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Comunicação e Sociedade

versão impressa ISSN 1645-2089versão On-line ISSN 2183-3575

Comunicação e Sociedade vol.28  Braga dez. 2015

https://doi.org/10.17231/comsoc.28(2015).2287 

VÁRIA

Entre a dupla ausência e o profissional transnacional o “não dito" da mobilidade científica

Between double absence and transnational professional – the unrevealed side of scientific mobility

 

Izabela Wagner*

*Universidade de Varsóvia, Institute of Sociology.

wagneri@is.uw.edu.pl

 

RESUMO

O artigo versa sobre a situação da maioria dos cientistas em mobilidade e a trabalhar nos mais prestigiados laboratórios internacionais de investigação do século XXI. Problematiza-se o desfasamento entre o discurso oficial que tende a enfatizar constantemente a existência de seleções democráticas e justas e de acesso livre às carreiras científicas e o discurso “não dito" sobre a discriminação étnica baseada na nacionalidade dos investigadores que permeia os locais de trabalho em ciência. A informação recolhida através de investigação etnográfica realizada em laboratórios científicos indica que a etnia e a origem geográfica (bem como a nacionalidade do cientista) desempenham papéis importantes no processo de seleção e permanência nos laboratórios de investigação. Neste texto usa-se o conceito “dupla ausência" de Abdelmalek Sayad, mostrando que a situação de ser cientista “estrangeiro" (a maioria dos alunos de doutoramento e pós doutorandos que trabalha no estrangeiro) é idêntica à de outras categorias em migração.

Palavras-chave: Carreiras científicas; discriminações; etnicidade e plano de carreira; internacionalização.

 

ABSTRACT

The paper concerns the situation of the majority of mobile scientists working in the international prestigious research laboratories in 21st century. I point out the lag between official communication about open access and democratic and fair selections which occur in scientific careers all the time and unspoken issues related with ethnical and national discrimination in the workplaces. The problem of ethnical discrimination is omitted in the sociological literature issue however, the ethnographic data provided from scientific laboratories indicates that the ethnicity and origin (as well as the nationality of scientist) play an important role. I employ in this paper the Abdelmalek Sayad’s concept of “double absence", showing that the situation of “foreigner" scientists (majority of the PhD students and post-docs working abroad) is similar to other categories of migrants.

Keywords: Scientific careers; discriminations; ethnicity and career path; internationalization.

 

Introdução: o ponto de vista microssociológico sobre as carreiras científicas

Notas de observação de campo:

Boston a “Meca" dos investigadores em ciências da vida2011durante o evento organizado pela associação de pós doutoramento, intitulado “carreiras de investigação": Na enorme sala de conferências do hotel estão cerca de mil investigadores que trabalham em instituições nos Estados Unidos da América. Um dos principais oradores, um especialista norte-americano que se dedica a falar sobre o modo como “construir carreira na área de ciência", começa o seu espetáculo. O tema é: o que fazer depois do seu pós doutoramento? O slogan é este: networking, networking, networking!

Depois de vários anos como pós-doutorandos nos melhores institutos de pesquisa mundial, o público escuta sobre o modo como deve construir as suas carreiras na investigação. Surpreendentemente, aprende acerca do modo como a realização de um doutoramento significa ser inteligente, não só no que respeita à aprendizagem de uma especialidade científica, mas também, e, acima de tudo, como refere o orador principal, no que respeita à necessidade de se estar incrivelmente treinado em competências sociais. É preciso saber não só sobre a proteína que protege de choque térmico, mas também sobre como trabalhar e pensar de forma criativa e independente, como organizar as experiências, como se candidatar a subsídios, como escrever sobre os resultados e, finalmente, como apresentar resultados numa conferência. O nosso principal orador faz de conta que todas essas competências (soft skills) constituem uma espécie de capital muito mais importante do que um conhecimento específico que milhares de pessoas adquirem depois de passar vários anos nas universidades. Segundo o que diz o orador, os investigadores devem antecipar o que vão fazer depois do seu pós-doutoramento, que tipo de trabalho podiam desenvolver e criar estratégias nesse sentido, a fim de terem um emprego com salário decente.

Para o orador, cada cientista deve mobilizar o seu capital, a fim de encontrar trabalho, usando os contatos da tua universidade, de um companheiro de quarto, de um membro da equipa de basquete, de uma pessoa que participou contigo num curso de artes ou com quem jogaste futebol no ensino secundário. Cada contato é importante e a tua universidade, a tua alma mater, é um capital importante que deves usar quando estás à procura de trabalho.

Enquanto escutava o orador, lembrei-me do pensamento de Bourdieu, no livro Nobreza de Estado (1996), no qual o autor mostrara como este mecanismo da acumulação de capital social obtido nas Grandes Écoles, em França, estava a funcionar. Logo de seguida, lembrei-me do estudo de Grannoveter (1973) e de uma obra de Newmann (1999), realizados noutros contextos sociais e noutras áreas geográficas e que provaram o impacto dos laços fracos, isto é, mostraram como as conexões familiares e os amigos contribuem para a procura de emprego.

E agora... Observo em meu redor:

Estamos aqui nesta sala de conferências enorme de um hotel agradável a ouvir esta pessoa. Entre nós, não mais do que 10% são norte-americanos. A grande maioria das pessoas não tem autorização de estadia permanente em os EUA. Apenas alguns têm a sorte de ter o cartão verde o importante J1 hold ou visto H1.

Networking, networking, networking. Como mobilizar os nossos amigos do ensino médio de Nova Deli, os membros da equipa de futebol de Milão e os companheiros de Chengdu ou os amigos de aulas arte de São Petersburgo? Como obter o apoio dos nossos professores universitários quando se é do Porto, Varsóvia ou Poitiers? Somos capazes a maioria de nós de conseguir um emprego permanente “de verdade" nos EUA, usando o nosso capital social? Ou talvez — como todos nós esperamos uma vez de regresso ao nosso país, nos tornemos verdadeiros profissionais transnacionais e prosseguiremos a nossa investigação de forma semelhante e com condições de trabalho semelhantes... Que tipo de futuro existe para a maioria dos cientistas que trabalha neste frenesim, sete dias sobre sete e sem férias durante os anos de pós-doutoramento despendidos no melhor lugar do mundo para as ciências da vida?

Nas portas do laboratório alguém vem colocar um autocolante: “comer-dormir-pós-doutoramento". Nos placards das instituições de investigação alguém vem colar o artigo da Nature: “quase 80% dos artigos publicados na Nature têm autores provenientes desta cidade!" Cada um de nós está realmente no coração da investigação básica nas disciplinas de ciências da vida (principalmente áreas médicas). Todos nós — estrangeiros — somos, por norma, os melhores ex-alunos do ensino secundário, formamo-nos na melhor universidade e estamos longe das nossas famílias e casas — os nossos pais estão orgulhosos por terem alguns filhos talentosos dedicados à ciência e investigação.

Durante anos temos ouvido os conselhos: “esforça-te para aprenderes, sê bom e serás bem-sucedido na ciência". Esforçamo-nos muito e ainda estamos a trabalhar. Mudamos de país e esperamos estar no bom caminho para obter um bom lugar no laboratório de pesquisa e não para sermos eternos pós doutorandos no estrangeiro, com o salário que faz de nós “trabalhadores pobres" nos EUA. Altamente qualificados e empenhados somos a população de estrangeiros que está a desenvolver a ciência, ou, como se dirá depois, a “ciência americana". Mas estamos neste mercado de trabalho sem praticamente qualquer possibilidade de conseguir um emprego “de verdade".

Estes profissionais são mão de obra barata e qualificada que chega atraída por excelentes condições de trabalho e pela possibilidade de obter uma experiência única graças à colaboração com uma equipa composta pelos melhores especialistas do mundo ... mas este sonho sobre as condições de trabalho têm a sua data de validade — o tempo de um doutoramento e um contrato de pós-doutoramento.

Este artigo incidirá sobre a situação das pessoas que trabalham como pós-doutorandos em laboratórios de ciência de vida e que tem expetativas de prosseguir a carreira na sua área de investigação — dedicando-se à investigação básica. Para elas, a mobilidade (geográfica) e flexibilidade são entendidas, não apenas como uma estratégia para melhorar suas competências e ampliar seus conhecimentos, mas também como a única maneira de alcançar a chamada mobilidade profissional ascendente — o que significa promoção e acesso a cargos com caráter permanente em instituições de investigação. O modelo que têm de carreira é construído na base da mobilidade, considerada o caminho ideal para uma carreira de prestígio, que conduz ao topo dos círculos mundiais de elite no seu domínio de conhecimento.

Estando no melhor lugar do mundo, os cientistas aprendem progressivamente sobre a saturação do mercado de trabalho nas instituições científicas, os apoios condicionados em função da preferência em termos de nacionalidade e etnia e outras barreiras importantes e com impacto sobre a sua trajetória profissional.

Contextos e conceitos dos estudos dedicados aos cientistas: entre a história e a política (meso e macro)

Os estudos sobre a carreira de cientistas têm uma longa história no campo da sociologia. O ensaio de 1940, de Znaniecki (que foi co-autor, com Thomas, do primeiro estudo realizado na base de documentos pessoais e biografias: “Os camponeses polacos na Europa e América", 1918-1920) foi o primeiro texto sociológico a incidir sobre o “papel social de um cientista".

O centro mais fecundo nos estudos sobre as carreiras científicas ficou situado na Universidade de Columbia onde Robert Merton fundou um grupo forte de investigação que realizou vários estudos dedicados aos cientistas. As trajetórias de carreira dos cientistas foram analisadas sob diferentes ângulos: a idade da primeira descoberta (Cole, 1979), a idade da principal descoberta, a religião, a influência da universidade, o tempo de carreira, os valores ligados ao trabalho científico, as carreiras de prestígio — os prémios Nobel (Zuckerman, 1977) e a construção da reputação (Merton, 1968). Esses estudos foram conduzidos principalmente entre 1960 e 1990.

Outros autores com diferentes perspetivas teóricas (principalmente os construtivistas Latour & Woolgar, 1979; Knorr-Cetina, 1999, 1981, mas também interaccionistas) focaram o lado subjetivo de carreiras. Glaser apresentou o conceito de comparative failure (1964) e Hermanowicz, 30 anos mais tarde (1998), tornou visível como efeito ainda carateriza os investigadores na área da física, nos EUA. Uma corrente importante de reflexão foi desenvolvida no domínio dos estudos de género e dedica-se ao estudo das mulheres na ciência e na universidade (Fox, 1995, 2001, 2005; SmithDoerr, 2004; Reskin, 1978). Outra categoria substancial de estudos incide sobre a mobilidade geográfica (Bento, Cotta, Araújo, 2009, Mahroum, 2000).

Nos últimos tempos, tem sido usado o conceito de “fuga de cérebros" que, desde o final de 1950, caraterizou os estudos sobre as trajetórias dos cientistas (Giannoccolo, 2004). Como já dediquei um artigo a críticas a este conceito (Wagner, 2013), irei referir-me ao seu sucesso e longevidade. Mais de 50 anos depois o termo tem vindo a ser usado continuadamente para descrever um determinado fenómeno que tem ocorrido desde 1950, afetando, principalmente, os laboratórios britânicos que se mudaram para a América do Norte. A emigração em massa de cientistas principalmente para os EUA provocou um sentimento de perda avassaladora na Europa. Este fenómeno chamado “fuga de cérebros" também acabou por ser, precisamente, a base do sucesso rápido e impressionante da ciência americana (a primeira onda importante de emigração, no entanto, ocorreu por causa de regime nazista, primeiro na Alemanha e, depois, progressivamente, em toda a Europa, a partir de 1930 para 1945). A guerra fria (com a corrida ao armamento) e a proliferação do setor de investigação na área das ciências da vida constituíram dois processos que tiveram lugar nos EUA, desde 1950. Nos Estados Unidos, várias novas instituições foram criadas e isso constituiu uma dinâmica única no surgimento de locais de trabalho para os cientistas (Pestre & Dahan, 2004).

Este aumento da oferta de trabalho foi excecional. Naquele tempo (em 1970 e 1980) cientistas que hoje estão no final ou na última fase da sua trajetória de carreira, entraram no mercado de trabalho. Por outras palavras — o modelo de carreiras apresentado nos estudos e transmitido no mundo da investigação está a refletir as experiências de pessoas, cujo percurso profissional ocorreu derivado da dinâmica excecional de novas instituições e das enormes ofertas de emprego. Este foi o tempo de prosperidade excecional. Os investigadores não tiveram problemas em conseguir um bom emprego e uma posição permanente. Este plano de carreira não ficou só reservado aos cidadãos dos EUA: cientistas estrangeiros também tinham poucas dificuldades em obter posições permanentes. Para os cientistas europeus, em especial os que tem origem em países que, após a Segunda Guerra Mundial, experimentaram grandes dificuldades para (re) criar condições dignas para a investigação científica de nível internacional, o acesso a uma carreira de elite foi inequívoco: obtinham a formação teórica no seu país de origem e, de seguida, a formação prática na Europa Ocidental ou EUA e, finalmente, uma posição nos EUA.

O contexto de trabalho nos domínios da investigação mudou radicalmente nas últimas décadas do século XX por causa não só do colapso da União Soviética, mas também devido à modificação do ambiente universitário. A chamada “democratização" do ensino universitário que significa mais laureados com o grau de doutoramento — bem como a globalização / internacionalização ou, melhor, a imposição da cultura americana que dominou os campos da investigação (por exemplo, a famosa regra de publicar ou perecer mas publicar em Inglês, em revistas científicas na sua maioria norte-americanas) — a macdonalização da universidade, a mercantilização do ensino superior combinada com todas as mudanças neoliberais — todas juntas estas tendências criaram as condições para a deterioração das condições de trabalho nas organizações de investigação.

A globalização e as mudanças políticas (a livre circulação de investigadores altamente qualificados da União Soviética, ex-países do Leste Europeu e China) convergiram com a emigração tradicionais de jovens investigadores da Índia, Paquistão, Europa Ocidental, Japão e Coreia. No espaço de duas décadas, o mercado de lugares permanentes nos EUA (dentro do mundo da universidade e instituições de pesquisa — públicas ou privadas) tornou-se saturado. O modelo de carreira de sucesso construída ao longo de vários anos não está mais disponível, mas este é um assunto tabu comum no meio dos cientistas. Aqueles que jogam o jogo de corrida de ratos e acreditam que o sucesso depende de trabalho duro e do incremento do potencial inteletual não falam sobre o mercado de trabalho. Mantendo a ideologia segundo a qual o melhor ganha e a seleção dos investigadores é justa e repousa sobre os critérios profissionais meritocráticos, fazem de conta que tais características auxiliares como o país de origem, a religião, a classe e a universidade não desempenham qualquer papel num concurso à obtenção de um emprego.

No entanto, somente nos últimos anos, algumas vozes começaram a veicular que a precariedade de trabalho está a aumentar muito rapidamente no universo da investigação e da academia, por todas as partes do mundo. Desde há 10 anos estamos a assistir à mobilização da comunidade internacional dos investigadores que se esforçam para melhorar as suas condições de trabalho. Neste contexto complexo e internacional, surgem as primeiras publicações de estudiosos sobre carreiras científicas focadas em temas relacionados com os fenómenos migratórios e as situações específicas de cientistas estrangeiros discriminações e práticas ocultas no quotidiano que condicionam o acesso ao trabalho e ao emprego.

Em tal contexto, observamos as tensões entre dois modelos opostos de carreiras científicas internacionais: o primeiro a que chamo ‘o profissional transnacional ideal’ e o segundo, “um modelo da dupla ausência ‘— usando um termo cunhado pelo sociólogo franco-argelino, o especialista da migração, Abdelmalek Sayad (1999).

Estudos etnográficos e seus conceitos: profissional transnacional, transmobilidade e a dupla ausência (do micro ao meso)

Este artigo baseia-se num estudo etnográfico realizado em vários laboratórios de ciências da vida situados em quatro países (França, Polónia, EUA e Alemanha). A especificidade do método etnográfico reside na dispensa de uma abordagem teórica construída a priori (antes de iniciar o processo de recolha de dados); requerendo, antes, a elaboração dos conceitos durante o próprio período de observação, bem como a escolha gradual dos objetos de investigação sobre os quais nos debruçamos. Nesta secção, vou apresentar desenvolvimento da minha análise, tendo em conta os espaços onde decorreu a observação. Nessa sequência, apresento as definições e os conceitos criados durante o período de recolha de informação apenas nesta seção.

Comecei o estudo em 2003, na França (numa instituição de investigação básica e com uma equipa não muito habitual naquele campo específico, pois era chamada por todos os investigadores que trabalhavam no edifício como equipa “internacional": dos 15 membros da equipa, apenas três eram cidadãos franceses). Desde essa primeira experiência de observação de trabalho no laboratório de ciências da vida, era óbvio para mim que as dimensões da “cultura internacional do trabalho" ou das “relações de trabalho determinada pela cultura ou origem", por outras palavras, a cultura no sentido da “etnia" dos investigadores, era absolutamente importante[1].

Que se saiba não há literatura sociológica incidindo sobre este assunto em particular: não há referências a conflitos, a mal-entendidos ou a problemas relacionados com esta questão fundamental que é a experiência numa cultura miscigenada. Como é possível que as diferentes línguas dos membros da equipa, os vários estilos de organização, as práticas quotidianas divergentes e as abordagens heterogéneas não venham a ser fontes de problemas? As informações recolhidas sugerem que elas foram, de facto, questões das mais importantes na vida diária das pessoas que trabalham neste lugar (Wagner, 2011).

Comecei a comparar as situações observadas com as análises de especialistas em estudos de gestão intercultural para verificar se encontrava pontos interessantes, mas não surgiu nada realmente adequado para a investigação nos meus tópicos. As configurações interculturais típicas apresentadas na literatura sociológica assumem que a gestão está normalmente situada em países centrais e que os trabalhadores da produção se deslocam de áreas geográficas mais periféricas, para usar a tipologia de Wallerstein (Wallernstein, 1974). A origem nacional aparece corelacionada com a classe social e, geralmente, os investigadores fizeram as suas investigações em espaços bi-nacionais ou bi-culturais. As relações de tipo colonial e os padrões de poder/domínio eram facilmente percetíveis ao refletir-se sobre a divisão internacional do trabalho e da estrutura de poder global. No caso de laboratório de pesquisa, porém, a situação é muito mais complexa, pois as equipas são muito mais mistas. No entanto, como mostrarei mais tarde, as relações de poder correlacionados com origem nacional (étnica) dos investigadores estão igualmente presentes no mundo da investigação.

Para ilustrar a composição típica de um laboratório de investigação, a equipa que observei não era característica do ambiente de investigação Francês, mas era típica de uma instituição internacional de pesquisa em CTEM (que pode variar dependendo da especialidade na pesquisa médica, nos EUA[2]).

No meu campo de observação — das 14 pessoas observadas, três eram investigadores franceses, dois da Argentina, um americano-coreano, duas pessoas da Espanha, dois da Alemanha, uma pessoa da Suécia, um de Israel e um da Grécia. O PI (líder de grupo) era britânico. Após esta primeira imersão, numa instituição francesa, mas também dentro de uma equipa de trabalho verdadeiramente internacional, percebi as tensões existentes entre um modelo de carreira internacionalizada e as trajetórias profissionais locais. Essa questão pode ser ilustrada no excerto da entrevista realizada com um PI (britânico, também educado nos EUA e no Japão e atualmente a trabalhar numa instituição francesa):

O John está furioso: Eu não posso acreditar! Tu conheces o meu ex-aluno de doutoramento, François. Ele era muito bom para a investigação, fez um trabalho fantástico e eu ajudei-o a obter o seu pós-doutoramento em Harvard. Após um mês de contrato, ele recebeu a informação de que obtera a posição de professor associado em P. (pequena universidade na França) e decidiu voltar e interrompeu o seu contrato. Estou chocado ele estava no melhor lugar do mundo para a sua investigação e ele largou tudo por esta posição de ensino. Eu sei que este é um lugar de funcionário público e que tens trabalho até ao final de sua vida, mas a sua investigação! Eu não consigo entender isso.

Este exemplo mostra a opção (que, em si, é hoje uma situação excecional uma vez que as posições permanentes na área da investigação são raras) entre: 1) uma situação precária que as instituições de prestígio oferecem há alguns anos sob o contrato de pós doutoramento durante o qual a “corrida de ratos" pode permitir aceder a uma carreira de sucesso na investigação e 2) a estabilidade do trabalho no ensino e com piores condições para fazer a investigação. É uma escolha entre uma carreira internacional e uma trajetória profissional nacional. A excelência na investigação parece ficar bastante mais acessível seguindo o primeiro caminho. Esses dois modelos de carreira também são discerníveis em outros campos profissionais, tal como na música clássica (Wagner, 2015) ou no ensino secundário e superior (Wagner, 1998). Em França, as pessoas percebem as suas carreiras de acordo com o modelo francês e graças a instituições francesas ou seguindo a via internacional (na investigação normalmente indo para instituições britânicas ou norte-americanas).

Esta distinção nítida entre a carreira nacional e internacional sobressai no segundo trabalho de campo que comecei, em 2006, na Polónia. O parco apoio financeiro por parte do Estado contrastava com o alto nível do ensino superior (o conhecimento teórico foi em geral excelente e apenas em algumas áreas teve caráter prático). Para uma pessoa altamente bem formada se tornar cientista é obrigatória a experiência no estrangeiro. Hoje, no caso dos polacos, é impossível obter uma posição (não permanente, dado que hoje em dia este tipo de contrato não é possível devido às rígidas reformas no ensino superior e ciência) sem pós doutoramento no estrangeiro.

O trabalho de campo de quatro anos não ficava completo sem entrevistas com investigadores de outras especialidades de CTEM e sem observações de curto prazo realizados em laboratórios alemães e norte-americanos. Analisando a informação recolhida, cheguei ao termo “profissional transnacional" que reflete a importância da experiência internacional na carreira de cientistas. No caso dos investigadores polacos, este não é mais o caso de membros da elite, tal como era no passado (também fiz a comparação histórica das carreiras construídas desde a segunda guerra mundial) mas uma trajetória banal na área da investigação (com a exceção de alguns especialistas de ciências humanas, cujo trabalho se baseia na cultura polaca e na linguagem).

De acordo com os meus resultados, o profissional transnacional é um profissional (Reader, 1967) e que foi socializado em vários países; a sua carreira inclui múltiplas experiências de mobilidade geográfica. Esta pessoa é membro das redes internacionais e possui afiliações com diferentes instituições, de vários países; o profissional transnacional trabalha com financiamentos fornecidos por várias fontes (nacionais e internacionais) e comporta-se de acordo com a “cultura internacional do trabalho" (Wagner, 2011)[3]. O adjetivo “transnacional" requer alguma explicação. Enquanto a palavra “internacional" se pode entender a partir principalmente de Durkheim adquirindo o sentido de “cultura cosmopolita", nas definições científicas observamos uma versão diferente do métissagemais perto da interpretação maussiana sobre o que define o internacional. A fim de evitar mal-entendidos, decidi empregar o termo transnacional. Esta expressão apareceu na sociologia no estudo da (i)migração:

referindo-se às associações cívicas-políticos, envolvimentos económicos, redes sociais, e identidades culturais dos (i)migrantes e seus descendentes que se estendem para além das fronteiras do Estado-nacional e que ligam pessoas e instituições em dois ou mais Estados-nação em padrões diversos e multinível. (Morawska, 2009)

Este termo permite uma melhor compreensão do fenómeno, marcado pela dinâmica entre o nacional e o internacional, entre a heterogeneidade de múltiplas culturas e a homogeneidade devido à internacionalização (em certas situações poderíamos falar de americanização fenómeno) e pelas interações constantes que animam a atividade nos locais internacionalizados do trabalho (Wagner, 2014).

A visão que construí, graças à minha formação polaca em etnografia, é compatível com o discurso da política da União Europeia para a investigação que, antes de 2013, sublinhou a necessidade de mobilidade dos cientistas. A ideologia dos políticos que definem estratégias de investigação e a convicção sobre o poder da mobilidade geográfica são tão incisivas que nas publicações de sociólogos europeus, bem como nas discussões entre investigadores europeus, a mobilidade perdeu o seu significado geográfico e passou a designar apenas o fenómeno da mobilidade. Mobilidade que era diferente nos EUA, onde aparece relacionada principalmente com a mobilidade social (ou profissional) ascendente (ascensão vertical), e não com a horizontal (geográfica). Mas, este papel da mobilidade horizontal / geográfica foi tão importante que pensei usar o termo “transmobilidade" para definir o processo de interação entre a mobilidade geográfica e a progressão na carreira. A transmobilidade é um processo social que ocorre nos campos profissionais internacionalizados (artistas, cientistas) e que é composto a partir de diferentes fases. Pode-se definir quatro fases de acordo com a forma da mobilidade e o nível da reputação (precoce, básica, de perito e mobilidade tardia[4]).

O conceito de transmobilidade — parece ser ajustado para mostrar o caráter processual e a complexidade do fenómeno estudado, não se limitando a uma análise sobre a deslocação de um lugar para outro. Mostra a mobilidade como um fenómeno simultaneamente: i ) construído como um relacionamento continuado; ii) gerador de informação e conhecimento; iii) fonte de outros recursos; iv) que condensa o conjunto de técnicas e comportamentos desta “cultura profissional internacional". Por outras palavras, “transmobilidade" é, ao mesmo tempo, um processo no qual as pessoas participam para adquirir os conhecimentos e competências. Este processo torna possível a participação na atividade dentro da especialidade profissional a nível internacional (o que é para as ciências da vida uma situação normal), num contexto que é a consequência do progresso tecnológico.

O próximo passo do meu estudo sobre cultura internacional foi concretizado na “Meca da pesquisa das ciências da vida", em algumas das melhores instituições de Boston dedicadas à pesquisa básica.

Na “Meca da pesquisa das ciências da vida", o laboratório onde fiz a observação, integrava um sueco em pós doutoramento, dois alemães, um francês, um polaco, um da Tailândia, estudantes de doutoramento da China, um investigador sénior chinês, um chinês em pós doutoramento, dois técnicos norte-americanos, um técnico polaco. Um americano-coreano em pós doutoramento e um japonês em pós doutoramento.

O líder era polaco-americano. Podiam-se usar 9 línguas neste lugar, mas, no entanto, o Inglês foi imposto e, somente em algumas situações ou discussões, era usado o chinês e/ou o polaco.

A fim de obter mais dados, também passei muito tempo no espaço de pós doutoramento, onde pessoas de todo o Instituto vinham para fazer coffee breaks e para descansar. Ali, consegui observar as pessoas no trabalho enquanto eu própria estava imersa no mítico fenómeno de ser “pós doutoranda nos EUA". Além da perspetiva típica de uma cientista francesa e polaca a trabalhar num laboratório dos Estados Unidos, poderia aprender a compreender situações de asiáticos e de outros investigadores de origem europeia. As minhas dúvidas sobre a cultura internacional em que os condicionantes profissionais rivalizavam com as características “auxiliares" dos investigadores, foram sendo alimentadas por situações quotidianas de numerosos relatos de investigadores estrangeiros que passaram por situações que eles/as próprios avaliaram como tendo sido discriminatórias.

O termo “caraterística auxiliar" (auxiliar characteristic), como ferramenta para investigar as carreiras pessoais, foi introduzida na sociologia por Hughes. Num artigo de 1945 —"Dilemas e Contradições do Status" — Hughes mostrou como as características não-profissionais, que não estão relacionadas com competências técnicas (que o autor exemplificou através da figura do médico afro-americano), seja de raça ou a cor da pele, podem determinar a perceção que o cliente tem de um certo profissional e, por conseguinte, podem desempenhar um papel importante na trajetória de um profissional. No meu trabalho de campo que desenvolvi nos Estados Unidos tive várias hipóteses de recolher os dados relativos sobre este fenómeno; um dos primeiros resultados do meu trabalho foi um texto que escrevi sobre o que os insiders designavam como “laboratórios do gueto". Neste artigo, analisei os efeitos da internacionalização das equipas científicas e dei conta de uma lista de obstáculos que os investigadores estrangeiros enfrentam normalmente na construção de carreira.

A primeira categoria de obstáculos está relacionada com a linguagem. A língua falada no laboratório de ciências da vida nos locais internacionalizados poderia ser chamada de Inglês Pidgin. Isto é, não se trata realmente do inglês tal como é usado pelos nativos nas relações de comunicação.

Um dos participantes contou-me a seguinte história:

O meu companheiro australiano chegou a casa depois de ter estado 2 anos a trabalhar na França. Após algumas horas passadas com os pais, a família pediu-lhe para falar inglês e para empregar mais de 200 palavras. Na verdade, as suas competências na língua ficaram mais modestas, pois no seu local de trabalho os cientistas estrangeiros usam formas muito básicas e tentam comunicar de forma direta, sem linguagem elaborada.

Mesmo que o Inglês Pidgin não seja realmente complicado para cientistas estrangeiros (exceto, talvez, para os britânicos, australianos, irlandeses e outras pessoas provenientes de regiões em que o Inglês é a primeira língua falada) os investigadores têm sotaques diferentes que se devem às influências da sua língua materna e, muitos deles, têm dificuldades em se fazerem compreender.

Recolhi opiniões sobre a recusa em falar por parte de cientistas de algumas origens (chinesa, japonesa e, por vezes, indiana) com medo de não serem capazes de manter uma comunicação clara a base para a colaboração bem-sucedida na ciência e qual garante o bom funcionamento da equipa no laboratório. Para ser tão precisa quanto possível, a fim de explicar o que deve ser feito ou o que uma determinada pessoa está a fazer ou quando o assunto é o espaço científico desconhecido (em pesquisa básica esta é uma situação premente), é muito importante para todas as pessoas que trabalham no projeto. É muito difícil assegurar, através informação curricular, se um candidato para uma posição de pós doutoramento é capaz de expressar claramente as suas ideias em Inglês. Durante o processo de seleção, esta competência está entre as características mais importantes a considerar. Por conseguinte, a noção de “característica auxiliar" corresponde bem a uma situação em que um excelente estudioso chinês não seria aceite para o seu pós doutoramento devido à falta de adequação da sua pronúncia. Um falante nativo Inglês não passará por essa condição eliminatória.

No entanto, não é apenas o sotaque que garante uma comunicação bem sucedida. Os significados culturais e a compreensão também são muito importantes (Wierzbicka, 1994). São lendárias nos laboratórios as estórias sobre as culturas em que as pessoas não são capazes de dizer ‘não’. Para os de culturas europeias, a recusa é fácil (alguns sistemas de educação recompensam mesmo a abordagem crítica dos alunos), enquanto para outras culturas recusar ou negar são atos percebidos como expressão de desrespeito e, por isso, torna-se um padrão habitual quase impossível de transgredir.

A estória a seguir descreve essa situação:

Eu estava ciente de que no Japão eles não estão a dizer não. Eu li isso antes de eu vir para Quioto durante a primeira semana, quando eu li o livro sobre a cultura japonesa. Mas no laboratório, eu não prestei atenção suficiente a esse facto. Quando perguntei ao colega que trabalhou comigo no projeto - “tu entendeste"? Ele disse “Okay" e, só depois de 2 meses de trabalho, percebi que ele fez experiências erradas e todos os seus erros foram devidos à falta de entendimento. Não lhe foi possível dizer “não tens de repetir" ou “eu não entendi".

Outro cientista polaco, depois de ter estado em doutoramento no Japão, afirma:

Eu colecionava um grande número de histórias semelhantes. É interessante o poder da nossa cultura de origem e como nos falta abertura ou atitudes não-etnocêntricas somos criados numa cultura em que os padrões de comunicação incluem a expressão do “não" e é difícil termos consciência de que outras pessoas podem ser educados de uma forma diferente.

Outra característica auxiliar que remete frequentemente para o assunto da discriminação e que torna a carreira científica mais difícil está relacionada com o sexo. Quando se cruzam duas características discriminatórias (origem étnica e género), temos uma situação muito difícil para um cientista que está a tentar construir a sua carreira ‘simplesmente’ na base de competências e conhecimentos profissionais.

Uma mulher cientista de 40 anos de idade da América do Norte afirma:

Tu sabes, isso é loucura, o poder da tua educação. Quando estive nos EUA, eu nunca tive problemas para discutir ciência com as pessoas, para desenvolver argumentação, para debate, entrar em contradição com alguém. Mas, quando estou no meu país, no Japão, isso é algo em mim que está a mudar. Eu torno-me numa menina e, na frente daqueles velhos professores ou mesmo daqueles que são da minha idade, eu não sou capaz de dizer “não! Tu estás errado!" Mesmo que tenha provas robustas e esteja convencida de que eles não têm razão tu sabes que este é o poder da minha socialização primária. Tu tens estatuto inferior e tu és mulher!

Em algumas situações, o género, como característica auxiliar, pode ser uma variável discriminatória também no caso dos homens:

Afirma uma mulher de 50 anos de idade, investigadora responsável (PI):

Eu tinha muito má experiência com esta colaboração com um tipo da Ásia Oriental. Ele estava sempre a dizer de forma muito vigorosa que entendia e que estava certo, etc., que não era capaz de aceitar as críticas e reconhecer as suas falhas. E, tenho certeza de que era porque eu sou uma mulher. Então, eu não fui capaz de orientá-lo e, depois de 2 anos de colaboração, o contrato expirou. Ele não tinha nenhuma publicação e eu não era favorável a uma prorrogação. E tu sabes o quê? Desde então, não aceito pessoas desta região, porque eu acho que, para eles, ter um chefe do sexo feminino é inaceitável. Mesmo sendo inteligentes, a sua educação é de tal maneira que acham que devem estar sempre em situação de domínio em relação às mulheres .... .

O que é importante no excerto desta entrevista é a convicção desta Investigadora Responsável (PI) sobre o facto de o problema na comunicação se ficar a dever à cultura e à socialização de género, tida como diferente da ocidental[5]. Sob essa perspetiva é evidente que a origem cultural desempenhará um papel crucial no processo de seleção para o cargo de pós doutoramento.

Os aspetos acima mencionados são fáceis de observar e analisar. O mesmo não pode ser dito sobre outros tipos de comunicações, que incluem sentimentos, conflitos e da dinâmica dos relacionamentos construídos ao longo do tempo.

Uma especialista no campo da sociolinguística, Wierzbicka, demonstrou como a nossa educação primária e os primeiros anos de nossa vida determinam os nossos sentimentos para o resto da nossa vida. Os cientistas móveis geralmente passam cerca de 20 anos da sua vida em diferentes ambientes culturais, nos EUA e noutras metrópoles europeias ou campus universitários. Os seus guias culturais (Wierzbicka, 1994) estão bem sólidos e funcionam como padrões culturais em diferentes situações. Isto é especialmente importante do ponto de vista da organização do trabalho e em situações de conflito que têm vindo a aumentar no ambiente que observámos, pois o espaço de laboratório é um ambiente social em que várias tensões favorecem situações de conflito[6].

As pessoas que trabalham em equipas internacionais possuem vários modelos de resolução de conflitos e diferentes perspetivas sobre o que é “perder a face". Na minha perspetiva, a análise goffmaniana acerca da manutenção de relacionamentos, assim como a abordagem interacionista que pressupõe o conhecimento sobre significações do nosso comportamento e expressões, devem ser complementados com análises dos aspetos culturais mesmo que esperemos algum “modelo intercultural de solução de conflitos" adaptado para a organização de trabalho no laboratório, a informação recolhida através da observação sugere que os participantes estão constantemente numa situação “in-between": oscilando entre os seus padrões culturais originais e algo que cada um deles imagina como “internacional" ou “global" ou modelos “profissionais" de gestão de conflitos[7].

Na verdade, não há estudos acerca dessas questões sobre gestão nos laboratórios. Os especialistas na área do trabalho concentram-se noutros problemas, como se as questões das diferenças culturais estivessem ausentes do mundo científico. No entanto, este é o ambiente social e profissional semelhante a outros lugares onde o modo de lidar com a presença multicultural se correlaciona com o uso de estereótipos que acabam por preencher a falta de conhecimento sobre uma determinada cultura ou evento.

Se os estereótipos ligados à origem nacional dos atores estão ativos, também exigem alguma adaptação ao ambiente de trabalho científico. Os cientistas desejam ter a mente aberta e tolerante e, certamente, estão a fazer enormes esforços a fim de prosseguir o seu trabalho em tais ambientes culturais complexos. Em alguns lugares, criam e usam guias formais, a fim de implementar boas práticas, independentemente dos hábitos que os recém-chegados possam ou não ter. Um chefe de laboratório disse-me que pede a cada aluno de doutoramento da Ásia para escrever à mão a definição de plágio. Ele passa horas a explicar que a transcrição sem citar a fonte é uma prática errada e não representa um reconhecimento para com o mestre (como é o caso na cultura chinesa). Outra pessoa disse-me ter explicado várias vezes que as revistas do conselho (espaço em que as experiências e todo o trabalho de laboratório são documentadas) são pessoais e que ninguém deve lê-las sem pedir. Eu observei como um jovem cientista ensinou ao seu colega por que razão olhar para o ecrã do computador de outra pessoa sem a sua autorização é falta de educação e constitui uma transgressão da regra de privacidade. Este tipo de educação cultural ocorre constantemente nos laboratórios.

Tais situações fornecem espaço para explicar as regras obrigatórias no mundo ocidental. Nesse seguimento, as pessoas envolvidas devem compreender e respeitá-las, ou compreender e não as respeitar, conforme as situações e os participantes. Não se trata mais de uma questão de cultura de origem, mas de uma questão de natureza humana, pois a violação das regras e as transgressões de boas práticas não ocorrem apenas em ambientes multiculturais.

Em todos os campos observados, consegui perceber as relações mais estreitas entre os participantes, que, em alguns casos, conduzem à génese de uma hierarquia informal. Há pessoas que colaboram mais com uma pessoa do que com outra, não só por causa do projeto, mas porque se entendem melhor. De acordo com a sociologia do trabalho, uma boa comunicação é fundamental para uma colaboração frutuosa. Como mencionei anteriormente, alguns obstáculos devem-se à origem diversa dos participantes. Por isso, frequentemente as pessoas de culturas similares colaboram de forma mais estreita. Não vou desenvolver a ideia sobre a importância das semelhanças culturais e da formação educacional para o conhecimento científico — porque irei versar sobre este assunto noutra publicação. No entanto, devemos notar que esse entendimento cultural também é importante para questões fundamentais do trabalho científico: não só na área das soft skills, boas relações humanas e comunicação clara, mas também no que respeita as capacidades científicas.

Concluindo esta secção dedicada a uma análise do impacto das “diferenças culturais em carreiras científicas", poderíamos entender por que as pessoas estão a organizar o seu trabalho nos chamados “laboratórios do gueto"— o que significa que escolhem colaboradores provenientes de áreas culturais mais próximas ou simplesmente a partir do espaço cultural que é conhecido pela pessoa encarregada da seleção (por exemplo, após a experiência bem sucedida de colaboração entre um PI francês e um pós-doutorado chinês, o PI não hesitará em contratar outro jovem cientista da China. Conheci pessoas que, depois de terem tido boas colaborações, ficaram fascinadas por essa cultura “exótica", começaram a aprender chinês).

Independentemente da falta de informação sobre os aspetos culturais do trabalho no laboratório científico, argumentamos que a cultura é importante. A cultura é também uma característica auxiliar crucial e pode ser um elemento determinante da seleção negativa.

A dupla ausência

Os dados recolhidos no meu trabalho de campo nos EUA vieram fornecer informações sobre o impacto que a origem nacional dos cientistas pode ter sobre as suas perspetivas de emprego e de desenvolvimento de carreira. Inúmeros serviços que se propõem ajudar os cientistas estrangeiros na redação de projetos de bolsas ou correções de textos indicam existir uma grande diferença entre as pessoas educadas sob influência da língua inglesa e as outras. Mas escrever bem em Inglês não é o único elemento.

Um dos IR disse-me:

Tu sabes: eu não posso investir em todas as pessoas do meu laboratório. Há mais de 20 pessoas e algumas delas estão aqui por um curto espaço de tempo. Eu não posso passar horas com eles a ensiná-los a escrever uma proposta de bolsa. Isso exige uma enorme quantidade de trabalho. Eu faço isso com as pessoas que vão ficar nos EUA, elas estão decididas a prosseguir a sua carreira aqui, não têm problemas de não-adaptação.

Como este cientista americano disse, a investigação é importante para a próxima geração de cientistas, mas nem todas as pessoas no laboratório irão beneficiar do mesmo tratamento. A minha pesquisa anterior mostrou que numa atividade profissional criativa, na qual o elemento crucial da carreira é a construção da reputação entre pares e em que o tipo de conhecimento é reservado para os especialistas altamente qualificados, o que se torna mais importante é o processo de acompanhamento da carreira (Wagner, 2006). O acompanhamento da carreira significa a colaboração muito estreita entre especialistas (normalmente na relação mestre e discípulo) durante a qual ocorre a interação entre duas carreiras, e as pessoas no campo reconhecem que a colaboração de cada um está a ser beneficiada pela outra carreira. Tal investimento numa relação de acoplamento carreira só é possível num número limitado de casos que exigem diariamente intensa colaboração. Durante os primeiros períodos de tais relações, as pessoas procuram verificar o que têm em comum de modo a estabelecerem uma colaboração intensiva e fusional durante anos. Certamente que uma cultura semelhante e uma comunicação fluída tornam a aproximação mais fácil. Para os que têm dificuldade em se aproximar dos supervisores e não são capazes de desenvolver uma relação privilegiada com eles, a sensação de falta de mentores e de oportunidade para aprender segundo esses canones é avassaladora. A aprendizagem de importantes habilidades (redação de artigos, submissão de propostas, escrita do CV de acordo com o estilo preferido de uma determinada área, declarações pessoais, cartas de motivação, entrada na rede da qual faz parte o mentor, introdução ao trabalho de revisão e, por vezes, a assistência pedagógica) é também importante enquanto conhecimento científico puro. Sem acesso a recursos informais (os recursos formais são modestos, pois os estrangeiros não estão propriamente no seu espaço), parece ser difícil dar o próximo passo na carreira neste país.

Uma antiga cientista que se tornou consultora e conselheira de jovens cientistas, ela mesmo originária da Índia, disse-me durante uma entrevista que os pós doutorandos estrangeiros dificilmente terão possibilidades de permanecer nos EUA obtendo algo mais estável do que pós-doutoramento. Ela reafirmou que o nível de Inglês, bem como a não adaptação cultural tornam impossível a entrada mesmo numa universidade de segundo nível. Que não sabem como ensinar os estudantes americanos e como fazer parte do corpo docente. Estão completamente perdidos com as burocracias da universidade, acabando por não ter dinheiro para a sua investigação. No final desta análise, esta cientista disse-me que as pessoas da Europa (Ocidental) estão melhor preparadas do que as que vem da Ásia, no entanto, a comissão de recrutamento seleção terá problemas em escolhê-los — e, tendo habilidades e produções iguais, acabarão por escolher o(a) candidato(a) americano. Ela ressaltou que:

Nós os pais norte-americanostemos de pagar muito para a educação dos nossos filhos e devemos apoiar os nossos filhos nas seleções. Na Europa, vocês têm a educação gratuita e a competição não é só esta. Tu sabes, para um filho temos mais de 200 000 dólares de hipotecas. Isso é muito dinheiro. Os tempos são difíceis e devemos apoiar-nos uns aos outros – tu entendes?

À luz deste excerto não é de estranhar que os cientistas estrangeiros percebam a sua origem como um obstáculo. Não me estou a debruçar sobre a questão dos vistos ou sobre as decisões por trás da sua atribuição e que tem impacto sobre as carreiras científicas (depois do 11 de setembro um grande número de cientistas do Médio Oriente tiveram problemas em prosseguir a carreira nos EUA). Os estrangeiros são trabalhadores científicos baratos que contribuem para o desenvolvimento da ciência americana, ainda que sem perspetiva de conseguir um emprego, tal como os seus colegas americanos o conseguirão. Tenho notado que, para a maioria dos meus entrevistados e participantes com quem me encontrei nos EUA, o futuro profissional vai ser difícil. Alguns falam em voltar para seu país (conforme o país), outros falam em voltar para a UE (como a maioria dos polacos que preferem trabalhar na União Europeia, embora não na Polónia). As visões que têm da situação no presente e no futuro próximo são semelhantes a de outros emigrantes que denotam estarem certos de serem cidadãos de segunda categoria, não terem os mesmos direitos que as outras pessoas na mesma situação, embora com um melhor passaporte.

O especialista de estudos de migração, Abdelmalek Sayad, definiu o conceito de dupla ausência (1994). No seu livro, o autor descreveu a situação de várias gerações de emigrantes submetidas à situação de dupla ausência: já não estão no seu país de origem, perderam as ligações importantes e tornaram-se turistas que visitam a sua família, e, ao mesmo tempo, não têm direitos como os cidadãos no país que escolheram viver. Não têm o mesmo acesso ao desenvolvimento profissional ou a outros recursos a que acedem os nativos. A perspetiva do desenvolvimento de carreira e melhoria da sua situação pessoal e financeira não são semelhantes aos da população nativa. Não se podem tornar membros das instituições de governo local, não têm acesso a cargos importantes. Os cientistas estrangeiros que trabalham no estrangeiro enfrentam a mesma situação. Não é exagero empregar o conceito de dupla ausência no caso de cientistas emigrantes. Aliás, aqueles que estão a voltar ao seu país também estão na categoria similar. Perderam a sua posição, especialmente se a sua experiência de mobilidade foi de longa duração. Como é o caso de numerosos cientistas, após vários anos de ausência (a carreira foi fortemente encorajada pela política da UE) o seu regresso não é fácil. No meu trabalho dedicado à população de cientistas polacos de elite, que voltaram depois das suas experiências no exterior, o sentimento de não adaptação, de ser-se um estranho e uma pessoa não muito bem-vinda por aqueles que ficaram no seu país e que trabalhavam de acordo com “ o velho estilo “ está largamente enraizado. Os cientistas falam sobre uma “cola": uma espécie de conjunção de várias dificuldades para implementar algumas modificações, principalmente relacionados com a organização do trabalho.

Os resultados do meu estudo permitem introduzir na área dos estudos sobre as carreiras o conceito de depressão de pós-doutoramento. Trata-se de definir um sentimento persistente de falta de agência e fracasso e que ocorre alguns meses após o regresso dos cientistas. Como ficam, em geral, muito motivados quando têm a possibilidade de voltar para o país de origem e obter uma posição (normalmente temporária) têm a expetativa de estarem em pé de igualdade de direitos, como as restantes pessoas que trabalham no mesmo espaço aonde também vão ficar. Frequentemente o não cumprimento dessa expetativa conduz à desilusão e decepção, não sendo capazes de executar o seu trabalho de investigação com o nível de dinamismo que tinham em fases anteriores da carreira (pós doutoramento no exterior).

Custo pessoal

Por consequência, o uso do conceito de dupla ausência está justificado. A mobilidade e a flexibilidade de cientistas no período de pós doutoramento são necessárias todas as pessoas são convidadas a moverem-se para outro país, independentemente de terem pais idosos, família recente, às vezes com membros próximos da família, às vezes sozinhos. O custo pessoal desta vida à distância dos membros da família não está de todo estudado. Muitos divórcios de casais, casais a viverem separados, relações que acabam abruptamente... Tantos acontecimentos de vida importantes a que se falta (os bons, como festas de final de ano e casamentos na família, ou difíceis, como a morte de membros familiares mais velhos ou a ajuda os pais na sua vida diária). Todos esses sacrifícios não são compensados nem com salários correspondentes (como acontece no caso dos gestores internacionais), nem com perspetivas de carreira interessantes. A ciência é voraz.

Este lado triste da experiência de ser um cientista internacional é, de acordo com meu conhecimento, pouco estudada e raramente constitui objeto de comunicações escritas. Mesmo as informações recolhidas sejam ricas, a comunidade científica não está a partilhar informação sobre as variáveis que moldam as suas vidas. Porquê?

Vários estudos dedicados aos cientistas móveis não empregam etnografia e esta é, em minha opinião, o único método adequado para trazer à luzes práticas discriminatórias. O foco nos estudos sobre regulamentações e implementações da lei não está a refletir a realidade, como neste caso de uma cientista bi-nacional:

Após o seu doutoramento na França esta cientista mudou-se para a Polónia e ali, dois anos após a regulamentação sobre o reconhecimento de diplomas e da assinatura do processo de Bolonha, amplamente implementado de acordo diretivas assinadas sob a supervisão da UE, a jovem portadora de um doutoramento francês era suposta obter o reconhecimento a fim de poder concorrer a uma vaga de dois anos como professora assistente. Tal procedimento era, no entanto, à luz dos regulamentos da EU, ilegal. Vários anos depois, essa mesma pessoa obteve a qualificação na Polónia. Para ser autorizada a apresentar – se no concurso para professora titular na França seguiu com o processo de qualificação. De novo, na França, a prática nacional (ilegal, mas usada) contra os regulamentos da UEde reconhecimento mútuo de diplomas. A comissão francesa para a qualificação aconselhou a candidata franco-polaca propor-se novamente à qualificação, em França.

Duas situações em dois países diferentes mostram como a internacionalização, sob a forma da europeização, não está a funcionar e como os cientistas móveis estão na situação de dupla ausência, penalizados por causa do seu percurso internacional.

Mentira coletiva

O conceito de mentira coletiva constitui outro fruto de décadas de trabalho conduzidas por Abdelmalek Sayad no meio dos emigrantes Norte Africanos que vivem na França. Este termo refere-se ao fenómeno de manter o silêncio coletivo sobre as condições de trabalho e de vida dos emigrantes em França, face aos membros da família que ficaram no seu país (Sayad, 1999).

Este silêncio e omissão de informações sobre as dificuldades e o tratamento discriminatório dos emigrantes nos contatos que têm com familiares desempenham um papel importante na manutenção da imagem de que são pessoas de sucesso e com uma vida feliz que os emigrantes têm em seu novo local. A mentira coletiva prepara a próxima geração de emigrantes para o caminho migratório. Alguns casos de sucesso real ilustram meramente o carater excepcional de algumas trajetórias.

Esta situação é semelhante para os cientistas. As estórias sobre carreiras não falam sobre o lado triste da situação de cientistas que emigraram. Alguns delas são reais, mas, como já referi na introdução, as carreiras foram desenvolvidas no passado, num contexto completamente diferente em termos de mercado de trabalho, quando os cientistas puderam escolher o local de trabalho e quando as posições permanentes e posições estáveis não eram, de todo, excecionais. A mentira coletiva sobre a situação de cientistas precários (os emigrantes, mas também aqueles que tentam construir carreira no seu país de origem) está a funcionar bem para os políticos da ciência que popularizaram a mobilidade geográfica até ao ponto de criarem aquilo que acima nomeei transmobilidade, ou seja, a mobilidade tornou-se num elemento crucial para as carreiras científicas.

Finalmente, a mobilidade e numerosas “possibilidades de conseguir um emprego em todo o mundo" deram-nos a esperança de um futuro melhor. As promessas de ter uma oportunidade e a possibilidade de enviar o CV para qualquer parte do mundo atraem alguns cientistas, ainda que só algumas exceções venham a ser bem-sucedidas no jogo do “tribunal mundial" para conseguir trabalho. Aqueles que não ficarem vão convencer-se que são culpados e que não são suficientemente bons, que o seu currículo não é suficientemente rico, que a sua lista de publicações não é suficientemente extensa e que o índice de IF ou H não é suficientemente elevado.

Na cultura do individualismo, o fracasso não é individual, mas estrutural e a mentira coletiva sustenta este mecanismo para explicar fracassos a partir de fraquezas individuais. Quando sociólogos e especialistas nos estudos sobre carreiras nos mundos da ciência e da academia começarem a trabalhar intensamente sobre os aspetos mencionados acima irão contribuir para quebrar o silêncio sobre a qualidade de vida e as perspetivas de carreira de milhares de cientistas formados em países periféricos (onde a sociedade se organiza para a garantia da educação gratuita dos melhores alunos) e que trabalham em países desenvolvidos (onde estão sub-remunerados e explorados; Stephen, 2012) e talvez um debate mais geral contribua para a melhoria das situações de cientistas.

Conclusão: os investigadores Kleenex...

O trabalho científico é um empreendimento coletivo e a individualização da nossa sociedade que ocorre recentemente sob influência neoliberal bem percebida na Academia e no ambiente Ciência não caminham lado a lado.

Paula Stephen, uma economista americana, usando as ferramentas da sua disciplina-demonstra a enorme corrupção estatal e o desperdício de recursos públicos derivados desse novo tipo de gestão liberal. Além disso, fala abertamente sobre a exploração de trabalhadores baratos. Eu chamo-os investigadores Kleenex, uma vez que despendem 10 dos seus melhores anos de vida profissional a trabalhar num pós doutorando sem outras perspetivas.

Neste artigo fiz uma pergunta sobre a situação dos investigadores que trabalham em laboratórios de ciências da vida (em certa medida, esta análise diz respeito também outros especialistas investigadores).

No meio, há uma grande variedade de situações que oscilam no espaço delimitado, de um lado (positivo), pelo profissional transnacional que define o sucesso de cientistas que realizam a sua carreira em dois (ou mais) países e estão presentes a internacional nível e, do outro lado – o (negativo) – o cientista duplamente ausente – o investigador emigrante ou temporariamente presente noutro país destituído dos recursos similares aos dos seus e suas colegas de laboratório com origem no país aonde trabalham.

A perspetiva interacionista inclui tradicionalmente no estudo da carreira as dinâmicas da situação. Esta é a razão pela qual se deve olhar sempre para uma determinada situação particular no seu contexto e dinâmica. Uma pessoa pode experimentar ambas as situações. A carreira dos cientistas é longa – geralmente mais de 40 anos – e as práticas de mobilidade são várias. O contexto em torno dessas carreiras também é muito dinâmico e multidimensional (algumas disciplinas tornam-se “quentes" e outras perdem popularidade). A carreira profissional em campos criativos é sempre complexa e depende de múltiplos factores e conjunções de elementos. As características de mobilidade e de apoio a trajetórias no mundo da pesquis tem muitas vezes impacto crucial. É por isso que nós – os sociólogos – temos um importante papel a desempenhar para quebrar a mentira coletiva e contribuir para a melhoria da condição de trabalho dos investigadores. Esta área da atividade humana deve ser livre de exploração, de relações de dominação Norte / Sul e relações de poder centro-periferia — como mostram diversos estudos relativos às melhores condições para a criatividade, engenhosidade e inovação.

 

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Nota biográfica

Izabela Wagner é professora associada desde 2008 na Faculdade de Filosofia e Sociologia na Universidade de Varsóvia e centro de sociologia do trabalho e das organizações. Presentemente é professora visitante na Universidade de Cagliari, Itália.

E-mail: wagneri@is.uw.edu.pl

Universidade de Varsóvia, Institute of Sociology, ul. Karowa 18, 00-927 Warszawa, Polónia

 

* Submetido: 03-04-2015

* Aceite: 02-07-2015

 

Notas

[1]Esta é uma abordagem muito conhecida na Polónia, primeiramente introduzida por Ludwik Fleck que ficou internacionalmente conhecido graças à Escola de Edimburgo e depois da publicação da obra de Thomas Kuhn “A estrutura das revoluções científicas" (1962). Em 1935, Fleck, um famoso microbiólogo, físico, sociólogo e filósofo da ciência publicou num livro traduzido 44 anos depois em inglês com o seguinte título: The Genesis and Development of a Scientific Fact, (editado por T. J. Trenn e R.K. Merton, com prefácio de Thomas Kuhn), pela Universidade de Chicago, em 1979. Fleck debruçou-se sobre a questão do conhecimento coletivo, mas também mostrou como é importante para a produção de conhecimento científico o papel desempenhado pelo cientista ele/ela próprio(a) e pela cultura em que está enraizado/a.

[2]Quando apresentei os meus resultados aos estudantes de STS em Harvard, em 2010, um estudante perguntou-me se eu estava a descrever o laboratório do pai dele (na China) pois aquela situação que eu descrevera era, segundo ele, exatamente a situação dessa equipa. Obviamente, eu tinha descrito outra equipa. É essencial saber que algumas especialidades estão sobre representadas por investigadores de um certo país, por exemplo, na bio informática, há muitos investigadores da Rússia, os cristalógrafos são normalmente formados na Polónia (tradicionalmente).

[3]Não vou desenvolver aqui o termo de cultura internacional do trabalho porque não é um termo preciso e requer uma longa perspetiva de análise. De forma sintética, diremos que define um tipo de cultura profissional que não está inscrita num reportório e é objeto de transmissão direta por meio da imersão requerendo tolerância e flexibilidade na comunicação do dia-a-dia, uma atitude mais aberta face às pessoas que têm origem noutros países e não são falam o inglês nativo (Wagner, 2011).

[4]É importante mencionar que o modelo reflete um ideal tipo o limite da idade, por exemplo, é adotado nos requisitos e categorizações das instituições europeias. De facto, esta é uma visão masculina da carreira científica, na qual os anos da parentalidade não são considerados. Trata-se de uma das variáveis importantes, embora nem sempre reconhecidas, de desigualdade de género.

[5]Estou a seguir a perspetiva dos participantes, não especialistas em género que estão obviamente conscientes das importantes diferenças na educação de género implementada nos países da União Europeia, diferenças de estatuto e classe social e áreas profissionais. Mas para os meus participantes esta é uma caixa negra/branca onde existem duas categoriais de educação de género: a ocidental que respeita a igualdade e a outra (para os participantes tal está relacionado com a religião de acordo com a qual o islão é uma cultura na qual a desigualdade de género é altamente discriminadora das mulheres).

[6]As tensões devem-se a vários factores estruturais (contratos temporários, falta de estabilidade, competição por bolsas, publicar ou perecer, expetativas de publicar e ter bons resultados, pressão para acabar o doutoramento, sistema de avaliação, falta de casa e da família, estar num país estrangeiro, linguagem diferente na comunicação diária, diferente alimentação e clima, relacionais (relação orientando orientador, dependências na colaboração, modelos de relação profissional, aprendizagem constante dos relacionamentos em várias situações, o sentimento de estar aparte) e pessoais (o ambiente profissional no qual o sentimento desvantagem comparativa (comparative failure) (Glaser, 1967; Hermanowicz, 1999) é elevado.

[7]Num outro texto dedicado ao tema do “laboratório de gueto" mostro vários exemplos de conflito.

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