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e-Pública: Revista Eletrónica de Direito Público
versão On-line ISSN 2183-184X
e-Pública vol.5 no.1 Lisboa jan. 2018
DESTAQUE
A internacionalização de situações internas no direito internacional privado unificado da União Europeia
Tendências jurisprudenciais recentes
The Internationalization of internal situations in EU private international law
Recent trends in case law
Porfírio Moreira0
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Alameda da Universidade – Cidade Universitária, 1649-014 Lisboa. E-mail: pmoreira@cardigos.com
RESUMO
A geometria variável do conceito jurisprudencial situação transfronteiriça, expandindo-se ou contraindo-se em razão inversa do conceito de situação puramente interna, desempenhou um papel fundamental na construção jurídica, rectius, na construção tout court, do mercado interno europeu. Sob uma aparência de tecnicidade jurídica, jogou-se a repartição de competências entre a agora União Europeia e os Estados-membros. O alegado activismo jurídico do TJUE marcou uma época político-económica e, claro, também jurídica. Entre outros aspectos, e para além da expansão do âmbito de aplicabilidade do direito da UE, consolidou-se o diálogo na ordem jurisdicional europeia entre o TJUE e os tribunais nacionais. São precisamente (alguns) tribunais nacionais que surgem, agora, como actores principais da expansão do âmbito de aplicação do direito internacional privado europeu na medida em que, materialmente, prescindiram da transnacionalidade como requisito de aplicabilidade daquele direito.
Palavras-Chave: Regulamento de Bruxelas * Regulamento de Roma * situação transfronteiriça * situação puramente interna * direito internacional privado europeu * derivados financeiros.
ABSTRACT
The variable geometry of the jurisprudential notion of cross-border situation, expanding or contracting in inverse ratioto the notion of purely internal situation, played a fundamental role in the legal development, rectius, in the development tout court, of the European internal market. Under a cloak of legal technicality, the division of competences between the now European Union and the Member-States was at stake. The so called judicial activism of the ECJ marked a political and economic era and, obviously, a legal era. Among other relevant matters, and other than the expansion of the scope of application of EU law, one remarks the consolidation of the dialogue in the European jurisdictional system between the ECJ and the national courts. (some of) The national courts are now taking the leading role in the expansion of the scope of application of the European private international law to the extent that they have arguably dismissed transnationality as a requirement for the application of said body of law.
Keywords: Brussels Regulation * Rome Regulation * cross-border situation * purely internal situation * European private international law * financial derivatives.
Sumário
1. Enquadramento; 2. Generalidades em torno do conceito de situação transfronteiriça no direito da União Europeia; 3. O elemento de conexão no Regulamento de Bruxelas; 3.1.A jurisprudência do TJUE 3.2. A Jurisprudência do STJ; 3.2.1. Três acórdãos e um reenvio prejudicial 3.2.2.Pacto de jurisdição, elemento bastante de transnacionalidade? 3.2.3. Transnacionalidade indirecta, ténue ou potencial; 4. O artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma segundo os tribunais ingleses 4.1. Processo Dexia 4.2. Processo BST; 4.3. Os Acórdãos do England and Wales Court of Appeal; 4.4.A omissão de Reenvio prejudicial; 4.5 Análise crítica; 5. Nota conclusiva.
1. Enquadramento
A crise financeira de 2008, a subsequente crise das dívidas soberanas e as medidas de resposta adoptadas pelos países afectados e pelas instituições da UE, e muito em particular pelo BCE, alteraram radicalmente o desenho inicial de inúmeros contratos de derivados financeiros. De entre estes, destacam-se os swaps de taxa de juro1, cuja dinâmica sinalagmática se desviou manifestamente do feixe de previsibilidade objectiva existente ao tempo da contratação, em virtude da prolongada baixa histórica das taxas de juro oficiais e de referência do BCE, iniciada em Novembro de 2008, e que ainda não terminou2. O desvalor económico subsequente dos swaps, regra geral em prejuízo da parte não financeira, deu azo a múltiplas disputas judiciais e arbitrais em Portugal – e no estrangeiro – tendo constituído terreno fértil para interessante e viva discussão jurisprudencial3 e doutrinária4, em torno de institutos jurídicos substantivos basilares do ordenamento jurídico nacional.
A litigância em torno dos contratos de swap encerrou, igualmente, importantes subsídios para balizar os conceitos de transnacionalidade e elemento de conexão no quadro dos pactos atributivos e privativos de jurisdição – Regulamento (UE) n.º 1215/20125 (“Regulamento de Bruxelas”) – e nas cláusulas de escolha de lei, tal como configuradas na Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (“Convenção de Roma”)6. São precisamente estes subsídios, e o seu papel específico no diálogo na ordem jurisdicional europeia entre o TJUE e os tribunais nacionais, que constituem o objecto de análise do presente artigo, não se dispensando um brevíssimo excurso sobre o conceito de situação transfronteiriça no direito da UE
2. Generalidades em torno do conceito de situação transfronteiriça no direito da União Europeia
A existência de um elemento transfronteiriço é requisito de aplicação do direito da UE e da conexa competência jurisdicional do TJUE referentes às liberdades do espaço europeu. O TJUE reiterou, consistentemente, que às situações exclusivamente internas não era, ratione materiae, aplicável o direito da UE, através da seguinte fórmula repetida, mutatis mutandis, ao longo de várias décadas de jurisprudência:
“A este respeito, há que recordar que as disposições do Tratado FUE em matéria de liberdade de estabelecimento, de livre prestação de serviços e de livre circulação de capitais não são aplicáveis a uma situação em que todos os elementos estejam confinados a um único Estado-Membro”7.
A inaplicabilidade do direito da UE a situações puramente internas consubstancia uma fronteira de soberania legislativa dos Estados-Membros na complexa e delicada teia de repartição de atribuições e competências entre estes e a UE8, alicerçada na tríade principológica atribuição, subsidiariedade e proporcionalidade9. A redução do âmbito operativo da locução situação puramente interna implica automaticamente igual redução da reserva de competência legislativa e jurisdicional dos Estados-Membros. Perante esta locução de sentido parcialmente indeterminado, com efeitos na aludida repartição de atribuições e competências, o TJUE, historicamente, lançou mão de uma certa dose de activismo judicial, de intensidade variável, no qual se descortina uma tendência global de maximização da aplicabilidade do direito da UE – e, por arrasto, da competência do próprio TJUE – contribuindo, com maior ou menor intencionalidade, para a aceleração e aprofundamento do projecto europeu.
No âmbito da livre circulação de pessoas, o TJUE foi particularmente generoso com os indivíduos que se quiseram prevalecer de normas, quer de fonte originária quer de fonte derivada, atributivas de direitos. Para o efeito, numa abordagem realístico-finalista – senão declarada, pelo menos indisfarçada – o TJUE foi muito além dos limites conceptuais tradicionais de conector transnacionalou elemento transfronteiriço10. Esta abordagem, com a qual se concorda, visou, em termos práticos, impedir situações de discriminação inversa, que, na ausência de intervenção do direito da UE, redundariam em onerosas limitações à vida familiar, impossibilitando, concretamente, o exercício do direito de reagrupamento11. O recente acórdãoComansé tributário desta linha decisória:
“Como foi recordado nos n.ºs 23 e 24 do presente acórdão, quando, por ocasião de uma residência efectiva do cidadão da União num Estado-Membro diferente daquele de que é nacional, por força e no respeito das condições previstas pela Directiva 2004/38, se tenha desenvolvido ou consolidado uma vida familiar neste último Estado-Membro, o efeito útil dos direitos que o artigo 21.°, n.° 1, TFUE confere ao cidadão da União em causa exige que a vida familiar que esse cidadão manteve no referido Estado-Membro possa ser prosseguida quando do seu regresso ao Estado-Membro de que é nacional, através da concessão de um direito de residência derivado ao membro da família em causa, nacional de um Estado terceiro”12.
O TJUE teria, sem dúvida, prestado maior tributo à ciência jurídica se considerasse, abertamente, que a discriminação inversa é contrária ao direito da UE tout court e, ou, se derivasse direitos directos da cidadania europeia, dispensando, por uma ou outra via, a artificialidade da construção de conector transnacional conforme acima assinalado. Não o fez, guardou o mantra, naquele que, crê-se, constitui mais um exemplo de realismo judicial, expropriando, aqui e ali, a reserva legislativa dos Estados-Membros em situações puramente internas, com simultânea proclamação anestésica em contrário13.
Em matéria de livre circulação de mercadorias, o TJUE considerou aplicável o direito da UE em situações em que o elemento de transnacionalidade era ténue, indirecto e, ou, meramente potencial:
“É um facto que a regulamentação francesa só se aplica efectivamente aos produtos vendidos no mercado francês, sem qualquer incidência sobre as exportações para os outros Estados-membros, e que, deste modo, não há que apreciá-la em relação ao artigo 34.° do Tratado, relativo às medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à exportação. Todavia, resulta das observações não contestadas da Comissão que os iogurtes ultracongelados são legalmente fabricados e comercializados sob essa denominação noutros Estados-membros; assim, não está afastada a hipótese de esses produtos serem importados em França e de a legislação francesa lhes ser aplicável”(negrito nosso)14.
Em Pistre15, o TJUE deu um passo mais além, pois ao contrário do estatuído no acórdão Smanor, não deixou margem ao tribunal nacional para determinar se a medida afectava, no caso concreto, o comércio intra UE:
“Com efeito, de acordo com uma jurisprudência constante (acórdão de 11 de Julho de 1974, Dassonville, 8/74, Recueil, p. 837, n.° 5, Colect., p. 423), a proibição constante do artigo 30.° do Tratado visa qualquer regulamentação comercial dos Estados-Membros, que possa entravar, directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário.
Assim, embora a aplicação de uma medida nacional, que não tenha efectivamente, qualquer conexão com a importação de mercadorias, não caia sob a alçada do artigo 30.° do Tratado (acórdão de 15 de Dezembro de 1982, Oosthoek's Uitgeversmaatschappij, 286/81, Recueil, p. 4575, n.° 9), esta disposição não pode, todavia, ser ignorada pela simples razão de, no caso específico submetido ao órgão jurisdicional nacional, todos os elementos estarem localizados no interior de um único Estado-Membro.
Com efeito, numa situação desse tipo, a aplicação da medida nacional pode igualmente ter consequências a nível da livre circulação das mercadorias entre Estados-Membros, designadamente quando a medida em causa favorece a comercialização das mercadorias de origem nacional em detrimento das mercadorias importadas. Nestas circunstâncias, a aplicação da medida, embora limitada apenas aos produtores nacionais, cria e mantém, por si só, uma diferença de tratamento entre essas duas categorias de mercadorias, que entrava, pelo menos potencialmente, o comércio intracomunitário (negritos nossos)”.
Enfim, o tribunal não se coibiu de actuar sob as vestes de órgão consultivo16, despojado de funções jurisdicionais, dando pareceresnão vinculativos ao órgão de reenvio quando a lei nacional reflecte soluções plasmadas no direito da UE17, e, bem assim, quando, por força da legislação interna, o tribunal de reenvio esteja obrigado a evitar soluções que comportem discriminação inversa18.
A questão da distinção entre elemento conector enquanto pressuposto de aplicação do direito da UE e enquanto pressuposto de competência do TJUE é, muitas vezes, obnubilada pelo TJUE, sendo, porém, mais clara nos casos que se vem de referir, já que, nestes, o TJUE considera-se competente, determinando, do mesmo passo e de forma inequívoca, a inaplicabilidade do direito da UE. Há, porém, uma ligação estreita entre aplicabilidade do direito da UE e jurisdição do TJUE. Conforme salienta S. Iglesias Sánchez19, “se aos factos não se aplica o direito da UE, a relevância da questão [para o processo principal] é plausivelmente duvidosa. Apenas nas circunstâncias excepcionais identificadas pelo TJUE devem as questões objecto de reenvio ser consideradas relevantes”. A aplicabilidade do direito da UE aos factos em crise é, por regra, pressuposto da competência jurisdicional do TJUE.
O realismo jurídico tem, acima de qualquer outro referente, norteado o TJUE nestas matérias de aplicabilidade ratione materiaee competência. O pré-citado Ullens de Schooten parece encerrar um exercício de consolidação desta jurisprudência e, simultaneamente, um sinal de que o TJUE adopta agora uma perspectiva mais estrita no que toca à aplicabilidade do direito da UE e à competência jurisdicional do TJUE neste tipo de casos. Tanto nas situações em que há uma transnacionalidade meramente hipotética, como naquelas em que o TJUE adopta um papel de órgão consultivo, só se aplicará o direito da UE (nos primeiros) e o TJUE só se considerará competente (em ambos) se o:
No artigo 94 do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, em que medida, apesar do seu carácter puramente interno, o litígio nele pendente revela um elemento de conexão com as disposições do direito da União relativas às liberdades fundamentais que torna a interpretação prejudicial solicitada necessária para a solução desse litígio”20.
Este ónus que o TJUE impõe ao tribunal de reenvio consubstancia um passo atrás na desvalorização da locução situação puramente interna, e, por conseguinte, um aumento da amplitude da competência legislativa dos Estados-Membros. Sustenta-se, pois, que o paroxismo da expansão ratione materiae da aplicabilidade do direito da UE é uma situação pretérita e que, presentemente, o TJUE está em fase de refreamento do referido activismo judicial, talvez sob pressão de uma deriva soberanista que grassa em parte considerável do território da UE.
A jurisprudência do TJUE não é sempre produto de um activismo judicial pró integração europeia. Não raras vezes, o TJUE foi um activista involuntário ou, no máximo, terá agido com dolo eventual. Decisões emblemáticas, arrojadas, como as que consagraram o efeito directo e o primado do direito da UE21, foram concebidas para um estreito campo de atribuições da UE, sendo discutível, no mínimo, que o TJUE configurasse como possível e se confirmasse com o resultado de que (i) a competência legislativa da UE chegasse à omnipresença de que comunga actualmente e (ii) que aqueles princípios se aplicariam directamente a todo este admirável mundo novo normativo, o que, escusado seria referir, lhes confere uma híper relevância. Pelo contrário, constitui exemplo de uma certa reserva ou conservadorismo o facto de o TJUE considerar a transnacionalidade como requisito de aplicabilidade do direito da UE noutros campos que não o das liberdades do mercado interno22, onde, porventura, a poderia dispensar.
A questão da relevância da transnacionalidade como requisito de aplicabilidade do direito da UE constituiu e constituí foco de debate, quer de jure conditoquer de jure condendo. Parece acertado o entendimento de S. Iglesias Sánchez23: actualmente, o corpo normativo da UE vai muito além das liberdades do mercado interno, sendo que, em grande parte desses domínios, tais como, e entre muitos outros, cidadania europeia, asilo e emigração, dados pessoais, direitos sociais, protecção do consumidor, energia, ambiente, dever-se-ia assumir-se a aplicabilidade tout court do direito da UE e respectiva jurisdição do TJUE, i.e., sem necessidade de contorções fácticas tendentes à criação de uma transnacionalidade fictícia. Noutras áreas, designadamente cooperação judiciária e direito internacional privado de uma forma geral, fará, evidentemente, sentido continuar a indagar-se pela transnacionalidade. São, de facto, áreas, sejam ou não de fonte europeia, a cuja essência é conatural a ideia de transnacionalidade.
Propõe-se, no próximo ponto, e à luz do enquadramento que antecede, analisar criticamente a visão dos tribunais de dois – um deles ainda– Estados-Membros, Reino Unido24 e Portugal, da transnacionalidade relevante para efeitos de escolha de jurisdição – no caso dos tribunais portugueses – e para efeitos de limites à escolha de lei estrangeira – no caso dos tribunais ingleses. Estas visões foram expressas em acórdãos recentes e, por motivos diferentes, que adiante se verão, não foram sujeitas ao escrutínio do TJUE.
3. O elemento de conexão no Regulamento de Bruxelas
3.1 A jurisprudência do TJUE
O TJUE é unívoco quanto à exigência de um elemento de estraneidade, de um conector transnacional, para que se caia no âmbito de aplicação do Regulamento de Bruxelas. Os trechos jurisprudências que se transcrevem são concludentes:
“[é] verdade que a própria aplicação das regras de competência da Convenção de Bruxelas, como resulta do relatório sobre a referida convenção, apresentado por P. Jenard (JO 1979, C 59, pp. 1, 8), exige a existência de um elemento de estraneidade”25.
“[…] a aplicação das regras da competência do referido regulamento [de Bruxelas] exige a existência de um elemento de estraneidade”26.
“Assim, há que examinar se, nas circunstâncias do processo principal, o Regulamento n.° 44/200 é aplicável a um co-contratante como a TUI e se existe um elemento de estraneidade susceptível de justificar essa aplicação”27.
O TJUE acolheu, pois, a interpretação segundo a qual o âmbito de aplicação pessoal ou espacial do direito europeu uniforme em matéria de competência internacional implica a preexistência de uma situação que seja, ela própria, transnacional, mantendo contacto, através de elementos subjectivos ou objectivos, com mais de uma ordem jurídica. Nesse sentido, apontavam, desde logo, no que se refere à Convenção de Bruxelas, o texto do parágrafo 4 do respectivo preâmbulo28, o relatório explicativo de P. Jenardsobre a versão original da Convenção de Bruxelas29 e o relatório preparado por P. Schlosserreferente à Convenção de Adesão de 197830. Esta posição foi igualmente defendida por uma parte substancial da doutrina31
Nas decisões pré-citadas, existia, claramente, um elemento de estraneidade. Em Maletic, estava em causa a seguinte factualidade: um casal austríaco comprou uma viagem através de um site alemão (Lastminute), que actuava como agente intermediário, sendo o operador final a TUI, uma empresa austríaca. A acção foi intentada contra as duas empresas, uma sedeada na Alemanha e outra na Áustria, por gastos incorridos nessa viagem em virtude de um erro na marcação de um hotel. A compra foi feita directamente ao site alemão, sendo que, nesse mesmo site, a Lastminute declarava que actuava apenas como agente e que o operador final seria a empresa austríaca TUI. O TJUE considerou que, neste caso, também em relação à empresa austríaca teria aplicação o artigo 16.º, n.º 1, do Regulamento de Bruxelas, que permite ao consumidor demandar judicialmente a outra parte no contrato quer perante os tribunais do Estado-Membro em cujo território estiver domiciliada essa parte, quer perante o tribunal do lugar do domicílio do consumidor:
“[o] conceito de “outra parte no contrato” previsto no artigo 16.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no sentido de que designa, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, também o co-contratante do operador com o qual o consumidor celebrou esse contrato e que tem a sua sede no território do Estado-Membro em que esse consumidor tem domicílio”32.
A situação em causa era claramente transnacional: um dos co-demandados tinha sede num Estado-Membro diferente dos demais elementos da situação jurídico, sendo que o domicílio é um conector transnacional primário.
No acórdão Owusu, um cidadão britânico, residente no Reino Unido, foi vítima de um grave acidente quando se encontrava de férias na Jamaica. O sinistrado intentou uma acção de responsabilidade contratual contra um cidadão britânico, também residente no Reino Unido, que lhe arrendou o imóvel para a estada de férias na Jamaica e, bem assim, uma acção por responsabilidade extracontratual contra diversas sociedades de direito jamaicano. O TJUE considerou que:
“[a] implicação de um Estado contratante e de um Estado terceiro, em virtude, por exemplo, do domicílio do demandante e de um demandado no primeiro Estado e da localização dos factos controvertidos no segundo, também é susceptível de conferir natureza internacional à relação jurídica em causa”33.
A situação jurídica tinha evidente conexão com mais do que uma ordem jurídica, a de um Estado-Membro, v.g., Reino Unido, por um lado, e a de um país terceiro, a Jamaica, onde ocorreu a integralidade da factualidade relevante. O local da execução de um contrato ou o local onde ocorrem os factos relevantes susceptíveis de configurar uma obrigação extracontratual de indemnizar são, igualmente, elementos de conexão clássicos. A relevância desta decisão passa pela consideração de que a transnacionalidade pode advir da conexão da situação jurídica com um país terceiro, i.e., não tem de ser uma transnacionalidade contida dentro dos limites da UE.
Os factos subjacentes ao acórdão Lindner eram, sumariamente, os seguintes: uma sociedade de direito checo pretendia obter a condenação de um nacional alemão, no pagamento de um montante referente ao reembolso de um mútuo e respectivos juros de mora. O tribunal de reenvio desconhecia se o cidadão alemão tinha ou não domicílio em território checo. O TJUE considerou que existe um elemento de estraneidade para efeitos de aplicação do Regulamento de Bruxelas se:
“um órgão jurisdicional de um Estado-Membro é chamado a conhecer de uma acção intentada contra um nacional de um outro Estado-Membro cujo domicílio é desconhecido por esse órgão jurisdicional”34.
Também aqui, apesar de a nacionalidade não ser um elemento relevante para efeitos da determinação de competência jurisdicional no âmbito do Regulamento de Bruxelas35, a situação era inequivocamente transnacional. Existia um elemento de estraneidade clássico visto que uma das partes era nacional de um país diferente daquele onde se localizavam todos os demais elementos da situação jurídica36.
3.2 A jurisprudência do STJ
3.2.1. Três acórdãos e um reenvio prejudicial
Foi no quadro desta jurisprudência, que o STJ37 lançou mão do mecanismo de reenvio prejudicial, perguntando, no essencial, ao TJUE o seguinte38:
- A mera existência de um pacto atributivo de jurisdição em favor dos tribunais de um Estado-Membro, diferente do da nacionalidade e domicílio das partes, determina, por si só, e., na ausência de qualquer outro elemento de estraneidade, a aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas?
- Sendo a resposta à questão anterior negativa, uma situação jurídica com as características seguintes contém um elemento de estraneidade bastante que determine a aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas?
i. Os dois contratos de swap em discussão foram celebrados por duas sociedades comerciais (uma delas, um banco) de nacionalidade portuguesa e com domicílio em Portugal, são compostos por um ISDA Master Agreement, e duas confirmations.
ii. A parte não bancária foi assessorada por um banco português e por uma sociedade de advogados portuguesa.
iii. A celebração dos contratos de swap foi precedida de convites a bancos sedeados no estrangeiro para apresentação de propostas.
iv. O banco português contratante é totalmente detido por um banco sedeado em Espanha.
v. O banco português contratante tem filiais em vários Estados-Membros e actuou sob uma marca internacional.
vi. O banco português contratante é considerado no ISDA Master Agreement uma Multibranch Party, podendo fazer e receber pagamentos em qualquer transacção através das suas filiais em Londres ou no Luxemburgo.
vii. Nos termos do ISDA Master Agreement celebrado, as partes podem, em determinados casos, transferir os seus direitos e obrigações a favor de outros escritórios de representação ou filiais.
viii. As partes nos contratos de swapdesignaram como aplicável a lei inglesa e celebraram pactos de jurisdição atribuindo competência exclusiva e integral aos tribunais ingleses.
ix. Os contratos foram redigidos em inglês e a terminologia e os conceitos utilizados são anglo-saxónicos.
x. Os contratos de swap foram celebrados com o objectivo de cobrir o risco de variação de taxa de juro de dois contratos de financiamento, celebrados com entidades estrangeiras.
xi. O banco contratante agiu como intermediário no mercado financeiro, tendo celebrado contratos simétricos de cobertura no contexto do mercado internacional.
A resposta do TJUE esclareceria se a designação da jurisdição de um Estado-Membro diferente daquele onde se encontram os elementos da situação jurídica seria, ipso facto,um elemento de estraneidade e, em caso de resposta negativa, se elementos remotamente ligados à situação jurídica seriam, individualmente ou combinados entre si, suficientes para conferir transnacionalidade a uma situação jurídica para efeitos de aplicação do Regulamento de Bruxelas. Na pendência do procedimento de reenvio prejudicial, as partes chegaram a acordo no litígio principal pelo que, ao abrigo do artigo 100.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, foi determinado o cancelamento do processo de reenvio por despacho de 10 de Março de 201739.
A Comissão apresentou as suas observações escritas em 10 de Junho de 201640, sustentando uma resposta afirmativa à primeira pergunta formulada pelo tribunal de reenvio, i.e., considerando a escolha da jurisdição de um Estado-Membro diferente daquele em que se localizam os elementos relevantes da situação jurídica como elemento de estraneidade suficiente para desencadear a aplicação do Regulamento de Bruxelas41. A Comissão não se pronunciou sobre a relevância individual ou combinada dos demais elementos identificados como potencialmente relevantes pelo tribunal de reenvio.
Em Portugal, estiveram pendentes quatro outras acções judiciais cujos factos eram absolutamente idênticos aos da que originou referido pedido de reenvio prejudicial42. Em primeira instância, as cinco sentenças foram prolatadas no mesmo sentido, considerando-se em todas elas que a situação em causa continha elementos de estraneidade bastantes para que fosse aplicável o Regulamento de Bruxelas. O TRL confirmou duas das decisões de primeira instância43, que foram, por seu turno, objecto de recurso de revista para o STJ. Duas decisões de primeira instância foram objecto de recurso per saltum para o STJ. Entre os quatros processos que chegaram ao STJ, contam-se três decisões que sufragaram o entendimento das instâncias44 e a aludida decisão de reenvio prejudicial. Finalmente, o outro processo, que se encontrava pendente no TRL no momento da decisão de reenvio, foi suspenso em virtude da pendência do reenvio prejudicial45. Sintetiza-se, de seguida, a forma como o STJ se posicionou relativamente às duas questões em cada um destes três acórdãos.
No acórdão de 26 de Janeiro de 201646, o STJ considerou que a mera existência de um pacto atributivo de jurisdição em favor dos tribunais de um Estado-Membro, diferente do da nacionalidade e domicílio das partes, não determina, por si só, i.e., na ausência de qualquer outro elemento de estraneidade, a aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas:
“Face à forma como se encontra redigida a disposição em análise, numa primeira aproximação à questão, poderíamos ser levados a afastar, perante o Regulamento, a necessidade do elemento de estraneidade de que fala a recorrente. Porém, pese embora não haja uma alusão expressa a tal no dito art. 23º, afigura-se-nos que da ratiodo diploma se deve retirar a necessidade de, para sua aplicação, ocorrer ou surgir uma situação jurídica internacional”.
À questão subsequente, ou seja, a de determinar se os elementos da situação jurídica, individualmente considerados ou combinados entre si, conferir-lhe-iam transnacionalidade bastante, o STJ dedicou um parco número de linhas:
“[O]s contratos swap (…) apresentam[-se] como contratos internacionais, em conexão com mais de uma ordem jurídica (têm subjacentes contratos de financiamento celebrados com bancos holandês e italiano, redigidos em língua inglesa, encontrando-se um deles sujeito à lei inglesa e aos tribunais ingleses), sujeitos a um quadro negocial padronizado, com actuação do R., no respectivo âmbito, como uma Multibranch Party, um verdadeiro banco internacional, podendo fazer e receber pagamentos através das suas filiais em Londres e no Luxemburgo. Isto mesmo se afirma na sentença recorrida.”
Abordar-se-á mais à frente a importância de cada um destes elementos. De todo o modo, ressalta-se que o STJ se bastou com elementos pouco sólidos, alguns dos quais alheios ao negócio jurídico em causa, para determinar a internacionalidade da situação jurídica. Paralelamente, neste acórdão o STJ deu prova de fraco conhecimento da jurisprudência do TJUE nesta matéria. Em primeiro lugar, ao afirmar que:
“A jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) considera a necessidade da internacionalização da situação jurídica controvertida para aplicação do dito art. 23º.”
Tal é falso: o TJUE nunca se pronunciou sobre esta questão, ou seja, nunca afirmou que o pacto de jurisdição não preenche por si só o requisito de internacionalidade.
Em segundo lugar, ao afirmar que:
“Não poderemos deixar de confirmar a ocorrência de uma relação jurídica com carácter internacional, na senda do decidido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, nos acórdãos Owusu, Lindner e Maletic.”
A assimilação da factualidade em crise à subjacente nesses acórdãos é manifestamente desadequada, porquanto nesses três casos existiam elementos de transnacionalidade clássicos47.
No acórdão de 04 de Fevereiro de 201648, o STJ não se pronunciou sobre a questão da suficiência do pacto de jurisdição enquanto elemento de estraneidade, tendo considerado que o facto de haver outros elementos que conferiam à situação em crise carácter internacional dispensava a análise da primeira questão49. Valorou o STJ particularmente seguinte factualidade: (i) a mera possibilidade de fazer e receber pagamentos em qualquer transacção através das filiais do banco em Londres ou no Luxemburgo; (ii) a escolha de lei inglesa; e (iii) a conexão funcional económica e prática dos contratos de swapcom os financiamentos subjacentes, sendo estes internacionais.
O acórdão tem, nesta matéria, e numa primeira análise, maior solidez técnica que o precedentemente analisado. Porém, concomitantemente, o STJ recusou lançar mão do mecanismo de reenvio prejudicial, em flagrante contradição com o entendimento do TJUE expendido em Cilfit50. Por um lado, o STJ considerou que só a questão da suficiência ou não do pacto de jurisdição para determinar a aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas é que poderia ser objecto de reenvio prejudicial. Ora, evidentemente, também a questão do que seja uma situação transnacional pode constituir objecto de um procedimento de reenvio51. Por outro lado, considerou que, em todo o caso, a situação sempre configuraria um acte clairestando, portanto, o STJ dispensado da obrigação de reenvio. Ora, um acto clarotem de cumprir os apertados requisitos constantes dos § 16-17 do acórdão Cilfit, ou seja, a correcta aplicação do direito da UE tem de revelar-se com tal evidência que não subsista qualquer dúvida razoável sobre a solução da questão suscitada. Antes de declarar essa evidência, o órgão jurisdicional tem de estar certo que a mesma se imporia também aos órgãos jurisdicionais nacionais dos outros Estados-Membros52, assim como ao TJUE.
Como se viu, mesmos nos casos em que foi mais maximalista na definição de situação internacional, nunca o TJUE considerou como internacional uma situação tão internacomo esta. Tal constatação seria bastante para afastar a aplicação da teoria do acte clair.
No acórdão de 21 de Abril de 2016, o STJ converteu, de certa forma, as duas questões numa só. Considerou que há uma “estraneidade idealmente contida no art.º 23 ”, bastando, porém, para que tal estraneidade se aplique que “os interesses no contrato protegido se não contenham completamente cingidos ao espaço territorial do Estado-Membro em que as partes movimentem as suas conveniências patrimoniais”53. No caso concreto:
“Os contratos de swap (contratos derivados) celebrados pelas partes, uma exigência da moderna atividade bancária e empresarial sustentada na ideia de que cada vez mais as previsões económicas se tornam inalcançáveis, são eles próprios intrinsecamente caracterizados como ajustes de natureza internacional, conotados com a ligação a outro Estado-Membro - são contratos de cariz internacional, redigidos em inglês, sujeitos à lei inglesa, com terminologia anglo-saxónica - e de molde a caracterizarem a “estraneidade” estabelecida pelo art.º 23.º da Convenção de Bruxelas. Reparemos que estes contratos de swap se destinam a financiar a mutuária/autora de modo que fiquem acautelados os riscos de flutuação das taxas de juro nos empréstimos concedidos pelo Banco/réu, o Banco atuou na qualidade de banco internacional, estão redigidos em língua inglesa, é a lei inglesa a aplicar ao litígio e está admitida a possibilidade do seu cumprimento em Londres ou nas Ilhas Caimão, circunstancialismo jurídico-factual este que faz determinar que estamos perante uma relação contratual onde não falta a “internacionalidade” capaz de facultar o juízo de que estão verificados os requisitos do pacto de jurisdição que ora analisamos”.
À semelhança do sucedido no acórdão de 26 de Janeiro de 2016, o STJ voltou a assimilar erroneamente os factos em causa aos dos acórdãos Owusu, Maletice Lindner. O STJ confundiu neste arresto duas questões diferentes, a da desnecessidade de conexão entre a jurisdição escolhida e a situação jurídica relevante com a da (des)necessidade de existência de um elemento de estraneidade:
“É por este sentido que se vem norteando o Tribunal de Justiça da União Europeia - Acórdãos Owusu (processo C- 281/02), de 01-03-2005; Lindner (processo C- 327/10), de 17-11-2011 e Maletic (processo C- 478/12), de 14-11-2013. “…Para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado (…)”
Finalmente, andou novamente mal o STJ ao abster-se de lançar mão do mecanismo de reenvio prejudicial54.
3.2.2. Pacto de jurisdição, elemento bastante de transnacionalidade?
Há bons argumentos para responder positivamente à primeira pergunta, ou seja, sustentar-se que a mera existência de um pacto atributivo de jurisdição em favor dos tribunais de um Estado-Membro, diferente de todos os outros elementos da situação jurídica, é elemento bastante para que seja aplicável o Regulamento de Bruxelas.
De entre estes, o que mais impressiona é o argumento de natureza finalística. O Regulamento de Bruxelas visou uniformizar a competência jurisdicional em matéria civil e comercial, contribuindo para a segurança e previsibilidade jurídica no mercado interno, na medida em que essa uniformização obsta a conflitos positivos e negativos de competência jurisdicional. A inaplicabilidade do Regulamento de Bruxelas a situações puramente internas determinaria a resolução da questão através de normas de fonte nacional. Em alguns ordenamentos nacionais, a lei exige que a situação jurídica contenha um elemento de estraneidade para que possa ser validamente convencionado um pacto atributivo ou privativo de jurisdição55, sendo que tal não sucede em outros ordenamentos. Ora, a aplicação dessas diferentes normas levaria a possíveis conflitos de jurisdição, derrotando o propósito do Regulamento de Bruxelas. Assim, a questão de competência internacional decorrente da escolha da jurisdição de outro Estado-Membro, consubstanciaria, em si mesma, o elemento transnacional pressuposto de aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas de harmonia com o estatuído nos arrestos do TJUE, designadamente nos pré-citados Owusu, Maletic e Lindner56. Este foi, aliás, o argumento principal da Comissão nas suas observações escritas proferidas no processo C-136/16:
“Apesar da ausência no Regulamento (e no artigo 81.° TFUE), de quaisquer indicações relativamente à exigência da existência, numa determinada relação jurídica objecto de litígio, de um elemento de estraneidade necessário para que o Regulamento se aplique, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à Convenção de Bruxelas, aplicável ao Regulamento Bruxelas I, a aplicação das regras da competência deste Regulamento exige a existência de um elemento de estraneidade. É, no entanto suficiente, para tal efeito, que o tribunal de um Estado-Membro onde a acção foi instaurada suscite questões relativas à determinação da sua competência internacional57.”
Encontram-se, porém, bons argumentos em sentido contrário58. Desde logo, um argumento lógico-formal. A validade do pacto de jurisdição só será aferida à luz do Regulamento de Bruxelas se este for aplicável. A internacionalidade, sendo pressuposto de aplicação do Regulamento de Bruxelas tem de anteceder logicamente a apreciação do pacto de jurisdição, i.e., tem de ser um elemento prévio, e logo externo, ao próprio pacto. Caso contrário, estar-se-ia perante uma autojustificação circular de aplicabilidade.
O elemento sistemático também pode ser pertinentemente convocado. Outros instrumentos procedentes das atribuições normativas dos órgãos da UE ou a que a UE deu o seu acordo contêm lugares paralelos que apontam no mesmo sentido. É, designadamente, o caso da Convenção de Roma e do Regulamento que lhe sucedeu (Regulamento (CE) n.º 593/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho de 2008 – “Regulamento de Roma”), no domínio da electio iuris, que possuem indícios de não aplicação ou de aplicação limitada a situações puramente internas59. O Regulamento de Roma determina, no seu considerando 15, que uma situação não deixa de ser puramente interna, i.e., não tem carácter transnacional, apenas pelo facto de se ter designado uma jurisdição de um outro país como competente:
“Caso seja escolhida uma lei e todos os outros elementos relevantes da situação se situem num país que não seja o país da lei escolhida, a escolha da lei não prejudica a aplicação das disposições da lei desse país não derrogáveis por acordo. Esta regra será de aplicação independentemente de a escolha da lei aplicável ser ou não acompanhada da escolha de um tribunal ou de outro órgão jurisdicional”.
Este argumento é reversível. Efectivamente, poder-se-á dizer que esta disposição implica justamente que se possa escolher uma jurisdição de um outro Estado-Membro numa situação puramente interna. Porém, de tal não se segue necessariamente que essa escolha tenha sido feita ao abrigo do Regulamento de Bruxelas. Pode, de facto, ter sido feita ao abrigo de uma norma de fonte nacional que admita a validade de pactos privativos ou atributivos de jurisdição em situações integralmente internas. Curiosamente, a Comissão, no processo C-136/16, retirou o seguinte argumento desta disposição:
Convém mencionar, por último, o Regulamento 593/2008 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I). Segundo o considerando 11 deste Regulamento, a liberdade das partes de escolherem o direito aplicável deverá constituir uma das pedras angulares do sistema de normas de conflitos de leis em matéria de obrigações contratuais. O artigo 3.°, n.° 3, prevê expressamente que a escolha das partes, numa situação idêntica à do processo principal, […] em que todos os outros elementos relevantes da situação se situem, no momento da escolha, num país que não seja o país da lei escolhida, a escolha das partes não prejudica a aplicação das disposições da lei desse outro país não derrogáveis por acordo. Verifica-se, portanto, que a escolha das partes constitui o elemento de estraneidade necessário para que este Regulamento se aplique. Tendo em conta a importância da autonomia das partes nos dois Regulamentos, a Comissão considera que o mesmo princípio se deve aplicar ao Regulamento 44/2001.
O argumento formulado pela Comissão é frágil, pois faz tábua rasa do verdadeiro significado da aplicação do artigo 3.º, n.º 3, do Regulamento, que é, em tais situações, equiparar a escolha de uma lei estrangeira à determinação pelas partes de cláusulas contratuais. Dito de outra forma, de acordo com o princípio da autonomia contratual, as partes podem regular as suas relações contratuais dentro dos limites da lei (imperativa). Ora o que o artigo 3.º, n.º 3, permite é que as partes façam essa regulação através de remissão para uma lei estrangeira, que convertam a lei estrangeira em disposições contratuais, sujeitas à legalidade limite aplicável a todo o conteúdo contratual.
Por seu turno, o artigo 1.º da Convenção da Haia sobre os acordos de eleição do foro, de 30 de Junho de 2005, determina, explicitamente, que as normas convencionais se aplicam “em processos de natureza internacional”, esclarecendo, em seguida, que “um processo tem natureza internacional excepto se as partes residirem no mesmo Estado Contratante e a sua relação e todos os elementos pertinentes da causa, independentemente da localização do tribunal eleito, estiverem associados unicamente a esse Estado”. Esta Convenção foi aprovada pela Decisão 2014/887/UE do Conselho, de 4 de Dezembro de 2014. Não podem, por isso, deixar de relevar os problemas que a respectiva aplicação suscitará, caso não exista coerência, quanto ao aspecto examinado, entre o que nela se dispõe e os requisitos de aplicação dos textos da UE referentes aos pactos de jurisdição60.
Enfim, e sem preocupação de exaustividade, há uma linha de argumentação que deflui da geometria constitucional da UE. Seguindo essa linha, dir-se-ia que o Regulamento de Bruxelas tem necessariamente de ser interpretado à luz dos princípios da atribuição, subsidiariedade e da proporcionalidade, actualmente ínsitos no artigo 5.º do TUE. Consoante se prevê no preâmbulo do Regulamento de Bruxelas61, este instrumento encontra base legislativa no artigo 81.º do TFUE, que corresponde ao artigo 65.º do TCE, do qual resulta que, nas atribuições da UE, só se compreende a cooperação judiciária “em matérias civis com incidência transfronteiriça”62. Por sua vez, os n.os2.º e 3.º da mesma disposição repartem a competência entre o Parlamento Europeu e o Conselho no que respeita à adopção das medidas destinadas a assegurar o objectivo geral definido no n.º 1, reafirmando o n.º 3 que essas competências pressupõem “o carácter transfronteiriço das situações a regular”. Consequentemente, poder-se-ia concluir pela inexistência de fundamento normativo para as instituições da UE interferirem com a delimitação da competência dos órgãos jurisdicionais de cada Estado-Membro, em situações e litígios que se contenham dentro dos limites do seu território (situações e litígios puramente internos, portanto)63.
Certo é que a consideração do pacto de jurisdição como elemento de estraneidade implica do mesmo passo que os Estados-Membros abdiquem da aplicação das regras de fonte interna que exigem que se exerça um controlo sobre a possibilidade de desaforamento de acções que cabem na sua jurisdição natural (como acontece, por exemplo, com o artigo 94.º do Código de Processo Civil, ou com o artigo. 19.º, alínea g) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Novembro, na versão actualmente em vigor), em situações que não apresentem laços relevantes com outras ordens jurídicas, possibilitando a internacionalização artificial de situações jurídicas.
3.2.3. Transnacionalidade indirecta, ténue ou potencial
Examina-se, agora, sem preocupação de exaustividade, a segunda questão, relativamente a cada um dos elementos que a compõem.
Já se viu que na situação jurídica em análise não há nenhum elemento semelhante aos subjacentes aos acórdãos Maletic, Owusu e Lindner. O local de celebração, bem como o local de execução dos contratos, estão espacialmente contidos na jurisdição portuguesa. Efectivamente, os contratos foram assinados em Portugal e as contas bancárias através das quais as partes procediam aos pagamentos devidos ao abrigo dos mesmos estavam sedeadas em bancos portugueses64. Consequentemente, a situação não era comparável à do acórdão Owusu. Aí, o local de execução contratual, sito num país terceiro, foi considerado como o conector internacional relevante65.
Não havia uma pluralidade sujeitos processuais activos ou passivos domiciliados em diferentes jurisdições. De facto, a relação processual tinha como sujeitos um autor e um réu, ambos domiciliados na mesma jurisdição, a portuguesa66. Assim, os factos determinantes que conduziram o TJUE à conclusão de que em Maletica situação tinha carácter transnacional não encontram paralelo nesta situação jurídica67.
A utilização do modelo ISDA não pode em si mesma ser considerada como um elemento de conexão68. A utilização de um modelo contratual não liga uma determinada situação jurídica a nenhuma jurisdição específica, nem lhe confere internacionalidade relevante para efeitos de aplicação do Regulamento de Bruxelas. Seguindo esse critério, na presença de uma letra de câmbio, de um cheque, de uma garantia bancária ou de um contrato celebrado segundo um modelo incoterms, estar-se-ia, sem mais, perante uma situação jurídica internacional69. Os modelos contratuais, independentemente da sua fonte e natureza – e sublinhe-se que o ISDA Master Agreement não é um modelo contratual vinculativo – têm por propósito conferir segurança jurídica às relações jurídicas que constituem o seu objecto, mas de forma alguma lhe conferem carácter
O elemento de estraneidade relevante tem de dizer respeito à situação jurídica, rectius ao contrato, no âmbito do qual foi celebrado o pacto de jurisdição, e não por referência a contratos virtuais entre partes diferentes, ou a elementos relativos a relações pré-ontratuais paralelas e malogradas. Assim, parece carecer de relevância para este efeito o facto de a celebração dos contratos de swapter sido precedida de convites a bancos sedeados no estrangeiro para apresentação de propostas.
A relação societária de grupo não pode conferir carácter internacional ao litígio. Tal corresponderia à desconsideração da autonomia jurídica da entidade contratante, tomando-se como elemento relevante o seu accionista, o que não é compatível com o quadro dogmático-legal das pessoas colectivas, em particular das sociedades comerciais, vigente nos Estados-Membros da UE70. A este elemento, presente no caso Maletic71, não foi, como seria expectável, dada qualquer relevância pelo TJUE ou pelo órgão de reenvio.
O STJ considerou que o facto de o banco ter filiais em vários Estados-Membros, aliado ao facto de actuar sob uma marca única, lhe conferiria a qualidade de banco internacional. A expressão banco internacionalnão têm valor intrínseco, nada acrescenta a estes dois factos, sendo meramente conclusiva. Quanto ao facto de o banco fazer parte de um grupo societário, integrado por sociedades domiciliadas em diversos países, incluindo vários Estados-Membros da UE, remete-se para tanto quanto se disse no parágrafo anterior.
Ao elemento marca internacional, presente, igualmente, no caso Maletic, não foi dada qualquer relevância pelo TJUE ou pelo órgão de reenvio. A TUI é uma marca internacional, sendo, desde logo, uma marca europeia72. Uma vez mais, é simples demonstrar que o argumento prova demais. Caso a existência de uma marca internacional fosse elemento de estraneidade suficiente, virtualmente todas as transacções comerciais seriam enquadráveis na categoria dos actos de comércio internacionais, ficando o requisito de internacionalidade desprovido de qualquer tipo de efectividade.
O STJ colocou ainda a questão de saber se a mera possibilidade de uma cessão de créditos, de obrigações, ou de posição contratual é elemento suficiente para conferir carácter internacional a uma situação jurídica contratual. De acordo com a lei portuguesa, por exemplo, a cessão de créditos é admissível, salvo estipulação contratual em contrário73. Igualmente, as obrigações podem ser satisfeitas por um terceiro, ficando nesse caso o terceiro sub-rogado nos direitos do credor74. A transmissão singular de dívidas pode ocorrer sem o consentimento do devedor originário75. A cessão da posição contratual pode ocorrer mesmo que tal possibilidade não esteja prevista no momento da celebração do contrato: basta que o outro contraente preste o seu consentimento para o efeito em momento contemporâneo ou mesmo posterior ao da cessão contratual76. Os diversos ordenamentos jurídicos dos Estados-Membros contêm respostas semelhantes para estas questões, sendo alguns mais restritivos e outros menos relativamente à necessidade e forma da prestação de consentimento.A transmissão de dívidas, créditos ou de contratos pode ser feita em benefício de uma pessoa (colectiva ou singular) nacional ou estrangeira. Consequentemente, se este elemento fosse em si mesmo bastante para conferir carácter internacional à situação jurídica, todos os contratos regidos pela lei portuguesa77 teriam um elemento de internacionalidade potencial o que equivaleria a negar a internacionalidade como requisito de aplicação do Regulamento de Bruxelas.Acresce que a possibilidade de cessão contratual não é um elemento que confira internacionalidade ao contrato no momento da sua celebração. Confere, na melhor das hipóteses, uma internacionalidade contingente e futura. Imperativos de segurança jurídica impõem que o carácter internacional ou não da situação seja determinado no momento da celebração do contrato e não no momento da propositura da acção judicial78.
No caso vertente, não tinha ocorrido qualquer cessão de posição contratual, de créditos ou de dívidas, e os pagamentos foram todos feitos entre as partes contratuais originárias. Admitir que a mera previsão contratual de cessão seria bastante, permitiria às partes contornar, através de um expediente formal, desprovido de substância, o requisito de internacionalidade.
A escolha de lei e a redacção da documentação contratual em língua estrangeiram, no caso a inglesa, devem ser analisadas conjuntamente. A redacção de um contrato numa língua estrangeira ou a mera escolha de uma lei estrangeira – que, numa situação puramente interna, só será efectiva na medida em que não contrarie as disposições imperativas da lei interna, nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do Regulamento Roma I – não podem ser consideradas critério bastante de transnacionalidade.De facto, nesse caso, a competência para dirimir qualquer relação jurídica puramente interna poderia, sem mais, ser subtraída a essa mesma jurisdição. Ora, a teleologia subjacente à exigência de um elemento de estraneidade como pressuposto de aplicação do Regulamento de Bruxelas prende-se com a necessidade de garantir que cada Estado-Membro mantenha jurisdição efectiva sobre disputas puramente internas, evitando quea jurisdição nacional seja meramente facultativa. A interpretação contrária colidiria, parece, com os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade que enquadram o processo legislativo europeu, conforme exposto acima a propósito da não suficiência do pacto de jurisdição enquanto elemento de estraneidade.
Quanto a relações contratuais conexas, note-se que, mesmo quando visem a cobertura de um risco subjacente, os contratos de swap são autónomos relativamente ao contrato de financiamento que os origina, não estando dependentes deste último negócio (que é res inter alios acta), nem sendo influenciados pelo cumprimento ou incumprimento das obrigações que derivam do mesmo79.
É este recorte autónomo que os contratos de swap têm na legislação da UE80. A abstracção dos swapsimplica uma total independência relativamente a eventuais contratos subjacentes que, aliás, podem ou não existir. Assim, da internacionalidade dos financiamentos subjacentes, não deflui o carácter internacional dos contratos de swap. A situação vertente era flagrantemente dissimilar daquela com que o TJUE foi confrontado em Maletic:
“mesmo supondo que uma operação única, como a que levou o casal Maletic a reservar e a pagar a sua viagem organizada no sítio web da lastminute.com, possa ser cindida em duas relações contratuais distintas com, por um lado, a agência de viagens em linha lastminute.com e, por outro, o operador de viagens TUI, esta última relação contratual não poderia ser qualificada de «puramente interna», pois estaria indissociavelmente ligada à primeira relação contratual, tendo sido realizada por intermédio da referida agência de viagens situada noutro Estado-Membro81”.
A mesma linha argumentativa deve ser seguida na análise da relevância da celebração de contratos simétricos pelo banco com outras entidades no mercado internacional.A parte não financeira era contraparte do banco, e só do banco, nos contratos de swapem crise. A existência de contratos simétricos back-to-backcom outras entidades, fossem elas portuguesas ou estrangeiras, é igualmente res inter alios acta82. Também aqui não ocorre uma interdependência jurídica ou funcional entre os contratos. Acresce que estes contratos serão sempre um facto superveniente e a validade e eficácia do pacto de jurisdição tem, como se disse, de ser aferível no momento em que o mesmo é celebrado. Enfim, a celebração de tais contratos provirá da decisão de um dos contraentes, sem conhecimento ou consentimento do outro. Ora, não pode ficar nas mãos de uma só parte promover a internacionalização das relações que estabeleça com outra, desencadeando potestativamente uma alteração nas regras de competência internacional.
De uma forma geral, estes elementos são de tal forma ténues e indirectos que a consideração da sua suficiência como elemento conector esboroaria a distinção entre esta questão e a anterior. Se factos como a existência de documentação contratual em língua estrangeira, uma das partes estar inserida num grupo societário internacional, a coexistência de negócios jurídicos externos à situação relevante, seja a montante – com um fornecedor, por exemplo – a jusante – com um cliente – ou paralelos – com uma seguradora – forem considerados como elemento conector, então, virtualmente, não existirão situações puramente internas. Equivaleria em termos de pragmática jurídica à consideração, ainda que de forma envergonhada, de que o pacto de jurisdição é elemento de estraneidade suficiente.
4. O artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma, segundo os Tribunais Ingleses
Num determinado contrato, a escolha de jurisdição e a escolha de lei comungam, por via de regra, da mesma nacionalidade. As excepções a esta regra implicam a interpretação e aplicação do direito de uma dada ordem jurídica por um tribunal de uma outra, sendo, consequentemente, susceptíveis de tornar a resolução do litígio mais complexa e onerosa. Mais importante, o juiz aplicará sempre, em maior ou menor grau, o direito que lhe é estrangeiro sob a influência dos institutos jurídicos do seu direito. A relação entre transnacionalidade e competência internacional, por um lado, e entre transnacionalidade e escolha de lei aplicável, por outro, é fortemente analógica, situando-se ambas no terreno pouco firme do conceito de elemento transfronteiriço83.
Na Convenção de Roma84, consagrou-se expressamente a seguinte solução: a escolha de lei estrangeira é válida em situações puramente internas, mas, nesse caso, aplicar-se-ão todas as normas imperativas da ordem jurídica em que se encontram os elementos da situação jurídica. Mantém-se intacta a vocação de aplicação do direito de um determinado Estado-Membro a situações jurídicas que nele se encontrem factualmente contidas.
A resposta directa quanto ao papel da escolha de lei enquanto elemento de conexão na Convenção de Roma contrasta com o silêncio relativo ao pacto de jurisdição no Regulamento de Bruxelas. Consequentemente, no que respeita à escolha de lei, perante uma factualidade semelhante à do processo de reenvio prejudicial que correu termos sob o número C-136/16, poder-se-ia concluir inequivocamente, em derrogação da máxima por cada dois juristas, três opiniões, que a escolha de lei cai no âmbito de aplicação ratione materiae da Convenção de Roma. Tal não dispensa, porém, que se indague que outros factos constituem, considerados individual ou conjuntamente, elementos de estraneidade, pois de tal consideração depende a aplicabilidade efectiva da lei estrangeira escolhida pelas partes.
A jurisdição inglesa foi confrontada com dois casos cuja factualidade era em tudo semelhante à dos processos que correram termos em Portugal, objecto de análise supra. No primeiro desses casos, os elementos da situação jurídica localizavam-se em Itália, tendo sido escolhida pelas partes como competente a jurisdição inglesa e como lei aplicável a inglesa. No segundo, os elementos da situação jurídica localizavam-se em Portugal, tendo sido escolhida pelas partes como competente a jurisdição inglesa e como lei aplicável a inglesa.
4.1. Processo Dexia85
O município italiano de Prato celebrou contratos de swap com a subsidiária italiana do banco Dexia. O município sustentou que, com base no artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma, seriam aplicáveis disposições de direito italiano às transacções em crise conducentes à invalidade das mesmas. Caso o referido artigo da Convenção de Roma fosse inaplicável, as disposições de direito italiano seriam igualmente inaplicáveis em virtude da escolha pelas partes da lei inglesa.
O banco Dexia indicou apenas dois elementos de estraneidade, o uso da documentação ISDA e a celebração de contratos back-to-back, para tentar afastar aplicação do artigo 3.º, n.º 3. A questão foi resolvida com grande simplicidade pelo tribunal de primeira instância:
“To my mind, Prato is right to say that both these points are misconceived. As to the master agreement, it is true that it is an international standard form, but it does not follow from this that it is an "element in the situation" which is connected to a country other than Italy. It is of course designed to promote certainty, but that does not give it a connection to a country other than Italy. Nor does the significance and global nature of ISDA. Even if the standard form itself were shown to have a connection with another country, that would not in the present case be an "element relevant to the situation" as it existed at material times. Throughout the relevant period everything relevant to the use of the form happened in Italy. As to Dexia's decision in each case to choose a non-Italian counterparty for its back to back hedging swap, that does not appear to me to be an element relevant to the situation as between Prato and Dexia. Whether or not Dexia entered into a hedging swap is a matter for Dexia alone: to Prato it is immaterial. There was no contemplation that a non-Italian entity would take over obligations of either party. Dexia's choice to use a non-Italian counterparty is something which is completely external to "the situation" at the time that choice of law was agreed”86.
4.2 Processo BST87
Quatro empresas públicas de transporte portuguesas (“Empresas de Trasnporte”)88 celebraram transacções de swap com o Banco Santander Totta SA (“BST”). As Empresas de Transporte pretendiam, com base no artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma, que o tribunal Inglês aplicasse disposições imperativas de direito português às transacções em crise conducentes à invalidade das mesmas. A abordagem do tribunal a esta questão foi consideravelmente mais exaustiva por comparação à expendida no processo Dexia.
Em primeiro lugar, o tribunal elencou os princípios que devem nortear a aplicação da Convenção de Roma, tendo em conta a sua natureza híbridade tratado internacional e de instrumento legislativo de direito da UE e a sua função de complementaridade relativamente à Convenção de Bruxelas de 1968 relativa à Competência Jurisdicional e à Execução de Decisões em matéria civil e comercial (“Convenção de Bruxelas”) à qual sucedeu o Regulamento de Bruxelas. Tais princípios são (i) prevalência do elemento finalístico (ii) igual autenticidade das versões em todas as línguas e (iii) uniformidade interpretativa89.
Em segundo lugar, o tribunal considerou que o propósito desta disposição legal é impedir que as partes se furtem à aplicação de direito doméstico imperativo em situações puramente internas, esclarecendo, do mesmo passo, que basta que tal suceda objectivamente, não sendo requisito adicional de aplicação desta disposição legal uma eventual intenção fraudulenta de uma ou de ambas as partes90.
Em terceiro lugar, o tribunal observou que esta disposição deveria ser interpretada restritivamente em tributo ao princípio da segurança jurídica91.
Em quarto lugar, o tribunal considerou que putativos elementos de estraneidade não têm de ter conexão com uma jurisdição específica, podendo ser meramente internacionais92.
Aplicando estas considerações ao caso concreto, o tribunal descortinou diversos elementos de estraneidade.
Em primeiro lugar, deu relevância à mera previsão de cessão contratual da posição do BST nos contratos para entidades sedeadas noutros países. O tribunal considerou que este elemento era particularmente importante em relações contratuais duradouras, como as sub judice, cuja duração média era de 14 anos93.
Em segundo lugar, considerou importante a utilização da documentação ISDA, concretamente do modelo “Multicurrency-Cross Border”94.
Em terceiro lugar, deu (alguma) relevância à utilização da língua inglesa, particularmente pelo facto de a língua de trabalho normal das partes ser o português95.
Em quarto lugar, o tribunal qualificou como elemento conector a existência de contratos simétricos back-to-back celebrados entre o BST e a casa mãe espanhola, e, bem assim, a aprovação interna e apoio técnico que a casa mãe espanhola prestou ao BST nas transacções96.
Por fim, o Tribunal considerou relevante o facto de os swapscomercializados pelo BST estarem enquadrados num mercado internacional over the counter, o que decorreria, designadamente, do facto de as Empresas de Transporte terem celebrado outros contraos swapcom bancos estrangeiros97. Os restantes elementos analisados correspondendo, no essencial, aos indicados pelo STJ no reenvio prejudicial C-136/1698, foram considerados irrelevantes pelo tribunal.
4.3 Os Acórdãos do England and Wales Court of Appeal99 100
A decisão do tribunal de primeira instância quanto ao artigo 3.º, n.º3, da Convenção de Roma foi confirmada pelo tribunal de recurso no processo BST. O tribunal de recurso enfatizou necessidade de uma interpretação restritiva desta disposição pelo facto de a mesma constituir uma norma excepcional relativamente ao princípio da autonomia privada, verdadeira trave mestra da Convenção de Roma101. Para sustentar esta posição, o tribunal invocou como lugar paralelo a seguinte passagem do acórdão Unamar do TJUE102:
“Assim, para atribuir eficácia plena ao princípio da autonomia da vontade das partes no contrato, pedra angular da Convenção de Roma, retomada no Regulamento Roma I, há que fazer com que a escolha livremente efectuada pelas partes quanto à lei aplicável no âmbito da sua relação contratual seja respeitada, em conformidade com o artigo 3.° n.° 1, da Convenção de Roma, de modo a que a excepção relativa à existência de uma «disposição imperativa», na acepção da legislação do Estado-Membro em causa, como referida no artigo 7.°, n.° 2, desta Convenção, deva ser interpretada em termos estritos”.
O tribunal de recurso acentuou, ainda, a importância da disposição conter a locução “elementos da situação” e não “elementos do contrato”, sendo, no entender do tribunal, a primeira mais abrangente do que a segunda. Relativamente aos elementos relevantes do caso concreto, o tribunal secundou as considerações feitas pelo tribunal a quo103.
No recurso Dexia, o tribunal revogou a decisão do tribunal de primeira instância, seguindo, fundamentalmente, o precedente estabelecido no caso BST. O tribunal acrescentou, porém, um aspecto de grande relevância: a consideração individual de cada um dos elementos de estraneidade identificados como pertinentes no caso BST é suficiente para afastar a aplicação do artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma104.
4.4 A Omissão de Reenvio Prejudicial
A Convenção de Roma, temporalmente aplicável aos contratos de ambos os litígios, não é direito originário ou derivado da UE. Consequentemente, é-lhe inaplicável o mecanismo de reenvio prejudicial, com o recorte dado pelos artigos 19.º, n.º 2, b), do TUE, e 267.º do TFUE. Os estados signatários da Convenção de Roma previram o mecanismo de reenvio prejudicial no Primeiro Protocolo anexo à convenção. Porém, o regime do reenvio prejudicial instituído através deste Protocolo difere do seu congénere dos tratados. Para o que aqui releva, o mecanismo de reenvio prejudicial está somente disponível para os órgãos judiciais de cuja decisão não caiba recurso, sendo o reenvio sempre facultativo. Estas importantes diferenças foram sublinhadas pelo tribunal de primeira instância no processo BST105.O England and Wales Court of Appeal neste mesmo processo considerou que:
“(…) a reference is not necessary or otherwise appropriate in the present case because the proper interpretation of the words "all the other elements relevant to the situation … are connected with one country only" is clear106.”
No processo Dexia, a possibilidade de reenvio prejudicial apenas foi abordada pelo despacho de indeferimento do pedido de recurso extraordinário para o Supreme Court:
“In relation to the point of European law said to be raised by or in response to the application, it is not necessary to request the Court of Justice to give any ruling because the case involves the application of a clear set of words to specific facts and there is no reason to restrict “the elements relevant to the situation at the time of the choice” further; the Court of Appeal carefully identified the relevant elements107.”
4.5 Análise crítica
Relativamente à posição de princípio do tribunal inglês de primeira instância no processo BST108 , discorda-se de dois pontos fundamentais.
A Convenção de Roma é um diploma de direito internacional privado e é, pois, no quadro específico desta área do direito que deve ser interpretada. Ora, o elemento de transnacionalidade implica necessariamente o contacto com mais do que uma ordem jurídica. Assim, não faz sentido concluir-se que pela inaplicabilidade do artigo 3.º, n.º3, sempre que haja elementos internacionais, sem ligação a nenhuma ordem jurídica particular.
O segundo aspecto de que se discorda prende-se com as inferências que o tribunal retira da conjugação do princípio da autonomia privada com o da segurança jurídica. Ladeiam o princípio da autonomia privada outros princípios de valor equivalente, entre os quais o da soberania legislativa dos Estados-Membros sobre o seu território que, segundo se crê, é precisamente o princípio que subjaz ao artigo 3.º, n.º, 3. Por seu turno, o princípio da segurança jurídica postula a que as normas sejam interpretadas de uma forma previsível. Enquadrados correctamente estes princípios, deles não deflui que esta disposição deva ser interpretada restritivamente.
O acórdão Unamar, citado pelo England and Wales Court of Appealdebruça-se sobre uma matéria distinta, o recorte do conceito de normas de aplicação imediata, pelo que o respectivo iter decisório não é transponível para o artigo 3.º., n.º 3.
A interpretação maximalista do elemento de estraneidade é, ela própria, um factor de insegurança jurídica, como o atesta a destrinça constante destes arrestos entre elementos relevantes e irrelevantes. Quanto a essa análise em concreto, remete-se, por evidente paralelismo, para o que se disse em 3.2.3 supra. Não se deixa, porém, de sublinhar a aparente aleatoriedade com que no processo BST se considera, por um lado, relevante a celebração de contratos back-to-back como elemento de conexãoe, por outro, irrelevante a transnacionalidade dos contratos de financiamento subjacentes aos swaps109. Subscreve-se a conclusão a chegou o Advogado-Geral Maciej Szpunar a respeito desta disposição legal:
“A fim de determinar, para efeitos da aplicação do artigo 3.°, n.° 3, do Regulamento Roma I, se «todos os outros elementos relevantes da situação se [situam], no momento da escolha, num país que não seja o país da lei escolhida», entendo que não é necessário tomar em consideração todas as circunstâncias, mas apenas as que são relevantes à luz das regras de conflito de leis 110.”
Se alguma dúvida houvesse quanto à controvérsia em torno do alcance do artigo 3.º, n.º 3, a opinião do referido Advogado-Geral dissipá-la-ia. Foi com ligeireza que os tribunais de recurso ingleses aplicaram a doutrina do acte clair.
5. Nota conclusiva
A controvérsia em torno da relevância e extensão do conceito de situação transfronteiriça atravessa as mais diversas áreas do direito da UE, tendo sido objecto de interessantes desenvolvimentos no direito internacional privado de que aqui se pretendeu conta.
Os tribunais portugueses defenderam a aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas a pactos de jurisdição referentes a situações jurídicas em que os elementos de transnacionalidade são potenciais e, ou, indirectos, não correspondendo aos elementos conectores tradicionais de direito internacional privado.
Os tribunais ingleses excluíram a aplicabilidade do artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma a situações jurídicas com elementos de transnacionalidade potenciais e, ou, indirectos.
Por razões diferentes, o TJUE não teve oportunidade de se pronunciar sobre estas questões. A Comissão considerou, expectavelmente diga-se, a existência de um pacto de jurisdição como elemento de estraneidade suficiente para determinar a aplicação do Regulamento de Bruxelas.
Relativamente ao artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma, o Advogado-Geral Maciej Szpunar entendeu que os únicos elementos a que se deve atender são os relevantes à luz das regras de conflito de leis, em linha, crê-se, com aquele que tem sido o entendimento implícito do TJUE nos seus acórdãos que afloraram a questão da transnacionalidade à luz do Regulamento de Bruxelas.
Caso a interpretação proposta pelos tribunais portugueses e pelos tribunais ingleses venha a ser adoptada pelo TJUE, dar-se-á um passo importante no sentido da eliminação da relevância prática da existência de um elemento de conexão numa área do direito a cuja essência é conatural a ideia de transnacionalidade.
Os tribunais de ambas estas jurisdições nacionais adoptaram uma postura de maximização da aplicação do direito da UE. No caso dos tribunais ingleses, crê-se que as decisões foram impulsionadas pela prevalência hegemónica do princípio da autonomia privada na sua jurisdição que coincide com o interesse de manter atractiva aquela jurisdição para as grandes disputas comerciais e, em particular, financeiras.
Os tribunais dos dois países, com a honrosa excepção do STJ no processo 542/14.0TVLSB.L1.S1, não lançaram mão do mecanismo de reenvio prejudicial. Sendo certo que no caso inglês o reenvio era uma mera faculdade, não pode deixar de se sublinhar a forma errónea como nas decisões de não reenvio os tribunais de ambas as jurisdições aplicaram a doutrina Cilfit a questões claramente fora da órbita conceptual do acte clair.
Ambas as questões continuam pedir resposta definitiva do TJUE pendente de oportunidades futuras de escrutínio. Com os elementos disponíveis, arrisca-se um exercício de adivinhação: relativamente ao Regulamento de Bruxelas, o TJUE consideraria o pacto de jurisdição como elemento de estraneidade bastante, em linha com a posição da Comissão; relativamente à Convenção e Regulamento de Roma, o TJUE seguiria a posição do Advogado-Geral Maciej Szpunar que, aliás, parece coincidir com a do tribunal inglês de primeira instância no caso Dexia.
NOTAS
0 Mestre em direito da UE pelo Colégio da Europa. Docente convidado na Universidade Católica de Angola e na Universidade Agostinho Neto. Advogado na Cardigose Associados. Esteve envolvido na equipa de mandatários em representação das partes não financeiras nos litígios referidos em 3.2. e no litígio Empresas de Transporte v. Banco Santander Totta.
1 “[Negócio jurídico pelo qual as partes] se obrigam ao pagamento recíproco e futuro de duas quantias pecuniárias, na mesma moeda ou em moedas diferentes, numa ou várias datas predeterminadas, calculadas por referência a fluxos financeiros associados a um activo subjacente, i.e., a taxa de juro” J. A. Engrácia Antunes, “Os Derivados”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 30, Agosto, 2008, p. 93.
2 Para uma perspectiva jurídica do impacto da crise em contratos financeiros de longa duração, M. Carneiro da Frada, “Crise financeira mundial e alteração das circunstâncias: contratos de depósito vs.contratos de gestão de carteiras”, ROA, Ano 69, n.º 3-4, 2009, pp. 660-674.
3 Sem qualquer preocupação de exaustividade, cfr. os seguintes arrestos do STJ, todos pesquisáveis em: www.dgsi.pt acórdão de 10.10.2013, proferido no processo 1387/11.5TBBCL.G1.S1; acórdão de 29.01.2015, proferido no processo 531/11.7TVLSB.L1.S1; acórdão de 11.02.2015, proferido no processo 309/11.8TVLSB.L1.S1; acórdão 16.06.2015, proferido no processo 1880/10.7TVLSB.L1.S1; acórdão de 26.01.2016, proferido no processo 876/12.9TVLSB.L1.S1; acórdão de 3.05.2016, proferido no processo 27/14.5TVPRT.P1.S1; acórdão de 4.05.2017, proferido no processo 1961/13.5TVLSB.L1.S1; acórdão de 8.06.2017, proferido no processo 2118/10.2TVLSB.L1.S10 e acórdão de 22.06.2017, proferido no processo 540/11.6TVLSB.L2.S1.
4 Igualmente sem preocupação de exaustividade, M. Carneiro da Frada, “Crise financeira”; J. N. Calvão da Silva, “Anotação ao Acórdão da Relação de Lisboa de 21 de Março de 2013 (Swap de taxa de juro: sua legalidade e autonomia e inaplicabilidade da excepção do jogo e aposta)”, RLJ, Ano 142.º, 2013, pp. 238 e ss.; H. Mourato, “O Contrato de Swap de Taxa de Juro”, 2014, Almedina; M. C. Calheiros, “O contrato de swapno contexto da actual crise financeira global”, Cadernos de Direito Privado, nº 42 (Abril /Junho 2013), pp. 3-13; C. Ferreira de Almeida, “Swapsde Troca e SwapsDiferenciais”, Ensaios de homenagem a Amadeu Ferreira, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 50, 2015, vol. I, p. 11 ss; P. Boullosa Gonzalez, “Interest Rate Swaps: Perspectiva Jurídica”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 44, Abril de 2013, pp. 10-28; A. Pereira de Almeida, “Instrumentos financeiros: os swaps”, Estudos em Homenagem a CFA, Coimbra, 2011, II, p. 37 e ss e P. Mota Pinto, “Contrato de swapde taxas de juro, jogo e aposta e alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar”, Revista de Legislação e de Jurisprudência, 2014, nº 3987, p. 391 ss, nº 3988, p. 14 ss.
5 A jurisprudência que se analisará teve por base as disposições do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, entretanto substituído, pelo Regulamento (UE) n.º 1215/2012. Esta alteração não modifica, no essencial, os pressupostos decisórios daquela jurisprudência.
6 A jurisprudência que se analisará teve por base as disposições do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, entretanto substituído, pelo Regulamento (UE) n.º 1215/2012. Esta alteração não modifica, no essencial, os pressupostos decisórios daquela jurisprudência.
7 Acórdão C-268/15, Ullens de Schooten, [2016], § 47.
8 Cfr., M. Mataija, “Internal Situations in Community Law: an Ucertain Safeguard of Competences Within the Internal Market”,Croatian Yearbook of European Law and Policy, 5, 2009, p. 35, disponível em http://www.cyelp.com/index.php/cyelp/article/view/89.
9 [1]Cfr. artigo 5.º do TUE.
10 Cfr., entre outros, os emblemáticos acórdãos C-370/90, Singh, [1992]; C-60/00, Carpenter,[2002] e C-200/02, Zhu and Chen, [2004].
11 A discriminação inversa consiste no tratamento menos favorável de cidadãos ou pessoas colectivas do Estado-Membro em causa comparativamente com os provenientes de outros Estados-Membros em situação comparável. Crê-se que, em Portugal, tal não seria admissível por força do alcance e extensão do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP. Esta não é, porém, situação comum a todos os Estados-Membros como o demonstra a jurisprudência do TJUE.
12 Acórdão C-673/16, Comans, [2018], § 47 Saúda-se esta decisão que, indiscutivelmente, constituí um passo de gigante dado pelo TJUE no sentido de combater efectivamente a não discriminação em razão da orientação sexual ao nível da UE.
13 No acórdão C-127/08, Metock, [2008], o TJUE confirma o entendimento de que a cidadania europeia não confere direitos fora do quadro da livre circulação, ou seja, em situações puramente internas. Para uma análise crítica ver A. Tryfonidou, “Purely internal situations and reverse discrimination in a Citizens' Europe: time to "reverse" reverse discrimination?”,2009, disponível em:
14 Acórdão 298/87, Smanor,[1988], § 8.
15 Acórdão C-321/94 - C-324/94, Pistre, [1997], §43-45.
16 M. Mataija, “Internal Situations…”, pp.58-60.
17 Acórdão C-297/88 e C-197/89, Dodzi, [1990]. Em rigor, nesta questão, o TJUE não considerou aplicável o direito da EU ratione materiae, mas considerou-se competente para analisar a questão em abstracto porque “existe um interesse manifesto para a ordem jurídica comunitária em que, para evitar divergências de interpretação futuras, qualquer disposição de direito comunitário seja interpretada de forma uniforme, quaisquer que sejam as condições em que se deve aplicar” - § 37.
18 C-448/98, Guimont, [2000]: “No presente caso, não se verifica de maneira manifesta que a interpretação solicitada do direito comunitário não é necessária ao juiz nacional. Com efeito, essa resposta pode ser-lhe útil no caso de o seu direito nacional impor, num processo como o do caso em apreço, fazer beneficiar um produtor nacional dos mesmos direitos que os que um produtor de outro Estado-Membro retira do direito comunitário na mesma situação” – § 37.
19 S. Iglesias Sánchez, “Purely Internal Situations and the Limits of EU Law: A Consolidated Case Law or a Notion to be Abandoned”, European Constitutional Law Review, 14, 2018, p. 29. Tradução livre do seguinte excerto: “only if the facts are not governed by EU law, the relevance of the question can be very plausibly be doubted. Only in the exceptional circumstances identified by Court of Justice can such preliminary references still be regarded as relevant”.
20 § 55.
21 Acórdãos C-26/62, van Gend & Loos, [1963] e C-6/64, Costa v ENEL, [1964], respectivamente.
22 Sobre a aplicabilidade deste requisito a outros domínios jurídicos, veja-se M. Mataija, “Internal Situations…”, pp. 36 e ss. e S. Iglesias Sánchez, “Purely Internal Situations…”, pp. 22 e ss.
23 S. Iglesias Sánchez, “Purely Internal Situations…”, pp. 26-27.
24 Mais concretamente, jurisdição de Inglaterra e País de Gales.
25 Acórdão C-281/02, Owusu,[2005], § 25. Proferido a propósito da aplicabilidade da Convenção de Bruxelas, de 27 de Setembro de 1968, relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1972, L 299, p. 32; EE 01 F1 p. 186), alterada pelas sucessivas Convenções relativas à adesão de novos Estados-Membros a esta Convenção.
26 A interpretação do TJUE no que respeita às disposições da Convenção de Bruxelas é válida igualmente para as do Regulamento de Bruxelas, quando as disposições desses instrumentos possam ser qualificadas de equivalentes (acórdão C-533/08, TNT Express, [2010], § 36)
27 Acórdão C-327/10, Lindner, [2011], § 29.
28 Acórdão C-478/12 Maletic,[2013], § 25.
29 “CONSIDERANDO que, para esse fim, é necessário determinar a competência dos seus órgãos jurisdicionaisna ordem internacional, facilitar o reconhecimento e instaurar um processo rápido que garanta a execução das decisões, bem como dos actos autênticos e das transacções judiciais” (sublinhado nosso).
30 Cfr. JOCE, n.º C 59, de 5.03.1979, p. 8, onde se afirma que a Convenção “alters the rules of jurisdiction in force in each Contracting State only where an international element is involved. It does not define this concept, since the international element in a legal relationship may depend on the particular facts of the proceedings of which the court is seised. Proceedings instituted in the courts of a Contracting State which involves only persons domiciled in that State will not normally be affected by the Convention; Article 2 simply refers matters back to the rules of jurisdiction in force in that State”(o sublinhado é nosso). Vejam-se, também, pp. 37 s., a propósito do artigo 17.º da Convenção (que corresponde ao artigo 23.º do Regulamento Bruxelas).
31 Cfr., a título de exemplo,E. dos Santos, “Convenção de Bruxelas”, Lisboa: Rei dos Livros, 1992, pp. 21 ss. e 42, M. Teixeira de Sousa/D. Moura Vicente, “Comentário à Convenção de Bruxelas, Lisboa”: Lex, 1994, pp. 24 e 37 e ss., A. Sequeira Ribeiro, “Sobre os Pactos de Jurisdição na Convenção de Bruxelas de 1968: uma Breve Abordagem ao Art. 17.º”, Separata da Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1996, pp. 422 ss., M. Desantes Real, “La competencia judicial en la Comunidad Europea”, Barcelona: Bosch, 1986, pp. 47 ss., H. Gaudemet-Tallon, “Les Conventions de Bruxelles et de Lugano - Compétence international, reconnaissance et exécution des jugements en Europe”, Paris: LGDJ, 1993, pp. 78 ss., P. Schlosser, “EuGVÜ, Europäischer Gerichtstands- und Vollstreckungsübereinkommen mit Luganer Übereinkommen und den Haager Übereinkommen über Zustellung und Beweisaufnahme”, München: Beck, 1996, pp. 104 s., e H. Schack, “Internationales Zivilverfahrensrecht”, München: Beck, 1996, p. 94. Reportando-se à Convenção de Lugano, onde o problema se coloca nos mesmos termos, cfr. Y. Donzallaz, « La Convention de Lugano du 16 septembre 1988 concernant la compétence judiciaire et l’exécution des décisions em matière civile et commerciale”, vol. I, Berne: Staempfli, 1996, pp. 425 ss.
32 Maletic, trecho decisório.
33 Owusu,§ 26.
34 Lindner, § 35.
35 Como, aliás, o TJUE sublinha no §31 do acórdão.
36 Para além disso, o TJUE tomou também em consideração o facto de o Estado-Membro de residência do demandado ser incerto.
37 Despacho de 02 de Fevereiro proferido no processo 542/14.0TVLSB.L1.S1. As questões formuladas estão disponíveis em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A62016CN0136.
38 Foi colocada, ainda, uma outra questão “A aplicação do pacto de jurisdição pode ser afastada se a escolha de Tribunais de Estado-Membro diferente do da nacionalidade das partes causar graves inconvenientes para uma delas sem que exista um interesse atendível da outra que justifique tal escolha?”. Esta questão, na medida em que pressupõe a aplicação do Regulamento de Bruxelas, não é relevante para a temática objecto do presente artigo. Sempre se dirá que, sendo o Regulamento aplicável, a validade do pacto de jurisdição só poderá ser colocada em causa com base em normas de direito da UE. Tal entendimento é uma decorrência do princípio do primado do direito da UE e, crê-se, está subjacente a várias decisões do TJUE nesta matéria, das quais se destaca a proferida no processo C-159/97,Castelletti, [1999], designadamente, § 47-52. Veja-se, no mesmo sentido, acórdão do STJ de 11.02.2015, proferido no processo 877/12.7TVLSB.L1-A.S1, revogando, curiosamente, acórdão em sentido contrário proferido pelo TRL em 10.04.2014, no processo 877/127TVLSB.L1-1.
39 O procedimento de reenvio correu termos sob o número C-136/16.
40 As partes e o Estado Português apresentaram igualmente observações escritas.
41 Em 3.2.2, infra, detalha-se alguns aspectos da posição da Comissão.
42 Processos 536/14.6TVLSB, 538/14.2TVLSB, 539/14.0TVLSB e 540/14.4TVLSB.
43 Processos 536/14.6TVLSB e 542/14.0TVLSB.
44 536/14.6TVLSB.L1.S1 e 538/14.2TVLSB.L1.S1 e 540/14.4TVLSB.S1.
45 Processo 539/14.0TVLSB.
46 Proferido no referido processo 540/14.4TVLSB.S1 disponível em www.dgsi.pt.
47 Veja-se supra3.1.
48 Proferido no referido processo 536/14.6TVLSB.S1 disponível em www.dgsi.pt.
49 “No caso dos autos, estando em jogo uma questão de competência emergente do estabelecimento pelas partes de um pacto de jurisdição, a norma comunitária, de sentido duvidoso, a interpretar autenticamente pelo TJ seria naturalmente a que consta do art. 23º do Regulamento 44/2001, enquanto estabelece os requisitos ou pressupostos de tal figura – sendo a dúvida interpretativa suscitada a que se traduz em saber se – vigorando também nesta sede o requisito da internacionalidade ou estraneidade do litígio, correntemente considerado pelo próprio TJ como condição geral de aplicação da disciplina contida no referido. Regulamento - ele se deve ter por satisfeito com a mera estipulação do pacto de jurisdição: ou seja, se o pacto de jurisdição, em si mesmo considerado, já consubstancia, só por si e sem mais, um elemento de estraneidade da relação material controvertida, susceptível de despoletar a aplicação do referido Regulamento. Porém, e como é evidente, tal questão interpretativa só ganha actualidade e relevância se chegarmos à conclusão que – no litígio objecto dos presentes autos – o único elemento de internacionalidade seria o resultante da estipulação de competência a favor dos tribunais ingleses: se, pelo contrário, apreciando a matéria de facto em que se consubstancia a relação litigiosa, se impuser, de forma clara e inequívoca, a conclusão de que ocorrem seguramente outros elementos materiais de internacionalidade na relação contratual controvertida entre as partes, fica naturalmente prejudicada a referida questão interpretativa a colocar quanto à norma do citado art. 23º.”
50 C-283/81 – Cilfit,[1982].
51 Como se comprova pelo despacho de 02 de Fevereiro proferido no processo 542/14.0TVLSB.L1.S1. O STJ não aduziu qualquer tipo de fundamentação para esta distinção deveras peculiar.
52 Nem sequer a outro colectivo de juízes do mesmo STJ se impôs uma tal clareza…
53 Proferido no processo 538/14.2TVLSB.S1 disponível em www.dgsi.pt.
54 Explanou-se,supra, o suporte jurídico desta asserção. Note-se que, quer neste acórdão quer no proferido em 26 de Janeiro de 2016, o STJ nem sequer se pronunciou sobre um possível reenvio prejudicial. O acórdão de 04 de Fevereiro de 2016 tem o mérito de ter identificado essa possibilidade.
55 É, designadamente, o caso do artigo 94.º n.º 1 do Código de Processo Civil Português e da legislação francesa, sendo que os tribunais franceses estendem esse entendimento à forma como interpretam ao actual artigo 23 do Regulamento de Bruxelas. Cfr. acórdãos da Cour de Cassation: i) Sorelec, de 17 de Dezembro de 1985: «les clauses prorogeant la compétence internationale sont en principe licites, lorsqu’il s’agit d’un litige international … et lorsque la clause ne fait pas échec à la compétence territoriale impérative d’une juridiction française (sublinhado nosso) », disponível em : https://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriJudi.do?oldAction=rechExpJuriJudi&idTexte=JURITEXT000007015807&fastReqId=525994944&fastPos=1
(ii) Keller Grundbau, de 4 de Outubro de 2005: « l’application de l’article 17 de la convention de Bruxelles … est subordonnée à la reconnaissance du caractère international de la situation qui s’apprécie, pour des motifs de sécurité juridique, au moment de la conclusion de la clause attributive de juridiction (sublinhado nosso)», disponível em: https://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriJudi.do?idTexte=JURITEXT000007048979
(iii) Compass, de 23 de Setembro de 2014 : « L'article 23 du règlement (CE) n° 44/2001 du 22 décembre 2000 (Bruxelles I) reconnaît la validité de la clause attributive de juridiction aux seules conditions que l'une des parties au moins soit domiciliée sur le territoire d'un État membre et que la juridiction désignée soit celle d'un État membre ; qu'ayant constaté que les parties étaient domiciliées sur le territoire d'États membres différents, la cour d'appel a, par ce seul motif, faisant ressortir un élément d'extranéité suffisant à établir le caractère international du contrat, légalement justifié sa décision (sublinhado nosso) »
56 Ulrich Magnus, Comentário ao artigo 23 in Ulrich Magnus / Peter Mankowski (Coord.), European Commentaries on Private International Law, Brussels Regulation, Sellier European Law Publishers, 2ª edição, 2012, pp.454-455. [ Links ]
57 §19.
58 Esta mesma interpretação era já preconizada no Relatório Schlosser relativo à Convenção de Adesão de 1978 : “Article 17, applying as it does only if the transaction in question is international in character (see paragraph 21), which the mere fact of choosing a court in a particular State is by no means sufficient to establish”.
59 O artigo 1, n.º 1, da referida Convenção estabelece, de modo claro e expresso, que as regras convencionais são unicamente aplicáveis “nas situações que impliquem um conflito de leis”. Para os Professores M. Giulianoe P. Lagarde, isto significa que as regras uniformes visam apenas “situations which involve one or more elements foreign to the internal social system of a country (for example, the fact that one or all of the parties to the contract are foreign nationals or persons habitually resident abroad, the fact that the contract was made abroad, the fact that one or more of the obligations of the parties are to be performed in a foreign country, etc.), thereby giving the legal systems of several countries claims to apply” – Relatório sobre a Conveção de Roma, publicado no JOCE n.º C 282, de 31.10.1980, p. 10.A referida disposição é retomada, quase ipsis verbis, pelo art. 1 (1), do Regulamento Roma I.
60 Referindo também a Convenção da Haia, cfr. H. Gaudemet-Tallon,op. cit., pp. 125 e ss. No comunicado de imprensa da Comissão sobre esta matéria, pode ler-se: “[t]he recent reform of the so-called Brussels I Regulation paved the way for today's ratification. This regulation determines which national court has jurisdiction in cross-border cases involving EU firms and how court judgments issued in one EU country are recognised and enforced in another. The reform of these EU-internal rules will ensure coherence with the Convention”.
61 Cfr., nomeadamente, o considerando 3.
62 Relevando este aspecto, veja-seL. Lima Pinheiro, Federalismo e Direito Internacional Privado – algumas reflexões sobre a comunitarização do Direito Internacional Privado, inEstudos de Direito Internacional Privado, Coimbra: Almedina, 2006, pp. 331 e ss., onde o Autor se revela particularmente crítico do exercício, pelos órgãos comunitários, da competência fundada no art. 65.º do TCE, chegando mesmo a afirmar que se tem “(...) verificado uma violação do disposto no art. 65.º do Tratado da Comunidade Europeia e do princípio da subsidiariedade, designadamente quanto à uniformização dos regimes da competência internacional e do reconhecimento de decisões estrangeiras”(pp. 340-341)
63 O Parlamento e o Conselho estariam a exorbitar as atribuições da UE e a sua própria competência, caso tivessem pretendido determinar a jurisdição dos tribunais dos Estados membros em tais situações (violação do princípio da atribuiçãoou da especialidade, artigos 4.º e 5.º do TUE). Cfr, igualmente, o artigo 13.º, n.º 2, do TUE e o considerando 4 do próprio Regulamento de Bruxelas, onde se afirma, explicitamente: “O presente regulamento limita-se ao mínimo necessário para atingir os seus fins e não excede o que é indispensável para esse efeito”. Não se, olvida, porém, os limites deste argumento, tendo em conta quanto se disse suprarelativamente ao propósito do Regulamento de Bruxelas.
64 O STJ omitiu estes factos (local de celebração e de execução dos contratos) no despacho remetido ao TJUE. Tal omissão dever-se-á, certamente, à assunção pelo órgão de reenvio de que o TJUE só estaria interessado em analisar os elementos que, em teoria, poderiam conferir cariz transnacional à situação jurídica vertente e já não aqueles que se localizavam inequivocamente em Portugal.
65 § 26: “A implicação de um Estado contratante e de um Estado terceiro, em virtude, por exemplo, do domicílio do demandante e de um demandado no primeiro Estado e da localização dos factos controvertidos no segundo, também é susceptível de conferir natureza internacional à relação jurídica em causa”.
66Jurisdição em que ambas as pessoas colectivas foram constituídas.
67 § 31. Em cúmulo com a pluralidade processual passiva com carácter evidentemente transnacional, a relação material controvertida era composta por um só contrato ou por dois indissociavelmente ligados(§29).
68 Aliás,este modelo contratual pode ser utilizado em situações puramente internas, conforme resulta do documento produzido pela própria ISDA intitulado “User’s Guide to the 1992 ISDA Master Agreements”, na sua p. 2, disponível em http://assets.isda.org/media/e0f39375/fb087821-pdf/.
69 Todos estes instrumentos foram objecto de padronização internacional, seja através de um processo vinculativo, como sucedeu relativamente às letras, livranças e cheques (convenção internacional assinada em Genebra em 19 de Março de 1931 – Lei Uniforme relativa ao Cheque – e convenção internacional assinada em Genebra em 7 de Junho de 1930 – Lei Uniforme relativa às Letras e Livranças), seja através de um processo de soft law, de uma auto-regulação sem intervenção directa dos Estados, como sucede nos modelos contratuais meramente facultativos elaborados pela Câmara de Comércio Internacional.
70 Uma parte substancial deste ramo normativo foi uniformizado pelo direito da UE, designadamente, através das várias directivas em matéria de sociedades comerciais. Mesmo as sociedades europeias, caso especialíssimo, são tratadas como constituídas segundo o direito de um único Estado-Membro, aquele em que a sociedade europeia tenha a sua sede estatutária. Veja-se o Regulamento (CE) n.º 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia, em especial, artigos.10.º 15.º, n.º1, 61.º e 63.º
71 A TUI Österreich GmbH, sedeada na Áustria (Viena) era (e é) detida a 100% por uma sociedade sedeada na Alemanha, a TUI AG.
72 Cfr. informação disponível em https://tmdb.eu/trademark/002504207/eu.
73 Cfr. art. 557 do Código Civil.
74 Cfr. art. 589 do Código Civil.
75 Cfr. art. 595 do Código Civil.
76 Cfr. art. 424 do Código Civil.
77 Cfr. H. Gaudemet-Tallon, op. cit., p. 127 e, como posição de princípio, U. Magnus/P. Mankowskiop. cit., p. 467
78 E arriscaríamos que o mesmo sucederia se fosse regido pela lei de qualquer outro Estado-Membro.
79 Cfr. a sentença do Tribunal de Comércio inglês no caso Caterpillar Financial Services Corp v SNC Passion [2004] EWHC 56 (Comm) (Cooke J). Concluiu-se, adequadamente, que os financiamentos a que o valor nocional dos swapsestava ligado eram irrelevantes, uma vez que os contratos de swapsão absolutamente autónomos relativamente a esses financiamentos, i.e., são contratos independentes.
80 Em particular desde a entrada em vigor da Directiva 2004/39/CE do Parlamento e do Conselho de 21 de Abril de 2004 (DMIF).
81 § 29.
82 O mesmo sucederia, evidentemente, na situação inversa, i.e., se a parte não financeira celebrasse contratos inteira ou parcialmente simétricos com outras entidades.
83 Cfr. ponto 2, supra.
84A escolha de lei consubstancia um elemento de estraneidade suficiente para a aplicação deste diploma – de contrário esta disposição não teria sentido prático – mas, paralelamente, o alcance prático dessa escolha está fortemente cerceado.
85 Dexia Crediop SPA v Comune di Prato [2015] EWHC 1746 (Comm) (Walker J), disponível em http://www.bailii.org/
86 § 211.
87 Banco Santander Totta SA v Companhia de Carris de Ferro de Lisboa SA et al. [2016] EWHC 465 (Comm) (Blair J), disponível em http://www.bailii.org/. Neste processo, foi debatida uma outra questão de grande interesse, a definição de norma imperativa no âmbito desta disposição legal, tendo por base o regime do artigo 437.º do Código Civil. Cfr. §465 e ss.
88 Companhia de Carris de Ferro de Lisboa SA, Sociedade de Transportes Colectivos do Porto SA, Metropolitano de Lisboa EPE e Metro do Porto SA.
89 §356. O tribunal elencou como fontes interpretativas de particular relevância os princípios constantes da jurisprudência do TJUE e decisões prévias relevantes do TJUE; o Relatório sobre a Convecção de Roma; os princípios interpretativos de direito da UE e os trabalhos preparatórios, de acordo com o artigo 32.º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de Maio de 1969.
90 §371-373.
91 §374.
92 §404.
93 §409 (1).
94 §409 (3).
95 §409 (4).
96 §409 (5).
97 §409 (6).
98 Cfr 3.2.1 supra.
99 Banco Santander Totta SA v Companhia de Carris de Ferro de Lisboa SA et al. [2016] EWCA CIV1267, disponível em http://www.bailii.org/
100 Dexia Crediop SPA v Comune di Prato [2015] EWCA CIV 428, disponível em http://www.bailii.org/
101 §46.
102 Acórdão C-184/12, Unamar, [2013], § 49. O tribunal convocou ainda o acórdão C-135/15, Nikiforidis, [2016], § 42-44 e 46.
103 §59 e ss.
104 §134 e 137. O tribunal considerou ainda como relevante o facto de a celebração dos contratos de swapter sido precedida de convites a bancos sedeados no estrangeiro para apresentação de propostas – §136.
105 §403.
106 Despacho de 18 de Dezembro de 2017, cujo texto está disponível em https://www.supremecourt.uk/docs/permission-to-appeal-2017-12-2018-01.pdf.
107 §77.
108 Cfr. 4.2, supra.
109 §409 (5) e (8).
110 §149 das Conclusões do Advogado Geral no processo C-54/16 [2017]. O acórdão do TJUE não retomou a questão por considerar que o artigo 3.º, n.º 3, não é aplicável quando está em causa o Regulamento 1346/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, relativo aos processos de insolvência (entretanto revogado pelo Regulamento (UE) 2015/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Maio de 2015).