento da transmissão do conhecimento, o que demanda um maior tempo, técnicas especiais, melhor planejamento e recursos financeiros (Moore & Kearsley, 2007:1).
Segundo Peters (2010:29-30), numa perspectiva tradicional:
“Educação a distância sob um ponto de vista didático, se trata da ligação mais ou menos integrada de formas de aprendizado. Entre elas constam: aprender por meio de leitura de material impresso, aprender através de estudo próprio dirigido, aprender por meio de trabalho científico autônomo, aprender por meio de comunicação pessoal, aprender com ajuda de meios auditivos e audiovisuais, aprender por participação em tradicionais ofertas de ensino acadêmico.”
Assim sendo, a educação tem assumido a conotação de “permanente” ou “continuada”, passando a se caracterizar pela difusão de conhecimentos no decorrer de toda existência humana, buscando proporcionar a emancipação dos indivíduos-cidadãos (Belloni, 2009). Assim, a EAD se sustenta em possibilidades pedagógicas, oportunidades econômicas, flexibilidade e liberdade na ação dos atores envolvidos, principalmente alunos e professores, caracterizando-se como uma importante inovação educacional das últimas décadas (Nunes, 2009). Ela se caracteriza como uma troca de saberes, intermediada por tecnologias de informação e comunicação (TIC´s), entre sujeitos distantes fisicamente, o que implica técnicas diferentes de elaborar cursos (Moore & Kearsley, 2007). Ela permite a interligação de informações, mas exige organização e conhecimento aprofundados das mesmas, para que tenham significado e relevância. Assim, a EAD pode contribuir para a “transformação dos métodos de ensino e da organização do trabalho nos sistemas convencionais, bem como para a utilização adequada das tecnologias de mediatização da educação” (Belloni, 2009:6). Ela se passa em um ambiente mutante, em que o sujeito tem condições de apropriar-se do conhecimento de uma forma diferenciada, considerando a “multidimensionalidade do conhecimento” (Waquil & Behar, 2009:148) e a necessidade de autoinstrução e autodisciplina, principalmente por parte do aluno (Moraes, 2010).
Isso tudo indica que a EAD culmina na necessidade de formar e desenvolver competências diferenciadas, em todos os envolvidos, de modo a auxiliar e resolver alguns problemas da educação, em especial no caso brasileiro, dadas suas idiossincrasias (Behar, 2009:16). Considerando este imperativo de mudanças, manifesta-se a necessidade de romper com o ensino tradicional e lançar-se em busca de novos protótipos e formas de aprendizado, os quais devem atentar tanto para os alunos como para os professores, sendo que estes últimos usualmente enfrentam inúmeras barreiras, dificuldades e falta de suporte (Seixas & Mendes, 2006). Essa “nova cultura” tende a redefinir noções de tempo e espaço (Waquil & Behar, 2009:147), exigindo o desenvolvimento de competências individuais, processo no qual a educação tem como papel primordial, ou seja, formar pessoas e profissionais competitivos para o mercado de trabalho (Moraes, 2010).
O Governo brasileiro parece atento a essas questões. A Lei n° 9.394, que trata das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB (MEC, 1996), regularizou o ensino a distância e a Portaria nº 4.059 (MEC, 2004, p.1), no seu artigo 1º, estabeleceu que “as instituições de ensino superior poderão introduzir, na organização pedagógica e curricular de seus cursos superiores reconhecidos, a oferta de disciplinas integrantes do currículo que utilizem modalidade semipresencial”.
Diante disso, apontou-se a necessidade de mudanças na gestão educacional e na formação dos docentes. Assim, o objetivo geral da pesquisa apresentada neste artigo consiste em descrever e analisar como se configuram as competências docentes na EAD, ideais e reais, na percepção de discentes e docentes do curso de graduação em Administração de uma faculdade particular brasileira.
O presente estudo se justifica por diversos motivos. Do ponto de vista acadêmico-conceitual, Belloni (2009) recomenda avançar nas discussões sobre EaD, seus benefícios e critérios de acessibilidade e qualidade; Campanário, Plonski e Garcia (2010) sugerem a realização de pesquisas relacionadas à EAD no campo das ciências sociais aplicadas, nas quais se inserem a Administração, as Ciências Contábeis e o Turismo, conforme legislação brasileira. A escolha de um curso de graduação em Administração foi proposital, pois este é o mais procurado no Brasil, tanto nos moldes presenciais como à distância, sendo estes os mais ofertados do país (2.732 cursos em atividade, em instituições públicas e privadas) (MEC, 2011). Do ponto de vista pragmático-organizacional, os resultados dessa pesquisa podem somar para o desenvolvimento de meios didáticos para disseminação do conhecimento na EAD (Peters, 2010), contribuindo com as instituições de ensino, podendo subsidiar mudanças e melhorias nos processos relativos à EaD, como afirmam Ronchi, Ensslin e Reina (2011). De modo mais amplo, este estudo também abre possibilidades em termos de inclusão no contexto educacional (Nunes, 2009). Enfim, na contemporaneidade, o contexto da sala de aula abrange as perspectivas de ensino presencial e à distância (Dias & Leite, 2010), decorrendo daí a importância de se debruçar sobre as perspectivas de discentes e docentes a respeito das competências docentes em EAD.
2. Competencia profissional, docência e EAD
Por ser tema de discussões em inúmeras áreas, a competência possui diferentes conceitos (Steffen, 1999). As complexidades presentes no trabalho e a necessidade de conhecimentos e habilidades para desenvolvê-lo também contribuem para a dificuldade em conceituar competência (Cheetham & Chivers, 1996).
Nas perspectivas de vários autores sobre a temática, Bittencourt (2002) identificou os aspectos sintetizados no Quadro 1 apresentado pela autora.
Note-se que os aspectos apontados por Bittencourt (2002) apontam para duas perspectivas, sendo a primeira voltada para qualificação, ou seja, para características que os indivíduos devem possuir para agir, e a segunda para a ação efetiva do sujeito. Assim sendo, a primeira trata de um potencial para a ação e a segunda para a ação em si. Neste segundo campo situa-se a percepção de diversos autores, como Dutra, Hipólito e Silva (2000) que caracterizam a competência profissional como uma ação com desempenho ótimo, isto é, como aquilo que de fato está sendo “entregue” pelo sujeito. Outra autora que se alinha a essa perspectiva é Paiva (2007), que adaptou o modelo de Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000) para fins de suas pesquisas com docentes do ensino superior no Brasil. Para a autora, competência profissional é a efetiva mobilização, de caráter individual por parte do profissional, de certos saberes pautados em cinco componentes (cognitivas, funcionais, comportamentais, éticas e políticas), cujos resultados são reconhecidos em várias instâncias: “individual (pessoal), coletiva (profissional) e social (comunitário)”, o que inclui as organizações (Paiva, 2007).
Cheetham e Chivers (1996, 1998, 2000) ao desenvolverem seu modelo de competência profissional consideraram aspectos individuais, coletivos e sociais, nos quais se incluem resultados diferenciados (macro, micro e, também, resultados parciais). Seu modelo é constituído por quatro componentes centrais: a cognitiva, que são os conhecimentos formais que capacitam o sujeito à execução de seu trabalho; a funcional, que reflete o domínio da execução do trabalho; a comportamental, vinculada às formas de relacionamento social que o sujeito desenvolve; e a ética, que reflete sua aderência a códigos morais da sociedade e das organizações. Paiva (2007) acrescentou ao modelo a componente política, a qual reflete a fluência, por parte do profissional, nas relações de poder no cotidiano do seu exercício profissional. Assim as cinco componentes pautam o comportamento efetivo do profissional, chamado pelos autores de metacompetências ou transcompetências, o qual é avaliado pelo próprio sujeito e por terceiros, permitindo que ele reflita na e sobre sua ação, de modo a revisitar suas bases e seus resultados visíveis, de modo a manter-se competente, tanto no seu julgamento como dos demais, que assim o legitimam como “competente”, ou não. A Figura 1 sintetiza o modelo.
Este modelo tem se mostrado amplo e profundo para a compreensão das competências profissionais, inclusive no âmbito da profissão docente, em pesquisas realizadas no Brasil, daí sua adoção para fins da pesquisa apresentada neste artigo.
No entanto, ele precisa ser delimitado mais especificamente para se estudar as competências docentes na EAD. Isso se deve ao fato de que mudanças na vida docente ocorreram impulsionadas pela reestruturação educacional, expandindo o escopo de suas tarefas e das suas exigências, sem fornecer qualquer ajuda ou suporte para tal transição Essa reestruturação da educação provocou um “aligeiramento da formação docente” em que a pedagogia parece ter sido esquecida e desconfigurada (Libâneo, Oliveira & Toschi, 2003:271). Assim, diante de um processo histórico e de âmbito mundial de proletarização do trabalho docente (Nóvoa, 2002), salienta-se a importância da reconfiguração do papel dos professores e de suas condições para uma melhor concretizar seu trabalho (Zabalza, 2004), voltando-se principalmente para as especificidades pedagógicas que caracterizam seu trabalho, nem sempre reconhecidas socialmente (Nóvoa, 2002)
É importante frisar que o papel do professor vai muito além da mera transmissão do conhecimento estabelecido: seu desafio está em “entregar” um ensino (Dutra, Hipólito & Silva, 2000; Paiva, 2007) que não se realiza de modo separado da pesquisa (Zabalza, 2004), principalmente considerando-se a educação em nível superior, como mostram os diversos estudos organizados por Frost e Andre (1996).
Isso implica em revisão no papel e, daí, nas competências do professor, principalmente considerando-se a EAD (Dias & Leite, 2010), a qual exige práticas atreladas às TIC´s (Belloni, 2009). Como enfatiza Niskier (2009:30), “a aquisição de competência abrange o saber e o fazer; a teoria e a prática; os princípios e processos da tecnologia educacional”.
No caso da EAD, a literatura aponta uma série de comportamentos percebidos como competentes por parte dos professores que atuam sob esta égide de ensino. No Quadro 2, tais competências docentes foram alinhadas ao modelo de competências profissionais de Paiva (2007), adotado como parâmetro analítico no estudo aqui apresentado.
De posse dessa síntese conceitual, realizou-se uma pesquisa com alunos e professores de um curso de Administração em uma instituição particular brasileira.
3. Metodologia
A pesquisa realizada caracteriza-se por ser um estudo de caso (Vergara, 2009) exploratório e descritivo (Vergara, 2009, Godoy, 1995), com abordagens quantitativa e qualitativa (Creswell, 2007, Godoy, 1995), que se complementaram para compreensão do fenômeno em questão, caracterizando-se uma triangulação metodológica (entre métodos) (Collis e Hussey, 2006).
A unidade de análise (Alves-Mazzotti & Gewasdisznajer, 1999; Appolinário, 2007) foi composta por professores do curso de Administração de uma instituição de ensino superior privada brasileira, localizada na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, fundada há mais de 10 anos. Ela oferta cursos de graduação (normal e tecnológica) e pós-graduação (lato e stricto sensu), todos presenciais, porém todas as disciplinas obrigatoriamente contam com atividades realizadas nos moldes da EAD, além de algumas delas serem ofertadas apenas nesse ambiente, caracterizando blended learning, ou seja, combinando processos de ensino-aprendizagem presenciais com os mediados por tecnologia (Tori, 2010). Note-se que o curso de graduação em Administração foi reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) em 2004. Os sujeitos da pesquisa foram professores e alunos desse curso, sendo todos escolhidos pelo critério de acessibilidade (Vergara, 2009), devido à abertura da instituição para realização da pesquisa e a disponibilidade dos sujeitos em preencher questionários e conceder entrevistas.
Assim, a coleta de dados foi realizada em um dos campi da instituição no primeiro semestre de 2012. Ela se deu em duas fases, sendo a primeira, por meio de questionários. Estes foram compostos de duas partes: dados demográficos dos alunos respondentes e dados sobre as competências docentes. Nesta segunda parte, as competências presentes no Quadro 2, apresentado anteriormente, foram subdivididas em frases nas quais os alunos respondentes deveriam indicar seu nível de concordância em dois pontos: o que o professor deveria apresentar (ideal) e o que os professores do seu curso efetivamente apresentavam. Nesta primeira fase, foram distribuídos 200 questionários aos discentes da instituição, dos quais 112 retornaram preenchidos, porém, devido a problemas de preenchimento, apenas 107 deles compuseram amostra. Na segunda fase, foram entrevistados cinco professores e cinco alunos do referido curso. Nesta parte da pesquisa, foram apresentados os resultados da primeira fase de coleta de dados aos entrevistados e estabeleceu-se um diálogo com eles sem um roteiro previamente definido, buscando-se identificar como eles compreendiam tais resultados. Todas as entrevistas foram gravadas com permissão dos sujeitos, os quais preencheram um formulário de identificação com dados demográficos.
As respostas da parte quantitativa foram lançadas em planilha eletrônica e tabuladas utilizando estatística descritiva univariada, calculando-se médias e percentuais de entrevistados por nível de concordância com as frases sobre as competências ideais e reais do professor na EAD. Já na parte qualitativa do estudo, todas as entrevistadas foram transcritas na íntegra e procedeu-se à análise de conteúdo (Bardin, 2008).
4. Apresentação e análise dos dados
A maior parte dos alunos respondentes do questionário foi constituída de mulheres (55% do total), de idade entre 21 e 25 anos (34%), estado civil solteiro (61%), cursando o 7º sétimo período do curso de graduação em Administração (24%), com experiência profissional (99%) e ocupando cargos operacionais nas empresas onde trabalham (51%).
As médias atribuídas por eles às componentes das competências profissionais dos docentes do curso, no que tange à sua performance em EAD, foram consideradas satisfatórias (igual ou acima de 3,5) na maioria dos casos, considerando-se tanto o comportamento ideal (esperado, desejado) como o real (efetivamente apresentado pelo docente no cotidiano escolar). As duas exceções foram as componentes política e comportamental (Paiva, 2007), ambas com médias 3,4 no plano real, o que indica que as competências mais pautadas nessas componentes não estão sendo legitimadas junto aos discentes em nível semelhante às demais, caracterizando-se em nível mediano (entre 2,5 e 3,5). Além disso, observaram-se diferenças entre os planos ideal e real em todas as componentes, com destaque, mais uma vez, para a comportamental e a política (Paiva, 2007), atingindo, em ambos os casos, uma diferença de 1,1 pontos (lembrando que a escala do questionário variava de 1 a 5); a menor diferença encontrada (0,7) foi para a componente cognitiva (Paiva, 2007), o que denota a menor variação, na opinião dos alunos, entre o que o professor deveria saber em termos de conteúdos formais e o que ele realmente demonstra na condução da matéria. Observe o Gráfico 1, onde constam todos os resultados:
Outra forma de analisar os dados divide os respondentes por três grupos, ou seja, os que apresentam níveis satisfatórios, medianos e insatisfatórios em cada uma das componentes das competências docentes por eles avaliadas. Quanto a percepção dos discentes sobre as competências ideais dos professores na EAD, a maioria indicou níveis considerados satisfatórios, denotando suas elevadas expectativas com relação aos resultados do comportamento de seus professores, como pode-se observar no Gráfico 2.
No entanto, quando apurados os percentuais de alunos separados por nível de avaliação das competências reais dos docentes na EAD, a situação não é tão positiva, indicando um gap entre o comportamento esperado e o efetivamente demonstrados pelo corpo docente do curso em questão. A menor diferença refere-se à componente cognitiva (Paiva, 2007), corroborando a análise das médias, já que o percentual de alunos que a avaliaram em nível satisfatório no plano ideal foi de 92% e no real foi 79% deles, indicando que a maior parte considera a atuação do professor competente no que tange à sua formação superior na área de atuação, ao domínio de princípios e processos de tecnologia educacional, ao domínio dos contextos político e econômico relativos aos conhecimentos transmitidos, à capacidade de segmentar o ato de ensinar, e à sua habilidade com as TIC´s (Moraes, 2010; Belloni, 2009; Costa, 2008; Niskier, 2009).
Por outro lado, a maior diferença apurada diz respeito à componente comportamental (Paiva, 2007), pois o percentual de alunos que a julgaram em nível satisfatório no plano ideal foi 91% e no real eles somaram 49% da amostra, o que revela um contingente significativo de discentes que não visualizam importantes competências na conduta efetiva de seus professores, relacionadas ao domínio da dimensão humana, ao incentivo à troca de saberes, ao uso das TIC’s na gestão, na crítica, na síntese e na apresentação dos conteúdos apreendidos, ao desenvolvimento de equipes de projetos inovadores, à mediatização, ao desafio cognitivo dos alunos, à promoção da interação e, enfim, ao apoio psicossocial (Belloni, 2009; Behar, 2009; Niskier, 2009; Borba, Malheiros & Zulatto, 2008). Estes e os demais resultados podem ser visualizados no Gráfico 3.
Assim, a componente cognitiva destacou-se das demais, pelas médias mais significativas nos planos ideal e real e pelos percentuais de respondentes que as avaliaram em níveis satisfatórios, diferentemente da componente comportamental, cujos resultados foram preocupantes.
Diante desses dados partiu-se para as entrevistas. Quanto aos cinco alunos entrevistados, quatro eram mulheres, três entre 21 a 25 anos de idade, quatro solteiros, três há menos de um ano de formar-se no curso, quatro com experiência profissional entre 2 a 5 anos e quatro ocupam cargos operacionais nas empresas onde trabalham. Já entre os cinco professores, três eram mulheres, quatro com idade acima de 46 anos, quatro casadas, todos com experiência profissional e três com acadêmica entre 6 e 10 anos, sendo que todos lecionam em outras instituições.
De modo geral, os entrevistados perceberam que os resultados apontaram distâncias entre o que se espera do professor e o que eles efetivamente “entregam” (Dutra, Hipólito & Silva, 2000; Paiva 2007) para os alunos.
Em todas as dimensões, componentes avaliados, ocorreu uma discrepância muito grande, a que menos fugiu [entre] o ideal e o real foi a componente cognitiva. (Professor 1)
No que se refere a componente cognitiva (Paiva, 2007), a maioria dos entrevistados (todos os professores, quatro alunos) acredita que o gap seja menor do que o apontado pelos alunos no questionário, fundamentados essencialmente na capacitação periódica realizada junto aos professores.
Então, no que diz respeito ao conhecimento formal os alunos têm uma certeza... do que nossos professores têm, detém esses conhecimentos formais. (Professor 2)
Já as discrepâncias quanto às competências pautadas na componente funcional (Paiva, 2007) foram atribuídas à “falta de competência” de professores da instituição, às dificuldades em manter uma relação interpessoal por meio de ferramentas de EAD. Eles manifestaram preocupações em relação a esse fato e verbalizaram que há pontos a serem “trabalhados junto aos docentes”, já que parte deles não guiam o percurso de aprendizagem dos alunos, não dão feedback das tarefas e não estão realmente envolvidos com a EAD na instituição pesquisada.
(...) até eu mesmo, como professor, sinto uma certa dificuldade de manter essa interação por meio de ferramentas do EAD. (Professor 2)
(...) guiam o percurso de aprendizagem não guiam. (Aluno 2)
Quanto à componente comportamental (Paiva, 2007), os alunos entrevistados apontaram a falta de comunicação e de interação como os docentes na EAD, o que denota desvios quanto ao caráter interativo da profissão (Tardif & Lessard, 2005; Paiva, 2007), com fortes impactos também na EAD. Os professores mostraram-se especialmente preocupados com essa componente, entendendo sua importância no fazer pedagógico que caracteriza a docência (Nóvoa, 2002; Paiva, 2007).
Não tem comunicação, porque, às vezes, você manda uma mensagem para o professor, ele não te responde e fica por isso mesmo (risos). (Aluno 2)
Eu acho que essas características comportamentais, elas são fundamentais nisso, e ficou com uma avaliação muito baixa... (Professor 1)
Com relação à componente política (Paiva, 2007), o item mais comentado pelos entrevistados foi o relativo aos conflitos, inclusive os decorrentes da falta de domínio das ferramentas de EAD, mencionadas por professores e alunos. Houve relatos que ressaltaram o “descaso”, a falta de comprometimento e de capacidade dos docentes para lidar com os discentes no contexto da EAD, inclusive porque eles não conseguem estabelecer um processo comunicativo que sustente o diálogo.
(...) acontecem muitos conflitos no EAD... (Professor 1)
(...) saber lidar com conflitos, não existe, porque conflito existe entre pessoas, não é, e a partir do momento que não tem a comunicação entre pessoas... (Aluno 2)
Por fim, no que se refere à componente ética (Paiva, 2007), os professores ressaltaram a dificuldade de os alunos avaliarem o comportamento ético de um professor na EAD; por outro lado, os alunos verbalizaram a necessidade dos professores lidarem com a diversidade “à distância”, o que parece não ser tarefa fácil nem no cotidiano de sala de aula.
(...) como que eles vão avaliar se o professor que está ministrando essa disciplina a distância, ou parte dessa disciplina a distância, se ele está sabendo lidar com essa diversidade, se ele está estabelecendo parâmetros de qualidade didática e pedagógica (Professor 2)
Quanto a ética, o profissional deve estar pronto para lidar com a diversidade, entendendo que cada aluno tem um tipo de entendimento, de aprendizagem diferente, uma maneira de entender... (Aluno 1)
Essa componente ética, na opinião de alguns dos entrevistados, é a mais preocupante diante do gap encontrado nas opiniões dos alunos:
A ética, no meu conhecimento, parece a pior avaliação... (Professor 3)
Os entrevistados também questionaram os motivos de os resultados das componentes ideais não terem alçando o escore “ 5”, já que seria o valor máximo possível.
(...) aliás, eu fiquei curiosa, porque que será o próprio ideal não chegou no “ 5” (Professor 1)
(...) percebi que a média ideal, indo de uma escala de 1 a 5, nenhuma obteve “ 5”, mesmo sendo média ideal. (Aluno 5)
Na avaliação deles próprios, isso mostrou que os alunos têm clareza quanto ao que esperam do professor na EAD; além disso, os entrevistados sabem, também, que tem muito ainda a ser feito, principalmente porque a evasão na EAD é significativa, precisando ser essa forma de educação estudada e melhorada, explicitando a relevâncias de pesquisas como esta.
(...) acho que o melhor desse resultado é isso: mostrar que eles vão ter que ser trabalhados. (Professor 1)
Por fim, alguns entrevistados manifestaram a necessidade de se estabelecer um diálogo de modo que a avaliação das competências docentes em EAD seja feita de modo mais participativo e integrado, reunindo os atores mais importantes nesse processo de ensino e aprendizagem: alunos e professores.
(...) mas se você levar em conta que os discentes estão avaliando os docentes... temos que trabalhar isso junto aos docentes, não é! (Professor 1)
5. Conclusão
Os resultados da pesquisa são preocupantes, pois demonstraram um gap entre as competências ideais e as reais dos professores no que tange às atividades desenvolvidas por meio da EAD praticada na instituição de ensino, as quais são mescladas com atividades presenciais, que predominam no cursos oferecidos, inclusive no de Administração abordado.
As médias apuradas para cada uma das componentes da competência profissional, que reuniram diversas competências mencionadas na literatura sobre a temática em EAD, foram elevadas em sua maioria, principalmente no campo ideal, porém sem chegar ao máximo da escala disponibilizada para a avaliação. Isso surpreendeu tanto alunos como professores, mas, por outro lado, indica que os alunos têm ciência do que é possível de ser realizado, devido às idiossincrasias da EAD e do contexto onde ela opera. No entanto, as médias que sintetizam o que os professores efetivamente vêm entregando aos alunos são preocupantes, pois, apesar da maior parte ter sido considerada satisfatória, elas indicaram diferenças sensíveis em relação ao ideal, o que implica maior atenção por parte dos professores, como também da instituição, no que tange às práticas de EAD realizadas no seu interior.
É importante ressaltar que as competências que se pautam na componente cognitiva foram as que apresentaram os melhores resultados na avaliação dos alunos, indicando que o domínio sobre o conhecimentos formal e sobre as TIC´s se fazem presentes no corpo docente. Entretanto, as demais componentes (funcional, comportamental, ética e política) não se apresentaram na mesma intensidade, colocando em risco a efetividade das primeiras, o que implica em não legitimação da “competência profissional”, já que se trata de um conceito multidimensional, dependendo de todas as componentes e não apenas de uma ou outra para ser reconhecida.
Nas entrevistas, foi possível identificar o papel central do professor na EAD, pois é ele quem deve conduzir, mediatizar e facilitar apropriação do conhecimento pelos alunos, o que exige comportamentos pautados em todas as componentes da competência profissional. O descaso por esse lugar de destaque na EAD, apontado pelos entrevistados, parece estar contribuindo negativamente no processo -sempre em curso- de profissionalização da categoria, podendo implicar em mais um fator de precarização do trabalho docente, fato mundialmente reconhecido e que preocupa a todos os atores sociais vinculados à educação.
Diante desses achados e das limitações de ter-se realizado um estudo contando com professores e alunos de apenas um curso e em uma única instituição particular, nota-se a necessidade de prosseguir nas investigações envolvendo a temática e o contexto aqui abordado. Assim sendo, sugere-se ampliar a pesquisas para os outros cursos ofertados na instituição abordada nesta pesquisa, assim como partir-se para outras instituições, privadas e públicas, e outros níveis de ensino, com vistas à identificação de traços díspares e semelhantes e, com isso, traçar um perfil mais nítido de como as competências profissionais docentes são necessárias e concretizadas no ensino superior.
Com isso acredita-se estar contribuindo tanto para com a melhoria na qualidade de ensino, como com a profissionalização docente, inclusive no ensino superior, especificamente em Administração.
Referências
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Processo do artigo
Submetido: 22 agosto 2012
Aceite: 18 fevereiro 2013